Achei muito interessante a proposta, pelo menos como teste. Se a técnica já foi utilizada e continua sendo com sucesso em outros lugares, porque será que o ministério responsável não responde?
Aviões contra o Aedes aegypti
Sindicato Nacional das Empresas de Aviação Agrícola defende uso de aviões agrícolas para combater a dengue no Brasil, desde 2004. Ação que poderia ter salvo milhares de vidas. Governo não dá resposta desde 2008.
Há 40 anos Brasil teve uma das mais bem-sucedidas operações de combate a mosquitos em sua história, na qual a aviação agrícola ajudou eliminar um surto de encefalite que assolava a Baixada Santista, em São Paulo. Foram 495 casos da doença, entre março e junho daquele ano, registrados principalmente em Mongaguá, Peruíbe e Itanhaém. A transmissão estava ligada ao mosquito Culex, que foi combatido com uma ação enérgica da Superintendência de Controles de Endemias (SUCEN) de São Paulo.
A estratégia abrangeu ações de educação para eliminar criatórios em residências e também aplicações de larvicidas por terra. Mas foi a aplicação por aviões do mesmo inseticida hoje aplicado por terra (nos chamados fumacês) que reduziu em 90% a população de mosquitos adultos da região, segundo levantamento da própria Sucen. Um exemplo extraordinário de como vontade política e ferramentas adequadas podem resultar em benefício para a população. No caso, centenas de vidas salvas ou livres de sequelas irreparáveis.
Em 2004, o Sindicato Nacional das Empresas de Aviação Agrícola (SINDAG) sugeriu ao Ministério da Saúde uma parceria para se chegar a uma fórmula que repetisse em escala nacional o êxito obtido 29 anos antes no litoral paulista. A proposta era (e ainda é) de se eleger uma área piloto em uma zona de epidemia da doença. E, ali, utilizar um avião para aplicar o mesmo inseticida atualmente aplicado apenas por terra através de bombas costais ou em caminhonetes. Porém, com uma dosagem de 400 milímetros por hectare.
Pela recomendação do SINDAG para esse teste, a entidade entraria com o avião, equipamentos embarcados, piloto e equipe de terra para fazer o preparo do produto. O Ministério da Saúde forneceria o inseticida e disporia ainda de uma equipe multidisciplinar para avaliar a toda a operação e seus resultados – químicos, biólogos, ambientalista, sanitarista etc.
Ou seja, além de colocar verdadeiramente à prova o método que deu certo em 1975 – e que hoje é utilizado nos Estados Unidos, México e diversos outros países, a intenção é chegar a um protocolo de operações que melhor adeque a técnica à atual realidade brasileira. Tudo da maneira mais transparente possível e deixando claro que se trata de uma ação para áreas de epidemia. E complementar ao combate de larvas e às ações educativas para que a própria população continue prevenindo e eliminando os focos do inseto.
O SINDAG seguiu insistindo com a ideia, vendo a dengue crescer 109% em 2005. Em 2007, quando o Brasil registrou 496,9 mil casos da doença – crescimento superior a 90% em relação ao ano anterior, o Ministério da Saúde publicou uma nota técnica descartando o uso da aviação, exceto em casos de epidemia. O documento apresentou dados que apontariam desvantagens no uso de aviões e foi contestado ponto a ponto pelo SINDAG, inclusive a relação custo/benefício da aviação.
Em uma audiência com o então ministro José Gomes Temporão, o sindicato apresentou seus argumentos e reforçou que a parceria seria justamente para colocar tudo à prova. Isso já em 2008, quando o país chegou a 632,6 mil casos de dengue. Em junho daquele mesmo ano, o SINDAG apresentou o plano em uma reunião do grupo técnico do Programa Nacional de Combate à Dengue, onde a resposta foi de que o grupo iria deliberar sobre o tema e informar á entidade da decisão. Resposta essa que não veio até hoje.
Enquanto vimos a dengue crescer mais 137% e o Brasil fechar 2015 com mais de 1,5 milhão de casos – a maior epidemia da doença em sua história. E o Aedes aegypti iniciou 2016 causando medo também com da febre chikungunya e, principalmente, epidemias do vírus zika. Pessoas estão morrendo e crianças estão sendo marcadas por sequelas que a acompanharão por toda a vida.
No último dia 23 de dezembro, o SINDAG reencaminhou sua proposta ao Ministério da Saúde, solicitando nova audiência junto ao órgão. Repetindo, como vem fazendo há 11 anos, que o Brasil tem a segunda maior força aérea agrícola do mundo, que ajudou a salvar vidas em 1975 e que está disposta a ser colocada à prova, para repetir o feito.
Espera-se apenas vontade política.
Não é por falta de vontade política. É porque é uma ideia idiota. Primeiro por uma questão de segurança de voo. O uso desses aviões em grandes centros urbanos, em voos rasantes, em meio a prédios e tráfego de helicópteros, além das rotas dos aviões comerciais representaria um grande risco à segurança. Lembre-se que a última vez utilizada essa técnica foi há 40 anos, quando o Brasil era menos urbano do que é hoje e, provavelmente, não foi utilizada em grandes centros. E isso para uma efetividade quase nula.
Há 40 anos atrás, o inseticida mais utilizado era ainda o DDT, apesar de ser o início do seu banimento. O DDT é altamente tóxico e poluente. Até hoje você encontra traços do DDT nos EUA, anos depois de ter sido proibido. Para além dos riscos à saúde humana, ele atuava sobre uma enzima nos pássaros, responsável pela formação da casca do ovo. Isso fez com que espécies fossem quase extintas. (Detalhes sobre isso tem em um vídeo do Canal do Pirula). Se teve uma efetividade sobre os mosquitos do hemisfério norte, nas regiões tropicais não funcionou, por causa da população de mosquitos que era muito maior. O que gerou foi uma seleção dos indivíduos resistentes ao DDT.
O Aedes aegypt é um mosquito essencialmente urbano. Ele está presente dentro das casas, prédios, construções... ele é um mosquito doméstico. A pulverização simplesmente não atingiria o local onde o mosquito se encontra. A pulverização terrestre não consegue, a pulverização pelo ar conseguiria muito menos. Além disso, como aconteceu com o DDT, o mosquito já está resistente ao inseticida atualmente em uso. Esses inseticidas também atuam sobre as formas adultas do mosquito. Não possuem ação sobre os ovos e as formas larvais. Por fim, seria uma dispersão sobre uma grande área, envolvendo não somente mosquitos, mas também uma grande quantidade de seres humanos e outros animais, além de poluir o meio ambiente.
O fumacê possui uma ação muito limitada. O que REALMENTE combate o mosquito é a eliminação dos criadouros e, provavelmente, foi o que foi mais efetivo também há 40 anos.