Autor Tópico: Imitação, um sinal da evolução da espécie  (Lida 4470 vezes)

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Offline Südenbauer

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Imitação, um sinal da evolução da espécie
« Online: 21 de Dezembro de 2005, 13:19:07 »
Imitação, um sinal da evolução da espécie

Estudo feito com crianças e chimpanzés mostra que os humanos insistem em imitar mesmo quando isso é inútil

Carl Zimmer escreve para o "The New York Times":

Fui a New Haven com uma pergunta martelando a cabeça. Como minha filha tinha se saído em comparação com os chimpanzés? Um mês antes, havia encontrado uma carta da escola com minha filha Charlotte.

Era de um formando de Yale pedindo voluntários para um estudo de psicologia. O estudante, Derek Lyons, queria observar como as crianças de 3 e 4 anos aprendem.

Fiquei curioso e entrei em contato. Lyons explicou como o estudo poderia lançar luz sobre a evolução.

O estudo seria baseado num documento publicado na revista Animal Cognition de autoria de Victoria Horner e Andrew Whiten, psicólogos da Universidade de St. Andrews, na Escócia.

Eles mostraram a chimpanzés como tirar comida de uma caixa. A caixa era pintada de preto e tinha uma porta e um ferrolho atravessado na parte de cima. O alimento era escondido num tubo atrás da porta.

Ao mostrar aos chimpanzés como tirar a comida, os pesquisadores acrescentaram etapas desnecessárias. Antes de abrir a porta, empurraram o ferrolho para trás e deram um pancadinha na caixa. Só depois puseram o ferrolho no lugar, abriram a porta e pescaram a comida.

Como os chimpanzés não podiam ver dentro da caixa, não conseguiram descobrir que etapas eram desnecessárias. Como resultado, quando foi dada a caixa aos chimpanzés, dois terços imitaram fielmente os cientistas.

Depois, a equipe usou um caixa transparente e isso resultou num comportamento tremendamente diferente. Os chimpanzés puderam perceber que os cientistas estavam perdendo tempo deslizando o ferrolho e batendo na caixa.

Foram direto para a porta.

Os pesquisadores repetiram a experiência com seres humanos. Mostraram a caixa transparente para 16 crianças. Depois de colocar um adesivo na caixa, mostraram às crianças como retirá-lo incluindo os passos desnecessários.

Os cientistas puseram o adesivo de volta na caixa e deixaram a sala. As crianças perceberam com tanta facilidade quanto os chimpanzés que não fazia sentido abrir o ferrolho ou bater na caixa. Mas 80% delas fizeram isso. "Foi espetacular", disse Lyon.

Porém, era possível que os resultados fossem conseqüência do desejo de as crianças simplesmente os imitarem. Para verificar até que ponto exatamente ia esse impulso para imitar, Lyons planejou um estudo mais amplo, com cem crianças. Fiquei intrigado. Inscrevi Charlotte, e ela participou do estudo duas vezes.

Charlotte não quis falar sobre as experiências, a não ser que foram divertidas. Lyons estava mais ávido para falar. Ele me convidou para dar uma olhada no desempenho de Charlotte no Laboratório de Cognição de Yale.

Enquanto viajava para New Haven, senti como se Charlotte acabasse de passar por um vestibular entre espécies. Era bobagem, mas eu esperava que Charlotte mostrasse aos chimpanzés que podia perceber causa e efeito tão bem quanto eles. Um ponto para o Homo sapiens.

A princípio, ela percebeu. Lyons pôs um filme no computador no qual Charlotte o ouviu atentamente falar sobre a caixa transparente. Ele se sentou em frente a ela e pediu que retirasse a tartaruga de plástico que acabara de pôr na caixa.

Em vez de delicadamente abrir a porta, Charlotte agarrou toda a parte da frente, rasgou para abrir as suas abas de velcro e arrancou a tartaruga. "Peguei!" Um chimpanzé poderia ter feito melhor, pensei.

Mas, no segundo encontro, as coisas mudaram. Dessa vez, Lyons fez com que uma caloura mostrasse a Charlotte como abrir a caixa. Antes, a caloura deslizou o ferrolho para trás e deu um tapinha desnecessariamente. Charlotte imitou. Ela não mais rasgou a caixa. Quase pude ouvir os chimpanzés vaiando.

Barnes mostrou a Charlotte outros quebra-cabeças e ela o imitou fielmente. Quando os filmes terminaram, eu não sabia o que dizer. "Ela é bem típica da sua idade", disse Lyons. Tendo observado cem crianças, ele concorda com Horner e Whiten que elas realmente imitam.

Lyons encara esses resultados como um indício de que os humanos já vêm programados para aprender por imitação, mesmo quando é evidente que essa não é a melhor maneira de aprender. Se ele estiver certo, isso significa uma grande mudança evolucionária dos nossos ancestrais macacos.

Outros primatas são ruins de imitação. Quando observam outro primata fazendo algo, parecem se concentrar em quais são os objetivos e ignorar suas ações.

À medida que os ancestrais humanos começaram a fazer ferramentas complicadas, descobrir os objetivos talvez não tenha deixado de ser suficientemente bom. Os hominídeos precisavam de uma forma para registrar automaticamente o que os hominídeos faziam, mesmo que não entendessem as intenções por trás.

