Autor Tópico: Chamar a crença dos outros de "muleta"  (Lida 5926 vezes)

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Offline AlienígenA

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Re:Chamar a crença dos outros de "muleta"
« Resposta #75 Online: 18 de Fevereiro de 2018, 01:02:51 »
O contexto é o mesmo - a realidade que nos cerca, melhor compreendida nos poucos séculos de pesquisa científica, graças a desmistificação, do que nos muitos séculos de contemplação filosófica e temor religioso, dos quais só me interessa a história. Há dimensões da natureza humana que acho preferível evitar, se possível.
Você está confundindo mistificação com misticismo, e experiência mística não tem nada a ver com mistificação ou temor religioso, apesar dos termos serem parecidos ou, no imaginário leigo, invocarem imagens semelhantes. Agora, independente disso, suas palavras parecem confirmar minha tese ao dizer "melhor compreendida por poucos séculos de pesquisa científica". Ou seja, no quesito "compreender", a pesquisa científica é o método adequado. Este é um contexto, uma esfera/dimensão. Da mesma forma, eu poderia dizer - "o contexto é a realidade que nos cerca, melhor embelezada nos longos séculos de arte e poesia do que nos poucos séculos de pesquisa científica". Isso provaria que Arte é superior e devemos descartar a Ciência? Não! Mas que Arte e Ciência são diferentes esferas/dimensões do homem, que se aplicam com fins e meios diferentes. Para ser cientista ou pelo menos estudar ciência, você precisa de parar de pintar, compor ou escrever? Não. Para pintar, compor e escrever, é necessário recusar o empirismo e a ciência? Muito menos! É a mesma coisa com a experiência mística. Dizer que só se pode ser apenas artista, ou cientista, ou filósofo, ou místico, é apenas limitar a si mesmo, mutilar parte de sua potencialidade e enfiar sobre si um rótulo de como deve pensar e agir. Veja bem - minha intenção aqui não é converter ninguém, até porque nem teria "para onde" converter - não tenho religião, não creio em divindades. O Gigaview postou um link de um sujeito chamado Penn Jillette como sendo "o primeiro ateísta que ora". Admiro este tipo de coisa. Isso é um pedacinho do que significa não ser limitado. Meu professor de Mahayana é um monge da escola Sotozen e é ateu e cético, e não ensina nada de supersticioso, mistificador ou anticientífico. Artista é antônimo de cientista? Não. Filósofo é antônimo de místico? Não. É para isso que estou apontando. Liberdade plena e esclarecimento é o que você possui entre o momento em que você abandona um sistema de crenças e dogmas e o segundo em que você se enquadra novamente sob novos vícios de linguagem, pensamento e comportamento. Meu objetivo não é atacar o ateísmo ou converter alguém em filósofo e místico, mas atacar o preconceito contra a experiência do místico e do sagrado - que de vez em quando cria raízes no pensamento embotado de materialistas.

Para deixar claro, não acho que seu intuito seja converter alguém aqui e sim debater temas que você considera úteis e que acha que ateus rejeitam por preconceito. Citei essa recorrente tentativa de conversão sofrida apenas para enfatizar que não se trata de preconceito, uma opinião concebida sem exame crítico, mas o contrário. Quero dizer, é um tema tão debatido que já quase se esgotou.

Bom, estou me atendo ao significado usual dos termos, se há alguma confusão aí não consegui identificar. Quando digo desmistificação quero dizer refutação do misticismo. Nesse sentido, experiência mística tem tudo a ver com mistificação.

Insisto que há somente um contexto - a realidade, pois é sobre a qual o místico faz alegações e que não podem ser verificadas pela ciência, que é a melhor ferramenta de que dispomos para compreender a realidade, promovendo assim, o ceticismo - a incompatibilidade é evidente. Já a analogia com a arte, por exemplo, não procede porque essa é apenas uma forma de expressão.

Dificilmente a experiência mística vai ser vista por aqui como uma experiência positiva, pelo simples fato de que não é possível distingui-la de ilusão, alucinação, auto engano - situações que induzem ao erro. Para o cético, que só aceita como fato o que pode ser verificado, rejeitando que não pode, até prova em contrário, a experiência mística é para lá de questionável. Para dar um exemplo, embora sem relação com o misticismo propriamente - sabemos que a Terra gira em torno de si mesma e do Sol, porque isso foi verificado, embora nos pareça que a Terra é estática e o Sol é que gira em torno dela. Se decidíssemos confiar na nossa intuição e percepção da realidade, desconsiderando a questão do misticismo em torno do geocentrismo, talvez ainda estivéssemos na Idade Média.

O maior problema do misticismo é que ele raramente é algo isolado, inofensivo, quase sempre vem atrelado as noções de absoluto, transcendental, sagrado, universal - podendo gerar distorções morais hediondas - bastando que o objeto de adoração seja algo bizarro como, por exemplo, um deus que envia seu filho para, através do flagelo, salvar a humanidade da ira dele. Resultado: cruzadas e rituais sádicos, com gente sendo torturada, queimada viva e escravizada, para deleite dos verdadeiros cristãos, tudo justificado, claro, em nome do amor. Isso é doentio!

Tudo de que precisamos para um desenvolvimento físico, intelectual, moral e emocional saudáveis é disciplina, com base na empatia e observação, com uma boa dose de ceticismo para sabermos medir as consequências de nossos atos. Valores devem ser refletidos. É o que distingue bons de maus valores.

Deus abençoe o ceticismo!  :)
 

Offline Fernando Silva

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Re:Chamar a crença dos outros de "muleta"
« Resposta #76 Online: 18 de Fevereiro de 2018, 08:04:18 »
Como não acredita? Cético é o antônimo de místico. São pensamentos incompatíveis. Uma coisa necessariamente exclui a outra
Por que? Se você agir de forma cética no contexto em que isso é exigido, e agir de forma mística no contexto em que isso é exigido, qual a incompatibilidade? A incompatibilidade só surge em agir de forma cética ou mística em todos os contextos, que é quando alguém se torna incapaz de experimentar esta ou aquela dimensão do ser humano
Em qual contexto é necessário agir de forma mística?

Não seria arrogância dizer que alguém é "incapaz de experimentar isto ou aquilo" sem antes ser capaz de provar que tal experiência é real?

No dia em que conseguirem provar objetivamente que tais dimensões existem, o cético as reconhecerá sem problema.

Offline montalvão

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Re:Chamar a crença dos outros de "muleta"
« Resposta #77 Online: 18 de Fevereiro de 2018, 18:32:27 »
Não poderia discordar mais de alguns ateus e materialistas que gostam de chamar as crenças dos outros de muleta. Não é muito mais fácil crer que se vem do nada, do nada, e se volta para o nada? Isso sim, me soa muito mais como uma muleta, do que pensar que se tem toda a eternidade pela frente, e que há de se deparar com as consequências de cada erro e pecado.


