1 - Deus(ONICIENTE) não criou a vida, pois se fizesse isso...os animais não se matariam para sobreviver, teriam outro modo de sobreviver e viveriam em harmonia total!
2 - Veja meu vídeo...não acha que se Deus(oniciente) existe temos duas opções...ou ele não está nem aí pra nós, ou gosta de nos fazer de otários?
O velho problema do mal, criado por um hedonista corruptor de menores, Epicuro.
Um estimado amigo já rebateu essa falácia gritante, refutação essa que tenho prazer em reproduzir integralmente aqui:
Um dos problemas clássicos oferecido pelos defensores do ateísmo é o Paradoxo de Epicuro. Basicamente, ele sustenta que há algum tipo de contradição entre a existência de Deus e a existência do Mal. Estou certo que todos os que estão aqui já devem ter uma idéia do que ele significa. Nesse artigo, farei uma análise da relação Deus e o Mal.
Eu costumo fazer posts mais diretos, mas como esse é um desafio filosófico real, não uma imbecilidade do tipo “Monstro do Espaguete Voador” (que, incrivelmente, alguns ainda levam a sério), vou me alongar um pouco. Tentarei ser o mais simples que puder, mas não mais simples do que isso.
Se você quiser, pode pular diretamente (não recomendo, mas…) para as seções 2) e 3) onde eu lido com o Paradoxo. Se estiver ainda com mais pressa, leia a introdução que faço dentro de 2) e 3) e depois o resumo final dos erros e já terá uma base para entender.
Agora vamos ao texto:
1. Duas Observações Preliminares
Antes de começar a argumentação, duas observações são importantes para melhor entendimento da argumentação:
O que são Mundos possíveis?
O conceito de Mundos Possíveis está relacionado à lógica modal. Basicamente, temos que fazer a distinção entre o possível e o necessário.
Uma afirmação possível é uma que contenha um enunciado cujo valor de verdade não seja contraditório. Ou seja, algo possível é algo que não é necessariamente falso: pode ser ou não ser. Pense da idéia de “É possível que…” que entenderá facilmente. José Serra não ganhou as eleições. Era possível, mas ele não ganhou. A idéia de José Serra ganhar a eleição de 2010 não se atualizou na realidade, mas não é necessariamente falsa. Podemos descrever um mundo hipotético desse jeito sem criar nenhuma contradição. Uma Terra quadrada também é possível. Não é verdade, mas é possível. Todos os coelhos serem vermelhos também é uma possibilidade, embora não seja verdade no mundo real.
Já uma afirmação necessária é uma que contenha um enunciado que não pode ser nem possivelmente falso (se verdadeiro) nem possivelmente verdadeiro (se for falso). Ou é, ou não é. Por exemplo: um triângulo DEVE ter NECESSARIAMENTE 180º graus internos (esqueça as palavras e pense apenas nos conceitos abstratos). Isso é necessariamente verdadeiro. Um homem casado (não uma pessoa específica, mas o conceito abstrato desse termo, novamente) deve necessariamente não ser solteiro; se for solteiro, não é casado. Uma afirmação contraditória do tipo “Esse homem casado é solteiro” é necessariamente falsa e não faz parte de nenhum mundo possível.
Então, um mundo possível é uma descrição da realidade que contenha enunciados, como:
Mundo Possível MP1: S0 & S1 & S2 & S3 & S4…
Mundo Possível MP2: S0 & S1 & S2 & S5 & S6…
Mundo Possível MP3: S0 & S1 & S2 & S7 & S8…
Vamos verificar quais são essas afirmações. A primeira delas é S0:
S0: A proposição 2 +2 =4 é verdadeira.
A proposição S0 é necessariamente verdadeira (pois nunca é possivelmente falsa). Ela faz parte de TODOS os mundos possíveis. Não existe nenhum mundo possível onde 2 + 2 = 4 não seja verdade (vou pedir mais uma vez: não pense nos algarismos e nos sinais gráficos, mas no conceito).
