(EDIT, porque tive que corrigir umas besteiras que falei)
Bem, espero ter sido compreensível em relação em relação a esse tema infinitamente complexo chamado teoria do valor...Pelo menos, para o Dono da verdade:
Huxley, tirando fora SOMENTE a parte em que voce disse que a teoria do valor-utilidade só é adequada para os casos em que a concorréncia é perfeita, enquanto a teoria do valor-trabalho é mais abrangente, todo o resto está corretíssimo, perfeito e eu não tenho absolutamente nenhuma dúvida sobre os mesmos. Aquilo que voce expos sobre as curvas de demanda e oferta e o ponto de equilíbrio é be-a-bá de economia e eu já estou careca de saber isso. (Já tive aulas de economia em dois semestres de administração que eu fiz e já li vários livros de economia, inclusive o de Rosseti, apesar de achar que isso é irrelevante agora). A única questào que está sendo discutida (agora, devido ao andamento das postagens) é se a teoria do valor-utilidade é mais abrangente do que a do valor-trabalho (ponto que eu defendo) ou se é o inverso: a teoria do valor-trabalho é mais abrangente (ponto que aparentemente vocé defende, pelo que escreveu naquela sua postagem maior).
A questão é simples.Se você acha que os mercados em média estão mais próximos do protótipo de concorrência perfeita do que o de monopólio e que os preços e salários são relativamente flexíveis, minha sugestão é: a teoria valor-utilidade tem relevância maior na determinação dos preços.
Vejamos o que ocorre nos mercados onde os produtos são homogêneos e não há grandes vantagens de custos devido ao baixo dinamismo tecnológico da atividade.Por exemplo, se o mercado de leite está com um preço “irrealista” (para o demandante), essa elevação excessiva da margem de lucro dos produtores de leite torna a eficiência marginal do capital nesses setor mais alta que a média, atraindo investimentos para ele; a conseqüente ampliação da capacidade produtiva neste setor pressiona seus preços de mercado ao nível de preço ‘natural’.Esse preço de equilíbrio é mais compatível (porém, não igual) com o nível de valor-utilidade atribuído aos demandantes daquele mercado.Num mercado muito competitivo, a demanda está num pedestal.
Outra coisa, eu tenho mudado minha opinião sobre esse assunto de Concorrência Imperfeita.Ainda assim, continuo com a opinião que numa teoria de formação de preços de curto prazo (isso se refere a um período de alguns poucos anos), não há espaço para grande flexibilidade nos preços das mercadorias, exceto nos mercados flex.Mas no LONGO PRAZO, há espaço para flexibilidade de preços e salários e remoção das barreiras à entrada.Mas o que ocorre é um aumento no grau de concorrência que empurra os preços para baixo, mas não ocorre uma indução para o preço que equilibra os prazeres e desprazeres do consumidor.A visão marginalista de Menger e sua turma só seriam válidas se a falha Lei dos Rendimentos Decrescentes (e sua idéia de custo marginal ascendente) fosse válida, como expliquei a um marginalista lá no blog do Rodrigo Constantino:
http://rodrigoconstantino.blogspot.com/2007/06/teoria-da-explorao.htmlO principal problema da flexibilidade dos preços são as barreiras à entrada e as vantagens competitivas que geram como conseqüência uma estratégia de rigidez de preços conhecida como “estratégia da curva de demanda quebrada” (darei o link que a explica logo a seguir).Existem vantagens de diferenciação e vantagens de custos que impedem uma firma de outro setor entrar livremente num mercado de concorrência imperfeita.
Se uma firma tem vantagem de diferenciação do bem em relação a uma firma que tem uma outra firma que tem a mesma competitividade em custo, isso significa que ela pode cobrar um preço maior que a última, e conseqüentemente, seu lucro será maior.Neste caso, elas têm o mesmo custo marginal, mas como lucro é Receita (representado pela venda das mercadorias) – custo, logo a lucratividade da empresa do produto mais aceito é melhor. Por exemplo, a Toyota tem vantagens de diferenciação em relação a Hyundai na indústria automobilística.A curva de demanda de um bem mais aceito é mais inelástica, ou seja, a demanda é relativamente mais insensível à variação de preços.Aumentar 5% o preço de um Toyota Corolla não afeta significativamente a demanda por este bem, mas aumentar o preço de um Hyundai Elantra em 5% pode ser bem temível para um revendedor de tal bem.