Não faz muito tempo que muitos psicólogos pensavam que a imitação era uma ação primitiva em comparação com a descoberta das intenções dos outros. Isso está mudando. "Talvez a imitação seja muito mais sofisticada", diz ele.

"A imitação está tão entranhada na nossa natureza que quase nunca se sobressai. É preciso criar circunstâncias muito artificiais para perceber isso."

Dentro de pouco anos, planejo explicar a experiência a Charlotte. Não tem problema perder para os chimpanzés. Na realidade, talvez seja isso que nos torne unicamente humanos.
(O Estado de SP, 18/12)

Offline Felius

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Re.: Imitação, um sinal da evolução da espécie
« Resposta #1 Online: 21 de Dezembro de 2005, 13:24:52 »
Ok, agora a professora não pode me dar 0 por copiar provas, trabalhos e redações.
É genetico. :hihi:  :hihi:  :hihi:  :hihi:

Mas serio, o pior é que é.
Ser humano é fogo.
"The patient refused an autopsy."

Offline Nina

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Re.: Imitação, um sinal da evolução da espécie
« Resposta #2 Online: 22 de Dezembro de 2005, 00:24:16 »
"Ser macaco pelado é fogo..."  :P
"A ciência é mais que um corpo de conhecimento, é uma forma de pensar, uma forma cética de interrogar o universo, com pleno conhecimento da falibilidade humana. Se não estamos aptos a fazer perguntas céticas para interrogar aqueles que nos afirmam que algo é verdade, e sermos céticos com aqueles que são autoridade, então estamos à mercê do próximo charlatão político ou religioso que aparecer." Carl Sagan.


Offline Nina

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Re.: Imitação, um sinal da evolução da espécie
« Resposta #4 Online: 22 de Dezembro de 2005, 23:02:33 »
Talvez.... é preciso pensar sobre...

Mas que não passamos de macaquinhos, isso tá na cara!  :D
"A ciência é mais que um corpo de conhecimento, é uma forma de pensar, uma forma cética de interrogar o universo, com pleno conhecimento da falibilidade humana. Se não estamos aptos a fazer perguntas céticas para interrogar aqueles que nos afirmam que algo é verdade, e sermos céticos com aqueles que são autoridade, então estamos à mercê do próximo charlatão político ou religioso que aparecer." Carl Sagan.

Offline Marcel

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Re: Imitação, um sinal da evolução da espécie
« Resposta #5 Online: 15 de Dezembro de 2006, 00:52:40 »
  É o seguinte Fernando, se não for pedir muito, tu conhece algum site com informações sobre essa experiência??? Se sim, me informe, por favor...

Offline LIAN

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Re: Imitação, um sinal da evolução da espécie
« Resposta #6 Online: 15 de Dezembro de 2006, 10:10:58 »
será que isso dá embasamento à se dar importância ao tipo de coisas que as crianças assistem na TV?

:D Algumas mais bobas imitam mesmo, de certa forma se fosse eficiente na nossa sociedade, seria uma seleção dos mais bobos!:D Um amigo quando criança jogou álcool num ferimento e ateou fogo, imitando a cena em que o Rambo faz o mesmo (e vira um canhão humano)!:D
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Offline Nina

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Re: Imitação, um sinal da evolução da espécie
« Resposta #7 Online: 15 de Dezembro de 2006, 13:59:35 »
será que isso dá embasamento à se dar importância ao tipo de coisas que as crianças assistem na TV?

:D Algumas mais bobas imitam mesmo, de certa forma se fosse eficiente na nossa sociedade, seria uma seleção dos mais bobos!:D Um amigo quando criança jogou álcool num ferimento e ateou fogo, imitando a cena em que o Rambo faz o mesmo (e vira um canhão humano)!:D

:histeria: E que sobrevivam os mais aptos!!!!

Mas falando sério, não sei se inteligência é adaptativo.... :roll:

Agora, se aprendemos por imitação, uma ambiente propício (por ex violento) poderia explorar facetas que não seriam óbvias num ambiente mais controlado. Ou não?
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Offline FZapp

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Re: Imitação, um sinal da evolução da espécie
« Resposta #8 Online: 05 de Janeiro de 2007, 20:57:05 »
Citar
À medida que os ancestrais humanos começaram a fazer ferramentas complicadas, descobrir os objetivos talvez não tenha deixado de ser suficientemente bom. Os hominídeos precisavam de uma forma para registrar automaticamente o que os hominídeos faziam, mesmo que não entendessem as intenções por trás.

Não faz muito tempo que muitos psicólogos pensavam que a imitação era uma ação primitiva em comparação com a descoberta das intenções dos outros. Isso está mudando. "Talvez a imitação seja muito mais sofisticada", diz ele.

Na verdade, a partir das ações humanas serem mais complexas e gerarem resultados mais complexos, o imitar humano não seria igual ao imitar de outro primata. Isso faz sentido.

Assim como não saberiamos construir uma TV do início, mas sabemos ligá-la se vemos a nossa mãe ligá-la.