Prosseguindo:
S1: Existe um país chamado P1.
S2: O País chamado P1 teve eleições no ano A1.
São duas afirmações possíveis, pois não são necessariamente falsas; o país P1 poderia ou não existir. Da mesma forma, poderia ou não ter feito eleições no ano A1.
Vamos considerar que S1 e S2 são possíveis e reais. De fato existem. S1 e S2 se desdobram em:
S3: O sujeito X1 venceu as eleições.
S4: O primeiro ano do governo de X1 foi marcado pelo fim dos concursos públicos.
Não há nada contraditório nas proposições S3 e S4. Elas poderiam muito bem ser verdades reais. Então o conjunto MP1 formado por {S0 & S1 & S2 & S3 & S4…} é um mundo possível.
Adiante, elas ainda poderiam se desdobrar em:
S5: O sujeito X1 venceu as eleições.
S6: O primeiro ano do governo de X1 foi marcado pelo aumento dos concursos públicos.
Também não há nada contraditório nas proposições S5 e S6. Então o conjunto MP2 formado por {S0 & S1 & S2 & S5 & S6…} também é um mundo possível. Pode ser que ele seja falso; mas ainda assim é um mundo possível.
Ou ainda:
S7: O sujeito X1 (concorrente direto de X2) venceu as eleições sozinho no primeiro turno e exerceu seu mandato;
S8: O sujeito X2 (concorrente direto de X1) venceu as eleições sozinho no primeiro turno e exerceu seu mandato;
Agora sim temos um problema; as proposições S7 e S8 não podem ser verdadeiras ao mesmo tempo. Ou S7 é falso ou S8 é falso; não há como conciliar as duas afirmações, que são excludentes. Se um mundo possível é um mundo onde não há nenhuma contradição lógica entre duas proposições (seja ela interna para uma mesma afirmação ou entre si correlacionadas como no exemplo), então o mundo MP3 formado pelo conjunto {S0 & S1 & S2 & S7 & S8…} NÃO é um mundo possível.
Se quisermos estabelecer uma contradição, então temos que mostrar que em NENHUM mundo possível comporta duas proposições. A conclusão é obrigatória e não tem nenhuma escapatória lógica. Se houver uma outra saída, então não há mais a contradição lógica e temos um mundo possível novamente.
Passamos ao próximo esclarecimento.
De quem é o ônus da prova no Problema do Mal?
O ônus da prova no Problema do Mal é do ateu que o propõe, não do teísta. O Paradoxo de Epicuro é utilizado com o objetivo de mostrar que Deus não pode existir ou que é irracional acreditar que Deus exista dado o Paradoxo. O que um teísta tem que fazer é apenas mostrar que o Problema do Mal não implica na conclusão “Deus não existe”, mostrando algumas saídas. Não é preciso provar que tais coisas realmente sejam assim como descritas na sua saída, a princípio.
Lembre, por exemplo, do post que fiz sobre Cristina Rad. Ela fazia a acusação, por exemplo, dizendo: “Como é possível que alguém seja feliz no Céu se seu filho está no Inferno?”. Meu trabalho era apenas mostrar um caminho: “Bem, talvez as pessoas no Céu entendam os parâmetros de Deus e aprendam a conviver com isso”. Não é preciso ser verdade para a impossibilidade do Céu ficar refutada. A mera saída já tornaria a hipótese possível e não contraditória.
O mesmo vale para o Problema do Mal.
2. Problema Lógico do Mal
Agora vamos ao Problema do Mal. Eu gostaria de falar sobre o desafio de um ateu dar uma definição objetiva para a existência do Mal sem usar uma base transcendental, mas, por questões de espaço, vou pular essa parte.
O Problema Lógico do Mal consiste em dizer que há uma contradição lógica entre Deus e o Mal; ou seja, não há nenhum mundo possível entre que aceita ao mesmo tempo (1) “Deus existe” e (2) “O mal existe”. Um é a negação de outro; o mal é uma prova necessária da inexistência de Deus. É uma contradição simples e direta, nos moldes do que vimos acima. E, para desfazer uma contradição, basta achar uma terceira saída que seja logicamente possível.