Se uma firma tem vantagens de custos em relação a uma firma que tem a mesma vantagem de diferenciação (digamos que a curva de demanda dos bens dessas respectivas empresas sejam idênticas), então a firma mais competitiva terá uma lucratividade maior.Neste caso, o lucro maior não terá origem no preço maior como no caso hipotético anterior, mas nos custos menores.Preços iguais, custos diferentes.
Quando a uma empresa combina fortes vantagens de custos e de diferenciação (ver explicação desses dois conceitos no apêndice 1), o resultado pode ser a conquista de um grande market-share e poder de monopólio. As barreiras à entrada são vantagens apropriadas sob a forma de lucros acima do normal, que lhe conferem maior poder ao decidir sua estratégia do que se estivesse em situação de concorrência perfeita (ou quase).As firmas em concorrência imperfeita têm uma margem de lucro usualmente que está na margem (na região limiar) de induzir a entrada de potenciais concorrentes.Se elas tentam aumentar a margem de lucro acima desse nível, fatalmente elas irão atrair novos concorrentes.Se elas aumentam as barreiras à entrada (como através de vantagens de custo), elas podem aumentar seus preços sem induzir a entrada de novos concorrentes.
Claro que, mesmo na situação monopolista, a demanda ainda tem impacto.Mas há um espaço bem maior para a empresa cobrar preços abusivamente acima dos custos marginais, que é o preço que se pagaria numa situação de concorrência perfeita.Não por acaso, a Microsoft foi para os tribunais americanos em 1998 sob a acusação de monopólio e adivinhem o argumento que os advogados-economistas usaram?*( ver apêndice 2).
Nessa postagem maior, vocè diz que em uma situação de concorrencia imperfeita (oligopoplios, monopólios, etc), o preço é determinado assim:
Preço = Custos Variáveis + Custos Fixos + Margem de lucro definida arbitrariamente.
Olhe bem: Os custos, tanto variáveis quanto os fixos, podem ser entendidos como a quantidade de trabalho despendida na produção de um produto, tanto direta (trabalhadores humanos envolvidos) quanto indireta (o trabalho que foi utilizado para produzir as matérias-prima, as máquinas, etc). Correto até aqui?
Correto.
Como voce mesmo colocou, na concorrencia imperfeita, a margem de lucro é definida arbitrariamente, ou seja, há uma maior 'liberdade' para os ofertantes colocarem o preço nas alturas, bem acima do 'trabalho' necessário para a produção destes produtos, concorda?
Portanto, na concorrencia imperfeita, mais do que na perfeita, não se pode dizer que o valor é determinado basicamente pelo 'trabalho' (custos) necessário para a produção, já que o grau de liberdade para se colocar o preço bem acima dos custos é muito maior do que na concorrencia perfeita. Concorda ou não? Se não, por que?
Portanto, na concorrencia imperfeita, mais do que na perfeita, não se pode dizer que o valor é determinado basicamente pelo 'trabalho' (custos) necessário para a produção, já que o grau de liberdade para se colocar o preço bem acima dos custos é muito maior do que na concorrencia perfeita. Concorda ou não? Se não, por que?
Na concorrencia perfeita, como esse grau de liberdade para colocar o preço bem acima dos custos é bem menor, então os custos (trabalho) terão um peso bem maior na determinação do preços. É por isso que eu disse que a teoria do valor-trabalho serve melhor como aproximação no caso da concorrencia perfeita, o que pelo visto é o oposto do que voce disse (voce disse que é a teoria do valor-utilidade que é mais restrita, se adequando melhor para o caso da concorrencia perfeita).