[off-topic]
Cada vez fico mais brabo com o tipo de manchete totalmente imbecil que os 'repórteres' fazem quando fazem algum anúncio 'científico', ou seja, algo mais complexo do que noticiar um gol do Brasil.
Será que eles pensam que somos tão idiotas assim, ou é idiotice particular inserida no curso de jornalismo ?
É uma tentavia de ser idiotamente popular ?
Será uma faceta do jornalismo daquele orgulho de ser idiota ('ah, daquilo não sei de nada !', diz o idiota orgulhoso de ser idiota, como se quem sabe fizesse parte de alguma elite promíscua ou indesejada) ?

Já não se sentiram discriminados por saber ? Ou por dizer que se conhece sobre o assunto ?

Já me falaram 'mas eu não perguntei porque com certeza você sabia' (e no caso não sabia, era algo sobre historia brasileira, da qual confesso que sei menos do que a média).

[/off-topic]
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Offline Orphao

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Re: Imitação, um sinal da evolução da espécie
« Resposta #9 Online: 09 de Janeiro de 2007, 19:18:50 »
Alguns comentários:

(1) Eu tenho certeza que "inteligência" (claro, precisamos definir melhor isso....) é claramente adaptativa. É necessário a existência de seleção positiva de uma magnitude considerável para que características que dependam de substratos de tecido neural metabólicamente caros e de investimento de tempo e recursos em desenvolvimento (e.g., aprendizagem) e que portanto, ofereçam custos altos, possam ser incremencialmente modificadas pela seleção natural e demonstrar os traços adaptativos que obviamente exibem tais traços fenotípicos.

(2) à pergunta sobre "as crianças assitindo TV" cabe a seguinte observação: os processos de aprendizado são tb adaptativos, e coisas como aprendizado observacional ou imitação estão envolvidos em mecanismos de plasticidade fenotípica que ajustam variantes de um genótipo fixo qualquer à condições locais. Em princípio, seria algo como se os individuos imaturos procurassem pistas antecipatórias no ambiente, de modo a ajustar suas respostas preferenciais às condições e estimativas de variáveis locais, e.g., número médio de parceiros disponíveis, presença de sinais físicos particulares associados à ação predatória e etc. Um mecanismo psicológico associado à seleção d epistas sobre níveis de competição, violência e etc. seria plausível.
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Offline Nina

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Re: Imitação, um sinal da evolução da espécie
« Resposta #10 Online: 10 de Janeiro de 2007, 21:50:52 »
Orphao, acho que realmente precisamos definir que tipo de inteligência estamos mensurando... pra dizer que inteligência foi selecionada, teríamos de conseguir explicar a estupez alastrada nas populações humanas. Este é um tema no qual ainda não pensei o bastante para poder discutir, mas a inteligência humana me parece mais resultado de efeito carona...

Não creio que o intelecto tenha sido um fator preponderante na sobrevivência. Acho que manter-se vivo e reproduzir-se não dependem de uma inteligência maior que a dos nossos parentes peludos, e muitos Homo sapiens não tem mais que isso...
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Offline FZapp

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Re: Imitação, um sinal da evolução da espécie
« Resposta #11 Online: 11 de Janeiro de 2007, 00:01:43 »
Citar
Orphao, acho que realmente precisamos definir que tipo de inteligência estamos mensurando…

Sendo um leigo em biologia, mas um profissional dos sistemas de informação, sempre achei que se dá muita importância à inteligência, como se houvesse uma inteligência humana que não animal.

Por que não podemos falar de inteligência dos chimpanzés ? Inteligência dos cachorros, dos cavalos, inteligência herbívora, ou himenóptera ? (sim, Sky Kunde, eu e minhas malditas formigas).

Principalmente imaginando que não há níveis numa hierarquia (nem estamos no ápice) senão diversas explorações no discernimento do ambiente. Embora os humanos tenhamos muitas faculdades, e onde talvez sejamos hoje os únicos com certas características (ou faculdades cognitivas), teriamos capacidades que outros animais poderiam ter (ou outras espécies tiveram, por exemplo Neandertal, sei lá).

Assim como podemos descrever a capacidade auditiva ou visual (onde alguns captam melhor cores, outros contrastes, outros com maior gama, etc), temos diversas inteligências, ou capacidades cognitivas.

Há alguma corrente biológica ou psico-biologia cognitiva que concordaria comigo ou possa me dar embasamento nessa linha ?




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Offline Buckaroo Banzai

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Re: Imitação, um sinal da evolução da espécie
« Resposta #12 Online: 11 de Janeiro de 2007, 04:29:10 »
Não creio que o intelecto tenha sido um fator preponderante na sobrevivência. Acho que manter-se vivo e reproduzir-se não dependem de uma inteligência maior que a dos nossos parentes peludos, e muitos Homo sapiens não tem mais que isso...

Também não vejo assim. Todos animais exceto nós mesmos, parentes mais próximos, e umas poucas exceções se deram muito bem com inteligência muito inferior, e instintos que dão muito bem para o gasto, se não forem muito melhores sob muitos aspectos. Hoje acabamos nos tornando quase dependentes da inteligência pelo modo de vida que construímos, mas no momento da cisão entre a linhagem dos humanos e a dos chimpanzés apenas a inteligência ao nível deles já era o bastante para a sobrevivência, tanto que ainda vivem. Se fosse adaptativa, era de se esperar que eles tivessem convergido, vivendo num mesmo habitat, e em nichos aparentemente não tão diferentes, como é típico de adaptações.