Então, o que o ateu está querendo dizer, basicamente, é que qualquer teísta entra em um problema quando aceita essas duas proposições ao mesmo tempo:
1. Deus existe;
2. O mal existe;
Mas, pense um pouco. Perceba que não há nenhuma contradição explícita ou formal entre esses dois enunciados. Ele não é como:
S7: O sujeito X1 (concorrente direto de X2) venceu as eleições sozinho no primeiro turno e exerceu seu mandato;
S8: O sujeito X2 (concorrente direto de X1) venceu as eleições sozinho no primeiro turno e exerceu seu mandato;
Em S7 e S8, você lê e imediatamente percebe que as duas frases não podem ser verdadeiras ao mesmo tempo. A primeira é negação da segunda e a segunda é negação da primeira. A contradição é explicíta. Mas não está claro como o “1. Deus existe” e “2. O mal existe” poderiam ser análogas a isso.
Se não temos uma contradição explícita, então quer dizer que a nossa contradição, se existente, deve estar implícita. A correlação provavelmente estaria nos atributos de Deus – o fato de ele ser todo poderoso, todo bom e odiar o mal.
Então o silogismo melhor ficaria se expressado dessa maneira:
(3) Deus é todo poderoso, todo bom e odeia o mal;
(3.1) Se Deus é todo poderoso, então pode criar qualquer mundo que desejar;
(3.2) Se ele pode criar qualquer mundo que desejar, então ele iria preferir um mundo sem nenhum mal;
(4) Mas o mal existe;
(5) Logo, Deus não existe;
Para que o conjunto acima implique dedutivamente em uma contradição lógica, todas as premissas devem ser necessariamente verdadeiras.
Mas elas são? Se não forem, o problema lógico cai por terra.
Analisamos a seguir:
Proposição I: Se Deus existe, então ele pode criar qualquer mundo que desejar:
A idéia crucial para entender se Deus pode criar qualquer mundo que ele quiser é a idéia de mundos possíveis, explicada na introdução. Mundos possíveis se referem a uma descrição em proposições de um estado de coisas que poderia ou não ter sido. Pense nas seguintes proposições:
Lula foi presidente do Brasil.
7 + 5 = 12
Uma criança pintou um quadrado desenhado de vermelho.
Elas não só idéias possíveis, mas como foram idéias reais. São idéias que realmente são verdadeiras, além de possuirem a propriedade de não serem necessariamente falsas (i.e, possíveis). Esse é, claramente, um tipo de mundo que Deus pode criar ou atualizar.
Mas Deus pode atualizar qualquer mundo? Pense nas proposições a seguir:
O número natural 1 (um) foi presidente do Brasil.
7 + 5 = 99
Uma criança pintou um quadrado desenhado de círculo.
Se pensarmos nos termos abstratos e não no simbolo social (porque é claro que “99” poderia ser o nosso “12”, se assim fosse nossa cultura) veremos que esses são mundos que Deus não pode atualizar ou não pode criar.
O número 1 (um) é um objeto abstrato; ele não tem corpo e não entra em relações causais. Já que para ocupar o cargo de presidente do Brasil é preciso poder causal, então o número natural 1 jamais poderia mandar no nosso país. A idéia é logicamente contraditória.
A conta 7 + 5 também não pode dar outro resultado que não seja 12. É impossível que juntando cinco peças com outras sete de algo terminemos com noventa e nove.
E uma criança não pode “pintar” algo de “círculo”; círculo não é uma cor. Essa frase não possui, da mesma forma, sentido, sendo contraditória do ponto de vista lógico.
