Uili,
Não me parece que é necessário esquecer ferramentas racionais para discutirmos metafísica. Acho que podemos decidir ter uma discussão onde podemos ter uma conclusão razoável aqui.
Certamente, mas acho que você está sendo muito otimista se acha que podemos chegar a uma conclusão
Se chegarmos podemos escrever uma tese em filosofia com ela
Acaso.
Eu decidi dar um soco em alguém. E é razoável que eu espere ter um soco de volta. Mas qual foi a razão do primeiro soco?
Podemos definir uma cadeia de eventos que seja inteligivel, mesmo que para alguém com uma mente mais capacitada? E se pudermos encontrar algo nesta cadeia de eventos que seja aleatório e que contribuiu para ela, toda essa cadeia seria então aleatória?
O fato de existir uma origem sem causa para toda a sequência já refutaria o determinismo, mesmo que todo o resto da sequencia fosse determinístico.
Se alguém atira no João, a bala desvia em um poste e atinge José, esse evento foi gerado pelo acaso ou por algo intrínseco à natureza de João e de José?
Quer dizer, a bala atingiu o poste em um determinado ângulo, o vento estava em uma velocidade X que contribui de forma determinante para a bala atingir João. Madalena ia sair de casa as 9:30 e estaria na exata trajetória da bala, à frente de João, e morreria em seu lugar. Não saiu de casa porque um vírus a derrubou.
Perfeito, é um monte de causas deterministas para o evento.
A única coisa que poderia dar conexão a todas essas condições que fizeram a bala atingir João é um ser supremo. O acaso só não existiria se existisse um ser supremo e esse gostasse de intervir na realidade. Por isso que o citei em minha resposta anterior, ele é a única condição possível para o caso não existir.
Aqui eu já não entendi mais o seu raciocínio. Todos esses eventos que você mencionou já estavam naturalmente conectados por uma sequencia lógica de causalidade. O ser supremo nesse caso é inútil, a não ser que fosse no sentido de intervir para que a bala não atingisse o alvo, um milagre. Por isso eu chego à conclusão oposta, um ser supremo seria uma forma de o acaso existir, o ser supremo poderia tomar decisões ao acaso e intervir ao acaso, ou seja, sem motivo algum.
Mas seres supremos não são a única forma de o acaso existir. Na verdade, segundo certas interpretações da mecânica quântica, como a de Copenhagen o acaso tem que existir, há eventos que ocorrem em termos de probabilidades, e não como consequências unívocas de causas específicas.
As leis da natureza no caso do assassinato do João são eventos aleatórios. O vírus que afetou Madalena é aleatório, o vento foi um evento aleatório. O posicionamento do poste foi aleatório.
Estamos tendo uma confusão de terminologia aqui. Se aleatório quer dizer "com causas, porém essas causas fogem ao nosso controle e ao nosso conhecimento" então sim, esses eventos são aleatórios e é óbvio e trivial que o acaso existe, não precisaríamos estar tendo essa discussão. Essa é a versão de "aleatório" para um mundo determinista. Porém, o conceito de aleatório em que estou pensando é de efeito sem causa mesmo.
No nível macrscópico pode parecer absurdo falar em efeitos sem causa, mas na mecância quântica isso pode ser uma realidade. Um exemplo é o das partículas virtuais, que brotam aos pares no espaço vazio aparentemente do nada. Outro é o decaimento radiativo de um núcleo, que também é aparentemente aleatório (que os físicos, por favor, me corrijam se eu estiver errado). Existem diversas interpretações para esses fenômenos, algumas são indeterministas e afirmam que existem sobreposições de estados que colapsam para um estado aleatório após se executar uma observação, existem interpretações deterministas, que falam em variáveis ocultas (desconhecidas) que determinam os fenômenos, e existe também a famigerada interpretação dos muitos mundos, que você tanto odeia
E a parada está longe de ser resolvida.
Também cabe perguntar se o fato de o mundo quântico ser indeterminado ou não afeta o mundo macrscópico. Talvez mesmo que ele seja indeterminado, que o acaso exista no mundo quântico, isso não afete o mundo macroscópico.
Não importa que sejamos uma máquina com bilhões de neurônios e que algum otimista queira dizer que há alguma fonte de determinismo nisto, não somos só no mundo nem este reage apenas aos nossos atos.
Ainda cabe perguntar se o resto do mundo, que interage conosco, é determinado ou não. O problema persiste.
Podemos afirmar com um grau de certeza adequado que o acaso existe. Se o acaso não existisse, já poderíamos ter bons argumentos para a não existência do livre arbítrio.
