Bem, é o tipo de intransigência que eu simplesmente não compartilho. Acho que as coisas podem ser substancialmente mais liberais, ao mesmo tempo em que incorporam algumas coisas "sociais" (exemplo quase clichê é a Suécia, que apesar de ser freqüentemente citado para o bem ou para o mal como "socialista" é um dos de maior liberdade econômica na Europa, só um pouco abaixo dos EUA, e com melhor qualidade de vida), especialmente se houver um déficit inicial de capacidade da iniciativa privada em suprir essa "demanda potencial", como possivelmente é o caso com creches. O que não precisa ser feito com administração pública, de qualquer forma. "Ressalvas" "contrárias" ao liberalismo também são perfeitamente aceitáveis e até mais saudáveis no que concerne a um código de defesa do consumidor razoável.
Como escrevi, os países escandinavos são expoentes em políticas de bem-estar social. Isso nada tem a ver com socialismo e, por mais que se negue, tais políticas só se tornaram possíveis depois de mais de um século de práticas liberais. É comum essa confusão, onde se identifica um governo como socialista por promover políticas sociais, mas o fato é que é justamente porque o governo não é socialista que tais políticas sociais funcionam.
Bem, eu não sei se estou "negando" qualquer coisa. Mas, qualquer que seja o histórico exato (que não pretendo questionar) também é equivocada a rejeição radical a todo tipo de política que possa se rotular (pejorativamente ou não) como "socialista".
Polícia em si poderia ser tida já como algo "socialista", é a segurança pública, da sociedade, estatal; não são seguranças pagos do próprio bolso, nem defesa pessoal. Mas é algo que só mesmo os libertários-anarquistas mais radicais rejeitarão como algo positivo, que contribui tremendamente para a prosperidade da sociedade (ou, no mínimo que em geral, ruim com eles, pior sem eles -- na verdade acho que a maior oposição a polícia estatal ultimamente vem dos socialistas). Mas não deve ser a única política possível, nesse sentido. O que também não leva honestamente ao "declive escorregadio", "então vamos planificar toda a economia de uma vez". Mas deve ser tremendamente comum que, a situação seja algo melhor para a sociedade ao todo se o governo dá acesso a alguns serviços para parte da população que não teria acesso pelos termos oferecidos apenas pela iniciativa privada.
Não digo que é trivial enxergar essas necessidades ainda não idealmente atendidas pelo mercado, e que é não algo que os políticos acabam até tendo um certo "incentivo" para inventar e prometer resolver mesmo sem ser um problema significativo, real, ou mesmo ter uma política que realmente melhore qualquer coisa, podendo até piorar. Mas é o mesmo tipo de erro, uma "falácia genética", achar que o estado ou a iniciativa privada são as fontes de todas as soluções ou problemas. A realidade é que podem vir soluções e problemas de ambos os lados, tem que se analisar caso a caso, e tem que se ter cuidado com dogmas, princípios básicos intransigentes dos quais se acha possível derivar sempre a melhor resposta.
Aqui você chega exatamente no ponto de convergência com minha concepção liberal mas, principalmente, com o livro que estou lendo atualmente:
O livro politicamente incorreto da esquerda e do socialismo, de Kevin D. Williamson.
Ele usa duas definições para qualificar o que será entendido, no contexto do livro, por socialismo. Cito abaixo:
“1) a provisão pública de bens não públicos;
2) um planejamento econômico central.”
Trecho de: Kevin D. Williamson. “O livro politicamente incorreto da esquerda e do socialismo.” iBooks.
O item
2 acaba conduzindo o Estado para uma das facetas do totalitarismo. No entanto, bastante alinhado com sua colocação está um item
1. Perceba que é exatamente esse limiar entre o que pode e o que não pode ser oferecido pelo mercado que marca o tamanho do Estado. Mais uma citação:
“Para os propósitos dessa argumentação, a expressão será usada em seu sentido econômico técnico: “bens públicos” não são coisas que fazem bem ao público ou coisas que o público deseja, mas coisas que, por sua natureza, não podem ser facilmente fornecidas pelo mercado livre, como a defesa nacional, a aplicação das leis e certos tipos de serviços públicos.”
Trecho de: Kevin D. Williamson. “O livro politicamente incorreto da esquerda e do socialismo.” iBooks.
Exatamente como sua observação:
Não digo que é trivial enxergar essas necessidades ainda não idealmente atendidas pelo mercado
Roberto Campos elencava como cinco as atribuições do Estado Mínimo:
- Segurança
- Educação Fundamental
- Justiça
- Defesa
- Relações Exteriores
Segundo ele, tudo o mais, até a saúde, poderia ser provida pelo mercado. É claro que com o Estado que temos hoje, paternalista, ultra-intervencionista e empresário, temos até dificuldades de enxergar como isso seria possível, já que nossa cultura está encapsulada por um holograma que nos impossibilita de
pensar fora da caixa. Quando um liberal aponta uma solução, a reação imediata é chamar a solução de utopia, ideologia ou coisa do gênero. Não temos nem condições de entender um mundo fora do
campo de força estatal!
Uma pessoa que vem sendo muito incompreendida em sua posição liberal é o Rodrigo Constantino. Independentemente de sua posição (às vezes) radical como anti-esquerdista, ele confessa que o Liberalismo Clássico é uma utopia, no sentido de que nunca foi alcançado no planeta e dificilmente o será. No entanto, existe um liberalismo possível, com exemplos mundiais e que pode ser perseguido a partir de medidas simples que, com o avançar do tempo, pode chegar aos níveis escandinavos, inclusive com suas políticas de bem-estar social (socialistas em essência mas liberais na prática).
A restrição ao termo
socialista se dá mais pelo fato de este nunca ter existido sem ser, na prática, implementado por regimes totalitaristas, tendo o Comunismo como expressão máxima da
mão de ferro do socialismo.
Penso que essa idéia de que um rompimento radical com o atual modelo intervencionista, onde na virada de 31/12 para 01/01 se implanta um estado de liberdade, é mais equivocada do que pensar em uma
revolução do proletariado. Isso é impossível!
Penso que apenas com medidas que, paulatinamente, vão transformando o mercado de ultra-intervencionista em livre (anos e anos, com certeza) é que isso pode acontecer. Até mesmo o PT poderia fazer isso! Isso se o partido não fosse bolchevique em toda sua essência

Saudações