Disso concluimos que, portanto, nem todos os mundos são capazes de serem criados; e Deus não pode atualizar qualquer mundo que ele desejar. Esses não são mundos possíveis, pois contém proposições que são logicamente contraditórias e então necessariamente falsas (i.e., impossíveis). Uma vez que Deus não pode fazer o logicamente impossível, pois o logicamente impossível não é sequer é “algo” no grupo de “tudo que pode ser feito” para contar dentro de todo poder (para uma visão desse assunto, ver meu artigo sobre o Paradoxo da Pedra).
Da mesma forma, não é logicamente possível causar ou fazer alguém livremente realizar uma ação. Pois ou ele realiza livremente ou ele foi causado para tanto; são duas idéias opostas.
Agora chegamos na defesa baseada no Livre Arbítrio (atenção: defesa – o que possivelmente poderia ser e não teodicéia – demonstração do que seria de fato).
Se é possível que existam seres com livre-arbítrio, significa que em cada situação possível A, B ou C eles iriam livremente responder de uma maneira.
Imaginemos uma situação A onde um homem chamado Charles recebe um presente. Considerando que é possível que Charles, na situação A, tenha livre-arbítrio, sabemos pela lei do excluído do meio que ou ele iria aceitar o presente (ação r que levaria ao mundo Mr) ou ele não iria aceitar o presente (ação t; levaria ao mundo Mt).
Então numa dada situação A, teríamos duas daquilo que vamos chamar de “contrafactuais da liberdade”. E uma delas, acontecendo A, teria que ser verdade. Ou (r) vai ter valor de verdade:
(r) Charles, se acionado na situação A, vai livremente agir para aceitar um presente (levando a um mundo Mr);
Ou (t) vai ter valor de verdade:
(t) Charles, se acionado na situação A, vai livremente agir para não aceitar um presente (levando a um mundo Mt);
Em primeiro lugar, Deus não pode atualizar um mundo onde (r) e (t) sejam verdadeiros ao mesmo tempo e sob o mesmo aspecto. Se A, então uma delas têm valor de verdade e a outra é falsa. Esse é mais um mundo que Deus não pode atualizar.
Se (t) tem valor de verdade e Charles, estando na situação A, iria livremente recusar o presente, então Deus não pode fazer com que Mr seja verdadeiro. E se (r) era verdadeiro e Charles, estando na situação A, iria livremente aceitar o presente, então Deus não pode criar Mt, onde Charles livremente rejeita o presente. Depende de como Charles livremente responde em A.
Como só um dos dois pode ser verdade, há pelo mais um mundo que Deus não pode criar.
Mude essa situação para um ação de valor moral – o presente é, na verdade, uma propina do governo. Deus não pode causar Charles para fazer o certo se ele está em uma ação livre. Está na mãos de Charles escolher livremente fazer a coisa certa ou não.
E assim então temos vários exemplos de mundos que Deus não pode criar (e sem que ele deixe de ser onipotente).
Então a primeira proposição não é necessariamente verdadeira; ou podemos ir além e dizer que ela é falsa.
O problema lógico do mal já perdeu uma de suas premissas.
Vamos considerar a segunda agora:
Proposição II: Podendo criar qualquer mundo que quiser, Deus escolheria um mundo sem nenhum mal:
Observe que a proposição II depende do antecedente que não é nada mais do que a proposição I. Mas já definimos que a proposição I não é necessariamente verdadeira, a dois já começa com uma falha fatal.
Em II, o que se postula é algo como um mundo em que Deus só permite vários escolhas entre boas opções. As pessoas não podem escolher o mal.
Mas, nesse caso, não haveria liberdade. Pense um pouco: imagine uma ditadura que faça eleições periódicas. Mas você só pode escolher entre vários generais do mesmo partido. Isso seria liberdade de escolha? Não. O mesmo se aplica a Deus não permitir o mal.
E é possível que Deus permita e prefira a liberdade. Então a primeira opção cai por terra.
Talvez o ateu desista dessa versão e mude para a seguinte idéia: “Certo, se Deus não permitisse o mal, não haveria liberdade. Mas é possível que Deus crie um mundo onde as pessoas livremente escolhem apenas ações boas”.
