Autor Tópico: O ateísmo é uma doutrina?  (Lida 5417 vezes)

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Offline Skeptikós

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O ateísmo é uma doutrina?
« Online: 31 de Janeiro de 2014, 13:26:34 »
Primeiro é preciso definir o que é uma doutrina. Entenda-se por doutrina, todo e qualquer sistema ordenado de pensamentos sobre determinado(s) assunto(s). São por tanto, exemplos de doutrinas, doutrina políticas, econômicas, filosóficas, religiosas, cientificas e etc. Pois todos estes exemplos citados são sistemas de pensamentos ordenados sobre determinado(s) assunto(s).

Além disso, para designar um 'termo' como doutrina, sua formação é em geral composta pelo sufixo "-ismo", que significa justamente: "doutrina, ideologia e sistema de pensamento".

O termo 'ateísmo' possuí não só um sistema ordenado de pensamentos sobre determinado assunto, como também possui em sua formação etimológica, o sufixo "-ismo". Logo, não há como negar, o ateísmo, de acordo com as premissas tomadas, é por definição, uma doutrina.
"Che non men che saper dubbiar m'aggrada."
"E, não menos que saber, duvidar me agrada."

Dante, Inferno, XI, 93; cit. p/ Montaigne, Os ensaios, Uma seleção, I, XXV, p. 93; org. de M. A. Screech, trad. de Rosa Freire D'aguiar

Offline Rocky Joe

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Re:O ateísmo é uma doutrina?
« Resposta #1 Online: 31 de Janeiro de 2014, 13:43:25 »
Isso tem alguma consequência, ou é análogo da semântica de discutir qual é a nave mais rápida de Star Trek (isto é, inútil/para nerds)?

Offline Skeptikós

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Re:O ateísmo é uma doutrina?
« Resposta #2 Online: 31 de Janeiro de 2014, 14:56:27 »
A utilidade é definir um padrão de referência do significado da palavra 'doutrina'.

Se cada um entender 'doutrina' a sua maneira, e esta maneira divergir das dos outros, isso implicará em uma discordância em relação ao ateísmo ser ou não uma doutrina por exemplo, enquanto na verdade a discussão deveria ser sobre o significado da palavra doutrina. Mas se já tiver uma referência de significado tomada como padrão, e todos trabalharem com base nela, discussões como essas não serão necessárias, economizando tempo e esforço que poderão ser direcionados para assuntos mais produtivos.
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Offline _Juca_

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Re:O ateísmo é uma doutrina?
« Resposta #3 Online: 31 de Janeiro de 2014, 17:33:16 »
Não, o ateísmo não é uma doutrina porque não é regido por um conjunto de idéias e princípios. Para ser ateísta, basta não acreditar em divindades, só. Não acredita em deus, é ateu. Não é uma doutrina, nem é uma ideologia, é apenas uma condição estabelecida a partir de um único fato.
« Última modificação: 31 de Janeiro de 2014, 17:35:22 por _Juca_ »

Offline Skeptikós

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Re:O ateísmo é uma doutrina?
« Resposta #4 Online: 31 de Janeiro de 2014, 18:44:11 »
1ª ideia, deus(es) não existe(m).
2ª ideia, como consequência, nenhum evento sobrenatural a ele(s) relacionado(s) também não existem.
3ª ideia, para uma pessoa se enquadrar como ateu é preciso aceitar pelo menos as duas ideias anteriores.

Na minha opinião temos ai um conjunto ordenado de pensamentos que rege um posicionamento a respeito da ideia da existência ou não de deuses e eventos sobrenaturais, ou seja, uma doutrina.

Além disso, se o ateísmo não é uma doutrina, qual o significado do sufixo "-ismo" que faz parte da formação da palavra?

