Agora, passando ao aprofundamento acerca do assunto da tecnologia que foi "uma solução à espera de um problema". Pesquisa em que a ferramenta foi feita para um propósito específico, para o qual, depois, foram encontradas aplicações que nem eram sonhadas na época. Esse é o caso do laser, do computador e da internet, por exemplo. Esse também foi um dos assuntos abordados por Taleb no seu livro e vejamos como ele argumentou...
Segundo ele, mesmo nesses casos, apesar de a ciência acadêmica ter tido alguma utilidade nesse percurso (já que muitas dessas tecnologias dependem da ciência na maior parte dos aspectos), ela em nenhum momento contribuiu para definir a direção. Em cada passo relevante, a ciência serviu apenas para descobertas causais em ambientes opacos, com praticamente nenhum ocupante.
Exemplos? As aplicações do computador de tempos antigos só estavam suficientemente difundidas no gerenciamento de banco de dados, sendo boas, apenas, para processar grande quantidade de informações. Aí veio o processamento de texto, e o computador decolou por conta dessa adaptação, particularmente com o microcomputador. E aí, depois disso, veio a internet. Ela foi concebida para que os EUA sobrevivessem à um ataque militar generalizado como um resistente dispositivo de rede de comunicação militar. Mas, depois com a soma do PC e da internet, chegamos a invenção das redes sociais.
Voltando ao caso do laser, uma das aplicações iniciais do laser estava a sutura cirúrgica das retinas descoladas. Mas quando a
The Economist perguntou a Charles Townes, inventor do laser, se ele tinha isso em mente, a resposta dele foi que estava satisfazendo o desejo de dividir raios de luz, e só. Mas, depois disso, vieram aplicações em CDs, correções de visão, microcirurgia, etc.
Além da questão de a ciência formal normalmente estar ausente na definição da direção, existem casos em que os cientistas receberam créditos que o levaram a fama paradoxal de "ornitólogos que ensinaram os pássaros a voar". O caso do motor a jato citado em
Antifrágil (p.284) é descrito assim:
Scracton demonstrava que temos construído e utilizado motores a jato de maneira completamente experimental, por tentativa e erro, sem que ninguém realmente compreenda a teoria. Os construtores precisavam dos engenheiros originais, que sabiam como acionar as coisas para fazer o motor funcionar. A teoria veio depois, de um modo débil, para satisfazer o intelectual obcecado em números. Porém, isso não é o que se costuma ler nas histórias sobre tecnologia: meu filho, que estuda engenharia aeroespacial, não estava ciente disso.
Vejam que, no caso acima, apesar do conhecimento dos físicos acerca da natureza já estava bem avançado (o motor a jato foi inventado em 1937), a inovação tecnológica foi uma realização de "tecnólogos construindo tecnologia" ou da "ciência amadora".
Claro, alguém vai mencionar que, em física pura, teorias são utilizadas para gerar teorias com alguma validação empírica. Tomar por base derivações teóricas levou à descoberta do Bóson de Higgs. Relatividade de Einstein e derivação da existência do planeta Netuno também entram nessa categoria. Mas isso só acontece abundantemente em física e em campos de conhecimento que se chamam de "lineares".
Todavia, em "campos não-lineares", que lidam com sistemas dinâmicos complexos (o que inclui a engenharia da tecnologia de ponta), o objeto de estudo é uma espécie de caixa preta. Veja o caso da medicina, por exemplo. Para ela, serve a fenomenologia, o método baseado em evidências, apoiado menos em teorias biológicas e mais na catalogação de regularidades empíricas. Métodos mais simples para prognóstico e inferência podem funcionar melhor do que os complexos. As pessoas querem “mais informações” para resolver problemas. Todavia, mais informações podem incluir epifenômenos que se possa imaginar como causas: análise complexa de causas em sistemas dinâmicos complexos é altamente frágil e sujeita a erros, essa é uma das coisas mais importantes que Taleb tentou demonstrar nos seus livros sobre incerteza mais recentes. Por exemplo, por muito tempo não se soube porque restrição de carboidratos ajuda na redução de massa gorda. Hoje, sabemos que é devido a melhora na sensibilidade à insulina (esse é tido como um hormônio fertilizante de gordura), mas não saber disso não impedia que alguém se beneficiasse da dieta muito antes da derivação teórica mencionada. E isso também não impede que, no futuro, apareça outra teoria que explique melhor o fenômeno da remoção da adiposidade excessiva. Eis então a explicação de que as teorias científicas em campos não-lineares são frágeis são frágeis, elas mudam de tempos em tempos, mas as catalogações das regularidades empíricas são robustas quanto ao teste do tempo.