O ponto era exatamente este. Se um espírito diz exatamente o que se pode saber sem ser através de espíritos, qual a utilidade do questionamento? Ou o espírito sabe mais do que sabemos aqui, ou ele é irrelevante para se questionar essas coisas. O fato é que sabemos a forma das moléculas e mais ainda, sabemos como acontecem as reações químicas, ataques nucleofílicos, transporte de elétrons, enfim, o espírito poderia ter dado um auxílio dizendo algo relevante, mas…
Interessante você abordar por este ponto de vista. Mas se existiam moléculas e se estas tinham forma era uma dúvida entre os químicos da época. Existiam opiniões divergentes a respeito do assunto, conforme o extrato abaixo:
A confusão entre peso equivalente e peso atômico e a não distinção clara entre átomos e moléculas, gerou uma confusão na Química durante toda a primeira metade do século XIX. Urgia repensar os conceitos fundamentais. Foi para isto que Friedrich August Kekulé (1829-1896), Karl Weltzien (1813-1870) e Charles Wurtz (1817-18840 organizaram uma reunião em Karlsruhe, em 1860, que veio a ser o primeiro congresso internacional de Química. Nesta reunião, a contribuição realmente expressiva foi a de Stanislao Cannizzaro (1826-1910), Professor de Química da Universidade de Gênova. Cannizzaro estava muito bem familiarizado com as idéias de seu patrício Avogadro, e as vinha empregando regularmente em seus cursos. Durante o Congresso, Cannizzaro defendeu as idéias de Avogadro. Num trabalho de Cannizzaro, distribuído por um amigo seu no final da reunião, era revisado o desenvolvimento histórico dos conceitos de átomo e molécula, empregando-se a hipótese de Avogadro. Cannizzaro empunha os resultados da aplicação da hipótese, a saber, adotava como unidade de referência para os pesos atômicos o peso de meia molécula de hidrogênio. Assim, construiu uma tabela corrente de pesos moleculares de muitos compostos.
A partir deste congresso, os químicos foram rapidamente aceitando a diferença entre átomos e moléculas, assim como a tabela moderna de pesos atômicos, baseada nessa diferença, eliminando a confusão entre peso atômico e peso equivalente. Talvez o químico mais influente, entre os prontamente convertidos às idéias de Avogadro, tenha sido Lothar Meyer que em 1864 publicou em Breslau o livro "Die Modernen Theorien. du Chimie und ihre Bedeutung für die Chemiche Statik", baseado naquelas idéias, e que se tornou popular entre os químicos.
Fonte: http://inorgan221.iq.unesp.br/quimgeral/inorgdescritiva/gases_nobres_desc.html
Detalhe: O Congresso em Karlsruhe se realizou em setembro de 1860, e a segunda edição do LE (a definitiva) foi publicada em março de 1860. Logo, se Kardec tomou algum partido, ele correu riscos. Isso se essa pergunta já não constava da primeira edição (o que é provável), que continha somente 501 perguntas contra 1019 da segunda edição (a definitiva).
Parece que a pergunta não foi óbvia e nem a resposta incorreta, apesar de a celeuma só acabar depois de Karlsruhe.
Quanto à geometria propriamente dita, essas só foram possíveis de se determinar no século 20, a partir de 1923 com a
Teoria de Lewis.
Pasteur provou com experimentos simples que não há seres que nascem espontaneamente hoje. Caso não seja de seu alcance, à época do surgimento do primeiro ser, as condições eram outras. Provas de que não há ou não houve outros surgimentos é a cladística, cujas características quando analisadas, incluindo evidências de DNA, demonstram que todos temos ancestralidade comum, e não houve dois momentos de surgimento da vida, pelo menos entre as atualmente viventes. Não houve surgimento de vida nova no século XIX e não há agora.
Se eu entendi bem, a criação espontânea ocorreu num passado remoto. É isso que disse? E se ocorreram num passado remoto, quais as garantias que se dão que não podem ocorrer hoje, mesmo que seja em algum lugar inóspito da Terra, com condições semelhantes às condições antigas da Terra?
Desculpe-me, mas não há nenhuma prova de que a geração espontânea, depois de haver ocorrido num passado remoto, não possa estar ocorrendo mais hoje.
Livro dos Espíritos, cap. 3, questão 38:
Como Deus criou o universo?
Por sua vontade
Fala sério! Que tipo de espírito iluminado é esse que não sabe a diferença entre "como" e "por que"??? Como implica em mecanismo, em meio utilizado. E o esperto do Kardec nem para refazer a pergunta!
A resposta é clara: o "como" é por sua Vontade, ainda que você não compreenda ou aceite.