Depende da sua definição de acaso. Pela que você parece estar usando, sem dúvida que o acaso existe. Mas eu não estou tão convencido de que o acaso existir é melhor para defender a existência do livre arbítrio do que ele não existir. Suponha que você tomasse todas as suas decisões baseado na jogada de uma moeda, e que o resultado da moeda fosse resolvdi pelo acaso. Você seria livre? Claro que não. Esse seu modelo de livre arbítrio não é melhor, a única diferença é que os "arremessos de moeda" estão dentro da sua cabeça, no modo como você toma decisões.
Existem várias definições de livre-arbítrio dependendo da abordagem, algumas evitam esses problemas. Se tiver curiosidade dê uma olhada na Wikipedia em inglês.
Destino
Se o acaso existe, o destino não existe. A não ser que queiramos tomar um porre de ad hocs e mais uma vez criarmos um ser super-poderoso que jogue com o acaso, seja lá o que isso signifique.
Exatamente, as duas possibilidades são mutuamente exclusivas.
Livre arbítrio
Para a não existência do livre arbítrio, a única coisa que deveríamos poder discutir a essa altura é: Eu posso apenas reagir de uma única forma a uma determinada causalidade?
Há definições de livre-arbítrio que vão contra a sua. Há deterministas que definem o livre-arbítrio de uma forma parecida com a força de vontade, ela seria sua capacidade de agir baseado no seu julgamento. Um exemplo é o caso do fumante que quer parar de fumar, seu julgamento é que ele deve parar, mas ele tem inclinações naturais que o atrapalham muito de seguir a sua decisão, portanto o fumante tem uma quantidade pequena de livre-arbítrio nessa questão. Mesmo que já estivesse determinado pelo "destino" que sua tentativa ia ser bem-sucedida, que ele não tivesse como não falhar, ainda assim, por essa definição ele teria livre arbítrio. Existem outras definições ainda. Sobre isso leia sobre
Compatibilismo.
Em informática, dizemos que uma função é determinista se ela retorna sempre o mesmo valor para o mesmo conjunto de parâmetros reais. Isto é, se eu tenho que x=f(a,b,c), se eu executo f(1,2,3) um milhão de vezes, todas as vezes X teria o mesmo valor.
Podermos afirmar que reagimos de uma mesma maneira à situações similares? A resposta simples e possível de ser respondida é "NÃO", porque todos sabem que podemos responder coisas distintas para um mesmo pedido. Para respondermos "talvez" é necessário entrarmos no terreno do esdrúxulo. Teríamos que afirmar que podemos mapear todos os "parâmetros" que nos fazem tomar uma decisão, algo como entender humor, hormônios, preconceitos, sonolência, relações com outras pessoas e seus efeitos em nós, ordens recebidas, interpretações dessas ordens, e um mundo de outros parâmetros. E que poderíamos de alguma forma entender como esses parâmetros se relacionam com nossa idiossincrasia para dar a resposta dada.
Estamos supondo que é possível mapear todas as variáveis, se não a discussão sobre determinismo versus indeterminismo não faz sentido. E essa resposta "NÃO" não é tão simples assim não. Para começar porque as variáveis não são todas iguais nessas situações similares. O tempo, para começo de conversa é diferente. E você não pode ver uma pessoa reagindo de mais de uma maneira diferente sob as mesmas condições e ao mesmo tempo, somos limitados a agir de somente uma maneira diferente por tempo. Se todo dia como pão com manteiga no café da manhã, mas amanhã não tomo, isso não quer dizer que minha mente funciona aleatoriamente. Eu posso simplesmente, por uma causa completamente determinista, ter enjoado de pão com manteiga.
Quem poderia responder a essa questão? Novamente deus. Mas, mais importante para este contexto. Quem podería manipular esses parâmetros de uma forma a obter um resultado desejado? deus, sem dúvida.
Nisso eu concordo com você.
Não há determinismo em nossas ações, somos mais um elemento gerador de acasos.
Quando afirmo que nossas decisões são tomadas por um contexto cultural, religioso, educacional, etc.. esse contexto também é aleatório.
Nisso eu discordo. Todos esses contextos podem em tese ser determinados. Mas, claro, mais uma vez as nossas definições conflitantes de "aleatório" comprometem a discussão. Dependendo da semântica da palavra, nós dois estamos certos ao mesmo tempo.
Temos livre arbítrio
Depende de como você define livre-arbítrio também. E da natureza da realidade