Por definição, o sufixo "-ismo" exerce sentido ou de "ideologia/doutrina" (a exemplo; materialismo, positivismo) ou de"dependência química" (a exemplo; alcoolismo, tabagismo), e como o ateísmo não pode ser considerado uma dependência química, por exclusão, ele seria então uma doutrina.
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Offline Buckaroo Banzai

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Re:O ateísmo é uma doutrina?
« Resposta #5 Online: 31 de Janeiro de 2014, 19:22:23 »
Poderia se ter:

1a idéia: planetas existem
2a idéia: apesar disso, eles não influenciam a sorte ou a personalidade das pessoas, que são determinadas por coisas sem a mais ínfima relação com os outros planetas
3a idéia: para a pessoa se enquadrar como descrente em astrologia é preciso aceitar pelo menos as duas idéias anteriores.

Daí poderia se dizer ser também uma "doutrina".

Calha de não haver "aastrologismo", talvez porque seja um assunto que interessa menos, além de ser mais relevante geralmente os termos pertinentes que forem descrições "positivas", não "negativas" (como ser "determinista genético", ou "ambiental", ou crente em "livre arbítrio", em destino determinado por Deus, etc). E  talvez por isso as pessoas não se preocuparam em rotular essa descrença, nesse caso. Acaba sendo incluído no pacote padrão das descrenças que constituem a "doutrina cética", sem destaque especial, como várias outras.

Pelo sufixo apenas, ateismo ainda poderia ser esporte, como futebolismo... etimologia não é algo tão rígido, e nesse caso, não deve nem ser caso de um uso casualmente "solto", mas de não haver essa especificidade mesmo.

Offline Skeptikós

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Re:O ateísmo é uma doutrina?
« Resposta #6 Online: 31 de Janeiro de 2014, 22:01:18 »
É verdade, o sufixo "-ismo" parece estar associado a outras aplicações que não apenas as citadas acima por mim. Devo reconhecer a consistência de seu argumento.

No entanto, qual será então o motivo de os principais dicionários da língua portuguesa [A exemplo do Aurélio V.5.0 e do Houaiss V.3.0] definirem "ateísmo" como doutrina, que se não o de que realmente seja uma doutrina?

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Offline Skeptikós

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Re:O ateísmo é uma doutrina?
« Resposta #7 Online: 31 de Janeiro de 2014, 22:05:57 »
Já a explicação de "astrologia" não ser chamada doutrina, ou quem a nega igualmente, é o fato de a palavra em questão ser formada pelo sufixo "-logia", provavelmente pelo fato de seus fundadores a terem considerado uma ciência, e o sufixo que designa este sentido em uma palavra ser "-logia" e não "-ismo".

« Última modificação: 31 de Janeiro de 2014, 22:10:52 por Skeptikós »
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Offline _Juca_

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Re:O ateísmo é uma doutrina?
« Resposta #8 Online: 31 de Janeiro de 2014, 23:20:32 »
1ª ideia, deus(es) não existe(m).

Não, a primeira "idéia" é tentar ouvir os argumentos, e não fazer uma afirmação. A partir dos argumentos colocados, "Nasceu de uma Virgem", "Falou com cobras", "andou sobre a água", "criou o mundo", etc, então podemos chegar a conclusão que a crença generalizada em um deus (cristão no caso) é totalmente baseada em fatos fantasiosos, é misticismo puro, para então chegarmos a conclusão que a afirmação é falsa e não ter porque aceitar essa crença mística como verdadeira.

Citar
2ª ideia, como consequência, nenhum evento sobrenatural a ele(s) relacionado(s) também não existem.

A premissa começou errada, como explanei no quote anterior, portanto essa conclusão segue a mesma linha.


Citar
3ª ideia, para uma pessoa se enquadrar como ateu é preciso aceitar pelo menos as duas ideias anteriores.

Idem. Não pode alguém se tornar ateu através de uma afirmação simples, seria sem dúvida uma crença e seua premissa estaria certa, já que não se pode provar e evidenciar a não existência de um deus, assim como não se pode evidenciar qualquer fato sobrenatural/místico. O ateísmo se dá a partir do ceticismo quanto aos eventos sobrenaturais afirmados pelos crentes, da descrença diante de fatos impossíveis no mundo real.