Apesar de hoje podermos nos dizer "mais adaptados" que eles pela diferença numérica e expansão territorial, a evolução da mente humana não poderia ter se dado teleologicamente, para isso, teria que ter evoluído lá onde os humanos surgiram e onde nossos ancestrais e parentes menos inteligentes viviam muito bem mesmo sem as capacidades mentais atuais, e apenas então incidentalmente resultado numa maior capacidade de expansão territorial.

Seleção sexual explica desvios que não tenham razão adaptativa, além de desvios exagerados e custosos, como é a nossa mente. O Steven Pinker por outro lado tem um artigo que ainda não li, "Language as an adaptation to the cognitive niche", onde talvez argumente mais sobre linguagem e outras faculdades mentais serem mesmo uma adaptação a um nicho diferente do dos chimpanzés.

Offline Orphao

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Re: Imitação, um sinal da evolução da espécie
« Resposta #13 Online: 11 de Janeiro de 2007, 23:46:30 »
Interessantes as respostas  :ok:

Entretanto, gostaria de contribuir com outros comentários:

Nina Acerca do que você disse sobre a "estupidez alastrada" vale lembrar que estamos falando da explicação última (i.e., evolucionária, funcional) do substrato cgnitivo/neural/perceptual/motor que permite que comportamento particulares ocorram, e não dos comportamentos (eventos particulares) que possamos considerar estupidos, que estão em uma escala diferente (proximal). Quanto a possibilidade de "respostas não-adaptativas" ou estúpidas, esse é um fenômeno bem compreendido na Etologia. A alteração incremencial de mecanismos, pro exemplo, fisiológicos, é sempre mais lenta do que as mudanças nas pressões seletivas a que uma população está sujeita. Grosso modo, o ambiente (físico e biótico) muda mais rápido, portanto, podem sempre existir "lags" evolucionários, aonde as pressões que moldaram mecanismos ótimos de resposta podem ser suspensas ou modificadas, e portanto respostas comportamentais inadequadas possam ocorrer.

Banzai As observações do banzai sobre a idéia do Pinker do Nicho Cognitivo são um ponto de entrada importante nessa discussão. Uma idéia comunmente usada para explicar os cérebros avantajados e a cognição primorosa dos primatas em geral recorre a idéia do "cérebro social". A maior pressão seletiva para o desenvolvimento da inteligência dos primatas viria das necessidades de navegação social. Os pontos interessantes são o seguinte: (1) ao contrário do caso da busca de alimentos aonde se lida com indivíduos de espécies distintas e que potencialmente são "menos inteligentes", no caso de problemas de navegação social os indivíduos com os quais disputamos acesso a recursos tem um nível comparável de inteligência. (2) diversos modelos formais, e.g., o modelo de teoria dos jogos evolucionária de Trivers para a evolução do comportamento altruísta recíproco mostram que a evolução desse tipo de cognição social levamuitas vezes a "corridas armamentistas" aonde há um pressão constante pelo desenvolvimento incremencial de estratégias melhores e mais eficientes por parte de todos os participantes. (3) De um lado mais empírico, primatas não-humanos demonstram em geral um desenvolvimento superior de capacidades de cognição social em relação a capacidades relacionadas a "cognição naturalistica" (e..g, inferir a presença d epredadores através depistas indiretas). Existe mesmo alguma discussão se chimpanzés possuem a capacidade supostamente unicamente humana de "teoria da mente" de compreender as ações de outros indivíduos em termos de intenções, desejos, emoções, objetivos e etc.

 Embora a seleção sexual através da escolha de parceiros (seleção intersexual) possa levar ao desenvolvimento de caracteres que são detrimenciais a aptidão "ecológica" (através dos handicaps de Zahavi) as condições para a operação de tal processo são bastante restritas e as tentativas de aplica-lo ao desenvolvimento da cognição humana me parecem frágeis (como a do psicólogo Geoffrey Miller em The Mating Mind) o problema mais óbvio sendo a inexistência de dimorfimos cognitivos salientes e (quando esses existem) a falta de correlação entre o desenvolvimento dos mesmos e de traços sexuais secundários (aqueles sob a ação da seleção sexual).

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Offline Orphao

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Re: Imitação, um sinal da evolução da espécie
« Resposta #14 Online: 12 de Janeiro de 2007, 00:07:34 »
jcatino Também acho que há inteligência animal. Mesmo microorganismos, bactérias, apresentam sinais de aprendizado básico como habituação ou sensitização de respostas.

Se você se interessa em inteligência animal e nas proezas realizadas por formigas, pode dar uma procurada no google por trabalhos de um psicologo chamado Randy Gallistel...é realmente impressionante como as nossas noções senso-comum de inteligência são erroneas...

