Autor Tópico: Um em cada cinco estudos médicos tem autor indevido  (Lida 1161 vezes)

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Um em cada cinco estudos médicos tem autor indevido
« Online: 04 de Novembro de 2011, 16:49:22 »
http://www1.folha.uol.com.br/ciencia/1001551-um-em-cada-cinco-estudos-medicos-tem-autor-indevido.shtml


Um em cada cinco artigos científicos das principais revistas médicas do mundo tem problemas de autoria. O dado é de um estudo da Associação Médica Americana que analisou seis periódicos de prestígio: "Annals of Internal Medicine", "Jama", "Lancet", "Nature Medicine", "New England Journal of Medicine" e "PLoS Medicine".

 Foram encontrados casos de autores "fantasma" (que participaram do trabalho, mas não são citados) ou indevidos (que assinam a pesquisa sem ter contribuído). Essas práticas são condenadas pela ética científica.

 Manuais recentes das principais agências de financiamento à ciência do mundo determinam que deve ser autor ou coautor de artigos quem contribuiu significativamente para o trabalho.

 "O fato de um indivíduo ter usado um laboratório que você coordena para fazer um experimento não quer dizer que você será coautor do trabalho dele", exemplifica Mário José Abdalla Saad, diretor da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp.

 Para ele, embora existam normas claras para identificar autores e coautores das pesquisas, ainda há uma espécie de "zona cinzenta". "Uma pessoa pode ter participado de maneira 'braçal' de uma pesquisa de modo decisivo. É preciso ter bom-senso para definir a autoria." Já para Gilson Volpato, da Unesp (Universidade Estadual Paulista), é preciso refletir sobre o significado de ser autor de um trabalho.

 "Há um costume de se colocar como autores cientistas que tiveram qualquer participação no trabalho sem pensar o que significa ser autor."




METODOLOGIA

 O levantamento dos dados da Associação Médica Americana foi feito por um questionário respondido por e-mail por 630 autores principais de trabalhos publicados em 2008 nas principais revistas médicas do mundo.

 Os cientistas responderam a 30 questões sobre a definição dos autores dos estudos dos quais participaram. No resultado, 21% dos trabalhos apresentaram autoria indevida. A porcentagem é menor que em 1996, quando os autores inapropriados apareciam em 29% dos artigos científicos na área médica.

 Mas, para os autores, os números continuam altos. O estudo está publicado no "British Medical Journal". De acordo com Saad, da Unicamp, a autoria indevida é um problema, por exemplo, no processo seletivo de um pesquisador em uma universidade ou instituição de pesquisa. Isso porque os artigos contam pontos na seleção.

 "Mas é preciso lembrar que critérios como entrevista e prova também são levados em conta", afirma. Para ele, os conflitos de interesse das pesquisas financiadas pela indústria farmacêutica, por exemplo, envolvem questões éticas ainda mais preocupantes.

 "Outra questão que deve ser destacada é o plágio. O pior tipo de fraude é copiar reproduzir ideias sem mencionar a fonte", analisa Saad. O biólogo Marcelo Hermes-Lima, da UnB (Universidade de Brasília), lembra ainda que fraudar dados nas pesquisas médicas é algo gravíssimo, pois afeta diretamente a vida das pessoas.

 Ele destaca uma pesquisa publicada em maio no "Journal of Medical Ethics", que mostrou que 188 artigos retratados com fraude na área médica envolveram 17.783 pessoas -e receberam mais de 5.000 citações de outros cientistas, que deram continuidade às pesquisas.
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Re:Um em cada cinco estudos médicos tem autor indevido
« Resposta #1 Online: 12 de Julho de 2014, 14:33:37 »
A praga do plágio acadêmico

Prof. Dr. Richard Romancini, publicado em Sites Google:

 
Resumo
O texto discute a prática do plágio em trabalhos feitos por estudantes universitários. O fenômeno é visto como resultante, em grande medida, de facilidades oferecidas nos dias de hoje pelos meios digitais e também por deficiências na formação e desinformação por parte dos discentes e docentes. Ressalta-se ainda o prejuízo que essa prática causa ao próprio aluno e, de modo a contribuir para a superação do problema, define-se o que é o “plágio” e são expostos meios de evitá-lo.

Palavras-chave: Plágio; Educação; Docência; Direitos autorais; Trabalhos estudantis
 

1. Introdução

Há cinco anos, numa reunião científica onde foi apresentado um texto sobre a figura do ghost writer, uma docente de uma universidade bem conceituada pediu a palavra, na fase de debates. Desculpou-se por externar uma preocupação que era apenas marginal ao texto (a venda de monografias), ou seja, uma das modalidades do plágio acadêmico. E, em sua fala preocupada, transmitiu informações sobre a disseminação desse desvio por parte dos estudantes de sua instituição. Pouco a pouco, os presentes à reunião (docentes de faculdades e universidades) fizeram relatos, mais ou menos dramáticos ou desapontados, sobre experiências parecidas.
 
A discussão que foi feita então produziu dois consensos, no nosso entender, ainda válidos: que o aumento dessa prática condenável está correlacionado à expansão da Internet, e que situações similares também existiram antes e, de modo paradoxal, eram mais difíceis de serem percebidas no ambiente pré-rede. Atuando na função docente, nessa época, recebemos uma resenha de livro muito bem escrita por um aluno relativamente ausente de um curso. E, como outros educadores versados nessa possibilidade, ao digitar uma frase do texto, entre aspas, num buscador na Internet, constatamos o plágio e invalidamos o trabalho.
 