Offline Gabarito

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Re:O ateísmo é uma doutrina?
« Resposta #9 Online: 01 de Fevereiro de 2014, 08:01:58 »
Atenção aos detalhes:

No entanto, qual será então o motivo de os principais dicionários da língua portuguesa [A exemplo do Aurélio V.5.0 e do Houaiss V.3.0] definirem "ateísmo" como doutrina, que se não o de que realmente seja uma doutrina?


Segundo o Houaiss, fica bem clara a definição se equilibrar na conjunção alternativa ou.
Citar
Ateísmo
substantivo masculino
Rubrica: filosofia.
1   doutrina ou atitude de espírito que nega categoricamente a existência de Deus, asseverando a inconsistência de qualquer saber ou sentimento direta ou indiretamente religioso, seja aquele calcado na fé ou revelação, seja o que se propõe alcançar a divindade em uma perspectiva racional ou argumentativa
2   Rubrica: religião. Uso: impróprio.
denominação atribuída às concepções heterodoxas ou dubitativas a respeito da existência da divindade, tais como o panteísmo, o ceticismo, o deísmo enciclopedista etc.

O colega Mr. Banzai falou de "aastrologismo", com um prefixo de negação a.

Já a explicação de "astrologia" não ser chamada doutrina, ou quem a nega igualmente, é o fato de a palavra em questão ser formada pelo sufixo "-logia", provavelmente pelo fato de seus fundadores a terem considerado uma ciência, e o sufixo que designa este sentido em uma palavra ser "-logia" e não "-ismo".
« Última modificação: 01 de Fevereiro de 2014, 08:04:01 por Gabarito »

Offline FredLC

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Re:O ateísmo é uma doutrina?
« Resposta #10 Online: 01 de Fevereiro de 2014, 10:05:42 »
1ª ideia, deus(es) não existe(m).
2ª ideia, como consequência, nenhum evento sobrenatural a ele(s) relacionado(s) também não existem.
3ª ideia, para uma pessoa se enquadrar como ateu é preciso aceitar pelo menos as duas ideias anteriores.

Na minha opinião temos ai um conjunto ordenado de pensamentos que rege um posicionamento a respeito da ideia da existência ou não de deuses e eventos sobrenaturais, ou seja, uma doutrina.

Desculpa, mas esse é um raciocínio circular viciado pela afirmação da consequência. É evidente que a posição de que "deus não existe" presume a aceitação da idéia de que "deus não existe", mas isso é verdade de absolutamente qualquer opinião. Gostar de lasanha seria uma ideologia, pois presumiria a ideia comum de que lasanha é bom.

A segunda idéia não é uma proposição, mas sim, uma inferência, uma derivação, ou como você mesmo diz, uma consequência da ideia anterior. Mas nenhuma premissa nova é trazida para compor uma série de conceitos organizados, e qualquer premissa presume independência das premissas anteriores. Essa é a própria ideia de uma premissa - ser um ponto de partida lógico.

Nesse ponto, é importante destacar que eu não teria nada contra ateísmo ser uma doutrina. Mas ele não é porque:

a) Não presume quais são os pontos de partida que você usou para chegar á conclusão de que deus não existe - um ateu pode duvidar por ceticismo, raciocínio ponderado/conclusivo, razões sentimentais, revolta (para usar um clichê que pode ter exemplos de verdade), e todas essas posturas completamente diferentes e incompatíveis ficam sob a mesma denominação, embora não tenham absolutamente qualquer álea de contato intrínseca (nada impede que mais de uma seja adotada).

b) não propõe qualquer tipo de conclusão política, modo de vida ou deferência. Um ateu pode não acreditar em milagres divinos, mas pode achar sim que é possível haver milagres (exceções para as leis da natureza). Não é comum (ateísmo normalmente vem acoplado de ceticismo), mas, como eu disse, não há qualquer conteúdo dogmático na ideia de não acreditar em deus, e por isso, não merece ser classificado de doutrina.

Além disso, se o ateísmo não é uma doutrina, qual o significado do sufixo "-ismo" que faz parte da formação da palavra?

Por definição, o sufixo "-ismo" exerce sentido ou de "ideologia/doutrina" (a exemplo; materialismo, positivismo) ou de"dependência química" (a exemplo; alcoolismo, tabagismo), e como o ateísmo não pode ser considerado uma dependência química, por exclusão, ele seria então uma doutrina.