...essa é sem duvida a maior lição que as ciências cognitivas nos deram. Consideramos coisas como jogar xadrez ou resolver equações diferenciais como sendo demonstrações de inteligência, mas quando as pessoas tentram programar um computador para segurar um copo de vidro sem quebrar ou diferenciar rostos humanos de objetos inanimados o sucesso foi (e é) mísero... Com a identificação de inteligência com processos computacionais, eu não tenho problema ou pudor em identificar processamento sensorial, controle motor e outras coisas consideradas "low-level" como "inteligência".

Com relação a questão da "hierarquia de inteligência" o ponto é o seguinte: a teoria da evolução, em si e por si só não legitima esse tipo de "taxonomia da vida" e nem mesmo a idéia de que há "objetivo" na evolução ou que o aparecimento de uma forma particular seja inevitável. Entretanto, acho que a noção de hierarquia pode, pelo menos em certos contextos e por outros meios ser sim justificada: por exemplo, é comum se ver aprendizado associativo como sendo um tipo mais amplo de processos que pressupõem a existência de processos não-associativos. Caso comparássemos, por exemplo uma bactéria capaz de habituação (não-associativo) com um chimpanzé, ou um cachorro, falar em hierarquia, ao menos nesse universo restrito e com base em uma teoria particular, parece jsutificado.
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Offline Buckaroo Banzai

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Re: Imitação, um sinal da evolução da espécie
« Resposta #15 Online: 12 de Janeiro de 2007, 01:12:46 »

 Embora a seleção sexual através da escolha de parceiros (seleção intersexual) possa levar ao desenvolvimento de caracteres que são detrimenciais a aptidão "ecológica" (através dos handicaps de Zahavi) as condições para a operação de tal processo são bastante restritas e as tentativas de aplica-lo ao desenvolvimento da cognição humana me parecem frágeis (como a do psicólogo Geoffrey Miller em The Mating Mind) o problema mais óbvio sendo a inexistência de dimorfimos cognitivos salientes e (quando esses existem) a falta de correlação entre o desenvolvimento dos mesmos e de traços sexuais secundários (aqueles sob a ação da seleção sexual).

Como o próprio Geoffrey Miller colocou, o dimorfismo não é um requisito necessário para a evolução de um caractere por seleção sexual, apenas o deixa mais óbvio. No livro ele diz que há diversos casos de possível seleção sexual que são no entando comumente ignoradas como tal e assumidas por alguns biólogos como rituais elaborados de acasalamento visando meramente o reconhecimento da espécie, e não uma seleção de parceiros mais criteriosa. Ele aponta que é uma tremenda subestimação da capacidade das espécies supor que elas demorem tanto para reconhecer um indivíduo da mesma espécie, e errem em muitos casos, isso em espécies que, por vezes, reconhecem instantâneamente a própria prole dentre outros indivíduos da prole da mesma espécie, predadores e presas.

Fora isso, supondo serem as capacidades mentais um caractere selecionado sexualmente, isso levanta impedimentos ativos contra um dimorfismo muito saliente: a seleção do caractere necessita de que o mesmo caractere esteja presente tanto no selecionador quanto nos selecionados/canditatos, diferentemente de uma cauda de um pavão, que para ser selecionada pela fêmea não precisa ser possuida também por ela; isso, e o próprio fato da mente ser tanto o que é responsável pela seleção quanto o que é selecionado me parece tornar mais difícil a dissociação, diferentemente da cauda do pavão e da atração pela cauda do pavão que são caracteres mais independentes.

Offline Nina

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Re: Imitação, um sinal da evolução da espécie
« Resposta #16 Online: 12 de Janeiro de 2007, 18:08:29 »
Interessantes as respostas  :ok:

Entretanto, gostaria de contribuir com outros comentários:

Nina Acerca do que você disse sobre a "estupidez alastrada" vale lembrar que estamos falando da explicação última (i.e., evolucionária, funcional) do substrato cgnitivo/neural/perceptual/motor que permite que comportamento particulares ocorram, e não dos comportamentos (eventos particulares) que possamos considerar estupidos, que estão em uma escala diferente (proximal). Quanto a possibilidade de "respostas não-adaptativas" ou estúpidas, esse é um fenômeno bem compreendido na Etologia. A alteração incremencial de mecanismos, pro exemplo, fisiológicos, é sempre mais lenta do que as mudanças nas pressões seletivas a que uma população está sujeita. Grosso modo, o ambiente (físico e biótico) muda mais rápido, portanto, podem sempre existir "lags" evolucionários, aonde as pressões que moldaram mecanismos ótimos de resposta podem ser suspensas ou modificadas, e portanto respostas comportamentais inadequadas possam ocorrer.


Orphao, não estava me referindo à comportamentos isolados. O sentido de estupidez alastrada é realmente o que siginificam os vocábulos... O ponto é que o ambiente não impõem pressões seletivas aos humanos que dependam da inteligência "avançada". Ninguém precisa entender física quântica para manter-se vivo ou ter descendentes. A população de humanos estúpidos (de maneira geral, não específica), "vai muito bem, obrigado". A frequência desta parcela é tão expressiva que um "lag" não explicaria seu contingente. Não vejo qualquer indício que explique ou comprove como poderia a inteligência ser adaptativa para o Homo sapiens. Creio que o caminho para explicar o maior intelecto de alguns humanos seja efeito carona, ou mesmo o neutralismo (quem sabe?!).