Você distingue erro de pecado, tudo bem, mas deveria definir o que entende por um e outro. São palavras de sentido vago e amplo, que podem ser aplicadas sob diversas denotações e conotações.

Por exemplo: errar é mau, mas pode trazer boas consequências se do erro se extraírem lições produtivas, então, errar pode ser bom...

E o pecado, o que se pode dizer dele? Certamente, muitas coisas e, a depender de quem dele fale, vamos encontrar ideações díspares a respeito. A teologia cristã cunhou termos que categorizam o substantivo, daí temos: pecado mortal, pecado venial, pecado imperdoável...(apesar de quê, protestantes não adotam esse pensamento): “portanto, digo-vos eu, se fordes pecar pequeis venialmente, pois ainda chance tereis diante do tribunal” (este sou eu no meu transe profético mensal). Já outras visões místicas sequer laboram com o conceito de pecado...

E o que foi dito do "erro" resultar em acerto também se aplica ao pecado. Imagine um sujeito nervosão que por qualquer coisinha já sai dando porrada nos outros. Um dia encontra quem inda mais nervoso e que o janta no cacete. Se o indivíduo tirar lição do acontecido se arrependerá dos pecados cometidos e se tornará outra pessoa, nova criatura.

É fato que ENFRENTAMOS as consequências de nossos atos, e não precisa da eternidade para isso: aqui mesmo, neste planeta de provas e expiações, a todo momento vivenciamos o resultante de que realizamos precedentemente. Desse modo, a não ser que a eternidade seja aqui  e dure o período de uma vida, desnecessário se faz o apelo ao desconhecido para sabermos que “o que o homem semear isso também ceifará” (este não fui eu quem disse, foi “ele” NSJC...).

Por outro lado, há “consequências” que não advêm diretamente de meu comportamento. Digamos que eu passe o dia inteiro em casa, deitado no sofá assistindo televisão, à tardinha resolvo ir ao mercado. Quando estou chegando no destino um desembestado me atropela e me pincha no chão! E aí, qual foi meu pecado para ter sofrido tal catástrofe? Se quiser responder faça-o em contexto verificável, não vá dizer, por exemplo, que pequei numa outra existência e minha pena nesta vida seria o atropelamento. Essa é explicação que nada explica, pois não pode ser conferida.



Offline montalvão

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Re:Chamar a crença dos outros de "muleta"
« Resposta #78 Online: 18 de Fevereiro de 2018, 19:53:40 »
Não se pode generalizar. Uns precisam da muleta, outros não.
Como alguém me disse, depois de debater sobre o meu ateísmo: "Concordo com o que você disse, mas não estou pronto para abandonar minha fé".

Da mesma forma, um ateu diria para Gautama:

"Concordo com o que você disse, mas não estou pronto para abandonar meu comodismo, meu conformismo, meu orgulho, meus vícios, minha arrogância, minha prepotência, meu pseudointelectualismo...."

Há muletas e muletas...

Muito "curiosa" a concepção que o Criso tem dos ateus...

Offline criso

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Re:Chamar a crença dos outros de "muleta"
« Resposta #79 Online: 18 de Fevereiro de 2018, 20:56:21 »
Muito "curiosa" a concepção que o Criso tem dos ateus...
Nietzche e Platão estão mais longe dos homens comuns do que estes dos macacos. Qual a característica humana mais universal: o medo ou a preguiça? Somos todos ateus com os deuses dos outros...
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Offline montalvão

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Re:Chamar a crença dos outros de "muleta"
« Resposta #80 Online: 18 de Fevereiro de 2018, 21:12:34 »
Pós-modernismo é o anti-logos em ação. Nas artes, na filosofia, no comportamento e sobretudo na linguagem, onde o sofisma reina absoluto sobre a Razão, todos os debates são conduzidos pelos intestinos e os conceitos divorciadas de qualquer substancia.

?!

Offline montalvão

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Re:Chamar a crença dos outros de "muleta"
« Resposta #81 Online: 18 de Fevereiro de 2018, 21:15:56 »
Apenas os ateus têm moral. Eles sabem que ela é necessária para possibilitar a vida em sociedade. Podem justificar racionalmente cada uma das regras.

Já os religiosos têm mandamentos. Alguns se justificam, já que foram copiados da moral do grupo em que sua religião surgiu, mas outros são arbitrários: "Deus mandou, a gente obedece, não precisa entender". Com essa obediência cega, justificam-se os maiores crimes.

Falou e disse! :ok:

Offline montalvão

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Re:Chamar a crença dos outros de "muleta"
« Resposta #82 Online: 18 de Fevereiro de 2018, 21:54:38 »
 
Citação de: Horacio
Pós-modernismo é o anti-logos em ação. Nas artes, na filosofia, no comportamento e sobretudo na linguagem, onde o sofisma reina absoluto sobre a Razão, todos os debates são conduzidos pelos intestinos e os conceitos divorciadas de qualquer substancia.

Esses intestinos que conduzem debates foram previamente esvaziados?


Citação de: Horacio
Criso, a felicidade é minha também por voce ter aberto um tópico sobre um tema da máxima prioridade.

Realmente:  a criatividade do Criso é admirável (e aqui não vai nenhuma facécia)!


Citação de: Horacio
Dialogar e aprender com correntes de pensamento diferentes da nossa é uma arte em extinção, nossa cultura está obviamente na rota da intolerancia e do dogmatismo num momento em que mais do que nunca o que precisamos é do oposto.
Porém, a questão cabeluda a ser enfrentada é como lidar com correntes de pensamento cujo objetivo é precisamente anular o direito à existencia e manifestação das correntes divergentes, que é precisamente o caso do pós-modernismo.
O relativismo e o sócio-construtivismo nega esse direito simultaneamente às religiões, à ciencia, à filosofia, ao materialismo, ao idealismo, pregando que devemos simplesmente nos lançar ao fluxo de narrativas desconexas sem nos preocupar com detalhes inuteis como a natureza, direção ou destino desse fluxo, seja ele nossa salvação ou destruição, que são obviamente conceitos relativos e socialmente construidos.


Deveras e sem dúvida alguma: o problema moderno é o pós-modernismo, que nos nega tanto que em face do maior zelo eu tanto me encanto quanto me espanto que dele posso dizer que não seja eterno, posto que é chama, mas que seja infinito enquanto dure!

O pós-modernismo é tão ingente praga que vai do Gênesis ao Apocalipse sem solução de continuidade.

Mas tal já estava previsto nos escritos sacrognósticos,  eis que no Livro dos Quatro Mistérios se lê: “ao pós-modernismo sucederá o expressionismo confuso-difuso e então virá o fim!”.

