- Engenheiros de Simulação seriam capazes de desenvolver softwares de modelagem computacional sem conhecimento de matemática e física;
O exemplo que você pôs foi sobre computação, cujos origem e desenvolvimento eu já tinha comentado no segundo post do tópico. Eu disse que, apesar de a ciência ter tido alguma utilidade nesse percurso, já que a tecnologia computacional depende da ciência na maior parte de seus aspectos, em nenhum momento a ciência acadêmica contribuiu para ajudar a definir a direção, tendo servido só para descobertas casuais em um ambiente opaco, com praticamente nenhum ocupante. O processo permaneceu auto-orientado e imprevisível em cada uma de suas etapas. Logo, nenhum mérito da ciência básica nesse aspecto.
- Engenheiros Civis seriam capazes de dosar concretos de alta resistência sem conhecer métodos de dosagem amplamente estudados e testados em laboratório;
Sem laboratório de ciência algum, os engenheiros romanos da Antiguidade, famosos pelos seus aqueodutos, construíram obras durabilíssimas feitas de concreto:
https://gizmodo.uol.com.br/segredo-concreto-romano-indestrutivel
- Engenheiros de Materiais seriam capazes de estimar a vida útil de materiais sem a utilização de métodos que foram desenvolvidos baseados no conhecimento de mecanismos de degradação, como corrosão e fadiga;
Como eu já disse, engenheiros da Idade Antiga e da Idade Média já fizeram o papel de engenheiros de materiais amadores e fizeram isso eficazmente para determinados materiais:
As coisas sofisticadas inventadas sem teorias acadêmicas de universidades são impressionantes. Vejam os objetos arquitetônicos como as pirâmides e as belas catedrais da Europa. Nenhum teorema...E os construtores conseguiam descobrir a resistência dos materiais sem as equações que temos hoje. De acordo com o historiador de ciência medieval Guy Beaujouan, antes do século XIII, não mais que cinco pessoas em toda a Europa sabiam como fazer uma operação de divisão. Também vale mencionar que os engenheiros romanos construíram aqueodutos sem matemática alguma (isto é, análise quantitativa de fórmulas).
- Engenheiros Hidráulicos poderiam ser capazes de calcular o escoamento de fluidos sem utilizar mecânica dos fluidos;
Engenheiros romanos da Antiguidade construíram aqueodutos impressionantes sem ter qualquer livro de mecânica de fluidos disponível.
- Engenheiros Mecânicos seriam capazes de determinar com precisão os efeitos causados por impactos em carros sem precisar fazer análise dinâmica;
Nunca se testou essa teoria em ambientais medievais, pois não existiam automóveis na Idade Média ou nas eras anteriores. Mas os medievais não precisaram estudar dinâmica na universidade para construir armaduras de soldados eficazes, em que as armas de corte raramente penetravam e as de impacto eram defletidas em suas curvaturas.
Engenheiros Estruturais poderiam hoje calcular prédios de mais de 100 andares sem ter estudado teoria de estruturas.
"Teorias" da Engenharia Civil são aproximadamente tão teorias científicas quanto às "teorias" da culinária. Especialistas em culinária, mesmo aqueles com formação na Universidade de Havard, não fizerem a retroengenharia do sabor da comida observando o rótulo com as informações nutricionais. De modo análogo, o que se questiona na Engenharia Civil não é sua eficácia, mas sim a existência de um efeito contundente da chamada "base epistemológica" (conceito de Joel Mokyr), isto é, um corpo de teorias a partir do qual outras teorias podem ser diretamente derivadas. Eu já expliquei isso neste tópico no post de 17 de Setembro de 2019, 22:17:40.
Mas quanta baboseira!
Veja que mencionei Engenheiro de Simulação, e não Computação. A função de um Engenheiro de Simulação não é desenvolver sistemas computacionais, mas desenvolver softwares para simular o comportamento de determinados fenômenos físicos, coisa que só é possível com conhecimento de matemática e física.