Como esperado, em função do aumento da população estudantil universitária e dos usuários de computador, a preocupação com o tema amplificou-se, nos últimos anos. Reportagens da imprensa (Folha de S.Paulo, 2006; Garschagen, 2006; Rabelo, 2006; Goulart, 2007) e textos de educadores (Oliveira, 2005; Silva, 2006) documentam e discutem essa situação, que não é só brasileira. Os textos chamam ainda a atenção sobre fraudes na elaboração de trabalhos acadêmicos inclusive no nível pós-graduado (Garschagen, 2005).
 
Assim, docentes e instituições procuram precaver-se e estas criam procedimentos, visando coibir os plágios. A preocupação principal diz respeito, em parte, à quebra na relação de confiança entre educadores e educandos, base da ação pedagógica, que a ocorrência de trabalhos com vícios revela. No entanto, há uma outra faceta da questão, não menos grave, mas certamente muito típica de países (como o Brasil) nos quais as práticas de leitura e escrita, e a própria educação, apresentam deficiências.

 
2. A questão da formação

No ano passado, percebemos esta outra dimensão do problema, quando solicitamos um trabalho a segundo anistas de uma faculdade e recebemos, majoritariamente, trabalhos com plágios a textos da Internet. Ao discutir a questão com os alunos, notamos que (no caso em questão) se poderia falar em “plágio involuntário”. Não era clara para os alunos a idéia de que, ao atribuir a si mesmos a autoria de produções intelectuais de outros, incorriam em plágios. Isso aponta para uma realidade negativa do ensino, representada, em particular, pela errônea associação entre “pesquisa” e “cópia” não refletida. Porém, é claro, era uma situação diferente da anterior.
 
Assim, alteramos o conteúdo do curso, de modo a discutir a questão da redação do trabalho acadêmico, para tanto utilizamos o quinto capítulo (“A Redação”) de um livro de Umberto Eco (1992). Aliás, estratégias, como essa, são recomendadas a quem passe por situações parecidas; e é esta também a atitude de outros educadores que assumem uma postura ativa frente ao problema (vide reportagem do site Universia, 2005).
 
Bem diferente disso é a atitude de indiferença que observamos, por vezes, em certos discursos docentes. Alguns, por trás de uma postura populista ou paternalista de “fechar os olhos”, estão sendo, na verdade, profundamente elitistas. O subtexto parece ser o seguinte: a certos estudantes é dado o direito de produzir conhecimento de modo rigoroso, sério e consistente; a outros, nem vale a pena explicar como fazer.
 
Há o caso de outros profissionais do ensino (segundo o relato que ouvimos de uma colega) que chegam a defender os plágios, já que o estudante “teve o trabalho de pesquisar (sic)”. Se por “pesquisa” se entende a localização de informações, houve pesquisa. No entanto, se por esse termo entendemos uma produção intelectual que, sem ignorar o estado da arte sobre determinado tema, revele um processo de questionamento e reflexão (do qual resultem sínteses pessoais), é certo que não.
 
Em outro caso bastante pitoresco contado por outra colega, um aluno defendia-se da acusação de plágio, ao dizer que concordava com a integralidade do texto copiado. Não seria suficiente explicar-lhe que entre concordância e autoria há uma distância bem larga? Ou dizer-lhe que o plágio configura um crime tipificado, ao violar direitos autorais? Que existem formas de manifestar concordância com a opinião de outrem que são diferentes do plágio? Ocorre que para alguns docentes fazer tais explicações talvez pareça uma tarefa “menor”, já que os estudantes de ensino superior, em tese, já deveriam, ao longo de seu processo educativo, ter internalizado esse conhecimento. Isso ocorre para todos?
 
No nosso entender, infelizmente, não; portanto um professor que não procure, com clareza, explicitar aspectos como os mencionados, a cada situação necessária, estará falhando em seu papel como educador. Devemos ser capazes de formar competências gerais e comuns, entre elas, a produção textual acadêmica (ou escolar) rigorosa e ética. Por isso é imperioso explicar porque determinada produção, eventualmente, foge a tais parâmetros.

 
3. Autoria e competência discursiva

Por mais que possamos discutir o conceito de autoria (e, de fato, isso pode ocorrer no atual ambiente digital), isso exclui o plágio. É necessário apontar o que faz de um sujeito o produtor pleno de uma obra textual, ou seja, facultar a cada sujeito a possibilidade de se tornar um autor. É claro, que “a construção do autor não se dá sem a formação do leitor, visto que depende das histórias de leitura do sujeito sua competência discursiva, a fim de que se constitua, de fato, co-autor de textos lidos e produzidos” (Silva, 2006, 10). Em outras palavras, é a conquista da competência discursiva que, num longo processo educativo, transversal às disciplinas, mostra-se central.
 
Espera-se, pois, que os professores possuam, eles próprios, essa competência para facilitar essa aquisição aos educandos. Mas o que acontece quando sequer parte dos professores têm bem consolidada essa capacidade ou clareza sobre o que isso significa? Isso é evidenciado por depoimentos como o do professor que, ao participar da avaliação de um trabalho de conclusão de curso, percebeu que a orientadora do mesmo “considerava o procedimento de cópia de trabalhos alheios uma coisa normal e corriqueira” (Lourenço, 2004). Em nossas experiências em EAD, na formação continuada de professores, também notamos deficiências nesse sentido.
 
É nesse contexto que devemos atuar, e a única atitude ética, no caso, é o reforço à ação pedagógica (também na formação dos docentes) que se respalde na transmissão de boas práticas de produção textual, para, algum dia, exterminar a praga do plágio. Esta prática prejudica, em particular, os estudantes que dela se utilizam, pois o plágio acaba tendo como resultado perverso, para o educando, o “roubar de si mesmo a possibilidade de um outro pensar, da inventividade [o que] é um preço muito caro que o sujeito tem a pagar” (Silva, 2006, 4).
 