Acautelai-vos, pois, naquele dia vos direi: afastai-vos de mim vós que verborrajais babelices: eu nunca vos compreendi!


Citação de: Horacio
É o verdadeiro elefante na sala que surpreendentemente tão pouca atenção recebe nesse clube.

Essa deve ser paquidermicamente supimpa! Eu conheço a do, na sala, bode... um amigo meu sabe a do, no mesmo aposento, boi...

Offline montalvão

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Re:Chamar a crença dos outros de "muleta"
« Resposta #83 Online: 18 de Fevereiro de 2018, 22:16:04 »
Citar
Vou inventar algum rótulo pra não ter que dar satisfações para ninguém. A partir de hoje sou neo-martinista-estoico-platônico-racionalista-idealista-sinárquico-popperiano-weishauptiano-illuminati-outsider-aleatório-etc...

O rótulo é grande demais. Que tal simplesmente "crente erudito"?

Que tal simplesmente "etc."?

Offline montalvão

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Re:Chamar a crença dos outros de "muleta"
« Resposta #84 Online: 18 de Fevereiro de 2018, 23:44:18 »
Você está confundindo mistificação com misticismo, e experiência mística não tem nada a ver com mistificação ou temor religioso, apesar dos termos serem parecidos ou, no imaginário leigo, invocarem imagens semelhantes.

A raiz das expressões é a mesma, porém os significados são distintos, portanto  confundi-los é equivocado. Mistificação é engodo, tramoia, safadeza. Já místico (“praticante” do misticismo) é quem ALEGA vivenciar experiência transcendental. Pode também ser conceituado como tal o indivíduo que BUSCA essa experiência,  ou seja, uma relação direta com as potestades celestes (que são muitas!).


Citação de: criso
Agora, independente disso, suas palavras parecem confirmar minha tese ao dizer "melhor compreendida por poucos séculos de pesquisa científica". Ou seja, no quesito "compreender", a pesquisa científica é o método adequado. Este é um contexto, uma esfera/dimensão. Da mesma forma, eu poderia dizer - "o contexto é a realidade que nos cerca, melhor embelezada nos longos séculos de arte e poesia do que nos poucos séculos de pesquisa científica". Isso provaria que Arte é superior e devemos descartar a Ciência? Não! Mas que Arte e Ciência são diferentes esferas/dimensões do homem, que se aplicam com fins e meios diferentes. Para ser cientista ou pelo menos estudar ciência, você precisa de parar de pintar, compor ou escrever? Não. Para pintar, compor e escrever, é necessário recusar o empirismo e a ciência? Muito menos! É a mesma coisa com a experiência mística. Dizer que só se pode ser apenas artista, ou cientista, ou filósofo, ou místico, é apenas limitar a si mesmo, mutilar parte de sua potencialidade e enfiar sobre si um rótulo de como deve pensar e agir.

Assino embaixo, quase sem ressalvas. Concordo que um cientista pode ser místico,  sem problema algum, a história tem vários exemplos de mentes brilhantes que participavam ativamente do contato com mortos e outras ocultices. Porém, o que penso estar na pauta não são facetas  das inclinações humanas, sim se há como acatar firmadamente alegações místicas em face de sua irreplicabilidade. A resposta curta e grossa: NÃO!

Você, por exemplo, pode aparecer aqui no CC com o rosto resplandecente de felicidade, transfigurado, e ante a questão:  o que houve? A resposta fosse: “tive uma experiência oceânica, me vi cara a cara com Deus! Por um instante compreendi todos os mistérios e todas as ciências!”.

Então, indago: qual a utilidade dessa vivência subjetiva em termos da produção de saber?

Se achar quem legitime seu depoimento este o fará por simpatia não por verificação objetiva da fidedignidade do relato.

Em outras palavras, pode ser que o todo-poderoso o tenha bafejado com essa ventura, mas,  dada a impossibilidade de fiscalizar o que noticia, seu encontro com o divino beneficiará somente o sortudo, mais ninguém! Deve ser como ganhar sozinho na mega, só que o tesouro  é celestial: valioso por toda eternidade!

Infelizmente, não é desse modo que se produz lídimo conhecimento...  :'(
« Última modificação: 19 de Fevereiro de 2018, 10:53:13 por montalvão »

Offline Fernando Silva

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Re:Chamar a crença dos outros de "muleta"
« Resposta #85 Online: 19 de Fevereiro de 2018, 07:46:12 »
E o pecado, o que se pode dizer dele? Certamente, muitas coisas e, a depender de quem dele fale, vamos encontrar ideações díspares a respeito. A teologia cristã cunhou termos que categorizam o substantivo, daí temos: pecado mortal, pecado venial, pecado imperdoável...(apesar de quê, protestantes não adotam esse pensamento): “portanto, digo-vos eu, se fordes pecar pequeis venialmente, pois ainda chance tereis diante do tribunal” (este sou eu no meu transe profético mensal). Já outras visões místicas sequer laboram com o conceito de pecado...
Pecado é transgredir um preceito religioso, portanto depende do contexto.
Aquilo que é pecado numa religião pode ser virtude em outra.

Offline AlienígenA

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Re:Chamar a crença dos outros de "muleta"
« Resposta #86 Online: 19 de Fevereiro de 2018, 08:56:14 »
Você está confundindo mistificação com misticismo, e experiência mística não tem nada a ver com mistificação ou temor religioso, apesar dos termos serem parecidos ou, no imaginário leigo, invocarem imagens semelhantes.

A raiz das expressões é a mesma, porém os significados são distintos, portanto  confundi-los é equivocado. Mistificação é engodo, tramóia, safadeza. Já místico (“praticante” do misticismo) é quem ALEGA vivenciar experiência transcendental. Pode também ser conceituado como tal o indivíduo que BUSCA essa experiência,  ou seja, uma relação direta com as potestades celestes (que são muitas!).

Mistificação também significa ilusão - delírio, fantasia, devaneio - mas a questão aqui vai além da semântica. Quem admite que a ciência é o método adequado para compreender a realidade, mas se recusa a submeter ao crivo científico o que lhe convém não está sendo intelectualmente honesto, pois deixa subentendido que está ciente de não ser possível distinguir experiência mística de ilusão. E, no mínimo, excede ao acusar de preconceituosos aqueles que não partilham da mesma opinião. Então o significado que você trouxe talvez se enquadre melhor.