Ele está certo. A princípio, um mundo onde as pessoas escolham apenas ações boas não é logicamente contraditório. Mas, no sentido contrário, é logicamente necessário que isso seja verdade? Ou isso pode ser possivelmente falso? Deus pode escolher um mundo sem nenhum mal, com as pessoas tendo a liberdade?
Talvez não. Imagine que para cada indivíduo criado há um conjunto completo de contrafactuais de liberdade como (t) e (r) mencionados acima. Em dadas situações ele sempre tomaria uma ação de liberdade descrita nos contrafactuais: em A, ele escolheria ou (t) ou (r). Em B, ou (t1) ou (r1). Em C, ou (t2) ou (r2). E assim por diante englobando todas as situações possíveis.
Sendo que uma delas sempre vai possuir um valor de verdade sobre o que a pessoa faria livremente em cada situação. Se A, então (t). Se B, então (t1). Se C, então (r3) e etc.
Agora a idéia chave é a “Depravação através de todos os mundos”. Se cada indivíduo tem suas contrapartidas de liberdade, que possuem valor de verdade em dada situação A, B ou C, então é possível que elas existam de um jeito que, não importando o conjunto de situações que Deus coloque o indivíduo, se ele estiver com liberdade moral significante, ele sempre faria livremente pelo menos uma coisa errada. Então o mal seria possivelmente uma condição necessária da existência da liberdade moral.
E por que Deus não muda esses contrafactuais de liberdade ruins? Porque se ele mudasse não seria contrafactuais de liberdade. Voltaríamos então para o primeiro caso dos generais da Ditadura Militar.
Sim, é possível que “Charles” nunca faça a coisa errada. Mas Deus não pode fazer isso sem a ajuda de Charles. No fim das contas, depende apenas de Charles não cometer coisas ruins. Deus não pode obrigá-lo a livremente fazer a coisa certa.
Novamente, isso não significa que ele não é onipotente de forma alguma. Como vimos, Deus ser onipotente não significa que ele possa fazer alguém livremente escolher algo. Se ele causa as pessoas para fazer algo, então não estamos falando mais de “livremente”. E a questão toda depende da liberdade. E é possível que a humanidade seja como “Charles”: sempre escolheria livremente pelo menos algo errado.
Então suponha que você esteja dentro da situação acima. Nesse estado de coisas, não só é possível que o mal seja uma condição necessária de agentes livres pelos valores de verdade dos contrafactuais de liberdade, mas que também ele acabe servindo a algum propósito maior. Então, servindo a um outro propósito de acesso a um bem maior, também não podemos afirmar que necessariamente Deus escolheria um mundo sem nenhum mal.
Sobre o problema lógico, alguns levantam a questão do Céu. Não seria ele um mundo possível onde as pessoas nunca fazem nada de ruim? Então, nesse caso, temos liberdade ou não?
Temos duas respostas e as duas são aceitáveis.
Pode ser que tenhamos liberdade. Mas talvez só seja possível criar um mundo de criaturas sem os “contrafactuais” ruins com uma etapa de seleção anterior (como essa seria). Poderia ser, por exemplo, que só pessoas que entrem livremente numa relação completa de amor com Deus consigam causar-se para não cometer atos maus mesmo com uma liberdade significante. Como Deus dá a opção de entrar ou não nessa relação, seria preciso essa “etapa” para criar um mundo livre sem tais contrafactuais. Se é possível, então ainda não há erros.
No segundo caso, pode ser também que seja o caso de perdemos a liberdade de alguma forma. As pessoas, nesse caso, poderiam fazer o sacrífico de parte de sua liberdade para viver com Deus. Mas o sacrífico seria voluntário para os que querem entrar estar lá. Deus dá a liberdade, mas as pessoas podem optar não tê-la (o que seria diferente de Deus tirar a liberdade, é bom frisar) em “troca” de algo.
Então essa objeção também falha.