Para começo de conversa, eu acho que a existência de uma palavra para não acreditar em deus é um equívoco, pois consistência linguística exigiria que tivéssemos palavras para tudo que não acreditamos... e eu certamente não sou um aminotaurista. Existe, assim, uma tremenda bagagem política no uso dessa terminologia, mas é aceitável a sua adoção, considerando que o conceito da existência de deus tem, sim, um papel social de destaque, desproporcional à sua fragilidade lógica, na sociedade.

Assim, seria mais apropriado que a convicção na inexistência em deus não tivesse uma denominação particular, e se enquadrasse na ideia mais ampla do racionalismo. Entretanto, como esse exemplo específico de racionalismo é evocado com frequência, existe uma utilidade nessa classificação imperfeita.

De qualquer maneira, mesmo considerando tudo o que eu coloquei acima, me parece flagrante que você está usando errado o termo "ismo", e com isso criando uma falsa dicotomia. O sufixo "ismo" é extremamente versátil e refere-se também a gostos ou opiniões. Se você não acredita nisto, então por favor me esclareça: automobilismo é uma doutrina ou uma doença?

Já a explicação de "astrologia" não ser chamada doutrina, ou quem a nega igualmente, é o fato de a palavra em questão ser formada pelo sufixo "-logia", provavelmente pelo fato de seus fundadores a terem considerado uma ciência, e o sufixo que designa este sentido em uma palavra ser "-logia" e não "-ismo".

Consequência do que eu coloquei no parágrafo anterior, o simples fato de existir uma palavra para essa opinião em particular resulta de um enviesamento na zeitgeist de nossa sociedade, que coloca uma crença irracional em destaque comparado com outras crenças irracionais, e alude à rejeição daquela como um conteúdo diverso da rejeição de todas as outras.

De qualquer maneira, a opção de acreditar ou não acreditar em atrologia seria, por sua definição, uma doutrina, sim - astrologismo ou aastrologismo, conforme o caso - e a incapacidade das pessoas de qualificá-la adequadamente redundaria, apenas, numa classificação ruim.

Bem entendido, é claro, que eu não aceito sua definição, e não acho que o ato de acreditar ou duvidar de alguma coisa, pura e simplesmente, mereça o enquadramento de "doutrina". Estou adotando a sua definição apenas para fins deste argumento.

T+ :).
« Última modificação: 01 de Fevereiro de 2014, 15:53:52 por FredLC »
…There would be no atheism if there were no god…"

G.K. Chesterton.

"Deal"

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Offline Skeptikós

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Re:O ateísmo é uma doutrina?
« Resposta #11 Online: 01 de Fevereiro de 2014, 13:53:00 »
Citar
Segundo o Houaiss, fica bem clara a definição se equilibrar na conjunção alternativa ou.

Citar
Ateísmo
substantivo masculino
Rubrica: filosofia.
1   doutrina ou atitude de espírito que nega categoricamente a existência de Deus, asseverando a inconsistência de qualquer saber ou sentimento direta ou indiretamente religioso, seja aquele calcado na fé ou revelação, seja o que se propõe alcançar a divindade em uma perspectiva racional ou argumentativa
2   Rubrica: religião. Uso: impróprio.
denominação atribuída às concepções heterodoxas ou dubitativas a respeito da existência da divindade, tais como o panteísmo, o ceticismo, o deísmo enciclopedista etc.


Porém apresentar a alternativa de "atitude de espírito" não exclui "doutrina" como possível definição.

Além disso não é somente o Houaiss que apresenta "doutrina" como uma das definições de "ateísmo", o Aurélio, o Larousse, e muitos outros dicionários, se não todos, apresentam "doutrina" sempre como uma das definições do termo "ateísmo".  Isso é no mínimo pertinente.
"Che non men che saper dubbiar m'aggrada."
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Dante, Inferno, XI, 93; cit. p/ Montaigne, Os ensaios, Uma seleção, I, XXV, p. 93; org. de M. A. Screech, trad. de Rosa Freire D'aguiar

Offline Skeptikós

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Re:O ateísmo é uma doutrina?
« Resposta #12 Online: 01 de Fevereiro de 2014, 14:02:06 »
1ª ideia, deus(es) não existe(m).