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Citação de: criso
Agora, independente disso, suas palavras parecem confirmar minha tese ao dizer "melhor compreendida por poucos séculos de pesquisa científica". Ou seja, no quesito "compreender", a pesquisa científica é o método adequado. Este é um contexto, uma esfera/dimensão. Da mesma forma, eu poderia dizer - "o contexto é a realidade que nos cerca, melhor embelezada nos longos séculos de arte e poesia do que nos poucos séculos de pesquisa científica". Isso provaria que Arte é superior e devemos descartar a Ciência? Não! Mas que Arte e Ciência são diferentes esferas/dimensões do homem, que se aplicam com fins e meios diferentes. Para ser cientista ou pelo menos estudar ciência, você precisa de parar de pintar, compor ou escrever? Não. Para pintar, compor e escrever, é necessário recusar o empirismo e a ciência? Muito menos! É a mesma coisa com a experiência mística. Dizer que só se pode ser apenas artista, ou cientista, ou filósofo, ou místico, é apenas limitar a si mesmo, mutilar parte de sua potencialidade e enfiar sobre si um rótulo de como deve pensar e agir.

Assino embaixo, quase sem ressalvas. Concordo que um cientista pode ser místico,  sem problema algum, a história tem vários exemplos de mentes brilhantes que participavam ativamente do contato com mortos e outras ocultices. Porém, o que penso estar na pauta não são facetas  das inclinações humanas, sim se há como acatar firmadamente alegações místicas em face de sua irreplicabilidade. A resposta curta e grossa: NÃO!

Você, por exemplo, pode aparece aqui no CC com o rosto resplandecente de felicidade, transfigurado, e ante a questão:  o que houve? A resposta fosse: “tive uma experiência oceânica, me vi cara a cara com Deus! Por um instante compreendi todos os mistérios e todas as ciências!”.

Então, indago: qual a utilidade dessa vivência subjetiva em termos da produção de saber?

Se achar quem legitime seu depoimento este o fará por simpatia não por verificação objetiva da fidedignidade do relato.

Em outras palavras, pode ser que o todo-poderoso o tenha bafejado com essa ventura, mas,  dada a impossibilidade de fiscalizar o que noticia, seu encontro com o divino beneficiará somente o sortudo, mais ninguém! Deve ser como ganhar sozinho na mega, só que o tesouro  é celestial: valioso por toda eternidade!

Infelizmente, não é desse modo que se produz lídimo conhecimento...  :'(


Cientistas não precisam ser céticos, a ciência sim, mas o cético não pode ser místico, pois uma coisa anula a outra - a não ser que se atribua um significado muito particular aos termos que os desconfigurem.

Offline criso

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Re:Chamar a crença dos outros de "muleta"
« Resposta #87 Online: 19 de Fevereiro de 2018, 13:46:37 »
Em qual contexto é necessário agir de forma mística?
No contexto místico, ora. Assim como é no contexto científico que se deve agir de forma científica. Quando você está transando, você por acaso pára e diz para sua parceira -  "obtivemos sucesso na seleção natural!", "vamos levar nossos genes adiante!!" "nossos gametas estão se encontrando!!!". Acho que não. Seria um pouco fora de contexto, certo? A experiência da sexualidade, por exemplo, é uma dimensão própria do homem, onde absolutamente não se aplicam argumentos e falácias filosóficas, ou teses e discussões científicas. O que é diferente, por exemplo, da reflexão sobre a sexualidade (que ocorre na dimensão filosófica do homem), ou do estudo da sexualidade (que se dá na dimensão da ciência), só que ambos não são a experiência sexual em si, apesar de a estudarem e interpretarem. E, neste caso, você é como uma mulher que quer alcançar o orgasmo, mas o procura escutando teoremas sobre gametas, genes e reprodução. Por isso, está fatalmente condenado ao fracasso.
Não seria arrogância dizer que alguém é "incapaz de experimentar isto ou aquilo" sem antes ser capaz de provar que tal experiência é real?
Quem disse foi você mesmo - que nunca sentiu necessidade de orar e que nunca experimentou nada de sagrado ou transcendente. Quando você me pede para provar que é real (e, com "real", espera algo objetivo, externo, medido, científico e empiricamente testado) então saiba que vai se frustrar terrivelmente. Não porque a experiência mística não seja real (e o é, mais até do que a experiência convencional e cotidiana da realidade), mas porque ela ocorre dentro de você, e não fora. Da mesma forma, a Arte não é real. Você poderia muito bem escutar uma música e dizer "isso é apenas um monte de sons e silêncios, frequências, ondas, não passa disso", ou olhar para um quadro e dizer "isso são apenas umas moléculas de tinta sobre um pedaço de madeira", ou escutar alguém declamando poesia e dizer "é só um monte de carbono falando um monte de coisa com coisa". A Arte não está fora de você. Ela não tem existência real, externa, objetiva. A Arte acontece dentro de você. A Experiência Sexual acontece dentro de você. O Amor mesmo acontece dentro de você. Por isso, o que te separa da experiência mística é uma barreira que existe dentro de você mesmo. Outra dimensão do homem, por exemplo, é a Moral. Se você vê sua casa em chamas e adentra correndo para resgatar seus filhos, que você ama, e que estão dentro, você está agindo pela dimensão/esfera da Virtude, do Amor, etc. Se você parasse e pensasse de forma biológica, científica, talvez concluísse "ah, a tristeza que vou sentir vão ser só alguns hormônios, nada além disso" e "ah, minhas capacidades reprodutivas estão intactas, posso fazer mais alguns descendentes para levar meus genes adiante", ou "ah, analisando os riscos e benefícios, o mais provável é que seríamos todos queimados e mortos, então é mais matematicamente conveniente ficar aqui seguro e deixá-los perecer". Acontece que a Virtude é uma dimensão própria do homem, e mais, a Virtude é mais importante do que a Ciência. Ciência sem Virtude faz bombas de hidrogênio, não pela ciência ser má, mas por tornar-se um instrumento na mão de homens maus. Já Virtude, mesmo sem Ciência, é suficiente para justificar a efêmera e dolorosa existência humana.
Então, indago: qual a utilidade dessa vivência subjetiva em termos da produção de saber?
Qual a utilidade da Arte? da Moral? da Virtude? da Beleza? do Bem? "Utilidade" é um termo muito frio, morto, calculado. O que é útil e inútil? O que ajuda a mover a máquina do nosso regime socioeconômico é útil? Ou é inútil? Novas fórmulas, produtos, tecnologias, são úteis? Sempre? Quando penso nisso, toda a atividade humana não me parece essencialmente diferente do comportamento animal. As mais avançadas tecnologias nos elevam, na melhor das hipóteses, ao nível de "superchimpanzé". O reino do verdadeiro espírito, do verdadeiro artista, do santo, do filósofo, é raramente alcançado. Por que tão poucos? Por que a história do mundo e da humanidade não é uma história de progresso e realização, mas uma fútil e infindável adição de zeros? Nenhum grande valor se estabeleceu, os gregos há 3000 anos atrás eram tão avançados quanto somos. Quais são essas barreiras que impedem as pessoas de chegarem sequer perto de seu real potencial?
Infelizmente, não é desse modo que se produz lídimo conhecimento...
Infelizmente, não é desse modo que se produz orgasmo... disse a mulher frustrada, achando que o alcançaria lendo sobre gametas e sistemas reprodutivos em livros de biologia. Infelizmente, não é dessa forma que se produz beleza... disse o músico frustrado, para quem todos os seus acordes não passavam de vibrações de ondas mecânicas... Infelizmente, não é dessa forma que se produz virtude... disse o pai que preferiu deixar os filhos queimando até a morte porque seria matematicamente inconveniente se arriscar. Ciência produz conhecimento. Se o seu objetivo for produzir conhecimento, recorra à Ciência. E, quando estiver neste contexto, utilize sempre meios e ferramentas científicos. Existem outras esferas/dimensões do homem que estão além do "conhecimento" e da "utilidade". Aliás, existem coisas até mesmo mais importantes do que conhecimento e utilidade, como o Amor e a Virtude, por exemplo. Por isso, nem tudo é conhecimento e utilidade. Quem procura conhecimento e utilidade na experiência mística constrói, ele mesmo, a grande barreira interna, e planta as sementes de sua falha. Seria um erro tão grande quanto procurar orgasmos em aulas de darwinismo, ou procurar beleza em amontoados de tinta e carbono. A barreira entre um indivíduo e a experiência mística está dentro de si mesmo, no preconceito estabelecido que se ergue como o muro que traça os limites da própria experiência da realidade.
não está sendo intelectualmente honesto, pois deixa subentendido que está ciente de não ser possível distinguir experiência mística de ilusão. E, no mínimo, excede ao acusar de preconceituosos aqueles que não partilham da mesma opinião. Então o significado que você trouxe talvez se enquadre melhor.
O significado que ele trouxe foi de "engodo, tramoia, safadeza". É realmente isso o que pode ser interpretado de minha participação aqui? São essas as intenções projetadas sobre meu discurso? Se assim for, me resta encerrar minha participação no tópico, não mais enxergando de que forma poderia estar contribuindo para vossas interpretações, entendimentos e pós-conceitos a cerca da Mística, mas certo de que tentei e fiz minha parte.
Cientistas não precisam ser céticos, a ciência sim, mas o cético não pode ser místico, pois uma coisa anula a outra - a não ser que se atribua um significado muito particular aos termos que os desconfigurem.
“The finest emotion of which we are capable is the mystic emotion. Herein lies the germ of all art and all true science. Anyone to whom this feeling is alien, who is no longer capable of wonderment and lives in a state of fear is a dead man. To know that what is impenetrable for us really exists and manifests itself as the highest wisdom and the most radiant beauty, whose gross forms alone are intelligible to our poor faculties – this knowledge, this feeling... that is the core of the true religious sentiment. In this sense, and in this sense alone, I rank myself among profoundly religious men.” (Einstein)
« Última modificação: 19 de Fevereiro de 2018, 16:33:22 por criso »
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Offline Fernando Silva

