Sim, um dos interesses de uma pessoa pode inclusive ser de homeopatia e cura por cristais, mas um estudo não enviesado e nem muito profundo já sugeriria que tal campo de estudos é uma perda de tempo -- exceto talvez se formos considerar o pós-modernismo e a possibilidade/"fato" de que a "ciência" européia masculina heterocentrista não pode ser usada para analisar essas "outras verdades" porque blablablá e a realidade não existe.
Mas daí eu diria que essa linha de pensamento é também perda de tempo, daí pergunto. O que há aí de "útil", de "descobertas", em vez de apenas jogos mentais de faz de conta, auto-enganação?
Sim, o interesse pessoal de alguém pode levá-la a estudar essas coisas. O fato de a pessoa não concordar e/ou concluir, mesmo baseada em evidências, que algo é falso, implica necessariamente que é perda de tempo estudar aquilo? É perda de tempo estudarmos mitologia egípcia, então? É perda de tempo estudarmos literatura de ficção? Eu diria que é totalmente legítimo que uma pessoa tenha interesse por estudar esses temas. Quando a pessoa se matricula em um curso de filosofia, ainda por cima, é esperado que ela tenha interesse em conhecer coisas que hoje são consideradas absurdas pelo senso comum e pela ciência, como o platonismo, e nem por isso achamos que Platão seja desnecessário a um curso de filosofia. O pós-modernismo se enquadra no mesmo caso.
Não sei o que você chamaria de "útil" ou de "descoberta" em um contexto filosófico e que fosse tão universal a ponto de ser extensível a outras pessoas.
Não sei se "utilidade" é bem o melhor termo.
Quando alguém diz ser "interessante estudar mitologia egípcia", me parece geralmente fundamentalmente diferente de dizer que é "importante se estudar pós-modernismo".
"Mitologia" já traz implícito que nem se "acredite" nos mitos. Já quando se fala em "estudar pós-modernismo" me parece inevitável a sugestão de haver uma validade mais significativa no que me parece só um jogo de auto-engano. Soa mais como "estudar matemática" do que "estudar distúrbios mentais", ou "estudar falácias", "estudar história da ciência", que seriam os análogos a "estudar mitologia egípcia" e não "reviver"/acreditar nas religiões deles.
Da forma que eu percebo as coisas quase todo entendimento do "funcionamento" de algumas dessas coisas, no que concerne a "pós-modernismo", se enquadra nessas descrições que dei antes, de serem movimentos engajados em negação da realidade, auto-ilusão.
Mas, como disse, meu conhecimento de pós-modernismo é extremamente superficial e limitado. O que haveria que pudesse me dar uma compreensão mais completa e útil dessas coisas?
Eu achei útil -para mim- conhecer as justificativas filosóficas para essa "negação da realidade", principalmente em Nietzsche, que foi o grande precursor do pós-modernismo e introduziu todas as principais ideias dos pós-modernos. Mas não tenho como julgar o que seria importante para você. Talvez estudar pós-modernismo lhe seja mesmo uma perda de tempo, mas também há essa possibilidade em relação à filosofia grega, à filosofia moderna, etc.
"Importante" para mim não é nem mesmo essa discussão, é só curioso.
O que eu acharia de "curioso" no pós-modernismo, seria se houvesse/houver algo que possibilitasse dizer "graças ao pós-modernismo que hoje consideramos moralmente aceitável o divórcio", "graças ao pós-modernismo que muitas empresas trabalham num ambiente mais descontraído, que acaba sendo mais produtivo e saudável", etc.
Em vez de apenas algo como "graças ao pós-modernismo hoje entendemos que é tão correto afirmar que a Terra é redonda quanto que é chata, ou que está apoiada sobre o casco de uma tartaruga gigante".
A mim parece uma situação análoga a de criacionismo versus evolução. Não parece ser tremendamente útil a qualquer pessoa um "conhecimento profundo" sobre criacionismo. É suficiente saber que são distorções e apreensões seletivas dos fatos, de forma a concordar com uma conclusão que é também o ponto de partida. E que a motivação ideológica/religiosa será sempre colocada acima de uma análise imparcial dos fatos. Será parecido com, por exemplo, feministas pós-modernistas que digam ser um "mito" que homens, em média, como resultado natural do desenvolvimento, tenham mais massa muscular que mulheres. O criacionista diz que a conspiração evolucionista fabrica suas evidências e nega os verdadeiros fatos, e feministas pós-modernistas dirão que a conspiração patriarcal faz o mesmo aí.