Não, a primeira "idéia" é tentar ouvir os argumentos, e não fazer uma afirmação. A partir dos argumentos colocados, "Nasceu de uma Virgem", "Falou com cobras", "andou sobre a água", "criou o mundo", etc, então podemos chegar a conclusão que a crença generalizada em um deus (cristão no caso) é totalmente baseada em fatos fantasiosos, é misticismo puro, para então chegarmos a conclusão que a afirmação é falsa e não ter porque aceitar essa crença mística como verdadeira.

O cientificismo é a doutrina que pode ser resumida numa única ideia, somente a ciência pode estudar e demonstrar a verdade.

Só porque uma doutrina pode ser resumida numa única ideia isso não quer dizer que ela não seja uma doutrina.

O conjunto de pensamento que se usou para se chegar a está conclusão, "Deus não existe", atende as necessidade para considerar o ateísmo uma doutrina, assim como o conjunto de ideias que levaram a conclusão de que somente a ciência pode demonstrar a verdade tornam o cientificismo uma doutrina.
« Última modificação: 01 de Fevereiro de 2014, 14:16:34 por Skeptikós »
"Che non men che saper dubbiar m'aggrada."
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Offline Gabarito

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Re:O ateísmo é uma doutrina?
« Resposta #13 Online: 01 de Fevereiro de 2014, 14:04:40 »
Porém apresentar a alternativa de "atitude de espírito" não exclui "doutrina" como possível definição.

Além disso não é somente o Houaiss que apresenta "doutrina" como uma das definições de "ateísmo", o Aurélio, o Larousse, e muitos outros dicionários, se não todos, apresentam "doutrina" sempre como uma das definições do termo "ateísmo".  Isso é no mínimo pertinente.

Ok, eu me rendo quanto à etimologia.
Mas FredLC abordou uma séria de aspectos muito mais pertinentes. Acho que ele é o próximo da fila.

Offline Gabarito

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Re:O ateísmo é uma doutrina?
« Resposta #14 Online: 01 de Fevereiro de 2014, 14:07:03 »
Aproveitando o gancho, FredLC, acho que suas galerias de arte estão com o link quebrado...
Fiquei curioso.

Offline Skeptikós

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Re:O ateísmo é uma doutrina?
« Resposta #15 Online: 01 de Fevereiro de 2014, 14:11:03 »
Ok Fred LC, tomamos então a máxima do ateísmo "Deus não existe" como uma conclusão, e não mais como uma premissa.

Conclusão esta que foi possível graças a alguns critérios que o ateu usou para validar ou negar a proposição de que "Deus existe", basicamente evidências empíricas foram os critérios, e já que os relatos e teorias dos religiosos não apresentam nenhuma evidência empírica, logo, Deus não existe.

Quais foram as premissas:

É preciso uma evidência empírica.

A proposição de que Deus existe apresentada pelos religiosos não possue evidências que a corrobore.

A falta de evidências neste caso, resulta na negação ou recusa de que a ideia de que Deus existe seja verdadeira.

Logo a ideia de que Deus existe é falsa.

Temos ai um conjunto ordenado de pensamentos que nos fizeram chegar a conclusão de que Deus não existe.
« Última modificação: 01 de Fevereiro de 2014, 14:13:50 por Skeptikós »
"Che non men che saper dubbiar m'aggrada."
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Re:O ateísmo é uma doutrina?
« Resposta #16 Online: 01 de Fevereiro de 2014, 14:22:31 »
Fred LC, uma correção é que você disse que doutrina implica em dogmatismo, isso é falso, dogmatismo implica em afirmar possuir a verdade, enquanto dotrina implica em um conjunto de pensamentos e posturas sobre determinado(s) assunto(s).

