Eu estou falando se caso o PT implante de vez o comunismo no Brasil.
Vão dizer que sou muito confiante, mas sem chance. Tá mais fácil uma intervenção militar. Tem apoio para isso, não. Vai ter mais gente graúda contra do que a favor.
Não se trata apenas de enfrentar uma oposição graúda, a agenda comunista - se existisse - teria pela frente 3 tipos de obstáculos intransponíveis:
1 - A existência de uma oposição graúda.
2 - A inexistência de apoio graúdo.
3 - A inexistência de apoio miúdo.
(1)Você já falou da oposição: o Brasil é um dos maiores países do mundo e uma das maiores economias do mundo, um país estratégico territorialmente e em relação a seus recursos.
É virtualmente incalculável em sua dimensão, os interesses privados ( nacionais, estrangeiros e mistos ), que seriam radicalmente afetados até mesmo por políticas, digamos, um pouco mais socialistas; no sentido de serem em algum grau restritivas a investimentos, mercado de capitais, empresas, agronegócio e até instituições religiosas. Obviamente estes setores da sociedade, aliados a um poderoso apoio externo, mobilizariam uma força esmagadora contra aspirações dessa natureza.
Não foi possível em 1935, não foi possível em 1964. No século 21 não deveria ser possível nem imaginar.
(2)O socialismo no Brasil nunca teve realmente muita chance.
Porém, no séc. 20, foi muito mais fácil ter fé no comunismo do que é possível hoje, e existiram muitos que viram no socialismo um belo e realizável ideal. Havia pessoas simpáticas ao comunismo em todas as classes, mais notadamente entre os intelectuais. Estes comunistas tupiniquins, embora falhassem em conquistar apoio popular à causa, tiveram todo o apoio GRAÚDO do bloco de países comunistas. Nada mais, nada menos, que o apoio da URSS; um império que dominava meio mundo.
Com quem contariam hoje os comunistas?
(3)Tão determinante como os dois fatores anteriores, é a impossibilidade hoje ( e pro futuro ) de uma proposta de sociedade comunista parecer atraente a alguma parcela significativa da população. Marx teorizou que a revolução nunca poderia ser feita de cima para baixo, e nisso a História mostrou que ele estava certo. Sem mobilização das massas uma elite de intelectuais não tem capacidade pra fazer a "revolução", e esse sempre foi o maior problema da esquerda no Brasil. Não da esquerda, mas especificamente dos projetos de revolução marxista.
O texto abaixo descreve o tipo de realidade de onde o Marxismo do século 19 obteve a vitalidade necessária para impulsionar gigantescos movimentos proletários, que eventualmente no século 20 tornariam possível a revolução bolchevique.
As casas se localizavam nas proximidades das indústrias, estradas de ferro e rios, fontes de fumaça, barulho e poluição. Nas cidades industriais surgidas a partir de cidades antigas, os trabalhadores passavam a habitar casas de famílias antigas transformadas em cortiços. Cada quarto passou a abrigar uma família toda (prática realizada em Glasgow, na Escócia e Dublin, na Irlanda, até o início do século XX). Era comum, também, o congestionamento de camas onde dormiam de três a oito pessoas de idades diferentes. Pobres e privados de seus antigos referenciais culturais, os trabalhadores urbanos tendiam a formar uniões instáveis que acabaram por alterar a sociabilidade vigente, transformando a população dos cortiços em pessoas com padrões éticos diferentes dos de suas aldeias rurais de origem.
A sujeira era enorme tanto nos novos como nos velhos bairros operários.
As novas casas eram construídas com materiais baratos sem alicerces. Na Inglaterra, em cidades como Birmingham e Bradford, as casas foram construídas de parede-meia, dois em cada quatro quartos não recebiam luz nem ventilação. Em cidades marítimas, de grande importância econômica por causa dos portos, os porões subterrâneos eram utilizados como moradias. O Relatório sobre o Estado das grandes Cidades e dos Distritos Populosos de 1845 informava que em Manchester (Inglaterra) cerca de 7000 pessoas utilizavam apenas 33 privadas.
Se a gente pensar no capitalismo do séc. 19, nesse contexto o que o marxismo propunha fazia bastante mais sentido. A atividade econômica era infinitamente menos diversificada que hoje. A maior indústria era a têxtil, onde cada fábrica empregava milhares de trabalhadores. Não havia direitos, garantias, e o que se pagava mal dava para a sobrevivência em condições sub-humanas. A classe média era um grupo relativamente pequeno, então havia uma massa enorme de operários e camponeses vivendo como animais, e as necessidades das pessoas se resumiam basicamente a vestuário, alimentação, habitação, saúde e educação.
Ninguém tinha necessidade ou desejo de ter energia elétrica, linha telefônica ou automóvel. Estas coisas ainda não estavam disponíveis e a variedade de bens de consumo era muito limitada. De modo que a grande massa de trabalhadores se encontrava "pasteurizada" sob condições de vida muito semelhantes, constituindo uma classe bem definida e de certa forma homogênea, que partilhava anseios comuns.
Não há aqui intenção de trocadilho, mas quando há 7 mil pessoas compartilhando 33 privadas, a propriedade privada é quase um conceito abstrato.
Consequentemente o marxismo não exigia muita renúncia e oferecia algo razoável: trabalhadores obterem os meios de produção, e irmanados por necessidades e desejos semelhantes, produzirem aquele pouco que era necessário a uma vida considerada digna.