Em outras palavras, é preciso insistir que o educando é o principal prejudicado ao renunciar a (ou lhe ser negada a possibilidade de) constituir-se como autor – ainda que somente (e isso não é pouco) ao analisar/criticar/ sistematizar textos alheios, num processo reflexivo, contudo, pessoal. É essa a garantia da aquisição/produção de um conhecimento qualquer (que geralmente os trabalhos solicitados procuram aferir) que, por sua vez, reforça a competência discursiva do sujeito.
 
Feitas essas considerações, creio que um segundo nível, de caráter mais prático, da contribuição desse texto deve ser a explicação mais detalhada sobre o que define o plágio (e sua diferenciação em relação à citação), tipificação penal e meios de evitá-lo.

 
4. A citação e o plágio

O conhecimento humano, em suas produções mais sofisticadas como a ciência (que se pretende universal), é essencialmente coletivo. É impossível que um aspirante a produtor de conhecimento não lide com as reflexões, idéias, informações e dados de outros sujeitos, mesmo que para submeter à crítica algum desses aspectos. Desse modo, a prática da remissão a outros textos e autores é constitutiva do modo de produção do trabalho intelectual mais elaborado, que o ambiente universitário procura promover.
 
A citação a outros autores constitui um dos procedimentos mais característicos do texto crítico. Ela garante o ingresso do autor na “rede intertextual” relativa a determinado tema ou questão. Por isso, na produção acadêmica, a citação a idéias de outros autores, relevantes à discussão do trabalho, deve ser precisa e averiguável. Isso garantirá que o leitor possa – se quiser – checar o contexto geral da citação e a fidelidade com que a mesma foi feita. Nesse sentido, é que Eco (1992) vê a citação como uma “testemunha num processo”. Decorrem dessa preocupação, as recomendações dos diferentes sistemas (ABNT, Vancouver, ISO) quanto ao modo de produzir Bibliografias e Referências Bibliográficas.
 
Ressaltado esse caráter coletivo do trabalho intelectual crítico, observa-se que isso não chega a diluir o conceito da autoria (nem mesmo o de originalidade) de um texto. Ou seja, determinado autor (ou eventualmente autores) que se utiliza de idéias de diferentes sujeitos produzirá um trabalho cuja originalidade é garantida pela seleção, modo peculiar de exposição e interpretação dada ao seu objeto. Isso ocorre igualmente em termos temáticos e das idéias propostas e/ou utilizadas a partir de outros autores.
 
Em resumo, a citação, que podemos agora definir como a atribuição da fonte a uma idéia ou conteúdo, não é um empecilho ao trabalho autoral, nem se confunde com o plágio. A própria Lei de Direitos Autorais (nº 9.610/98) permite o uso de trechos de qualquer tipo de trabalho desde que seja indicada a autoria e procedência do mesmo.
 
Cabe ainda notar que a citação pode ser indicada de duas maneiras. A partir da transcrição de trechos literais de um texto, geralmente entre aspas ou outro sinal demarcador, como a fonte em itálico. O segundo método remete às paráfrases, ou seja, quando o autor da citação coloca a idéia de outrem em suas palavras, sem deixar, contudo, de citar a fonte (exemplos claros podem ser vistos em Eco, 1992, 128-9).
 
De outro lado, o plágio caracteriza-se como uma falsa atribuição de autoria, uma apropriação indevida de trabalho de um autor por outro indivíduo (o plagiário). Em outras palavras, trata-se da cópia de idéias ou conteúdos de trabalhos de outra pessoa, que são utilizados como se fossem daquele que finge ser o autor legítimo dos mesmos. É interessante notar que a origem etimológica da palavra (do grego “plagios” ao latim “plagiu”) carrega acepções que ilustram o conceito: “oblíquo”, “dissimulado”, “trapaceiro”.
 
“Nesse sentido”, nota Ferrari (2005), “a etimologia demonstra que plágio está diretamente ligado ao efeito ético e moral, logo, deve-se entender que não há níveis de interpretação. Incorreto é o não correto e pronto. Não há interpretações extensivas e paralelas”.
 
Também é fundamental notar que o plágio resulta numa violação de diretos autorais do autor plagiado. E esta ação configura, na linguagem jurídica: “Mais do que um ilícito civil, uma vez que afronta direito de personalidade do autor, constitucionalmente garantido, [...] nos deparamos também com um ilícito criminal gravíssimo” (Furtado, 2002). Como explica o autor citado, a violação de direito autoral é um crime previsto no artigo 184 do Código Penal, cuja penalidade envolve detenção e multa.
 
Tendo explicitado no que consiste o plágio na produção textual, podemos avançar, notando que o mesmo possui diferentes facetas, no cotidiano acadêmico, como:
- A compra ou furto de um trabalho na íntegra;
- A apropriação (sem citação), em determinado texto, de trecho(s) de certa(s) obra(s);
- A “falsa paráfrase”, ou seja, a cópia de texto de um autor, feita sem a indicação de citação integral (aspas ou formatação), mesmo que se informe que a idéia ou trecho provém do autor de que foi feita a cópia.
 
Sem dúvida, o primeiro caso é o mais grave e irremediável em termos de falha ética. Nos outros dois casos, em particular no último, pode existir um caráter “involuntário” no plágio. No entanto, o que é claramente recomendável é que os trabalhos sejam submetidos a análises e revisões (por seus autores e orientadores), antes de sua finalização, de modo a eliminar a possibilidade de plágio, pelos motivos apontados.
 
