Que o Schumacher foi um grande piloto não se pode negar, como dizem, os números estão aí para provar – mas parece que a forma como eles foram conquistados não convence a maioria dos fãs do automobilismo. E ainda dizem que teve sorte. Eu penso que o mínimo que um piloto espera dos fãs é reconhecimento.
Com sete títulos, os principais recordes e uma enormidade de números no curriculo, diga-se, difíceis de serem superados, o que explica o fato do alemão estar em segundo lugar, tão atrás do primeiro piloto mais votado como o “melhor piloto de todos os tempos”, o Senna, com um total de mais de quatro milhões e meio de votos, numa enquete proposta por um jornal italiano, terra da Ferrari, escuderia pela qual ganhou cinco títulos consecutivos, quebrando um jejum de dezoito anos e que possui, reconhecidamente, a maior e mais apaixonada torcida do mundo?
1) Seria por sua fama de piloto... digamos... desleal, que o acompanhou até o final de sua carreira [1], rendendo-lhe, carinhosamente, o apelido de “Dick Viagrista” personagem do desenho “A Corrida Maluca” famoso por sua desonestidade?
[1] Quem não se lembra do horroroso episódio, a encenação de uma batida nos treinos do GP de Mônaco para atrapalhar a classificação do seu rival, Fernando Alonso, que terminou em punição?
2) Seria por uma vasta lista de punições e episódios polêmicos envolvendo seus dois primeiros e a perda de um terceiro título, não menos polêmico, nos anos noventa?
3) Seria por ter conquistado cinco títulos consecutivos pela Ferrari, correndo sozinho, isso é, sem rivais nas pistas, com um carro comprovadamente superior e um fiel escudeiro correndo a seu serviço (medalha, medalha, medalha), como se já não bastasse os privilégios assegurados em contrato?
4) Seria pelas manobras escancaradas da equipe na pista [2] ou nos boxes que obrigaram a FIA a modificar as regras mais de uma vez para reverter a perda de audiência na F-1 quem diria e que renderam ao piloto uma demorada e calorosa vaia da torcida presente, inclusive, a sua própria, fato inédito e inesquecível na história da F-1?
[2] Ah, bobagem. Desnecessário comentar.
5) Será porque teria deixado escapar três títulos [3] pilotando o melhor carro da temporada, para os, finalmente, rivais Hakkinem (ah, aquela ultrapassagem!) e Alonso (a lista é grande) e com tentativas frustradas de superá-los de forma... digamos... desleal em mais de uma oportunidade, sendo prejudicado pelos próprios erros.
[3] Quatro na verdade, mas uma não conta, pois foi quando sofreu aquele terrível acidente, em que, aliás, não teve culpa, ficando sete corridas fora do campeonato.
6) Será pelos... digamos... alguns erros que não se espera de um heptacampão com o currículo do alemão, frente a pressão imposta pelo espanhol nas pistas?
7) Será pelas excepcionais ultrapassagens sofridas incontáveis vezes ao longo de sua carreira? [4]
[4] Não podemos esquecer que fez ultrapassagens fabulosas também.
8) Será pelos muitos GP’s marcados por lances... digamos... polêmicos? E os erros consecutivos que marcaram inúmeros GP’s?
9) Será por concorrer com um piloto que, de fato (ou por fatos) merece tanto destaque [5]?
[5] Que sou fá do Senna é notório, mas nada a ver com o “bom moço” que, aliás, só fui conhecer depois de sua morte. Nunca me interessou sua vida pessoal, eu amava mesmo era o piloto. Dava prazer de ver o Senna correr.
Por acaso e não por sua causa, pois não o conhecia, comecei a acompanhar a F-1 no ano de sua estréia, mas não demorou muito para que começasse a torcer por ele, mais até que pelo Piquet, já bicampeão e com chances reais de vitória.
O Senna já era um mito em vida, sua morte só fez acentuar isso e não apenas no Brasil, na voz de um empolgado Galvão Bueno, mas no mundo todo. Ele não foi o primeiro piloto brilhante a morrer de forma espetacular na pista. E não foi por acaso que houve grande comoção em vários lugares do mundo entre os fãs do automobilismo.
10) Será por ter sido piloto de uma era, diferente do que todos acreditavam, eu inclusive, que não deixaria saudades, com uma F-1 muito mais interessante e competitiva antes (com Senna, Piquet, Proust, Lauda, Mansell e cia) e depois (com Alonso, Hamilton, Haikkonem, Massa, Kubica e tal) da era Schumacher?
Eu poderia continuar enumerando uma série de episódios, afinal, foram dezessete anos correndo, dos quais acompanhei quinze [6], mas nem todos eles juntos, na minha opinião, desmerecem o grande piloto que foi o alemão – embora ache uma injustiça que ele esteja em segundo lugar à frente de Proust e Fangio, mesmo tendo visto apenas lances espetaculares desse último.
[6] Cheguei a acompanhar algumas corridas após a morte do Senna, mas achei muito apáticas e perdi o interesse em seguida, ficando quase dois anos longe da telinha aos domingos, perdendo os dois primeiros títulos do alemão, mas não sem acompanhar toda a polêmica que os envolveu.
Além dos números, que dizem, falam por si próprios, uma coisa acredito, pode ser dita a favor do alemão: não me lembro de outro piloto que tivesse sempre tanta garra, tanta vontade, quase sempre sem um rival nas pistas, correndo sozinho por anos seguidos contra números sem nunca perder aquele entusiasmo de principiante. Essa vontade é, sem dúvida, uma grande qualidade.