Se uma empresa está desenvolvendo um novo modelo de celular, existem basicamente duas formas de saber qual o dano que aquele celular vai sofrer com uma queda de x metros:
1. Fabricar e jogar o celular da altura x e avaliar os estragos;
2. Simular computacionalmente a queda do celular da altura x e calcular com certa precisão os efeitos.
Na primeira opção, a empresa teria que fabricar uma série de celulares diferentes e estragá-los até chegar em um modelo ideal, que seja capaz de resistir à altura x. Já na segunda, a empresa poderia simular diversas possibilidades em um software de modelagem e fazer o teste uma única vez para confirmar se o processo teórico está correto.
Porém, para o desenvolvimento do software capaz de efetuar tais modelagens, seria necessário:
1. conhecimento em programação, obviamente;
2. conhecimento do comportamento dos componentes que compõem o celular e como eles se interagem - atrito, deformação, tensões, elasticidade.
3. conhecimento sobre dinâmica de impacto;
4. capacidade de desenvolver modelos matemáticos que descrevem com exatidão os itens 2 e 3;
5. capacidade de desenvolver um algoritmo que permita implementar os modelos matemáticos descritos pelo item 4.
Se você pedir para um TI qualquer que manja de programação escrever um algoritmo que calcula o impacto de corpos inelásticos com comportamento não linear anisotrópico, ele muito provavelmente não vai saber. Então por isso a necessidade de alguém com conhecimentos específicos.
Quanto aos outros comentários, não vejo necessidade de responder um por um, já que a resposta foi basicamente a mesma: "engenheiros romanos da antiguidade faziam coisas semelhantes"
Não, não faziam. Primeiro que nem sei se é correto chamá-los de engenheiros. Empilhar pedras não é engenharia. Construir 100 casas diferentes onde uma vai ficar de pé e depois usar essa casa como padrão para reproduzir outras não é, nem de longe, qualquer coisa próxima da engenharia que é praticada hoje.
Engenharia é um processo de previsão e otimização. É eu saber, antes mesmo de construir, qual é a carga máxima que uma ponte suporta. E caso eu altere a geometria da ponte, posso responder essa mesma pergunta apenas com cálculos, sem a necessidade de construir uma nova ponte para testar.
O exemplo do Engenheiro de Simulação que mencionei se aplica perfeitamente bem à qualquer engenharia hoje. A função do engenheiro hoje não é só empilhar blocos para que um prédio de 10 andares fique de pé, mas testar diferentes posicionamentos de pilares, dimensões, quantidade de aço, resistência, dosagem, etc, para que o prédio suporte, com o menor custo possível, as ações que estará sujeito - peso próprio, efeitos do vento, sismos, etc.
Teoria de Estruturas (que você compara com teorias da culinária) é basicamente física e matemática aplicada.
Isso é um memorial de cálculo de um edifício:
https://www.eec.ufg.br/up/140/o/PROJETO_DE_UM_EDIF%C3%8DCIO_DE_NOVE_PAVIMENTOS_EM_ALVENARIA_ESTRUTURAL_-_COMPLETO.pdfIsso é uma norma de estruturas de concreto:
https://docente.ifrn.edu.br/valtencirgomes/disciplinas/construcao-de-edificios/abnt-6118-projeto-de-estruturas-de-concreto-procedimentoOs critérios e fórmulas que você enxerga não foram inventados. São baseados em estudos e pesquisas científicas. Qualquer Engenheiro hoje é obrigado a dimensionar de acordo com a norma.
O fato de engenheiros romanos desenvolverem objetos duráveis é irrelevante. Para o engenheiro não basta construir uma coisa durável. Um pedreiro pode fazer isso, simplesmente construindo uma casa gastando quantidades absurdas de material, de modo que ela vai provavelmente durar. O engenheiro, por outro lado, deve saber responder QUANTO TEMPO vai durar aquilo que ele construiu. Mesmo construções como pontes e barragens, possuem um tempo de vida útil estimado. Se você gasta mais para fazer algo que vai durar mais do que deveria, você está sendo ineficiente. E a única maneira de estimar a durabilidade de alguma coisa é conhecendo processos químicos e físicos de degradação, assim como a capacidade de aplicar estimativas de cálculo que permitem prever a degradação de determinado material sob certas condições ambientais de temperatura, umidade, presença de CO2 no ar, e por aí vai.