E como você poderia ter a certeza que ele atingiu de fato a iluminação, livre de orgulho, da fraqueza ou do vício? Como você poderia ter a certeza que o ensinamento do Dharma que você imploraria é o caminho correto sem partir para uma aposta bobinha baseada na fé e na esperança?
Na verdade, eu não poderia ter essa certeza, o que não me causa estorvo - o próprio Sidarta já alertava que se deve questionar tudo, inclusive as tradições filosóficas e religiosas (algo que ele mesmo fez) e a própria postura passiva e servil de "seguir alguém" vai contra a ideia de independência, sabedoria e esclarecimento de um iluminado. Mas, como disse o mais alto iniciado (Cristo): "pelos seus frutos os conhecereis". A obra, as decisões, atitudes e palavras de um buscador são a prova viva que podemos observar da validade de seus ensinamentos. Assim identifiquei a veracidade do conhecimento do meu falecido professor Arnoldo Vieira, do Lectorium, que me ensinou a alta tradição iniciática que defendo filosoficamente como portadora de verdades eternas situadas acima das limitações conceituais e linguísticas do pensamento concreto. Infelizmente, a maior parte de minhas tentativas de expor essas doutrinas transcendentes aqui no fórum foi frustrada pelo recorrente vício neurolinguístico dos foristas de tentar apreender estes ensinamentos por meio do pensamento concreto convencional, sempre tomando tudo literalmente, ao invés de entender que símbolos se dirigem ao pensamento abstrato, não ao convencional, e fábulas se dirigem ao conhecimento intuitivo, não ao convencional, e mística se dirige ao coração, não ao cérebro. Entretanto, alguns aqui se tornaram tão atrofiados nas esferas da experiência humana situadas além do pensamento objetivista que, quando se lhes apresenta Mona Lisa, vão dizer "são apenas moléculas de tinta num pedaço de madeira!!", ou, se lhes apresenta uma poesia, vão dizer "isso é só um monte de letras e palavras!!", ou, se lhes apresenta uma música, vão dizer "Isso são só umas frequências de ondas sonoras!!".
Quando se tenta apreender o
Tao Te King, a
Doutrina de Buda, os
Fragmentos de Heráclito, o
Corpus Hermeticum, as
Enéadas de Plotino, entre outros, com o pensamento embotado convencional cotidiano, então os ensinamentos soam absurdos. Soam absurdos porque são julgados por uma interpretação absurda. A interpretação é absurda porque tenta ler convencionalmente o que não é convencional. Você não deve ler essas obras com pensamento convencional pelo mesmo motivo que você não deve ler um artigo científico como se fosse uma prosa, e nem ouvir uma música como se ouve um discurso político. São esferas diferentes da experiência humana, que requerem ferramentas diferentes de observação e interação.
Quando um ateu ouve "Pai nosso que estás no céu, santificado seja vosso nome", ele se pergunta:
Que pai? Em que céu? Tá onde? Por que santificar? Qual é o nome?
Ele não entende que está lidando com outra dimensão da natureza humana. Ele quer levar tudo para o lado científico-objetivo-concreto e, fazendo isso, atrofia parte de sua natureza humana. Devido a sua interpretação errada, ele mesmo está projetando as quimeras caricatas e absurdas que ele mesmo terá de refutar depois.
Quando tiver de orar, simplesmente ore. Quando tiver que fazer um artigo científico, faça um artigo científico. Quando tiver que ouvir música, ouça música. Quando tiver de meditar, medite. Quando tiver de comer, coma, e depois lave a tigela.