Este tópico é parte brincadeira, parte desabafo, mas com um fundo de seriedade.
Domingo passado peguei a estrada, retornando de um passeio a Natal durante o feriadão de Porcus Thristis. Como
sempre acontece nessas viagens, fiquei assombrado com o imenso nível de estupidez quase-suicida de alguns motoristas.
Vi um imbecil quase ser abalroado por um caminhão numa colisão frontal, ao tentar fazer uma ultrapassagem. Vi outros
motoristas obrigados a jogar seus carros no acostamento para evitar uma colisão também frontal com outro idiota. Vi gente fazendo
utrapassagens em subidas e em curvas. Enfim, o de sempre.
Isso me fez pensar: esses barbeiros certamente não são mentalmente retardados. Alguns, eu diria, possuem inteligência normal
ou quase (se é que se pode medir isso). Porém, deixam-se levar por impulsos que podem causar - e frequentemente causam, suas
mortes e a de outras pessoas. Agem de forma infantil e irresponsável, sem pensar nas consequências de longo prazo. Percebi então
que o problema não é só dos motoristas: o problema está nos carros.
Não estou dizendo que os carros são inseguros. Afinal de contas, a maioria dos acidentes tem causa humana, mas que o problema
estaria na própria ideia de colocar uma tonelada de aço, vidro e plástico, capaz de se mover a 150 km/h, nas mãos de pessoas sem
capacidade de guiá-la com o mínimo de sensatez. Pessoas que, em outras circunstâncias, são perfeitamente capazes de conviver com
outros humanos harmoniosamente. Pessoas que, fora da estrada, são perfeitamente inofensivas.
A raiz desse problema estaria então numa incompatibilidade entre a capacidade mental adaptada a um ambiente defrontando-se com um
outro ambiente, onde os processos ocorrem numa escala de tempo menor. Nesse caso, além de reflexos e impulsos, é preciso que o
indivíduo, para sua segurança, tenha desenvolvida uma capacidade de obedecer instruções (no caso, as leis de trânsito) e um grau de
prudência e controle de impulsos. A discrepância entre nossa mente de primata caçador-coletor e as imposições do ambiente da estrada
ajudariam a explicar as tragédias que estamos acostumados a ver todos os feriados.
Então surge outra questão: como lidar com tecnologias que permitem o controle de máquinas de grande potência ou capacidade de causar
danos, ao sabermos que boa parte da população não tem a capacidade de lidar com estas? Por enquanto, a resposta é simples: limitando-se
a utilização destas máquinas para indivíduos selecionados (ex.: aviões de passageiros, explosivos de alta potência).
Mas o que fazer se o avanço tecnológico permitir que qualquer um tenha acesso a tecnologias potencialmente danosas?
De certa forma isso já está acontecendo na área de tecnologia de informação: hackers, criadores de vírus, spammers; todos eles são fruto da
democratização do acesso a computadores.
Talvez isso explique o paradoxo de Fermi: algum dia, alguem descobrirá um método caseiro de fabricar bombas de fusão/armas biológicas/Skynet
e, ingenuamente, divulgará essa informação ao público geral. Logo em seguida, os habitantes da rabeira da distribuição de sensatez correrão
para ver se funciona mesmo...