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Re:Chamar a crença dos outros de "muleta"
« Resposta #88 Online: 19 de Fevereiro de 2018, 14:40:42 »
Não porque a experiência mística não seja real (e o é, mais até do que a experiência convencional e cotidiana da realidade), mas porque ela ocorre dentro de você, e não fora. Da mesma forma, a Arte não é real. Você poderia muito bem escutar uma música e dizer "isso é apenas um monte de sons e silêncios, frequências, ondas, não passa disso", ou olhar para um quadro e dizer "isso são apenas umas moléculas de tinta sobre um pedaço de madeira", ou escutar alguém declamando poesia e dizer "é só um monte de carbono falando um monte de coisa com coisa". A Arte não está fora de você. Ela não tem existência real, externa, objetiva.
A arte existe, é real e palpável, seja ela tinta numa tela ou ondas sonoras. O que varia de uma pessoa para outra é a reação a uma determinada amostra de arte.

Quando falamos de misticismo, não temos nada de palpável, apenas conceitos e crenças. Tudo bem, podemos falar que, assim como a música e a pintura, tais conceitos e crenças provocam efeitos em algumas pessoas, mas acontece que a arte é um fim em si mesma: produzir algo belo e agradável que será recebido através de nossos 5 sentidos. Se funcionar para nós, ótimo, caso contrário, podemos ignorar.
Já o misticismo implica em "tem que fazer, tem que acreditar, tem que mudar de vida, eu tive uma iluminação, falei com Deus ou com o Universo e trago a verdade que você tem que aceitar".
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Em qual contexto é necessário agir de forma mística?
No contexto místico, ora.
Este contexto não existe para mim. Não se aplica à minha vida.

