Escrevi isso às 5 da matina. Irritado, não me restava mais nada a fazer...
Se esse é o primeiro de alguns dias preso a essa condição pós-cirurgia, quando não apenas me dói a perna como também me restringe o movimento, prevejo um insuficiente período de aborrecimento e irritação. Pelos dias seguintes, somente dois lugares me serão permitidos na casa, essa minha cama que a despeito de nossa intimidade é agora um estorvo, pois a percebo pouco preparada pra me suportar e mesmo me amenizar as debilidade s e suas conseqüentes dificuldades – mesmo macia, ela tem se mostrado dura, desconfortável, mesmo grande, ela não voa – e o sofá da sala, onde o vídeo-game me distraia melhor quando eu encontrava-me mais senhor de mim. Em nenhum lugar encontro posição, conseqüentemente, sossego, que é essa calma em se levar adiante, até com certo deleite, um dia ou mesmo uma semana à toa em afazeres discretos como uma leitura ou mesmo escrever.
Uma única e frágil motivação em mim é fazer tudo certo pra que me ocorra tudo bem, conforme previsões médicas, e não repetir ou mesmo prolongar toda essa penosa e fastigiosa situação. Contudo, nesse início de hora matutina de um dia que se me desdenha inteiro pela frente, ainda que pouco se comparado as extensões dos anos, sinto como se estivesse diante da entediante eternidade.
Meu humor sempre foi delicado, agita-se fácil por qualquer acaso que me ocorra e não poucas vezes se estilhaça numa irritação desmedida que normalmente depois me derruba num mordaz arrependimento – e não adianta saber isso, essa zanga exagerada é tão inevitável em mim quanto a fome, e é até possível educar-me, mas dela não me livro jamais. Aqui, preso a essa cama, é como se debaixo dela ou do guarda-roupa, estivesse esse monstro lá, à espreita, pra em qualquer momento devorar-me a paciência. Eu rezo, rogo benção à Dostoiévski e Fernando Pessoa pra que me protejam e tragam paz. De vez em quando, leio um sermão da Sciam também...