O fato é que não vejo qualquer evento histórico-evolutivo em que tenhamos sido selecionados por nosso intelecto diferenciado (em comparação com os primos Pan).
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Offline Nina

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Re: Imitação, um sinal da evolução da espécie
« Resposta #17 Online: 12 de Janeiro de 2007, 18:16:31 »
Entretanto, acho que a noção de hierarquia pode, pelo menos em certos contextos e por outros meios ser sim justificada: por exemplo, é comum se ver aprendizado associativo como sendo um tipo mais amplo de processos que pressupõem a existência de processos não-associativos. Caso comparássemos, por exemplo uma bactéria capaz de habituação (não-associativo) com um chimpanzé, ou um cachorro, falar em hierarquia, ao menos nesse universo restrito e com base em uma teoria particular, parece jsutificado.

Eu creio que não há justificativa para tal hierarquia, pois uma classificação de "melhor", em qualquer contexto, seria relativa ao meio e às pressões impostas por ele. Neste sentido, julgo inviável pensar em inteligência superior, como sentidos ou aptidões superiores. Como não há um meio de nivelar possíveis valores absolutos, creio ser impossível tornar paupável tal avaliação, em função dos relativismos.
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Offline Buckaroo Banzai

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Re: Imitação, um sinal da evolução da espécie
« Resposta #18 Online: 13 de Janeiro de 2007, 02:28:27 »

Orphao, não estava me referindo à comportamentos isolados. O sentido de estupidez alastrada é realmente o que siginificam os vocábulos... O ponto é que o ambiente não impõem pressões seletivas aos humanos que dependam da inteligência "avançada". Ninguém precisa entender física quântica para manter-se vivo ou ter descendentes. A população de humanos estúpidos (de maneira geral, não específica), "vai muito bem, obrigado". A frequência desta parcela é tão expressiva que um "lag" não explicaria seu contingente. Não vejo qualquer indício que explique ou comprove como poderia a inteligência ser adaptativa para o Homo sapiens. Creio que o caminho para explicar o maior intelecto de alguns humanos seja efeito carona, ou mesmo o neutralismo (quem sabe?!).

O fato é que não vejo qualquer evento histórico-evolutivo em que tenhamos sido selecionados por nosso intelecto diferenciado (em comparação com os primos Pan).

:hein: já quanto a isso, imagino que a inteligência "excepcionalmente" alta e a da maioria da população não representem diferenças biológicas, fortemente hereditárias, sendo a erudição simplesmente resultado de estudo e condições suficientemente favoráveis de nutrição e etc... assim, ainda poderia se argumentar que a inteligência mediana ou até mais ou menos baixa (qualquer que seja na maioria da população mundial), evoluiu adaptativamente (ou por seleção sexual, que seja), e apenas traz como "efeito colateral", implicitamente, o potencial de uma inteligência muito maior. Mais ou menos como o potencial para a musculatura dos fisiculturistas está latente na maioria das pessoas que tem um físico apenas mediano (ainda que haja uma variaçãozinha ou outra biológica por trás).

Offline Orphao

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Re: Imitação, um sinal da evolução da espécie
« Resposta #19 Online: 14 de Janeiro de 2007, 02:22:35 »
   Olá gente...

Primeiro em relação a seleção sexual e os comentários do Banzai.

   O Miller diz no livro dele que a existência de dimorfismos não é um efeito necessário do processo de seleção sexual. Na verdade, ele pretende (no caso específico da nossa espécie) formular um tipo de hipótese que apele para um cenário do tipo "exceção que valida a regra". Não só é verdade que a seleção sexual leva a padrões de dimorfismo como é fato que a existência de diferenças fundamentais e definidoras entre os sexos, diferenças em termos dos recursos investidos no processo reprodutivo (o que inclui investimento parental) forma o cerne da teoria da seleção sexual. Tudo mais segue-se a partir disso.

   A idéia do Miller é a de que com o desenvolvimento de níveis muito altos de investimento paternal na nossa espécie, os machos passaram a ter uma razão seletiva para se tornarem mais discriminativos na escolha de parceiros. Na verdade, a idéia não é originalmente dele, mas ele engenhosamente viu um meio de usar essa previsão para poder explicar a ação da seleção sexual sobre a evolução da cognição mesmo na ausência de dimorfismos. Isto é, se algum traço evoluiu nos homens como "pista" para a escolha por parte das fêmeas, a mesma capacidade poderia evoluir nas fêmeas como pista para a escolha dos machos em uma espécie com alto investimento paternal.

    Bem, eu acho meio problemática a hipótese do Miller, pelos seguintes motivos:
(1) o investimento paternal é apenas um fator determinando o investimento reprodutivo. Assim como o conceito de "aptidão" (fitness) o fator de investimento reprodutivo é componencial,i.e., é uma função de outras variáveis tb. Quando consideramos o que mais está em jogo na determinação das assimetrias de investimento, as fêmeas continuam pagando o maior preço: elas ainda tem os gametas mais dispendiosos e fazem os investimentos altíssimos da gestação e da lactação. Mesmo com o desenvolvimento de estratégias de investimento paternal, o padrão de assimetrias permanece bem parecido com o que vemos em outras espécies.