Offline criso

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Re:Chamar a crença dos outros de "muleta"
« Resposta #89 Online: 19 de Fevereiro de 2018, 16:00:34 »
A arte existe, é real e palpável
"Arte" não existe. É uma representação que se processa dentro da sua consciência. Fora da sua consciência a realidade é um oceano incognoscível de energia, vibração, ondas e forças cósmicas acima da sua compreensão. A arte, bem como todas as identidades por meio do qual o pensamento convencional interage com a realidade que experimenta cotidianamente, não possui existência intrínseca fora da sua mente.
O que varia de uma pessoa para outra é a reação a uma determinada amostra de arte
Não apenas isso, mas até mesmo o que é arte ou não, porque o que existe fora de você é o que existe fora de você - ondas, partículas, energia, vibração, apenas isso. No momento em que você olha para um amontoado destas coisas - ou melhor, para uma pequeníssima fração interpretada e simulada pelos seus sentidos - e chama de "arte", esse movimento ocorre dentro da sua percepção, e não fora. Fora, continua sendo um amontoado de energia, vibração e ondas. Essa é a natureza última e verdadeira da realidade. O resto é o que nós mesmos construímos e, convencionalmente, entramos em consenso para facilitar nossa interação uns com os outros e com o mundo.
Quando falamos de misticismo, não temos nada de palpável, apenas conceitos e crenças
Quando falamos de arte, não temos nada de palpável, apenas conceitos e crenças. A própria arte em si é um conceito e uma crença. Uma música? frequências sonoras. Uma pintura? Cores e luzes. Uma poesia? Amontoado de letras. O momento em que essas coisas se tornam "arte" é o momento em que a sua consciência, que PARA ARTE não possui barreiras nem preconceitos, é capaz de organizar estes conteúdos na forma de padrões com significado, e é aí que nasce a "arte", dentro de você e não fora de você.
mas acontece que a arte é um fim em si mesma: produzir algo belo e agradável que será recebido através de nossos 5 sentidos
Esse é o fim que você mesmo atribui para a arte. Arte, em si, é um conceito. E mais, é um conceito vazio. E mais, é vazio como todos os outros conceitos, porque todos os conceitos são representações desprovidas de substância. São representações do mundo, e não o mundo. Aliás, até o fim que você atribui é questionável - e as tragédias? e as dissonâncias na música? e as rupturas e transgressões poéticas? Deixam de ser arte por não serem belas e agradáveis? Talvez deixem, mas só vão deixar dentro de você, assim como algo só se torna arte dentro de você mesmo.
Já o misticismo implica em "tem que fazer, tem que acreditar, tem que mudar de vida, eu tive uma iluminação, falei com Deus ou com o Universo e trago a verdade que você tem que aceitar"
Dizendo isso, você diz mais sobre você mesmo (e sobre a sua relação interna e psicológica com o sagrado) do que sobre o misticismo. Isso significa que, na verdade, isso tudo é o que você atribui ao misticismo. Misticismo, para você, significa isso. E, após projetar estas imagens sobre um conceito vazio, você refuta, recusa e rejeita estas mesmas imagens, pensando com isso estar refutando o misticismo, quando no fundo está apenas recusando seu próprio conceito de sagrado e transcendente...
Este contexto não existe para mim. Não se aplica à minha vida.
Quer você diga que sim, quer você diga que não, das duas maneiras você estará correto. Nenhum ser humano reage diretamente à realidade última, mas ao seu universo psicológico representativo e mapa conceitual e linguístico, que possui o mesmo tamanho das experiências e observações que fez em vida. Em outras palavras, suas experiências e conhecimentos determinam o limite de sua apreensão da realidade, e este limite determina as esferas e dimensões que você é capaz de acessar. A experiência do sagrado, como qualquer outra, ocorre dentro de você, e não fora. Por isso, o erro ateu-materialista no trato com o sagrado não é um erro lógico, mas um erro epistemológico. Por fim, você mesmo determina do que você necessita e desnecessita, e se você acordar de manhã e decidir que arte é isso e aquilo (conforme quiser projetar), e que não sente falta de arte, e que arte não existe, e que é inútil, e refutar, recusar e rejeitar a arte com toda a convicção do mundo, tudo que vai conseguir com isso é expulsar a arte de você mesmo, porque sua existência nunca se deu externamente. Enfim, com outras palavras, a arte continuará com a mão estendida, eternamente paciente e esperando em abnegação absoluta por sua reconciliação, pelo religare. A experiência direta e pessoal da arte permanecerá latente, como um botão de rosa, em estado de potência, por "infindáveis kalpas", até que você perceba que sua tarefa não é buscá-la, mas simplesmente buscar e encontrar dentro de si mesmo todas as barreiras que você construiu contra ela. Para quem é iniciado na ciência das analogias, não tenho mais nada a dizer. Para quem reclama que certas coisas são pessoais, internas e intransferíveis, lhes resta pensar em todas as outras que também o são. Assim sendo, encerro minha atividade por aqui e expresso meus mais sinceros votos de que as rosas floresçam em vossas cruzes.
« Última modificação: 19 de Fevereiro de 2018, 16:05:56 por criso »
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e que as rosas floresçam em vossa cruz!

Offline Gorducho

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Re:Chamar a crença dos outros de "muleta"
« Resposta #90 Online: 19 de Fevereiro de 2018, 17:04:18 »
(e sobre a sua relação interna e psicológica com o sagrado)
"Sagrado" é um conceito já místico que só tem sentido dentro desse tipo de arcabouço mental.
Quem não é místico não "tem relação" com algo que considera inexistente a priori.
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Por isso, o erro ateu-materialista no trato com o sagrado
Por que alguém "trataria com" algo que não tem a mínimo motivo pra supor que exista dentro do universo real (não-solipsista)  :?:

Offline AlienígenA

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Re:Chamar a crença dos outros de "muleta"
« Resposta #91 Online: 19 de Fevereiro de 2018, 18:31:25 »
O significado que ele trouxe foi de "engodo, tramoia, safadeza". É realmente isso o que pode ser interpretado de minha participação aqui? São essas as intenções projetadas sobre meu discurso? Se assim for, me resta encerrar minha participação no tópico, não mais enxergando de que forma poderia estar contribuindo para vossas interpretações, entendimentos e pós-conceitos a cerca da Mística, mas certo de que tentei e fiz minha parte.

Honestamente, eu não sei, por isso mesmo disse talvez. Algumas vezes seu intuito parece ser apenas expor ideias, mas outras, quando confrontado, sobretudo, adota um tom impositivo. Tudo que posso afirmar é que tenho dificuldade de compreendê-lo. Você diz, por exemplo, que concorda que a ciência é a melhor ferramenta para compreender a realidade. E como se sabe a ciência trabalha com evidências. Disso seque que não é possível distinguir misticismo de ilusão, já que não há evidências. Contudo, chega a repreender quem não faz tal distinção. E aí enfia arte, filosofia e não sei quê mais na cartola para tirar de lá uma explicação pós-moderna (brincadeirinha) do porquê dos materialistas terem o pensamento embotado.


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Cientistas não precisam ser céticos, a ciência sim, mas o cético não pode ser místico, pois uma coisa anula a outra - a não ser que se atribua um significado muito particular aos termos que os desconfigurem.
“The finest emotion of which we are capable is the mystic emotion. Herein lies the germ of all art and all true science. Anyone to whom this feeling is alien, who is no longer capable of wonderment and lives in a state of fear is a dead man. To know that what is impenetrable for us really exists and manifests itself as the highest wisdom and the most radiant beauty, whose gross forms alone are intelligible to our poor faculties – this knowledge, this feeling... that is the core of the true religious sentiment. In this sense, and in this sense alone, I rank myself among profoundly religious men.” (Einstein)

Será por isso que, apesar de sua genialidade, Einstein reagiu com estupor ao Princípio da Incerteza?  :?

Offline montalvão

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Re:Chamar a crença dos outros de "muleta"
« Resposta #92 Online: 19 de Fevereiro de 2018, 22:54:12 »
Criso,

Creio que vai gostar desse sujeito: ele se diz ateu... e reencarnacionista!

Offline montalvão

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Re:Chamar a crença dos outros de "muleta"
« Resposta #93 Online: 20 de Fevereiro de 2018, 01:33:19 »
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Citação de: criso
Quando você está transando, você por acaso pára e diz para sua parceira -  "obtivemos sucesso na seleção natural!", "vamos levar nossos genes adiante!!" "nossos gametas estão se encontrando!!!". Acho que não. Seria um pouco fora de contexto, certo?

Se for o Sheldon Cooper o contexto será esse que descreve. Só não entendi a declaração de sucesso na seleção natural...

Por outro lado, se houver o  uso de camisinha aí o contexto perde o sentido.

Mas, não seria difícil que um biólogo com pendores poéticos propusesse à sua parceira de sexo casual: “gentil dama permita-me depositar um exemplar de espermatozóide meu num óvulo seu?”