Alguém pode perguntar agora: “Ok. Esse é o mal moral. Mas e quanto ao mal natural?” É ao menos logicamente possível que o mal natural seja aparentemente restrito ao natural, tendo sua origem também em um mal moral derivado de agentes livres (como pecados, ação de pessoas não humanas, etc). Não há nada de contraditório nessa idéia, então ela é possível. E sendo possível, a argumentação acima se aplica igualmente. (Acho que são possíveis outras argumentações para o mal natural, mas, por questões de economia, essa mais simples será adotada agora).
Então nem a proposição I nem a proposição II são necessariamente verdadeiras e não ajudam mais do que as outras versões do problema lógico ajudavam.
Então o último silogismo também não sobrevive a defesa do Livre Arbítrio. É logicamente possível que as proposições estejam erradas:
(3) Deus é todo poderoso, todo bom e odeia o mal;
(3.1) Se Deus é todo poderoso, então pode criar qualquer mundo que desejar;–> FALSO. Há pelo menos alguns mundos que Deus não pode criar, mesmo que não deixe de ser onipotente.
(3.2) Se ele pode criar qualquer mundo que desejar, então ele iria preferir um mundo sem nenhum mal; –> FALSO. Depende do antecedente, que demonstramos não ser verdadeiro; também depende da impossibilidade do mal servir a um bem maior, que é uma opção logicamente possível;
(4) Mas o mal existe;
(5) Logo, Deus não existe; –> Falso. Não segue necessariamente. Portanto, a existência de Deus é compatível no nível lógico com a existência do Mal.
Então HÁ uma terceira saída possível para o silogismo. Podemos facilmente revertê-lo em:
(6) Deus é todo poderoso, todo bom e odeia o mal;
(7) Mas o mal existe;
(7.1) Deus é todo poderoso, mas isso não significa que ele pode criar mundos impossíveis;
(7.2) Se Deus não pode criar qualquer tipo de mundo, então é possível que ele prefira, dentro os mundos possíveis, um mundo que possua o mal;
(8) Então logicamente possível que Deus tenha razões morais
suficientes para permitir o mal;
(9) Logo, a existência de Deus é ao menos logicamente compatível com a existência do Mal;
É muito fácil desfazer do problema lógico do mal. O mero fato de ser possível uma terceira saída não torna a conclusão obrigatória. E então não segue lógica e necessariamente a incompatibilidade entre Deus e o mal e o ateu não consegue fazer um caso contra o teísmo.
Na verdade, podemos até mesmo rever a existência do mal, transformando em um ARGUMENTO para a existência de Deus!
(1) Se Deus não existir, então o mal (entendido como algo objetivo, não como apenas um desagrado mental) não existe;
(2) Mas todos nós sabemos que o Mal de fato existe;
(3) Logo, Deus existe;
Essa é só uma versão do argumento moral. Não vou discuti-la em mais detalhes, mas vocês pegaram o ponto.
Recapitulando, então a derrota do problema lógico do mal é definida pelo fato de que:
(a) Não há contradição explícita entre Deus e a existência do Mal;
(b) A contradição implícita pode ser desfeita exemplificando uma terceira saída possível, ou seja, a contradição baseada em premissas implicitas não é lógica e necessariamente verdadeira;
(c) A adição de mais premissas deve ser obrigatoriamente de premissas necessariamente verdadeiras;
(d) As premissas adicionais não são necessariamente verdadeiras;
(e) Se não são logica e necessariamente verdadeiras, então o problema lógico do mal, por tabela, é falho;
(f) Na verdade, o reconhecimento da existência objetiva do Mal é evidência a favor da idéia que Deus existe, não contra;
Se a argumentação acima for aceita como possível, não há nenhuma contradição. E, de fato, muitos ateus já aceitaram que não há contradição lógica entre Deus e o Mal. É ao menos possível a coexistência dos dois. Então o argumento foi modificado: dada a quantidade de mal no mundo, é improvável que Deus exista ou irracional acreditar que ele exista. Isso nos leva ao problema Probabilístico ou Evidencialista do Mal e não mais ao lógico, que está abandonado.
Continua...