Minhas razões estão expostas, cabe ao leitor julgá-las , e se voce discorda delas, cabe a voce dizer o porque (da forma mais simples, clara e direta que puder).
Acho que você está pegando mal o conceito ricardiano de que “preço= salários + lucros”.Segundo sua ótica, se os lucros são crescentes, mais e mais saímos da situação onde o preço iguala a quantidade de trabalho necessária para se produzir uma mercadoria.Mas “valor” e “preço” não são conceitos equivalentes.Valor depende do conceito de preços relativos.Se tivermos dois bens de duas indústrias de diferentes setores que tem mantém a proporção da mesma quantidade de trabalho direto e indireto necessário para sua fabricação (1=1, 2=1, 3=1, etc.) ao longo de um tempo, seus preços relativos não se alterarão.Se seus preços absolutos aumentam um pouco, o que ocorre é que a quantidade de trabalho que cada mercadoria COMANDA é maior, ou seja, aumenta a capacidade de pagar salários de trabalhadores.Mas isso aí já é um conceito de valor smithiano * (apêndice 3).
A questão é que quanto mais longe do conceito de “preço de mercado” estiver o preço de o bem de uma firma, quanto mais diferente a curva de demanda de uma firma monopolista estiver da de concorrência perfeita (que é infinitamente elástica), menos valor terá o papel da demanda do mercado em questão na determinação do preço.Mas não é só a inelasticidade da curva de demanda do monopolista que justifica a teoria do valor-trabalho.Além disso, os empresários só deveriam mudar os preços quando os custos de produção se alteram (o que reestabelece as margens de lucro ao nível considerado "adequado").E os ganhos de produtividade não deveriam ser apropriados pelos salários de forma significativa (coisa defendida por Ricardo e Marx) ou de forma divergente entre os produtores de diferentes setores.Logo, nesta situação, os preços relativos só se alterariam se as proporções de quantidade de trabalho necessário para produzir as mercadorias se alterassem.E os ganhos de produtividade não deveriam ser apropriados pelos salários de forma significativa.Tudo isso existia na teoria do valor de Ricardo.E parece existir numa teoria de um neo-ricardiano do século XX chamado Piero Sraffa (ver prefácio de "Princípios de Economia Política e Tributação" da Editora Abril Cultural,1982).
Numa teoria do valor moderna, os preços e as margens de lucro são rígidas (ao menos no curto prazo; no longo prazo pode valer o conceito de perfeita flexibilidade de preços e salários, devido à entrada de potenciais concorrentes) por causa da “estratégia da curva de demanda quebrada”:
http://www.eumed.net/libros/2005/lgs-ei/3c.htmSe os preços e as margens de lucros são rígidas, os preços relativos nos setores “fixprice” não se alteram a menos que se alterem as proporções dos custos produtivos para produzir as mercadorias desses setores.Teoria valor-trabalho na cabeça (pelo menos no que se refere ao curto prazo)
Apêndice 1:Vantagens de custo:
-Controle de técnicas de produção, via patentes ou segredo, pelas firmas estabelescidas.
-Imperfeição do mercado de fatores que implicam em preços de compras mais baixos para as firmas estabelecidas.Neste caso, teríamos o controle de fatores estratégicos pelas firmas estabelecidas.
-Limitações significativas da oferta de fatores produtivos nos mercados para eles.
-Condições no mercado de dinheiro impondo taxas de juros mais elevadas para as entrantes em potencial do que para firmas estabelescidas.
Circunstâncias dando vantagem de diferenciação de produto:
-Preferência acumulativa dos compradores pelas marcas e reputação das companhias estabelescidas.
-O controle de desenhos superiores de produto estabelescidas através de patentes.
-Propriedade ou controle cntratual dos melhores pontos de distribuição
Circunstâncias desencorajando a entrada pela manutenção de economias significativas a grande escala*:
-Economias reais de produção e distribuição de tal forma que uma firma ótima suprirá uma parcela significativa do mercado (o fato que as entrantes devem acrescentar uma quantia significativa a produção do ramo de atividade para poder operar com custos mínimos e que incorreriam em custos perceptivelmente mais elevados se operassem em níveis de produção mais reduzidos).