Citação de: criso
Quem disse foi você mesmo - que nunca sentiu necessidade de orar e que nunca experimentou nada de sagrado ou transcendente. Quando você me pede para provar que é real (e, com "real", espera algo objetivo, externo, medido, científico e empiricamente testado) então saiba que vai se frustrar terrivelmente.

A oração, a reza, intercessão, o apelo à potestade... é real. Sentir ou não necessidade de orar é real. Neste caso o conceito de “realidade” não é o que está em xeque. O que se questiona é o alegado  efeito místico da oração. No sentido trivial do termo, ou seja, o de enviar petição ao poder superior a oração é ato absurdo. E olha que quem lhe diz isso já foi grande apelador aos céus. Muitas noites varei desperto rogando ao Senhor que solucionasse encrencas.
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A única oração que funciona, e funciona só para quem ora, é a que reconhece a incapacidade de modificar o que está além do poder do homem de interferir em algum acontecimento. Essa conversa de oração de cura,  de elucidação de encrencas, enfim, de ficar pedindo coisas a Deus,  nada disso faz sentido, mesmo assim, enquanto lhe escrevo estas linhas milhões estarão apelando ao Chefão para que cure, modifique, melhore qualquer situação!
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Pense cá comigo: se existe Deus e ele for o que se diz: onipotente, onipresente, onisciente, significa que é o ser soberano, cuja vontade predomina acima de qualquer outra. Sendo assim, seus desígnios são inalteráveis e não será lamentação, por mais dorida e contrita que se formate, que o levará a modificar o que tem estipulado. Se Deus quiser que eu morra de câncer de câncer morrerei e nem um milhão de apelos mudará minha sina.
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Desse modo, na acepção comum do que seja oração, orar é jogar seus bônus-hora no lixo!

Por outro lado, se quiser fazer uma oração legal, diga (caso acredite “nele”): Papai do Céu, valeu por permitir que eu chegasse até aqui. Câmbio, desligo.


Citação de: criso
Não porque a experiência mística não seja real (e o é, mais até do que a experiência convencional e cotidiana da realidade), mas porque ela ocorre dentro de você, e não fora.

Disse  grande verdade: a experiência mística é vivência psíquica, por exemplo:  toda viagem fora do corpo é uma viagem dentro do cérebro.


Citação de: criso
Da mesma forma, a Arte não é real. Você poderia muito bem escutar uma música e dizer "isso é apenas um monte de sons e silêncios, frequências, ondas, não passa disso", ou olhar para um quadro e dizer "isso são apenas umas moléculas de tinta sobre um pedaço de madeira", ou escutar alguém declamando poesia e dizer "é só um monte de carbono falando um monte de coisa com coisa". A Arte não está fora de você. Ela não tem existência real, externa, objetiva. A Arte acontece dentro de você. A Experiência Sexual acontece dentro de você. O Amor mesmo acontece dentro de você.

Você está correto, arte é denominação genérica destinadada a categorizar coisas que, em graus variados, sensibilizam o ser humano. A arte em si é abstração conceitual, não tem existência concreta.  Mas, quando o conceito se consubstancia em algo definido, aí passa a ser real: uma canção, uma pintura, escultura, poesia... mesmo que eu dissesse da música que se trata de mera sucessão de sonoridades intercaladas por silêncios ela não deixaria de ser real, perscrutável, analisável, apreciável...

A experiência sexual acontece dentro, mas há algo que se externaliza no processo... se é que me entende...

O amor é que nem o tempo na concepção agostiniana: quando dele falo penso que sei ao que estou me referindo, mas se tento explicá-lo percebo que não sei o que dizer...


Citação de: criso
Por isso, o que te separa da experiência mística é uma barreira que existe dentro de você mesmo.

O que nos separa de ter ou não  experiências místicas é a inclinação pessoal para vivenciar tais deleites. Quem se compraz em sentir esses tremores vai buscá-los avidamente; já quem não tenha interesse, seja por preferir outras percepções, seja por dificuldades em produzir o clima psicológico necessário, não se esforçará por ingressar em tal seara. Alegar que a vivência mística é algo mais real que a realidade é apenas frase de efeito: sem evidências satisfatórias de que se trata de “fenômeno transcendental” (sim, sei que a expressão é incongruente) por mais que a sensação gratifique a quem a experimenta nada acrescentará em favor da transcendentalidade!


Citação de: criso
Outra dimensão do homem, por exemplo, é a Moral. Se você vê sua casa em chamas e adentra correndo para resgatar seus filhos, que você ama, e que estão dentro, você está agindo pela dimensão/esfera da Virtude, do Amor, etc. Se você parasse e pensasse de forma biológica, científica, talvez concluísse "ah, a tristeza que vou sentir vão ser só alguns hormônios, nada além disso" e "ah, minhas capacidades reprodutivas estão intactas, posso fazer mais alguns descendentes para levar meus genes adiante", ou "ah, analisando os riscos e benefícios, o mais provável é que seríamos todos queimados e mortos, então é mais matematicamente conveniente ficar aqui seguro e deixá-los perecer". Acontece que a Virtude é uma dimensão própria do homem, e mais, a Virtude é mais importante do que a Ciência. Ciência sem Virtude faz bombas de hidrogênio, não pela ciência ser má, mas por tornar-se um instrumento na mão de homens maus. Já Virtude, mesmo sem Ciência, é suficiente para justificar a efêmera e dolorosa existência humana.

Sinto desapontá-lo, mas moral e virtude são conceitos relativizáveis, que vagam ao sabor das regras definidas pelas diversas culturas. Vários comentaristas aqui já disseram mais ou menos isso, mas parece que não ouviu: moral varia conforme o tempo e a geografia. Durante muitos séculos a maioria dos povos sacrificavam animais aos deuses, isso era moral, não fazê-lo seria imoral. Certas civilizações foram mais além, imolavam crianças, virgens e escravos, para elas o procedimento era moral. A escravidão até recentemente era considerada moral. A ideia de que algumas nacionalidades  ou etnias sejam superiores a outras é por muitos (e põe muitos nisto) tido como natural, portanto moral. O infanticídio foi prática comum de variadas culturas, inclusive os gregos, pais da filosofia, não viam nada de imoral em jogar no penhasco bebês que não fossem aprovados pelos sacerdotes. Na atualidade, vários países admitem uniões pedófilas: adultos casando e copulando com meninas de oito, nove anos! Não veem qualquer imoralidade nisso...

E tem mais, a concepção de virtude e a moral é passível de ser modificada entre indivíduos de uma mesma sociedade por fatores variados. Um pouco mais de testosterona circulando num corpo periga transformar o sujeito num devasso. Acidentes, com certa frequência, modificam as pessoas, tanto para o lado bom quanto para o outro.

Até mesmo situações agradáveis/desagradáveis são capazes de induzir pessoas a relativizarem a moral que seguiam.