(2) como o próprio Miller afirma, o processo de seleção sexual está fortemente sujeito a forças estocásticas, o que quer dizer, entre outras coisas, que ele é extremamente contingente às condições iniciais. Complementando o ponto (1), é difícil de se supor que saindo de pontos distintos, machos e fêmeas chegariam à estratégias "cognitivas" iguais ou semelhantes.

(3) Existe evidência de que em diversas espécies de símios (nós incluídos) parte desse "custo" incorrido pelas mães de filhotes cada vez mais imaturos e dependentes foi dirimido (ou compartilhado) através de seleção inclusiva, pela ação de fêmeas mais velhas e já inférteis (chamadas de "tias" na literatura primatológica) que promoviam o desenvolvimento de filhotes geneticamente proximos (netos, sobrinhos) e portanto, por seleção inclusiva, promoviam um aumento na replicação diferencial de seus proprios genes (tb chamada de "allomothering hypothesis"). Essa seria tb uma força evolucionária favorecendo a evolução de períodos extendidos de vida pós-reprodutiva nas fêmeas.

bom, eu até tenho outros pontos a fazer, mas acho que esses são suficientes.
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Offline Orphao

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Re: Imitação, um sinal da evolução da espécie
« Resposta #20 Online: 14 de Janeiro de 2007, 03:14:26 »
Nina Eu confesso que fiquei meio perplexo com suas observações "não-adaptacionistas"  :|. Para mim parece óbvio o papel da seleção natural. De qualquer forma, tais situações são interessantes pra fazer com que agente examine aquilo que carregamos sob o rótulo de "obviedades".... isso é essencial p/ a ciência e as vezes tem muito espaço pra dogma e besteiras na nossa bagagem... :D

Vamos lá então.

Sua observação sobre fisica quantica me parece um ponto retórico bem "Gouldiano". Evidentemente, ninguém busca explicações adaptativas para diferenças em versatilidade com mecanica quantica, calculo diferencial ou (por que não) jogar golfe ou assoviar sinfonias completas. Como eu disse, a estratégia correta é fraccionar os efeitos de performance observados em substratos neurais/cognitivos mais básicos. Nada impede que as pessoas façam matemática superior ou componham sinfonais usando capacidades cognitivas que não foram selecionadas para esse propósito. Essa foi a estratégia tomada por exemplo, por primatologistas e antropólogs contemporâneos. Deixou-se de lado as discussões estéreis de outros tempos, sobre se animais teriam ou não "cultura" e passou-se a buscar na psicologia comparada, evidência de processos psicológicos básicos como imitação, aprendizado observacional, cooperação entre indivíduos não aparentados, que sabemos serem relevantes para a evolução da cultura e serem passíveis de comparação entre espécies (os trabalhos do grupo de St. Andrews, objeto desse tópico, entram nessa categoria). Além disso, traços selecionados possuem uma série de "propriedades de design", organização funcional complexa, que denunciam a ação da seleção natural.

Por exemplo, lidar com entidades numéricas discretas e com conjuntos recursivos (potencialmente infinitos dessas entidades, e.g., os numeros naturais) é um bom candidato para capacidade cognitiva selecionada. É uma capacidade observada em todas as populações humanas, em qualquer lugar, sendo esse efeito de uniformização uma consequencia comum de seleção direcional intensa. Em uma área que eu tenho mais intimidade: Linguagem é outro característica dessa natureza.

Relacionado a isso cabe observar que, quando vc menciona a ausencia de "eventos evolutivos" que poderiam ter levado a seleção de capacidades intelectuais na nossa linhagem, me parece haver uma confusão entre os sentidos histórico e não-histórico do que é uma adaptação: o reconhecimento de caracteres ou traços fenotípicos adaptativos independe de considerações históricas. No inglês, existe mesmo uma distinção entre "adaptive trait", um caractere demonstrando os sinais de um traço selecionado (e.g., o olho humano) e "adaptation", um termo mais amplo usado quando temos hipóteses mais firmes sobre a origem evolucionária de um caráter através da seleção natural. A confusão destes dois sentidos parece ter levado a confusões maiores, por exemplo, nas discussões do Gould (cf. Gould & Vrba (1982) Exaptation: A Missing Term in the Science of Form.Paleobiology 8). Os conceitos operacionais modernos de adaptação excluem a necessidade de considerações históricas (repare bem, excluem a necessidade, não a importância de considerações históricas; cf. Reeve & Sherman (1993) Adaptation and the Goals of Evolutionary Research. Quarterly Rev. of Biol. 61.).

Mesmo que fiquemos nas evidências históricas, as evidências me parecem fortes, para ter um exemplo: caso contrário, como explicar as correlações, estabelecidas com base em evidências paleontológicas, arqueológicas e comparativas entre: (1) desenvolvimento significativo do tamanho do cérebro em nossa linhagem, e que acompanhou (2) o desenvolvimento de tecnologia lítica de produção de ferramentas e armas (3) usadas na caça de mamíferos maiores (4) que serviu de catalisador para o desenvolvimento cerebral (tecido neural é metabolicamente muito caro) (5) em especial de áreas frontais e parietais envolvidas em comportamento motor fino orientado por feedback sensorial.