Você também não entende a diferença entre "como", "o que" e "por que"?
Como sugere um mecanismo, uma forma, um meio. Como você acessa o clube cético: através de um computador conectado a uma linha telefônica ou por banda larga, ou via satélite (perceba, inclusive, que o "como" pode ter alternativas, igualmente válidas). Ou se eu perguntar "Como você acessa clube cético" você vai responder "de acordo com minha vontade"???]
Eu entendo a diferença entre o "como" e o "porque" ou o "o que". Quando se diz que criou o Universo por sua vontade, deve-se imaginar que pela vontade de Deus o Universo apareceu. É uma forma meio mágica, mas é isso que a resposta quer dizer. Ou você o imaginaria com a mão na massa contruindo cada pedrinha do Universo?
Ainda que ele desenvolvesse a questão e obtivesse as respostas, de uma forma que não pudéssemos conceber ou compreender, você acreditaria? Não passaria por misticismo, ainda que fossem verdadeiras as respostas? Por isso questões deste gênero se mantiveram na generalidade. Aliás, na questão 13, quando Kardec tentava aprofundar questões do mesmo gênero, os espíritos responderam:
“Deus existe; disso não podeis duvidar e é o essencial. Crede-me, não vades além. Não vos percais num labirinto donde não lograríeis sair. Isso não vos tornaria melhores, antes um pouco mais orgulhosos, pois que acreditaríeis saber, quando na realidade nada saberíeis. Deixai, consequentemente, de lado todos esses sistemas; tendes bastantes coisas que vos tocam mais de perto, a começar por vós mesmos. Estudai as vossas próprias imperfeições, a fim de vos libertardes delas, o que será mais útil do que pretenderdes penetrar no que é impenetrável.”
Resolvamos antes os problemas da pré-primário antes de tentar entender assuntos universitários.
Um abraço.
Meu questionamento foi em relação à compreensão da pergunta, enrolada pelo espírito (coisa que vocês aprenderam a fazer rapidinho) e não foi retomada pelo Kardec.
Ora, ou os espíritos que falavam com Kardec eram "evoluídos" e tinham algum conhecimento extra, ou qual seu valor para as questões?
É muito fácil observar que nas questões que envolvem o mundo natural, as respostas dos espíritos não iam além do conhecimento da época, que Kardec poderia alcançar em qualquer biblioteca. Por que é tão difícil aceitar, então, que as respostas outras não iam além do desejo de Kardec?
O objetivo da doutrina sempre foi moral. A parte científica existe somente para dar suporte a esta e é desenvolvida no limite necessário para que se atinja tal fim.
Entretanto, eu tenho pelo menos duas comunicações que sugerem descobertas científicas futuras. Vou citá-las abaixo:
2. Dizeis: a eletricidade, essa sutileza entre o tempo e o que não é mais tempo, entre o finito e o infinito; esta frase não nos parece muito clara. Teríeis a bondade de expô-la mais detalhadamente?
Resp.: Explico-me assim, da maneira mais simples que posso. Para vós o tempo existe, não é mesmo? Mas não existe para nós (precursor da relatividade do tempo?). Assim defini a eletricidade: essa sutileza entre o tempo e o que não é mais tempo (o elétron se move à velocidade da luz. Como será o tempo para ele?), porque esta parte do tempo de que outrora vos devíeis servir para vos comunicardes de um a outro extremo do mundo, esta porçao do tempo, digo eu, não existe mais. Mais tarde virá a eletricidade, que não será outra coisa senão o pensamento do homem, transpondo o espaço (pense nas ondas eletromagnéticas, transmitindo sinais de rádio e televisão, internet, etc. - o pensamento do homem transpondo o espaço). Com efeito, não é a imagem mais compreensível entre o finito e o infinito, o pequeno meio e o grande meio? Quero dizer, em síntese, que a eletricidade suprime o tempo.
3. Mais adiante dizeis: Não conheceis ainda senão a eletricidade material; mais tarde conhecereis também a eletricidade espiritual. Por isto entendeis os meios de comunicação homem a homem, por via mediúnica (nota: não seriam as ondas de rádio, que permitem as pessoas se comunicarem a distância sem precisarem de nenhum meio material?)?
Resp.: Sim, como progressos médios; outra coisa virá mais tarde. Dai asperações ao homem: a princípio ele adivinha; depois vê.
Fonte: Revista Espírita - agosto/1860
Detalhe: a Corrente de Deslocamento, que é o princípio das ondas eletromagnéticas, só foi teorizada por Maxwell em 1865, em complementação à Lei de Ampère e testada 23 anos depois.