Um exemplo disso é que o ceticismo filosófico é doutrina, mas por não proclamar verdades, não é dogmático. É doturina, mas não é dogmático.
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Offline Buckaroo Banzai

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Re:O ateísmo é uma doutrina?
« Resposta #17 Online: 01 de Fevereiro de 2014, 14:32:20 »
É verdade, o sufixo "-ismo" parece estar associado a outras aplicações que não apenas as citadas acima por mim. Devo reconhecer a consistência de seu argumento.

No entanto, qual será então o motivo de os principais dicionários da língua portuguesa [A exemplo do Aurélio V.5.0 e do Houaiss V.3.0] definirem "ateísmo" como doutrina, que se não o de que realmente seja uma doutrina?

A minha opinião é que toda essa preocupação semântica é exagerada, não "a realidade". É discussão mais sobre rótulos do que sobre as coisas em si.

De um lado, crentes que acham que ao equiparar ateísmo ou agnosticismo a "crença" ou "fé", ficam "de igual para igual", rebaixando os outros ao mesmo nível, e do outro ateus/agnósticos que compram a idéia e ficam fazendo malabarismos para dizer que "não é uma crença", ou "não é fundamenado em crenças", etc.

Astrologia é tão "ou mais" doutrina apesar do sufixo "logia". Astronomia também.

E economia "vs" ecologia não tem nos sufixos qualquer proximidade dos pares astronomia "vs" astrologia por causa dos sufixos.

São só usos mais ou menos arbitrários das palavras, não produto de "ciências exatas".

Offline Buckaroo Banzai

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Re:O ateísmo é uma doutrina?
« Resposta #18 Online: 01 de Fevereiro de 2014, 14:33:49 »
Genética já foi historicamente muito chamada de "doutrina mendeliana". E agora, ateus?


"Oh, mas não, os autores antigos estavam equivocados, pois a doutrina implica uma crença em fé irrracional e violenta em sobrenatural, blablablá, o que é fundamentaldmente diferente de uma esquematicação feita a partir de averiguações científicas sobre a realidade, blablablá".

Offline Skeptikós

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Re:O ateísmo é uma doutrina?
« Resposta #19 Online: 01 de Fevereiro de 2014, 14:45:55 »
É verdade, não estamos debatendo sobre "doutrina", "ateísmo" e "crenças" em si, mas sobre os significados destes termos.

Acho que considerar o ateísmo crença e doutrina não o rebaixa a algo equivalente ao teísmo, priemiramente por que pensar assim implicaria que um é superior ao outro, e isso eu não considero, depois porque a crença teísta é diferente da crença ateísta.

Uma é calcada na fé (o fideísmo por exemplo) como critério de validação, e dispensa evidências e lógica como critério de validação, a outra é calcada na evidência e na lógica (ateísmo) como critério de validação, e despreza a fé como critério de validação.

Além disso doutrina não implica em crença de fé irracional, mas sim em um posicionamento baseado num conjunto de pensamentos sobre deternimado(s) assunto(s). O ceticismo é uma doutrina assim como dogmatismo o é. E isso não desmerece nem diminui nem uma nem outra doutrina.
« Última modificação: 01 de Fevereiro de 2014, 14:48:15 por Skeptikós »
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Re:O ateísmo é uma doutrina?
« Resposta #20 Online: 01 de Fevereiro de 2014, 14:56:07 »
De acordo com o filosofo mario sergio cortella, toda ciência já foi uma doutrina, o que fez está doutrina se tornar ciência é a especialização em deterninado assunto, e a adequação aos critérios necessários para considerar uma doutrina de uma campo de estudo especifico numa ciência
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Offline FredLC

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Re:O ateísmo é uma doutrina?
« Resposta #21 Online: 01 de Fevereiro de 2014, 15:38:26 »
Aproveitando o gancho, FredLC, acho que suas galerias de arte estão com o link quebrado...
Fiquei curioso.

Apesar de eu postar pouco no fórum, minha inscrição é antiga... e também a minha assinatura.

O link está, sim, quebrado. Mas eis o link para minha galeria "online" mais completa:

http://fredlc.deviantart.com/

Tem tempo que eu não atualizo (alguns anos, em verdade), mas tem algumas coisas legais lá...