*Traduzindo o economês.Economias de escala:Aumento de eficiência associado a uma expansão na produção, causando redução do custo de cada unidade produzida.
Apêndice 2:Para empresa competitiva: P=RMg (receita marginal) =CMg
Para empresa monopolista: P> RMg=CMg
Para calcular o poder de monopólio de uma firma, foi criado um indicador chamado “índice de Lerner”, cuja equação é a seguinte:
L=[P-CMg]/P
P=preço
CMg=custo marginal
O índice varia de 0 a 1.Quanto mais próximo o índice estiver de 1, mais perto a firma está da situação monopolística pura.Quanto mais próximo a 0, mais próximo está a situação de concorrência perfeita.Esse índice é equivalente a:
[P-CMg]/P= 1/n0, onde n0 é a elasticidade-preço da demanda.
Foi notícia na imprensa que a Microsoft foi levada a julgamento em 1998 sob a acusação de monopólio.Em 1997, cobrava-se 2.000 dólares de preço médio por um PC.Não se sabe exatamente qual a elasticidade-preço da demanda do seu produto na época, mas uma estimativa conservadora dizia que se situava acima de 1 e a abaixo de 2.Mesmo na situação mais favorável a Microsoft (elasticidade-preço da demanda igual a 2), a acusação defendeu que o cálculo do índice de Lerner apontava que a Microsoft teria poder de monopólio ainda que cobrasse o preço de 950 dólares.Os detalhes desse cálculo pode ser visto em “Microeconomia:Teoria e Aplicações ,11ª edição (2005,Editora Saraiva,p.327,328) de Mansfield e Yohe. Hoje, ainda que se diga que ela não tenha índice de Lerner muito próximo a 1, pode-se dizer sim que ela tem tranqüilamente poder de monopólio em algo.
Apêndice 3:Ora, o que Smith tinha de diferente de Ricardo?O primeiro propunha que a medida real do valor de uma mercadoria estava na quantidade de trabalho que pode ser adquirida no mercado em troca dessa mercadoria.Mas Ricardo achava que era a quantidade de trabalho incorporado a produção dessa mercadoria.Não se pode confundir NEGAR que valor de uma mercadoria está na quantidade de trabalho que pode ser adquirida no mercado em troca dessa mercadoria (coisa que Ricardo fazia, mas Smith não!), com se NEGAR que o trabalho é o instrumento natural de medida de valor de troca (coisa que nem Ricardo e nem Smith faziam!) O que Ricardo diz é, que se um homem se torna duas vezes mais eficiente, produzindo o dobro da quantidade de mercadorias, no mesmo tempo que fazia anteriormente, isso não implica que esse homem venha a receber uma remuneração que lhe permite adquirir o dobro da quantidade de mercadoria que seu salário anterior lhe permitia.
Para explicar isso, Ricardo usa uma argumentação muito esclarecedora:
“Num mesmo país, para a produção de uma dada quantidade de alimentos e de outros gêneros de primeira necessidade, pode ser exigido, em determinada época, o dobro de trabalho que seria preciso numa época anterior, podendo, entretanto, diminuir muito pouco a remuneração do trabalhador. Se, na época inicial, o salário do trabalhador se constituísse de certa quantidade de alimentos e de gêneros de primeira necessidade, caso esta quantidade se reduzisse o trabalhador possivelmente não pudesse subsistir. Nesse caso, os alimentos e os demais gêneros de primeira necessidade teriam sofrido um aumento no valor de 100%, se fossem avaliados pela quantidade de trabalho necessária a sua produção, enquanto o aumento de valor teria sido muito pequeno, se este se medisse pela quantidade de trabalho pelo qual poderiam ser trocados.” (RICARDO, D.Principles of Political Economy and Taxation.In Sraffa,P. (ed.) The Works and Correspondence of David Ricardo.v,I.)