Em resumo, é como uma crença religiosa, ou mais especificamente, o mesmo padrão de pensamento/auto-engano que comumente acompanha crenças religiosas quando em negação de aspectos mais palpáveis da realidade.
E se o foco da pessoa for justamente estudar mitos de criação das civilizações do Crescente Fértil? Aí passa a ser essencial estudar o criacionismo judaico-cristão.
O que eu quero dizer é: se você considera como premissa que as únicas coisas relevantes a se estudar são coisas que possuem embasamento científico e aplicação prática imediata, então realmente você pode jogar não apenas o pós-modernismo, mas toda a estante de filosofia no lixo, junto com a sociologia, a história, a antropologia, etc. Se você considerar que o que há de relevante é apenas a "hard science" e o que for consistente com ela, então a maior parte do conhecimento humano realmente será perda de tempo para você. Mas é um critério individual seu, assim como estudar filosofias contradizendo isso é um critério individual meu.
Esse "estudar o criacionismo judaico cristão" não é referente ao que eu me referia por criacionismo. Esse outro significado seria equivalente ao "estudo de mitologia egípcia antiga", algo que eu não questiono.
Me referia a "aceitar as crenças" desses grupos ou outros, num malabarismo de seletividade e relativismo, ou mesmo apenas "pesquisar a fundo". Você pode fazer isso, mas percebe que não tem valor ir muito longe (a não ser por pura curiosidade), pois será sempre esse mesmo padrão, de peças fundamentais omitidas estrategicamente, distorções, etc. É evidente que, se o criacionista leu aquilo e acreditou, ele acredita nisso, não é muito "esclarecedor" se aprofundar mais.
Nesse caso eu acho perfeitamente normal "estudar" pós-modernismo, mas ainda me parece só algo análogo a "estudar" pseudociências e teorias conspiratórias, e não a "estudar matemática".
O que eu achava que pudesse haver seria algo mais parecido com "estudar matemática", ainda que só de longe se aproximando disso, conforme os exemplos que eu dei anteriormente ("como o pós-modernismo mostra que é moralmente aceitável o divórcio", etc)
É uma perspectiva diferente da que eu esperava, quando li, acho que de você mesmo, que seriam "os dois lados da mesma moeda", a negação cientifica e o desdém ao pós-modernismo. Passava a impressão de haver mais algo que se pudesse aproveitar no último, e não como análogo ao conhecimento acerca de uma religião, sem no entanto necessariamente concordar com "nada", ou com seus fundamentos.
O que eu disse que são dois lados da mesma moeda não inclui o desdém pelo pós-modernismo quanto ao seu mérito filosófico, e sim a afirmação categórica de que ele não merece ser estudado (por ninguém) e que a ausência de conteúdo pós-moderno em um curso de filosofia seria por si enriquecedora.
Aqui voltamos ao ponto de "estudo" podendo significar "aceitação", versus "entender o que eles pensam".
Acho que ninguém (nem o DDV) seria totalmente contra o "estudo do pós modernismo" sob essa segunda ótica, mas o que geralmente deve estar acontecendo quando as pessoas "estudam o pós modernismo" é uma espécie de conversão religiosa, não "estudo da mitologia da religião".
E nesse caso, acho difícil não considerar como um empobrecimento, é praticamente como "estudar/aceitar o fascismo", com seu anti-intelectualismo, versus "estudar o fascismo" como em "estudar história".
Meu ponto, tentando me expressar mais claramente, é: pouco importa se o pós-modernismo é consistente, é "verdadeiro", é correto. O fato é que ele exerce impacto significativo na sociedade e isso por si só já justifica o seu estudo pelo menos por pessoas que se interessam particularmente pela área de filosofia. Além disso, também pode ser enriquecedor a quem tem curiosidade de entender a base filosófica de alguns fenômenos da sociedade que acabam nos afetando, assim como também pode ser mera perda de tempo para outros que não têm interesse particular em entender essas coisas.
Sim. Acho que já foi esclarecido esse mau entendido, então. Como "estudar o fascismo" é enriquecedor, sem necessariamente haver o mínimo de simpatia pela coisa.
Nesse caso, fico ainda curioso com coisas que as pessoas tenham achado enriquecedoras nesse sentido, como "entendimento da base filosófica de alguns fenômenos da sociedade".