Concluindo, pode-se dizer que o papel do educador para coibir o plágio, além do acompanhamento na elaboração dos trabalhos de seus alunos, está ainda relacionado com a transmissão de informações sobre o plágio. Nesse sentido, é também válido que as instituições de ensino busquem esclarecer e informar os alunos e docentes sobre esse ilícito e adotem procedimentos que desestimulem sua prática. Como observa Furtado (2002):
Agir com respeito perante não somente àquilo que se propõe a produzir com seriedade, mas igualmente em relação às fontes pesquisadas, às idéias consultadas, aos pensamentos, reflexões, pontos de vista, propostos em estudos e pesquisas já feitas, que recorrera para melhor ilustrar, fundamentar ou enriquecer o seu trabalho científico, é o mínimo que podemos esperar de alguém voltado para o conhecimento.
 
 
Referências bibliográficas
 
ECO, Umberto. Como se faz uma tese. São Paulo, Perspectiva, 1992, 9ª edição.
 
FOLHA de S.Paulo. Oxford alerta para aumento de plágio entre alunos. Folha de S.Paulo, São Paulo, 14 mar. 2006. Disponível aqui. Acesso em 19 de jun. 2007.
 
FERRARI, Alexandre Coutinho. Plágio de textos e a editora de livros. Doutor D. 17 jun. 2005. Disponível aqui. Acesso em 19 de jun. 2007.
 
FURTADO, José Augusto Paz Ximenes. Trabalhos acadêmicos em Direito e a violação de direitos autorais através de plágio. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, nov. 2002. Disponível aqui. Acesso em 19 de jun. 2007.
 
GARSCHAGEN, Bruno. Comércio de teses e dissertações atrai pós-graduandos. Folha de S.Paulo, São Paulo, 07 nov. 2005. Disponível aqui. Acesso em 19 de jun. 2007.
 
______________. Universidade em tempos de plágio. NoMínimo. 29 jan. 2006. Disponível aqui. Acesso em 19 de jun. 2007.
 
GOULART, Guilherme. O golpe das monografias. Correio Braziliense, Brasília, 28 mar. 2007. Disponível aqui. Acesso em 19 de jun. 2007.
 
LOURENÇO, Alexandre. Plágio, direito autoral e registro legal de obras. Microbiologia, 2004. Disponível aqui. Acesso em 19 de jun. 2007.
 
OLIVEIRA, José Palazzo M. de. Plágio eletrônico e ética. Educação, Computação e Web. Dez. 2005. Disponível aqui. Acesso em 19 de jun. 2007.
 
RABELO, Camila. Idéias roubadas. UNB Agência, Brasília, 14 jul. 2006. Disponível aqui.  Acesso em 19 de jun. 2007.
 
SILVA, Obdália Santana Ferraz. Entre o plágio e a autoria: qual o papel da Universidade? 29ª Reunião Anual da Anped, Caxambu, 2006. Disponível aqui. Acesso em 19 de jun. 2007
 
UNIVERSIA. Como lidar com o plágio em sala de aula. Universia Brasil, 08 mar. 2005. Disponível aqui. Acesso em 19 de jun. 2007.
 
 
Publicado originalmente na Revista Científica FAMEC/FAAC/FMI/FABRASP. Ano 6, n. 6, 2007, pp. 44-48.
 
"Che non men che saper dubbiar m'aggrada."
"E, não menos que saber, duvidar me agrada."

Dante, Inferno, XI, 93; cit. p/ Montaigne, Os ensaios, Uma seleção, I, XXV, p. 93; org. de M. A. Screech, trad. de Rosa Freire D'aguiar

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Re:Um em cada cinco estudos médicos tem autor indevido
« Resposta #3 Online: 12 de Julho de 2014, 14:41:30 »
Ciência e Cultura
On-line version ISSN 2317-6660


Cienc. Cult. vol.59 no.3 São Paulo July/Sept. 2007

 


 

O plágio na comunidade científica: questões culturais e linguístcas

Sonia M. R. Vasconcelos

 

 

Na visão da maioria dos países de língua inglesa, o plágio é definido como a "apropriação ou imitação da linguagem, idéias ou pensamentos de outro autor e a representação das mesmas como se fossem daquele que as utiliza", conforme o Random House Unabridged Dictionary. Essa definição é compartilhada por inúmeros dicionários da língua inglesa, assim como por universidades britânicas e americanas. De acordo com a University of Hertfordshire Hatfield no Reino Unido, o plágio se caracteriza pela apropriação de idéias ou palavras de outrem sem o devido crédito, mesmo que acidental. Segundo a universidade, "o plágio é considerado uma prática muito séria na educação superior no Reino Unido. Mesmo que uma pequena seção de seu trabalho contenha plágio, é possível que a nota zero seja atribuída a ele... Em casos mais extremos, você pode ser expulso da universidade".

Nos Estados Unidos, a prática do plágio também é vista com bastante seriedade e está sujeita a punições acadêmicas. De acordo com John Edlund, da Califórnia State University, "o plágio é uma violação direta da honestidade acadêmica e intelectual. Muito embora ele possa existir sob várias formas, todos os tipos de plágio se resumem na mesma prática: representar as idéias ou palavras de outrem como se fossem suas... mesmo a utilização das idéias do outro nas suas próprias palavras sem citação também pode ser qualificado como tal".

Como a prática do plágio aponta para desonestidade acadêmica, ele também é investigado pelas agências de fomento à pesquisa em tais países. Em 2006, o Swedish Research Council recebeu uma denúncia de fraude relacionada ao plágio de um projeto de pesquisa. Um pesquisador de biologia submeteu uma versão plagiada de um projeto já entregue por sua orientadora ao National Institutes of Health (NIH), nos EUA. O financiamento para o biólogo foi automaticamente cancelado após a denúncia de fraude.

