Eu substituo a palavra "contradição" por "um aspecto curioso em relação ao desenvolvimento do cérebro em relação à explicação evolutiva".
Como o Felipe falou, o custo energético/evolução cerebral parece não bater muito. Por mais que tenha sido uma diminuição do tamanho do nosso intestino que tenha possiblitado esse fato, ainda tem que explicar como era que os nossos antepassados conseguiam manter esse custo energético. Um equino tem um intestino impressionantemente grande. É simplesmente descomunal, não é por acaso que Sindrome Cólica é comum neles. Eu já vi uma necropsia de um cavalo que tinha acabado de morrer de colica e, onde havia ocorrido a torção a alça estava dilatado de forma que passava, com folga, uma bola de basquete. Como eles são herbívoros, eles necessitam de um intestino enorme para retirar energia do alimento.
Uma diminuição do intestino, necessariamente para garantir o mesmo suprimento energético, tem que ser acompanhada de uma mudança de hábitos alimentares. Os alimentos devem ser de melhor qualidade e de mais fácil quebra em nutrientes. Ou seja, para que a diminuição do intestino possibilitasse um crescimento cerebral, os animais deveriam ser áptos a conseguir alimentos mais energéticos e com regularidade. Para que a encefalização ocorresse eles deveriam ser espertos o suficiente para que a encefalização fosse possível. Só que parece que foi o contrário. Ocorreu o crescimento cerebral que possibilitava indivíduos mais inteligentes que conseguiam melhores alimentos e com regularidade. E isso tudo eu estou falando não de homens modernos, estou falando dos Australoptecus da vida. Após muito tempo, após o surgimento do homem moderno, com a estrutura cerebral que possuímos hoje, é que a agricultura e a criação de animais se deu início. Se agricultura e a criação tivessem aparecido antes da "explosão de crescimento cerebral" ia ser perfeitamente plausível a encefalização. Com um excedente energético seria viável um crescimento. Por mais que nossos antepassados usasse o fogo eles deveriam ter um excedente energético enorme para possibilitar sobra suficiente para manter o cérebro.
A palavra "calote" cai bem nessa situação. Um calote energético.
E isso é somente o crescimento do cérebro em relação ao peso do cérebro em relação ao peso do corpo. O potencial latente de memória, capacidade de abstração entre outras características humanas não estão computadas nesse deficit.
Eu nem me prendo muito em relação a isso porque é de difícil argumentação e aqui é na base da machadada o trato a esse tipo de colocação que eu estou colocando.
Eu preferi individualizar a área de Broca e de Wernicke porque facilita o meu ponto de vista.
Então Buckaroo, o meu ponto não é "vocabulário de chamados maior que fosse útil à sobrevivência e reprodução, e/ou por ser alvo de seleção sexual". Isso é presente em animais como pássaros que são, "cerebralmente" falando, bem primitívos em relação aos MAMÍFEROS, mesmo mamíferos inferiores. Meu ponto é a verbalização e a compreenção da verbalização e escrita de terceiros. Essa característica exclusivamente humana, a que realmente nos diferencia de outros animais, só foi possível devido a pré-existência das áreas citadas.
http://en.wikipedia.org/wiki/Cortical_homunculusA área de broca emite axônios diretamente para a área do córtex motor primário referente aos músculos usados na vocalização complexa. Se você ver a figura do homunculo que tem na Wikipedia, você verá que ele é desproporcional nas mãos e na boca (principalmente a língua) isso é devido ao fato de que nós possuímos maior número de músculos e habilidade manual e facial. A área de broca coordena somente os músculos responsáveis pela fala. Tanto é que danos na área de broca causam dificuldade motora na verbalização. Não quero dizer com isso que um bebê nasce com esse sistema pronto. A gente sabe que a área de Broca "aprende" a coordenar os músculos necessários para a fala. E isso via plasticidade cerebral. Tanto é que o bebê começa balbuciando palavras, fala descoordenada e tal (isso é interessante porque, de novo, no meu ponto de vista, mostra que a plasticidade da área de broca responde a uma necessidade do self do bebê. só que isso é assunto para o outro tópico). Só que não dá para colocar que essa plasticidade comece do zero. A área de broca não é um núcleo isolado no cérebro, ou com axônios se projetando para outro lugar, que, devido a uma necessidade começam a fazer conexão com o córtex motor primário.
Ela está lá, seus axônios são obviamente destinados àquela região específica do córtex motor primário, só que, com o desenvolvimento do bebê essas conexões vão aprimorando sua capacidade de coordenação.
Eu tenho certeza que antes da capacidade de falar do ser humano a área de broca era usada. Talvez coordenando funções faciais, ou talvez com algum aproveitamento distinto, via plasticidade, semelhante a alguém que fica cego e o córtex visual assume outra função.
Só que ela tem como função a fala.
Ela é responsável pela fala.
Ela estava pronta antes que começassemos a falar.
Somente devido a pré-existencia dela é que nos tornamos áptos a falar.
Sem ela não haveria possibilidade de coordenação motora vocal que possibilitasse o desenvolvimento de linguagem.
A área de Wernicke, diferentemente da área de broca que emite axônios para coordenação, recebe inputs tanto do córtex auditivo primário, quanto do córtex visual (não sei se primário ou secundário). O impressionante aqui, de novo, no meu modo de ver, é mais os inputs do córtex visual. Esses inputs são responsáveis pela capacidade de de
compreenção da palavra escrita.
Como você falou, a escrita foi inventada muito após a fala e é produto direto da fala. Só que ela é uma questão evolutiva justamente por causa dessas conexões que o córtex visual faz com a área de Wernicke. Sem elas não haveria capacidade de interpretação de palavra escrita. Nós dependemos de um substrato neural para compreender a escrita.
Então Buckaroo, eu entendi seu ponto com relação a exaptação, só que essas conexões neurais são de uma complexidade, objetividade tal que é difícil colocar exaptação nesse processo evolutivo. E pior ainda, toda essa complexidade foi feita de um pulo MUITO antes da função começar a ser exercida pelos humanos.
E ainda tem o fato de que somente a área de broca, ou somente a área de Wernicke, ou a presença das duas sem a devida conexão entre elas não propiciariam o desenvolvimento da fala. É necessário o pacote completo.
Vou ser mais cuidadoso com minhas colocações aqui. Já tinha prometido isso antes. Não é uma contradição, mas é extremamente curioso relacionar o neodarwinismo com essas estruturas. Se eu me descuidar um pouco eu cito a palavra teleologia.
O bom de discutir com o Buckaroo é que você é obrigado a estudar.
Tive que pegar uma porrada de artigos na NET para ler durante a semana. Fim de semana que vem eu volto. Um barato curioso é que eu fui me informar sobre o FOXP2 e ele se relaciona ao tálamo, ao hipocampo e ao cerebelo. Não com as área citadas.