Fred LC, uma correção é que você disse que doutrina implica em dogmatismo, isso é falso, dogmatismo implica em afirmar possuir a verdade, enquanto dotrina implica em um conjunto de pensamentos e posturas sobre determinado(s) assunto(s).

Um exemplo disso é que o ceticismo filosófico é doutrina, mas por não proclamar verdades, não é dogmático. É doturina, mas não é dogmático.

Deixa eu responder esta parte primeiro, que me parece mais fundamental.

Reputo que você extraiu que eu equiparo doutrina e dogmática deste excerto do meu texto:

"(...) mas, como eu disse, não há qualquer conteúdo dogmático na ideia de não acreditar em deus, e por isso, não merece ser classificado de doutrina."

E a crítica é meritória, mas isso é mais por uma imprecisão de redação. Doutrina e dogmática não são coisas idênticas; e, realmente, a grande diferença entre elas é que uma dogmática é insensível à crítica e ao confronto, enquanto uma doutrina pode perfeitamente modificar-se à luz de críticas externas ou controles internos. Algumas doutrinas, como o método científico, são inteiramente baseadas na completa rejeição a dogmáticas.

Dito isto, doutrina e dogmática têm algo em comum, que é o fato de que ambas são proposituras positivas, trazem um conteúdo a ser adotado ou ao menos apreciado pelo interlocutor.

Crítica aceita, eu deveria ter dito, sobre ateísmo, não que " não há qualquer conteúdo dogmático", mas sim, que " não há qualquer conteúdo constitutivo". Mas esse é um acerto de redação, não um reajuste da ideia postulada.

Ok Fred LC, tomamos então a máxima do ateísmo "Deus não existe" como uma conclusão, e não mais como uma premissa.

Conclusão esta que foi possível graças a alguns critérios que o ateu usou para validar ou negar a proposição de que "Deus existe", basicamente evidências empíricas foram os critérios, e já que os relatos e teorias dos religiosos não apresentam nenhuma evidência empírica, logo, Deus não existe.

Quais foram as premissas:

É preciso uma evidência empírica.

A proposição de que Deus existe apresentada pelos religiosos não possue evidências que a corrobore.

A falta de evidências neste caso, resulta na negação ou recusa de que a ideia de que Deus existe seja verdadeira.

Logo a ideia de que Deus existe é falsa.

Temos ai um conjunto ordenado de pensamentos que nos fizeram chegar a conclusão de que Deus não existe.

Acho que minha mensagem original até já cobria o principal conteúdo desta resposta, mas vamos lá outra vez:

Ateísmo não é um consequente que necessita empiricismo como premissa, e eu não aceito a sua premissa de que o seja.

Digamos, por exemplo, que alguém opte por ser ateu não por que acha insuficiente a evidência, mas por razões de pura retórica; por exemplo, se alguém se baseia na incongruência intrínseca da existência de poderes infinitos - uma proposta que tem bases puramente matemáticas, como o famoso "paradoxo do hotel de Hilbert" ou, em uma alegoria mais conhecida do público, a proposta de que infinitos macacos em infinitas máquinas de escrever iriam necessariamente produzir as obras completas de Shakespeare.

Perceba que esse argumento jamais pode ser empírico, pois ninguém nunca teve contato com hotéis infinitos ou máquinas de escrever infinitas para poder extrair dessa experiência qualquer conclusão. Entretanto, se eles convencem o leitor da incongruência dos infinitos, é o bastante para justificar a conclusão de que o deus monoteísta - supostamente dotado de poder infinito - não existe, sem que empiricismo jamais tenha sido parte do argumento.

Claro, sempre podemos definir um deus de poderes finitos, mas essa resposta não afeta o argumento, pois ele se baseia no fato de que um argumento não empírico tem o potencial de levar uma pessoa ao ateísmo... e o argumento acima o tem, porque nossa sociedade define deus como todo-poderoso.

