ToNyDeAtH, não é você aquele que costuma dizer que religião é distúrbio mental, ou algo assim? De fato, é. E, neste caso, o que você espera de alguém que sofre de distúrbio mental? Alguma razoabilidade, para dizer o mínimo? Desista, não vai conseguir. O mundo é terrível demais com a presença de crentes? Sem dúvida alguma que é. E o mais terrível é que não podemos fazer nada muito efetivo em termos imediatistas.
Temos que reconhecer que o mundo ainda é dos crentes.
Então, seja você prático e razoável. Faça como Newton, Mendel, Einstein, eu mesmo e muitos mais já fizeram e fazem: minta, finja, escreva coisas místicas, ingresse na vida monástica se isso se mostrar uma boa alternativa para a sobrevivência, diga coisas filosóficas de cunho religioso para agradar os ouvintes. Eu tenho diversos parentes que até hoje pensam que sou tão crente *ou mais* que eles. Você talvez se surpreendêsse se me visse conversando com eles depois de ler coisas que já escrevi aqui.
É claro que há momentos incontroláveis de agonia no meio de tudo isso. Ivan Pavlov, por exemplo, manteve bem seu teatro por bastante tempo, mas chegou o dia em que não aguentou mais e, enquanto calçava as meias para se preparar para ir à igreja, o que fazia com religiosa regularidade por anos, largou mão de tudo de repente, largou as meias e disse para a esposa: chega de fingimento, não aguento mais! Não aguento mais fingir que sou estúpido como os outros! A esposa ficou muito chocada, mas depois ele se "emendou" -- foi só um desabafo. Não foi mais à igreja, mas não saiu por aí vociferando sua racionalidade.
Mas não cometa o erro que eu cometi -- o de pensar que o número de seres *realmente*, *integralmente* racionais é muito maior do que realmente é. Não se engane com miríades de classificações feitas entre muitos ditos céticos. Esse negócio de muitas subclassificações é para crentes, fantasiosos, pensadores mágicos em geral, que formam inúmeros subgrupos de irracionalidade, não para mentes racionais. Essa coisa de agnósticos, ateus fortes, fracos, meio-médio-ligeiros... são disfarces para crenças latentes. Não aceite que te chamem de ateu forte (ou melhor, aceite para não alongar em demasia certas inúteis discussões, mas não para si mesmo -- saiba, *exatamente*, quem/o que você é porque quem é crente, inclusos muitos que se dizem agnósticos, ateus, etc., não sabem, e essa talvez seja a principal das características desses e o motivador da busca por uma classificação). Se você percebe a clareza da realidade e entende que coisas mágicas não existem, seu problema interno está resolvido. O problema externo, das relações, não pode ser resolvido por "decisões" e movimentos advindos da nossa "vontade". É algo que não pode ser satisfatoriamente manobrado, nem mesmo por uma mente racional.
Crentes não precisam da racionalidade dos racionais; vivem muito bem como estão. Conseguiram a única coisa que poderia fazer falta e causar transtorno pela ausência -- infiltraram-se na ciência e a arrastaram para seu reduto. Tendo obtido essa "compatibilização" ilusória (e isto -- ilusão --, para crentes, não apresenta qualquer dificuldade) com ciência não resta mais nenhum argumento contra eles. É entendendo isto que o único movimento que faço neste sentido é o de separar joio de trigo em ciência. Enquanto for aceita a ideia forjada e inserida por religiosos de que existem cientistas crentes e que tal coisa é muito natural e nem um pouco prejudicial à ciência; que ciência e religião podem manter relação amistosa; que ciência não anula, não tem poder de veto sobre religião de modo que pode haver alguma possibilidade de conciliação e convivência pacífica; enquanto houver "cientistas" que admitam que ciência não tem alcance sobre as questões transcendentes da religiosidade, da magia, da filosofia, enfim, não há a menor chance para a solução dos dilemas que seus anseios expressam aqui. Enquanto for divulgada e aceita, inclusive por pessoas e comunidades "céticas" e "científicas", que ciência não extingue definitiva e irrevogavelmente a magia, pode esquecer; o mundo continuará, exatamente, como está. Pode até piorar.
Observe que o meu "embate" está num outro âmbito. Ele é da mesma natureza que o seu (suponho, ao que me parece) mas não é contra crentes convencionais; é contra outro tipo de crentes -- "céticos" e filósofos. Enquanto você chama religião de distúrbio mental, eu recuo mais e generalizo mais; vou mais próximo da fonte e digo que filosofia é expressão de distúrbio mental (TODA E QUALQUER). Filosofar é a religião fundamental; é aquela em que a entidade mágica, a divindade, é o próprio filosofador. Tudo mais, em termos de magia, desdobra-se daí.
Por fim, permita-me dizer que você está equivocado em dizer que coisas irreais interferem com as reais. Coisas irreais não existem, não podem interferir com nada. O que ocorre, de fato, é muito simples: inteligência é uma grandeza sistêmica evolutiva, uma variável de sobrevivência/seletividade e, como tal, possui sua respectiva grandeza recíproca -- a estupidez. E as duas têm, portanto, exatamente, o mesmo poder, o mesmo potencial de ação, embora inversos. Inteligência não é, por natureza, superior à estupidez em nada (e isto significa que não é melhor nem pior, entenda, pois isto é crítico para o entendimento da realidade); só concorre em direção inversa. Para uma mente racional, é fundamental entender isto; para que não reste nenhuma ilusão convincente o bastante para demovê-lo da racionalidade.
Espero que nada disso o faça sentir-se ou reagir como um crente diante de mim porque quando aponto filosofia como distúrbio mental até "céticos" reagem doutrinariamente como os crentes que ouvem alguém dizer que a religião (religiosidade) deles é distúrbio mental. E a crença em si mesmo (deus imaginário interior) é muito mais arraigada que qualquer projeção de si mesmo no universo exterior (deuses imaginários exteriores).