TOLERÂNCIA ZERO De certa forma, o mesmo rigor tem sido aplicado a denúncias de plágio em publicações acadêmicas. Atualmente, há uma política de "tolerância zero" ao plágio, que vem se estabelecendo através de periódicos internacionais. Recentemente, a Elsevier estabeleceu orientações bastante detalhadas sobre questões éticas relacionadas ao artigo científico. Na definição sobre o plágio, até mesmo algumas nuances foram abordadas: "a cópia pode ocorrer mesmo sem a reprodução exata das palavras do texto original. Este tipo de cópia é conhecido como paráfrase e pode ser o tipo de plágio mais difícil de ser detectado." Para autores acusados de plagiar idéias ou trechos de publicações anteriores, a punição é, muitas vezes, o bloqueio de nova submissão de manuscritos pelos envolvidos nesse tipo de "fraude". Em 2004, O The Scientist divulgou uma dessas. O pesquisador egípcio, Mostafa Imam, publicou, em cerca de 20 anos, vários papers sobre fósseis de algas, auto-plagiando várias imagens. Figuras de algas vermelhas, por exemplo, típicas de um determinado período geológico, apareciam como típicas do Egito, enquanto eram da Espanha. Ele não só teve sua reputação destruída na academia, como também comprometeu, através de seus plágios, o estado da arte na área de micropaleontologia. Imam ficou impedido de re-submeter trabalhos para o periódico.

No entanto, o conceito de plágio ainda é bastante difuso para pesquisadores de vários países. Na verdade, não só o conceito como também as relações que se estabelecem com tal prática decorrem de um viés cultural importante. A abordagem do plágio é permeada pelo conceito de autoria e propriedade intelectual. Sendo assim, não se pode negar que culturas que legitimam a condenação da cópia de textos e idéias de outrem sem a devida citação, legitimam a propriedade intelectual do autor, ou seja, a originalidade. De acordo com Edlund, "...em países de língua inglesa, as pessoas acreditam que idéias e expressões escritas podem ser possuídas. Quando um autor escreve uma determinada seqüência de palavras ou frases expressando uma determinada idéia, esse autor, de fato, é dono de tais construções e idéias. Portanto, a utilização de tais palavras sem a devida atribuição ao autor se configura roubo. Essa questão é bem diferente, por exemplo, da idéia chinesa de que palavras e idéias pertencem à cultura e à sociedade e devem ser compartilhadas entre os indivíduos..." O pesquisador Marcel Laffollette, no artigo "The evolution of the scientific misconduct issue: a historical overview" (2000), reporta que para um cientista americano, "o roubo de suas palavras é roubo de autoria. O roubo de sua idéia é roubo de sua própria identidade como cientista". A importância dada ao plágio nas universidades e órgãos de financiamento americanos acaba se introduzindo em outras culturas que não compartilham dessa mesma visão de propriedade. Para culturas confucianas – como, por exemplo, Singapura, China e Coréia – a autoria e a originalidade não são valorizadas como no Ocidente. A noção de propriedade intelectual, tradicionalmente, é bem mais coletiva do que individual. Portanto, num contexto acadêmico extremamente multicultural, não são poucos os conflitos e dilemas que decorrem dessa visão diversa de autoria e produção textual. Há uma preocupação considerável por parte de autores dessas culturas confucianas em desenvolver mecanismos educacionais para diminuir as diferenças, por exemplo, na visão do texto do artigo científico.

Em 1996, a Science divulgou que três casos de plágio envolvendo cientistas chineses levaram a uma discussão nacional sobre esse tipo de má conduta. A Academia Chinesa de Ciências, engajada na discussão, introduziu o On being a scientist, lançado em 1989 pela Academia Nacional de Ciências dos EUA, entre os pesquisadores chineses. O objetivo seria reduzir a incidência de fraudes, incluindo o plágio, entre os pesquisadores. Hoje, medidas educacionais contra o plágio e outras formas de má conduta se tornaram uma das prioridades no ambiente acadêmico daquele país.

Num editorial sobre o plágio (1996), Carlos Coimbra, editor de Cadernos de Saúde Pública, declara que "no Brasil pouco se fala sobre plágio em ciência. Isto certamente decorre menos da ausência do problema no país do que da falta de iniciativas para aprofundar essa discussão." É necessário considerarmos o cenário atual da pesquisa científica. Hoje, diferente do que acontecia até pelo menos a década de 1980, ciência em inglês é um imperativo. Se considerarmos que mais de 95% dos artigos na base de dados do Science Citation Index está em língua inglesa, qual a razão para que resultados originais de pesquisa não tenham pelo menos uma versão no idioma? Porém, quantos cientistas não-nativos, incluindo os brasileiros, são proficientes em inglês? Mais do que isso: quantos desses cientistas conseguem produzir sua própria voz em todas as seções do artigo científico? Para o Brasil, um país cuja língua materna é o português e onde o inglês não é falado nem mesmo como terceira língua, poderíamos dizer que bem poucos.

PERIÓDICOS ESTRANGEIROS No entanto, a produção do país em periódicos internacionais é crescente e hoje contamos com cerca de 1.6% das publicações em periódicos indexados no Thomson Scientific. Não se sabe se há trechos plagiados nessas publicações nem mesmo o quanto de auto-plágio existe nessa fração, já que isso não foi investigado. Porém, se considerarmos a realidade linguística da pesquisa brasileira e a de uma educação voltada para a produção do texto não como instrumento formador de senso-crítico e opinião, nos vemos numa situação favorável ao plágio. De acordo com Obdália Silva, em seu Entre o plágio e a autoria? qual o papel da universidade? (2006) [no Brasil]... "historicamente, desde o ensino fundamental à universidade, tem-se convivido com a prática de cópias de produções textuais de outrem, seja de forma parcial ou total, omitindo-se a fonte...". De volta à pergunta (1), será que por compartilharmos uma visão mais ocidental da autoria e propriedade intelectual, cometemos menos plágio do que, por exemplo, os chineses? Não necessariamente; a questão é que a produção científica chinesa é bem maior que a brasileira e talvez a exposição seja maior. Quanto à pergunta (2), será que os poucos casos de plágio (publicizados) envolvendo cientistas brasileiros indicam que a prática aqui é rara? Não necessariamente, pois se a tolerância à prática do plágio de textos em inglês, por exemplo, for a mesma para quem comete e quem detecta, não haveria interesse em investigar a questão. Seria quase como se pensar em abrir uma caixa de Pandora.