Quanto as alternativas: a existência de spandrels ou "correlatos não-adaptativos" é sempre considerada. Entretanto, sempre que houver evidência de organização funcional complexa, seleção natural é a causa.

Quanto a seleção neutra, me parece muito improvável: (1) a idéia de seleção neutra sempre aplicou-se ao nivel molecular de análise de variação, sua extrapolação para niveis hierarquicos mais altos me parece bastante discutível (o proprio M. Kimura, o pioneiro da "teoria neutra" era um darwinista ortodoxo e recomendou cuidado em essas extrapolações). (2) evolução de carateres neutros leva à oscilações de frequencias (e possivel fixação) de alelos ou variantes neutros. Como já dizia Niko Tinbergen, um dos fundadores da Etologia, a chance de existirem de caracteres comportamentais "neutros" (i.e., sem efeitos deletérios ou adaptativos) é muito discutível. Como Tinbergen viveu em uma época pré- (neuro)ciencia cognitiva e produziu antes do desenvolvimento do Neo-Darwinismo como o conhecemos (antes de Adaptation and Natural Selection de George Williams e antes de William Hamilton e Robert Trivers) podemos adicionar que tal situação é improvável quando um substrato cognitivo/neural complexo e funcionalmente especializado está envolvido. Esse é o tipo de fenótipo que "drift" ou evolução neutral definitivamente não pode criar (na verdade, evolução neutra não "cria" nada).


Quanto a observação sobre "hierarquia de inteligência", eu concedo que vc muito provavelmente está correta. Eu fiz apenas uma sugestão, bem recalcitrante, sobre a qual se pensar. O ponto que você fez sobre a dependência sobre pressões seletivas particulares é a tese neo-darwinista clássica. Mas eu creio que talvez haja algo mais aí por trás dessas idéias de complexidade ou sei lá o quê.
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Offline Nina

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Re: Imitação, um sinal da evolução da espécie
« Resposta #21 Online: 15 de Janeiro de 2007, 21:31:09 »
Orphao, estou preparando com calma alguns comentários sobre minhas afirmativas.

Danniel, embora tamanho cerebral não corresponda à inteligência, achei interessante este artigo. Estava cadastrando os últimos "baixados" nas férias... Creio que o acesso seja free:

Sexual Selection and the Evolution of Brain Size in Primates
Michael A. Chillaci - PloS ONE issue 1, e62.
"A ciência é mais que um corpo de conhecimento, é uma forma de pensar, uma forma cética de interrogar o universo, com pleno conhecimento da falibilidade humana. Se não estamos aptos a fazer perguntas céticas para interrogar aqueles que nos afirmam que algo é verdade, e sermos céticos com aqueles que são autoridade, então estamos à mercê do próximo charlatão político ou religioso que aparecer." Carl Sagan.

Offline Buckaroo Banzai

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Re: Imitação, um sinal da evolução da espécie
« Resposta #22 Online: 04 de Maio de 2010, 13:22:44 »
Citação de: [url=http://][/url]
Copycat Seen as Universal Behavior in Human Children Only

By LiveScience Staff

posted: 2010-05-03 12:00:00 ET



From prepubescent kids pretending to shave, to the offspring of smokers taking up their parents’ addiction, children often copy the exact behaviors of their parents.

Now science shows this trait universal to all human children, and may help explain how people pass their culture from one generation to the next.

“Scientists have been finding this odd effect where children will copy everything that they see an adult demonstrate to them, even if there are clear or obvious reasons why those actions would be irrelevant," said Mark Nielsen, a psychologist at the University of Queensland in Australia, and lead researcher on the new study. “It's something that we know that other primates don't do.”

When shown how to complete a task like opening a box or using a tool, chimpanzee babies will perform the task in the most efficient manner, even if their parent performs the same task inefficiently. Conversely, human children will copy the exact behavior of their parents, even if it involves elements unrelated to the final goal.

Writing in the journal Psychological Science, Nielsen and a colleague from the University of KwaZulu-Natal in Durban, South Africa, detail how they showed a group of Australian preschoolers and a group of Kalahari Bushman children of the same age, an unnecessarily complex method for opening a box sealed shut with a simple lock. Despite being able to open the box much more easily with their hands, the children in both groups continued to use the overly complex method demonstrated by the adults.

Previously, scientists had only observed that type of inefficient mimicry in children of Western cultures. By proving that children in other cultures copy adults just as faithfully, the University of Queensland researchers believe that have stumbled upon a universal human trait that separates mankind from its closet animal relatives.

The steady accumulation of these unnecessary behaviors over time grew into what humans now understand as culture, the researchers said. And the extreme fidelity of child imitations explains how children pick up these cultural behaviors even before they understand their significance.


Said Nielsen, “We see these sorts of behaviors as being a core part of developing this human cultural mind, where we're so motivated to do things like those around us and be like those around us.”

http://www.livescience.com/culture/Copycat-Seen-as-Universal-Behavior-in-Human-Children-Only-100503.html


Offline Eleitor de Mário Oliveira

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Re: Imitação, um sinal da evolução da espécie
« Resposta #24 Online: 04 de Maio de 2010, 14:36:11 »
Interessante.

 

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