Outra proposta lógica para a rejeição de deus é o argumento da parcimônia, ou seja, a ideia de que é logicamente desnecessário acrescentar elementos supérfluos que majorem a complexidade. Ora, a proposta "universo existe" carrega, necessariamente, menos elementos que a proposta "universo existe e deus existe", pois um novo elemento não evidente foi acrescido ao complexo a ser explicado - e, embora essa seja uma descrição lógica nada popular para a população geral, ela é bastante sensata, e para um logicista, convincente, ainda que a população em geral não pense como pensam os logicistas.

Em nota: não pense que outros argumentos puramente lógicos não poderiam ser feitos contra deuses "finitos", porque poderiam; só não vou entrar em debate detalhado sobre isso porque primeiro precisaríamos das características desses deuses.

Mas não é só a retórica que poderia ser suficiente. Argumentos emocionais também tem esse potencial. O "problema do mal", seja ele personalíssimo (se deus existisse meu avozinho não teria sido atropelado) ou universal (se deus existisse não haveria fome ou doenças no mundo) - é reconhecido pelos próprios apologistas como uma dificuldade seríssima sem uma resposta apropriada e a compreensão dele é, frequentemente, o motor inicial da dúvida (embora não tenha nenhuma base empírica, e possa ser mais tarde substituído ou complementado por outras ideias epistemologicamente mais fortes).

Em resumo - eu, em particular, concordo que o empiricismo é a melhor, a mais sólida, e possivelmente a mais difundida, base para o ateísmo. Mas ele não é, de forma alguma, uma premissa da ideia. Acabei de apresentar pelo menos quatro variantes tão diferentes entre si que, mesmo com a conclusão em comum, dificilmente podem ser descritos como sendo a mesma ideia - e como o ateísmo, enquanto conceito, não prefere qualquer uma delas em relação às outras, como a adoção de qualquer dessas perspectivas diametralmente opostas permite o uso da denominação, é simples concluir que não existe um conteúdo positivo/constitutivo que autorize a classificação de ateísmo como "doutrina". Um ateu empiricista não é mais ou menos ateu que um logicista ou um emotivo.

Em resumo, não há nada a ser seguido, dogmaticamente ou não, que defina a forma correta de ser ateu. Não há conjunto de idéias organizado a ser seguido. Há apenas e tão somente uma opinião comum entre pessoas completamente diferentes.

T+ :).
« Última modificação: 01 de Fevereiro de 2014, 15:45:14 por FredLC »
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Offline FredLC

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Re:O ateísmo é uma doutrina?
« Resposta #23 Online: 01 de Fevereiro de 2014, 16:15:37 »
Reputando que ateísmo significa apenas "não acreditar em deus", imagino que uma pessoa que não acredite em deus, mas acredite em fantasmas, poderes psíquicos e até no bicho-papão é, sim, um ateu, conquanto não atribua a qualquer dessas entidades um caráter de divindade. Não conheço nenhum caso, mas teoricamente é possível. se você conhecer alguém assim, diria que ele não é ateu?

Uma pessoa que diga que um ateu não pode acreditar em coisas sobrenaturais diversas de deus está compondo a ideia com elementos extras de uma bagagem ideológica de ceticismo. É quase como a "falácia do falso escocês". Não digo que está pregando necessariamente um "falso ateísmo", pois ele pode não exigir, mas também não proíbe, ceticismo... digo apenas que está pregando um ateísmo com mais elementos do que aqueles estritamente necessários, e que seria mais preciso usar outra terminologia se o elemento é reputado obrigatório.

T+ :).
« Última modificação: 01 de Fevereiro de 2014, 16:21:58 por FredLC »
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Offline Luiz F.

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Re:O ateísmo é uma doutrina?
« Resposta #24 Online: 01 de Fevereiro de 2014, 16:19:41 »
Tecnicamente um ateu pode crer em coisas como fantasmas, vodoo, "energias", sem ser descaracterizado como ateu. É só dar um jeito de justificar tudo isso sem uma divindade no meio que tá valendo.

Edit: O FredLC disse mais ou menos o que eu quis dizer, só que mais rápido.
"Você realmente não entende algo se não consegue explicá-lo para sua avó."
Albert Einstein

 

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