Imagine casal e um filho. Vão numa sexta à noite fazer um lanchinho fora. A criança decide dar seu showzinho de pirraça e volta pirraceando até o apartamento onde moram. A mãe exasperada dá umas sacudidelas no menino e, acidentalmente o joga sobre a quina de um móvel e ele bate a cabeça mortalmente. Após choro e lamentação e mulher percebe que será presa e entra em pânico. O marido diz que não vai perder o filho e a esposa. Então combinam simular um acidente e jogam o corpo da criança pela janela...

Outra: mãe solteira de dois filhos encontra um namorado que lhe parece ser o que sempre sonhou: rapaz atencioso, generoso, carinhoso, de boa situação financeira. Não vê hora de firmarem o compromisso, mas, para a decepção da moça o sujeito diz que a considera muito, porém não quer assumir filhos que não sejam gerados por ele. Desesperada ante a expectativa de perder a grande chance a mãe põe os filhos dentro do carro e vai dar um passeio. Na beirada de uma lagoa tranca o veículo, com as crianças dentro,  e o joga dentro da lagoa. Em seguida, registra queixa do desaparecimentos dos filhos.

Coisas assim acontecem com mais frequência que gostaríamos de ouvir...


Então, indago: qual a utilidade dessa vivência subjetiva em termos da produção de saber?

Citação de: criso
Qual a utilidade da Arte? da Moral? da Virtude? da Beleza? do Bem? "Utilidade" é um termo muito frio, morto, calculado. O que é útil e inútil? O que ajuda a mover a máquina do nosso regime socioeconômico é útil? Ou é inútil? Novas fórmulas, produtos, tecnologias, são úteis? Sempre? Quando penso nisso, toda a atividade humana não me parece essencialmente diferente do comportamento animal. As mais avançadas tecnologias nos elevam, na melhor das hipóteses, ao nível de "superchimpanzé". O reino do verdadeiro espírito, do verdadeiro artista, do santo, do filósofo, é raramente alcançado. Por que tão poucos? Por que a história do mundo e da humanidade não é uma história de progresso e realização, mas uma fútil e infindável adição de zeros? Nenhum grande valor se estabeleceu, os gregos há 3000 anos atrás eram tão avançados quanto somos. Quais são essas barreiras que impedem as pessoas de chegarem sequer perto de seu real potencial?


Comentarei melhor essa parte adiante, por ora retruco:  não me parece que os gregos de 3.000 anos passados fossem tão “avançados” quanto nós: em que sentido diz isso? Seja como for, meu comentário teve outro direcionamento: falei que experiências pessoais (subjetivas) não geram saber coletivizável, mas posso estar equivocado, se estiver me corrija e serei grato.

Offline Pedro Reis

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Re:Chamar a crença dos outros de "muleta"
« Resposta #94 Online: 20 de Fevereiro de 2018, 08:03:30 »
Citação de: criso
Não porque a experiência mística não seja real (e o é, mais até do que a experiência convencional e cotidiana da realidade), mas porque ela ocorre dentro de você, e não fora.

Toda essa dedicação do criso só para convencer os céticos de uma coisa que já estão mais do que convencidos.

Offline biscoito1r

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Re:Chamar a crença dos outros de "muleta"
« Resposta #95 Online: 25 de Fevereiro de 2018, 22:04:26 »
Nunca entendi essa de ter o ateísmo como filosofia de vida. Ateísmo nada mais é do que uma resposta a uma afirmação. Como é que a falta de algo pode ser muleta. A muleta simplesmente não existe.
O comentário original é cheio de estereótipos que já foram refutados a anos, mais uma variação de "não há moral sem Deus". Eu tenho que arcar com as consequências dos meus atos no mundo real, se eu causo dano a uma pessoa e sinto remorso, eu teria que ir lá e tentar reparar o mal que eu cometi e não simplesmente pedir perdão ao um homem mágico, isso sim é muleta.
Be ashamed to die until you have won some victory for humanity

Offline Fernando Silva

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Re:Chamar a crença dos outros de "muleta"
« Resposta #96 Online: 26 de Fevereiro de 2018, 07:56:34 »
Nunca entendi essa de ter o ateísmo como filosofia de vida. Ateísmo nada mais é do que uma resposta a uma afirmação. Como é que a falta de algo pode ser muleta. A muleta simplesmente não existe.
O ceticismo pode ser visto como uma filosofia de vida, já o ateísmo é apenas uma consequência do ceticismo.
Uma vez provada a existência de algum deus, o ateísmo desaparece, mas o ceticismo pode permanecer.

Offline Sergiomgbr

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Re:Chamar a crença dos outros de "muleta"
« Resposta #97 Online: 17 de Novembro de 2018, 19:57:51 »
Não poderia discordar mais de alguns ateus e materialistas que gostam de chamar as crenças dos outros de muleta. Não é muito mais fácil crer que se vem do nada, do nada, e se volta para o nada? Isso sim, me soa muito mais como uma muleta, do que pensar que se tem toda a eternidade pela frente, e que há de se deparar com as consequências de cada erro e pecado. Não é muito mais fácil achar que tudo é relativo, que não exista Moral, Razão ou Logos do que ter de orientar todas as suas decisões e atitudes conforme a providência de um permanente e onipresente all-seeing eye? E ainda tem gente que, no cúmulo da arrogância e autoafirmação, vem chamar a crença dos outros de muleta. Gente racional que nega uma Razão Universal, gente com consciência moral que nega uma Moral Transcendental, gente que acredita na Ciência e em Leis e que nega a existência de um logos ou princípio ordenador do cosmos, e que depois chama a crença dos outros de muleta...

Afinal, para um pequeno ser humano, frágil, vulnerável e confuso como é, não soam muito mais terríveis as visões da Eternidade, da Razão, da Moral e da Justiça do que a aposta no acaso, na sorte e no nada, que expressam com muito mais fidelidade nossa condição e mais secreto desejo ao nos confrontarmos com o absurdo e com o incognoscível? Como disseram as últimas palavras de Kierkegaard: "Varra-me de uma vez"...
Quem implica com a crença dos outros  salvo esteja sendo perseguido por essa crença não são ateus, as pessoas descrentes. Essa gente que você supõe ser racional não o é de fato, muito menos acredita na "Ciência, se não tão só quando ela sustenta suas próprias convicções, trata-se sim de pessoas com ideologias nefastas que vêem a crença dos outros como uma barreira à propagação de suas ideologias.

Não se ache menor por suas crenças para além das próprias proposições inerentes delas. Siga suas convicções o quanto puder sustentá-las sem prejuízo para outrem e pronto. Quem tenta miná-las não merece crédito.
« Última modificação: 17 de Novembro de 2018, 20:01:04 por Sergiomgbr »
Até onde eu sei eu não sei.

 

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