Se você anda com seu carro a 180 km/hora, está muito mais propenso estatisticamente a sofrer um acidente do que se dirigir a 60 km/hora. É isso o que se diz nas notícias.
Isto não está explícito em nenhuma das notícias. Mesmo se estivesse, precisaríamos do estudo em si para tentar chegar à esta conclusão específica.
De fato, o maior número dos acidentes ocorre por excesso de velocidade em relação ao estipulado por lei, porém, isso não é indicação direta de que o excesso de velocidade tem relação causal com acidentes, mas sim uma relação ocasional. Sim, uma relação ocasional pode ser suficiente para um estudo para a criação de uma lei proibitiva, mas é necessário saber com o máximo de certeza possível se esta relação ocasional é também causal (basta beber para se acidentar, ou, há uma relação direta entre bebida e acidentes, na maioria das vezes) ou não (é necessário beber e ouvir música alta para se acidentar).
É o que eu falei para o Geotecton, não é porque os casos estão interligados de alguma forma que eles são causa e efeito.
Especificamente por isso que eu pedi as fontes. Não foi uma tentativa de escárnio ou nada do tipo, só uma tentativa de mostrar como a forma de pensar pode estar enviesada meio a uma pobreza estatística. Explico a carência de evidências* abaixo.
Talvez na Alemanha, nas condições de lá, com os motoristas de lá, deixar para os motoristas decidirem suas próprias velocidades funcionem. Mas no Brasil, onde, como você mesmo disse, pela fiscalização frouxa os motoristas também acabam decidindo a que velocidade andam, não tem funcionado bem, já que nosso transito é um dos que mais matam no mundo. E grande parte dos acidentes é causado e/ou agravado pelo excesso de velocidade.
Vou tentar ilustrar o que penso a respeito com um exemplo de outra área e uma fonte interessante.
Se você entende de economia, já vai compreender o exemplo já no início.
Imagine que um grupo de políticos resolve tabelar os preços de todos os produtos vendidos no país por qualquer motivo. Embora eles sejam munidos de bons profissionais e boa base de pesquisa, por mais que eles se esforcem, as pessoas SEMPRE (isso é fato, é sempre) vão querer fugir do tabelado, seja pagando/vendendo por um preço diferente, escondendo/destruindo produtos, deixando de produzir e, no longo prazo, pressionar para a revogação legal do regime. Isso ocorre pura e unicamente porque somente as relações voluntárias e racionais podem apontar com exatidão o preço justo, para comprador e vendedor, a ser cobrado por qualquer produto de seja.
As leis de trânsito de limites de velocidade são bastante semelhantes à regulação de preços; as pessoas vão dirigir acima da velocidade em pistas livres, vão criar sistemas de identificação de radares, vão sinalizar as "blitzes" etc.
Só que isso não quer dizer que TODO limite é ruim. O problema fundamental é a decisão arbitrária.
Tem um
estudo bem bacana contratado pela "British Columbia Ministry of Transportation" do Canadá que tem um trecho que fala sobre os limites de velocidades.
Based on years of experience and observation, the following fundamental concepts have beenused to establish realistic speed zones.
The majority of motorists drive at a speed they consider reasonable, and safe for road, traffic, and environmental conditions. Posted limits which are set higher or lower than dictated by roadway and traffic conditions are ignored by the majority of motorists.
The normally careful and competent actions of a reasonable person should be considered legal.
A speed limit should be set so that the majority of motorists observe it voluntarily and enforcement can be directed to the minority of offenders.
A driver’s choice of speed can impose risks on other road users. Crash severity increases with increasing speeds because in a collision, the amount of kinetic energy dissipated is proportional to the square of the velocity. Crashes, however, appear to depend less on speed and more on the variation in speeds. The likelihood of a crash occurring is significantly greater for motorists traveling at speed slower and faster than the mean speed of traffic.
Maximum speed limits are set for ideal road, traffic, and environmental conditions.
Para simplificar para os monoglotas, os pontos mais relacionados com o post são: 1- motoristas em sua maioria dirigem nas condições que acham corretas (mesmo que a lei dite condições diferentes), 2- um limite de velocidade deve ser aplicado onde a maioria dos motoristas o respeite de forma voluntária, de forma que a força da lei deve ser aplicada contra quem foge deste comportamento e 3- a velocidade escolhida pelo motorista para tráfego pode impor riscos aos demais usuários da via, mas é o diferencial de velocidades entre os carros da via que têm mais relação com acidentes do que as velocidades altas em si.
É racional que, sendo completamente necessária a criação de leis, acatar as escolhas dos indivíduos a respeito da forma de dirigir é bem melhor do que tomar uma decisão "que invariavelmente será um pouco arbitrária"; assim, se pode definir uma velocidade máxima de tráfego com exatidão, diminuir o risco de diferenciação de velocidades, reduzir os casos de excesso de velocidade, ter uma lei e um limite que serão mais aceitos pelos motoristas e economizar tempo e dinheiro.
*(Leia após ler todo o post) definida especificamente pela inexatidão de estudos que não levam as escolhas individuais, dentro de um coletivo, em consideração, que são as verdadeiras determinantes do que é prático ou não.
Talvez na Alemanha, nas condições de lá, com os motoristas de lá"
O ataque ao excesso de velocidade é, muitas das vezes, uma bobagem sem fundamentos. Só que, mesmo com fundamentos, ainda resta a dúvida, "por que lá na Alemanha não é possível?".
Aqui realmente não é possível, mas é muito mais interessante moldar a situação para que o impossível se torne possível do que fazer com que o que pode ser possível nunca seja possível.
O excesso de velocidades, em si, é o alvo errado.