O fato é que a discussão da dimensão da prática do plágio na academia é de extrema importância para a atividade científica. Diante da relevância do tema e do foco internacional que ele vem recebendo é, no mínimo, ingênuo ou imaturo não se pensar de forma bem pragmática em abordar o plágio nas universidades e outras instituições de pesquisa. Isto poderia ser discutido nos programas de pós-graduação.

Vale lembrar, porém, que a definição de plágio aceita pelas agências de fomento americanas e européias é bastante rigorosa e demanda originalidade na produção textual. É difícil pensar que apenas informação resolva o problema de autores que, por não dominarem a língua inglesa, se vêem "tentados" a um empréstimo lingüístico subversivo de pequenos trechos de artigos em inglês. Segundo a definição internacional do plágio, mudar algumas palavras de uma frase de outrem e incorporá-las no texto em construção configura plágio. Sendo assim, também é extremamente importante que, paralelamente à orientação sobre tal prática, também estejam políticas educacionais que fomentem o ensino de redação científica em inglês nos programas de pós-graduação em ciências. Se as ações não forem conjuntas, pouco se avançará sobre essa questão e perderemos a oportunidade de, inclusive, questionarmos, se for o caso, o quanto dessas definições internacionais dialogam com a realidade cultural e linguística em que se dá a pesquisa científica brasileira.


Sonia M.R.Vasconcelos é mestre em literatura de língua inglesa e doutoranda do Programa de Educação, Gestão e Difusão em Biociências, da Universidade Federa do Rio de Janeiro (UFRJ).

Fonte:

Ciência e Cultura
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Dante, Inferno, XI, 93; cit. p/ Montaigne, Os ensaios, Uma seleção, I, XXV, p. 93; org. de M. A. Screech, trad. de Rosa Freire D'aguiar

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Re:Um em cada cinco estudos médicos tem autor indevido
« Resposta #4 Online: 12 de Julho de 2014, 15:28:50 »
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Print version ISSN 1413-7372


Psicol. estud. vol.18 no.2 Maringá Apr./June 2013

http://dx.doi.org/10.1590/S1413-73722013000200001




EDITORIAL

 

Autoria em tempos de "produtivismo acadêmico"

 

 

No Brasil, a expressão "produtivismo acadêmico", segundo o Professor João Zanetic (2012), presidente da Associação dos docentes da USP (Adusp), está relacionada a uma matéria publicada pelo Jornal Folha de S. Paulo em 21/2/1988, intitulada "A lista dos improdutivos". Nessa matéria o jornal dedicou várias páginas à temática da produção acadêmica e publicou uma lista fornecida pela Reitoria da USP em que são apresentados os nomes daqueles professores que nada tinham produzido nos anos de 1985 e 1986, o que correspondia a 1/4 dos docentes daquela instituição. O critério adotado de produção para definir docentes improdutivos foi apenas quantitativo e incluía: publicações (revistas, jornais, livros, capítulos de livro, anais de congresso), comunicações em congressos científicos e audiovisuais. Na época a matéria foi alvo de protestos e debates e a questão da avaliação de docentes por critérios apenas quantitativos, prática já comum entre outros países, como os Estados Unidos, passou a ocupar mais espaço em nosso do país.

Atualmente, cada vez mais a quantidade de publicações, especificamente de artigos científicos, é utilizada como o principal critério para avaliar a produtividade de um pesquisador. Por outro lado, é atingindo e superando metas de produtividade que se tem acesso aos parcos recursos disponíveis para o financiamento de pesquisas, principalmente no campo das ciências humanas. A cobrança e a pressão para publicar fazem parte do cotidiano dos pesquisadores, e neste contexto, existem aqueles que usam de estratégias nada éticas para cumprir e superar metas. Entre estas estratégias está a autoria de artigos científicos em cuja elaboração, execução e redação não se teve uma participação efetiva. Segundo Garcia, Martrucelli, Rossilho e Denardin (2010), embora esta prática seja mais comum que o plágio, em geral não é punida, por ser considerada apenas "mau comportamento".

Monteiro, Jatene, Goldenberg, Población e Pellizzon (2004) destacam que, na área médica, a supervalorização da publicação de artigos científicos é acompanhada pelo aumento do número de autores por artigo. Isto pode refletir o aumento da especialização e da complexidade das pesquisas que envolvem múltiplos centros, porém não é suficiente e torna problemática a discussão sobre a autoria em ciência. Na Psicologia, pelo menos no que diz respeito às revistas brasileiras, desconheço a existência de artigos com mais de uma centena de autores, mas isto já acontece em outras áreas. Newman, citado por Garcia et al. (2010), relata que um artigo de Física foi assinado por 1.681 autores.