Bom, esse é 1º X da questão: o proletariado não existe mais. Nós podemos classificar a população por níveis de renda mas dentro de um mesmo nível, a diversidade de estilos de vida, estruturas familiares, atividades econômicas, formas de moradia, desejos e necessidades é infinita! Não há uma massa de operários e camponeses, mas o "proletariado" moderno é composto por webdesigners, produtores de pornô, motoristas de uber, passeadores de cachorros, camelôs, cuidadores de idosos, youtubers, marceneiros, músicos, fabricantes de caixas orgônicas... uma diversidade interminável, e quantos destes "proletários" não são na verdade empreendedores, e portanto de certa forma capitalistas donos de seu próprio negócio ou serviço? Na verdade todos destas atividades citadas são.
A percepção da recente reforma trabalhista é um termômetro dessa nova realidade. Um grande número de trabalhadores estava simplesmente alheio porque a legislação trabalhista já não se aplica às suas relações de trabalho, e um outro grande nº era favorável por desejar maior autonomia de negociação. E aí sindicatos e partidos tentam se colocar como defensores dos direitos dos trabalhadores, mas o que se vê é que ironicamente poucos se sentem representados.
Então vem o 2º X dessa questão: esse "proletariado" não desejaria mais ser ditador pela inexistência de um denominador comum definidor dessa ditadura, porque o único real denominador comum do moderno proletariado é o desejo essencialmente capitalista de prosperar e consumir. Diferentemente do séc. 19, tanto a propriedade privada quanto a própria iniciativa privada estão disseminadas nas classes de baixo nível de renda. Portanto os sacerdotes da religião marxista hoje pregam em igrejas vazias.
Não há mais como o comunismo obter o amplo apoio popular, o apoio dos pequenos, o
"apoio miúdo". Ainda existem os fracos e oprimidos, e são maioria, mas o comunismo oferece pouco a estes enquanto deles exige muitas renúncias.
Mas, se a volta do comunismo no séc. 21 é tão viável quanto a volta do feudalismo, porque tem gente perdendo o sono com isso?
Porque um movimento conservador está botando o medo desse fantasma em cabecinhas de crianças impressionáveis!
O comunismo para os conservadores é o que o judeu foi para o nazismo: um inimigo inventado, no qual se podia pôr a culpa de todos os males, necessário para unir a sociedade em torno da causa nazi-fascista e dar uma explicação a problemas que eram na verdade estruturais. Sim, o que existe na verdade é uma agenda conservadora, e faz parte dessa agenda construir o mito absurdo da "agenda comunista".
Não por coincidência, mas exatamente tudo que os conservadores gostariam de reverter na sociedade está sendo atribuído a uma suposta conspiração comunista estendendo seus tentáculos invisíveis por todos os compartimentos sociais. Mas é impossível que valores e costumes sejam os mesmos de 50 anos atrás, com todas as transformações profundas que ocorreram. É como querer que os valores e costumes do Império Romano se mantivessem intactos depois do seu esfacelamento. Da mesma forma que, na revolução industrial, os padrões éticos da antiga população rural se perderam e deram lugar a novos, o homem de hoje está no meio do processo de uma profunda e acelerada revolução. A mais profunda e acelerada de toda a História, e não é necessária nenhuma conspiração para explicar um fenômeno que faz parte de todas as revoluções tecnológicas que alteram estruturalmente uma sociedade.
Além de tudo o chavismo caiu como uma luva nessas teorias conspiratórias.
Pelo amor de deus!, a Venezuela não pode ser usada como um alerta da ameaça comunista porque é exatamente o oposto. A Venezuela ( juntamente com Cuba, Nicarágua e Coreia do Norte ) é a prova da inviabilidade de existir uma agenda comunista no nosso século. E este país nem é comunista e nem nunca pretendeu ser. Pode-se discutir as peculiaridades da Venezuela, um país de população pequena e integrante da OPEP, que graças aos recursos do petróleo desenvolveu um modelo econômico de "Estado-empresário", pelo qual o Estado se tornou o maior empregador e controlador de parte substancial da economia, o que naturalmente levaria qualquer grupo que chegasse ao poder, fosse de esquerda ou não, a ter os instrumentos políticos e econômicos para se perpetuar no poder.
Daí é mais do que óbvio que, apesar de todas as condições favoráveis, peculiares e ímpares da Venezuela na América Latina, o verdadeiro caos econômico que se instalou naquele país, especialmente depois da queda nos preços do petróleo, demonstra a inviabilidade de um projeto de comunismo na A.L. Porque a Venezuela nem é comunista; é uma ditadura onde existe burguesia, um empresariado, proprietários rurais, empresas multinacionais instaladas no país, que não tem empecilhos constitucionais a iniciativa privada, mas onde foi bastante ter uma economia excessivamente estatizada, ineficiente e deficitária, que precisa ser bancada pelo governo o que consequentemente gera altos níveis de inflação, para fazer desse modelo inviável. A menos que o preço do barril de petróleo exploda.
E o Lula talvez não entenda, porque nunca leu um livro, mas o José Dirceu e os economistas do PT sabem muito bem que mesmo se não existissem todos os entraves insuperáveis para se instalar o comunismo no país, se este sistema fosse imposto iria falir como faliu em todos os lugares em que foi tentado.
O que já seria razão mais do que suficiente para não existir essa tal "agenda comunista".