E há também um outro artigo bastante interessante, que fala sobre a "borracha enrolada sob a roda":
Um Sonho Instrutivo
Durante a última doença que tivemos no mês de abril de 1866, estávamos sob o império de uma sonolência e de um arrebatamento quase contínuos; nesses momentos sonhávamos constantemente coisas insignificantes, às quais não prestávamos a mínima atenção. Mas na noite de 24 de abril a visão ofereceu um caráter tão particular que ficamos vivamente impressionados.
Num lugar que nada lembrava à nossa memória e que se parecia com uma rua, havia uma reunião de indivíduos que conversavam; nesse número só alguns nos eram conhecidos em sonho, mas sem que os pudéssemos designar pelo nome. Considerávamos a multidão e procurávamos captar o assunto da conversa quando, de repente, apareceu no canto de uma muralha, uma inscrição em letras pequenas, brilhantes como fogo, e que nos esforçamos por decifrar. Estava assim concebida: “Descobrimos que a borracha enrolada sob a roda faz uma légua em dez minutos, desde que a estrada...” Enquanto procurávamos o fim da frase, a inscrição apagou-se pouco a pouco e nós acordamos. Temendo esquecer estas palavras singulares, apressamo-nos em as transcrever.
Qual podia ser o sentido dessa visão, que nada, absolutamente, em nossos pensamentos e em nossas preocupações podia ter provocado? Não nos ocupando nem de invenções, nem de pesquisas industriais, isto não podia ser um reflexo de nossas idéias. Depois, que podia significar essa borracha que, enrolada sob uma roda, fazia uma légua em dez minutos? Era a revelação de alguma nova propriedade dessa substância? Seria ela chamada a representar um papel na locomoção? Queriam pôr-nos no caminho de uma descoberta? Mas, então, por que se dirigir a nós, e não a homens especiais, em condições de fazer os estudos e as experiências necessárias? Contudo, o sonho era muito característico, muito especial, para ser arrolado entre os sonhos de fantasia; devia ter um objetivo; qual? É o que procurávamos inutilmente.
Durante o dia, tendo tido ocasião de consultar o Dr. Demeure sobre a nossa saúde, aproveitamos para lhe pedir que nos dissesse se o sonho apresentava algo de sério....
No dia seguinte ele nos deu esta explicação:
“O que viste no sonho que me encarreguei de vos explicar não é uma dessas imagens fantásticas, provocadas pela doença; é, realmente, uma manifestação, não de Espíritos desencarnados, mas de Espíritos encarnados. Sabeis que no sono podemos nos encontrar com pessoas conhecidas ou desconhecidas, mortas ou vivas. Foi este último caso que se deu naquela circunstância. Os que vistes são encarnados que, de forma isolada e sem se conhecerem, ocupam-se de invenções tendentes a aperfeiçoar os meios de locomoção, anulando, tanto quanto possível, o excesso de despesa causada pelo desgaste dos materiais hoje em uso. Uns pensaram na borracha, outros em outros materiais; mas o que há de particular é que quiseram chamar a vossa atenção, como assunto de estudo psicológico, sobre a reunião, num mesmo local, de Espíritos de diversos homens, perseguindo o mesmo objetivo. A descoberta não tem relação com o Espiritismo; é apenas o conciliábulo dos inventores que vos quiseram mostrar, e a inscrição não tinha outra finalidade senão especificar, aos vossos olhos, o objetivo principal de sua preocupação, pois há alguns que procuram outras aplicações para a borracha. Ficai persuadido de que assim o é muitas vezes, e que quando vários homens descobrem ao mesmo tempo, quer uma nova lei, quer um novo corpo, em diferentes pontos do globo, seus Espíritos estudaram a questão em conjunto, durante o sono e, ao despertar, cada um trabalha por seu lado, tirando proveito do fruto de suas observações.”
“Notai bem que aí estão idéias de encarnados, e que nada prejulgam quanto ao mérito da descoberta. Pode ser que de todos esses cérebros em ebulição saia algo de útil, como é possível que só saiam quimeras. Desnecessário dizer que seria inútil interrogar os Espíritos a respeito; sua missão, como dissestes em vossas obras, não é poupar ao homem o trabalho das pesquisas, trazendo-lhe invenções acabadas, que seriam outros tantos estímulos à preguiça e à ignorância. Nesse grande torneio da inteligência humana, cada um aí entra por conta própria e a vitória é do mais hábil, do mais perseverante, do mais corajoso.”..
Fonte: Revista Espírita - junho/1866
É claro que estes artigos não provam nada. Pode ter sido só coincidência. Mas causaram viva impressão em Kardec ao ponto de ele chegar a publicá-los no seu periódico mensal.
Um abraço.