Diante de artigos com dezenas ou centenas de autores, o questionamento sobre autoria é inevitável. Como saber quem pode ser considerado autor de um artigo científico? Existem critérios objetivos para determinar quem pode ser considerado autor de um artigo científico? Diante de questionamentos como estes o International Committee of Medical Journal Editors (ICMJE) elaborou algumas recomendações, que foram traduzidas e apresentadas por Montenegro e Alves (1987), a saber:

Cada autor deve ter participado suficientemente do trabalho para poder assumir publicamente a responsabilidade pelo seu conteúdo. Sua participação deve incluir: a) concepção ou delineamento ou ainda análise e interpretação dos dados, ou ambos; b) redação do manuscrito ou sua revisão quando inclua crítica intelectual importante de seu conteúdo; c) aprovação final da versão a ser publicada. (...) Os editores podem requerer dos autores que justifiquem sua inclusão na autoria do trabalho (p.192).

Em 2011 a Comissão de Ética do CNPq elaborou um relatório sobre boas condutas na pesquisa científica que aborda, entre outras questões, a da autoria de artigos científicos. Entre suas recomendações estão: a discussão sobre quem serão os autores de um artigo deve ser feita antes de sua elaboração e seguir orientações já estabelecidas, como a do ICMJE, isto é, somente quem presta uma contribuição significativa à pesquisa deve ser incluído como autor, e todos os autores do trabalho são responsáveis pelo trabalho e devem ser capazes de descrever sua contribuição. Como a ideia do que seja uma "contribuição significativa" pode dar margens a diversas interpretações, a expressão é esclarecida no relatório:

Por contribuição significativa entende-se realização de experimentos, participação na elaboração do planejamento experimental, análise de resultados ou elaboração do corpo do manuscrito. Empréstimos de equipamentos, obtenção de financiamentos ou supervisão geral, por si só não justificam a inclusão de novos autores, que devem ser objetos de agradecimento (p. 4).

Por mais que orientações como estas do ICMJE e CNPq sejam difundidas e conhecidas pelos pesquisadores, elas não são isentas de possíveis diferentes interpretações. Por exemplo, um orientador de uma pesquisa de doutorado é um supervisor, e como tal, deve receber agradecimento quando da publicação da pesquisa, ou ele deve ser também considerado autor, uma vez que ele deve ter prestado uma contribuição significativa à pesquisa? Não defendo a ideia de que exista uma mesma resposta para todos os casos, mas tenho observado que, na área das ciências humanas, quando uma tese é publicada como livro, geralmente o orientador é mencionado e escreve o prefácio, mas não é apresentado como autor; já no caso de publicação de artigos científicos provenientes de tese, a situação é diferente e existe uma pressão no sentido de que o orientador seja apresentado como autor, e a essa pressão estão submetidos orientandos e orientadores, submetidos às exigências dos programas de pósgraduação e das agências financiadoras.

Considerando que orientações gerais sobre a autoria podem dar margens a diversas interpretações, Petroianu (2012) propõe um método numérico para identificar quem pode ser considerado autor de um artigo científico. Por seu método, diferentes atividades que compõem a elaboração, realização e redação da pesquisa científica são pontuadas e no final somente os pesquisadores que obtiveram uma determinada pontuação podem ser considerados autores. As atividades recebem diferentes valores de acordo com sua importância, por exemplo: "criar a ideia que originou o trabalho e elaborar hipóteses" recebe seis pontos, enquanto "trabalhar na rotina da função, sem contribuição intelectual", recebe um ponto. Somente pesquisadores que tenham obtido, no mínimo, sete pontos podem ser incluídos como autores. Petroianu sugere que a pontuação pode se utilizada para estabelecer a ordem dos autores no artigo, e aqueles com maior pontuação devem ser citados primeiro, inclusive para prevenir conflitos de interesse.

Assim, se podem existir dúvidas e polêmicas sobre quem deve ser autor de um trabalho científico, em algumas situações é muito claro que determinados pesquisadores não deveriam ser incluídos na coautoria. Petroianu (2012) cita o caso do "autor honorário" como a mais comum das situações de inclusão inapropriada de um autor. O "autor honorário" é aquele que, embora seja "alheio à pesquisa", foi nela incluído por uma das seguintes razões: para homenageá-lo por algum trabalho que tenha realizado; por sua notoriedade (a inclusão de seu nome pode facilitar a publicação do trabalho); para retribuir-lhe a gentileza de já ter incluído indevidamente algum dos autores em alguma de suas publicações e por sua baixa produção científica (Petroianu, 2012). Chamar de "autor honorário" alguém que não deveria ser incluído, por nem sequer ter participado da pesquisa, é um eufemismo exagerado (talvez proposital) do autor, pois se honorário significa "que tem honras, sem receber proventos ou desempenhar as funções de um cargo" (Ferreira, 1999, p.1060), neste caso não existiriam as honras, somente o não desempenho da função, e o "autor honorário" receberia indevidamente os proventos (com mais uma publicação acrescentada ao currículo).

Em sentido semelhante ao de "autor honorário", Montenegro e Alves (1987) empregam a palavra "cortesia" para referir-se à prática da inclusão de amigos e colegas como autores,  principalmente relacionada à política de troca de favores, e referem-se a esta prática como sendo imoral. Já Monteiro & cols., utilizam a expressão autoria "convidada" e, com base em outros estudos, acrescentam que este tipo de autoria pode ser encontrada "entre 17% e 33% dos artigos publicados" (p. IV).

Monteiro et al. (2004), em sua apresentação sobre padrões de autoria irregulares, incluem, além da autoria "convidada", a autoria "pressionada" e a autoria "fantasma". Se no primeiro caso poderíamos pensar em algum tipo de "reciprocidade", nos dois últimos o que vigora são, sobretudo, as relações de poder. Na autoria "pressionada" o responsável por um grupo impõe a inclusão de seu nome entre os autores. Este tipo de prática chega até mesmo a ser naturalizada e considerada "uma tradição departamental"; já na autoria "fantasma", pesquisadores que tiveram uma importante participação no estudo são excluídos da lista de autores, por diversos motivos. (Monteiro et al., 2004).

Quem tem seu nome indevidamente incluído como um autor assume a responsabilidade sobre o que está escrito, mas aparentemente os benefícios superariam os riscos e estes pesquisadores podem levar vantagem indevidamente na disputa pelos recursos disponíveis para pesquisa (Monteiro et al., 2004).

Recomendações e estratégias para tentar coibir práticas de autoria indevida não faltam, porém este tipo de prática está afinado com a lógica produtivista, que prioriza a quantidade em detrimento da qualidade, e com a ética do capitalismo, que, segundo Weber (1967/1904), é dúplice e permite o que não deveria ser permitido entre irmãos. Associar as práticas de autoria indevida com a lógica produtivista não significa que estas práticas não devam ser repreendidas, ao contrário, elas devem sê-lo, pois ferem a ética científica; no entanto, repreensões e orientações não resolvem um problema que é inerente à própria lógica produtivista.

Para um editor de um periódico científico é difícil identificar entre os autores de um artigo quais de fato podem ser considerados autores ou não. Diante desta dificuldade, algumas revistas apresentam uma definição de quem pode ser considerado autor de um artigo, e em suas normas limitam o número de autores de um artigo, ou mesmo solicitam que os autores especifiquem qual a sua participação individual no artigo. Se esta prática em algumas áreas do conhecimento já está consolidada e discussões sobre a autoria deram origem a diversos artigos, como os citados aqui (todos da área médica), na Psicologia brasileira esta discussão parece ser mais recente e também merece espaço. Por esta razão trouxe esta temática para este editorial e espero ter trazido contribuições para o debate na área.

 

Profª. Dra. Eliane Domingues
Editora de seção
edomingues@uem.br

 

REFERÊNCIAS

CNPq (2011) Relatório da comissão de integridade de pesquisa do CNPq. Recuperado em 20 maio, de 2013, de http://memoria.cnpq.br/normas/lei_po_085_11.htm.         [ Links ]

Garcia, C. C., Martrucelli C. R. N., Rossilho M. M. F, & Denardin, O. V. P. (2010). Autoria em artigos científicos: os novos desafios. Revista Brasileira de Cirurgia Cardiovascular, 25(4), 559-567. Recuperado em 20 maio, de 2013, de http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-76382010000400021&lng=en&tlng=pt.10.1590/S0102-76382010000400021.         [ Links ]

Ferreira, A. B. H. (1999) Aurélio século XXI: o dicionário da Língua Portuguesa (3ª ed. rev. e ampl.). Rio de Janeiro: Nova Fronteira.         [ Links ]

Monteiro R., Jatene F. B., Goldenberg S., Población D. A. & Pellizzon, R. de F. (2004). Critérios de autoria em trabalhos científicos: um assunto polêmico e delicado. Revista Brasileira de Cirurgia Cardiovascular, 19(4), III-VIII. Recuperado em 20 maio, de 2013, de http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-76382004000400002&lng=en&tlng=pt.10.1590/S0102-76382004000400002.         [ Links ]

Montenegro, M. R. & Alves V. A. F. (1987) Critérios de autoria e co-autoria em trabalhos científicos. Revista do Instituto de Medicina Tropical de São Paulo, 29(4), 191-193. Recuperado em 23 maio, de 2013, de http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0036-46651987000400001&lng=pt&tlng=pt.10.1590/S0036-46651987000400001.         [ Links ]

Petroianu, A. (2012). Distribuição da autoria em trabalhos científicos. ABCD. Arquivos Brasileiros de Cirurgia Digestiva (São Paulo), 25(1), 60-64. Recuperado em 20 maio, de 2013, de http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-67202012000100014&lng=en&tlng=pt.10.1590/S0102-67202012000100014.         [ Links ]

A lista dos improdutivos (1988, 21 de fevereiro). Folha de S. Paulo, São Paulo, p. A-28. Recuperado em 20 maio, de 2013, de http://acervo.folha.com.br/fsp/1988/02/21/2.         [ Links ]

Weber, M. (1967). A ética protestante e o espírito do capitalismo. São Paulo: Pioneira. (Original publicado em 1904)        [ Links ]
Zanetic, J. "Improdutivos". In Aduspnet. Debate "Produtivismo: a que veio? A quem serve?". Informativo nº 302.  Recuperado em 30 maio, de 2013, de http://www.adusp.org.br//180-defesa-da-universidade/condicoes-de-trabalho/produtivismo/953-choque-de-visoes-antagonicas-marca-debate-sobre-produtivismo-academico.         [ Links ]

Fonte:
"Che non men che saper dubbiar m'aggrada."
"E, não menos que saber, duvidar me agrada."

Dante, Inferno, XI, 93; cit. p/ Montaigne, Os ensaios, Uma seleção, I, XXV, p. 93; org. de M. A. Screech, trad. de Rosa Freire D'aguiar

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Re:Um em cada cinco estudos médicos tem autor indevido
« Resposta #5 Online: 13 de Julho de 2014, 14:47:41 »
Este outro tópico Ciência à prova de erros — e fraudes merece ser ligado a este outro por se relacionar a ele em certo nível, no que concerne o fato dos plágios e autorias indevidas estarem em vários graus associados a fraude no meio cientifico e acadêmico-cientifico.

Abraços!
"Che non men che saper dubbiar m'aggrada."
"E, não menos que saber, duvidar me agrada."

Dante, Inferno, XI, 93; cit. p/ Montaigne, Os ensaios, Uma seleção, I, XXV, p. 93; org. de M. A. Screech, trad. de Rosa Freire D'aguiar

 

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