Como sempre, agradeço à contribuição de todos e prossigamos com a discussão.
A realidade é terrível porque coisas terríveis podem acontecer. E acontecem.
Você não conhece a realidade, mas uma ínfima fração dela. Essa ínfima fração, você não conhece ainda, mas apenas o que, dentro disso, pode ser captado no seu sensório. Esse sensório mesmo, você também não pode conhecer, mas apenas o que sua mente dele interpreta e te apresenta de maneira cognoscível. Você não conhece a verdade, mas a refração da refração da refração da mesma - a imitação da imitação.
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Como o conhecimento progride? Destruindo suas fronteiras. Temos um modelo, encontramos falhas e brechas, e logo desmorona todo o edifício antes assentado em falsos alicerces. Somos onipotentes? Não. Sabemos quase nada. Disso decorre que não podemos servir de fundamento para nós mesmos. Não é que seu veredito (ou melhor, o você que interpreta do que pensa que enxerga) da realidade como "terrível" esteja possivelmente enganado - é que ele necessariamente está.
O universo é terrível porque ele pode gerar vida. E vida significa a possibilidade de martírios maiores do qualquer ser vivo seria capaz de suportar.
'O universo é terrível'/'O universo gera[...]' - e depois eu é que sou o religioso! Se não estivéssemos tão fora do contexto, daria para fazer uma bela duma psicanálise de algumas expressões que vemos foristas usando por aqui...
Sabendo ou não ler "o livro da Natureza", desenvolvendo ou não seu "organismo moral", você não estará a salvo da crueldade do universo. E quanto mais compaixão, mais você sofrerá o sofrimento do outro.
Interessante ver como concepções metafísicas aqui apresentadas desembocam em toda uma hierarquia de valores. Mais interessante ainda se o ir.Pedro Reis fizesse um exercício, uma
engenharia reversa para tentar localizar qual o fundamento, chão ou
"ground"¹ desses valores mesmos. Olhos veem luzes, ouvidos escutam. E o que é que, em nós, percebe essas coisas a que chamamos boas e cruéis? Que será essa misteriosa
jóia do discernimento?Neste sentido a realidade é terrível. Porque um animal pode ser devorado ainda vivo, porque uma criança pode ficar cega apenas para satisfazer o apetite de um verme, porque toda alegria pelo nascimento de um filho é acompanhada da preocupação pela vida deste filho, e porque muitas vezes existirá a dor de perdê-lo. É terrível porque apesar de tudo, somos feitos para querer viver mas vivemos com a consciência que tudo se acaba: a juventude, a saúde, a própria vida enfim. Para nós e para todos aqueles que amamos. Por fim o próprio universo, a própria realidade deixará de existir, e tudo se revela despropositado quando, perplexos, entendemos que o tudo que o nada criou colapsa inexoravelmente para o retorno definitivo ao próprio nada.
Se você quer apreender a essência de um livro, você o abre e lê, não apenas com olhos da matéria, mas com teu princípio inteligível. Você não encontra o sentido de um livro rasgando sua capa para encontrar o material de que é feito, sua capa, suas páginas. Se você der zoom em um livro, ad infinitum, em suas linhas, palavras, letras, moléculas de tinta, átomos, quarks, você não encontra ali a essência do livro. Esse é o sumo erro da Ciência. Que não é da ciência em si, mas do que fazem dela mau uso. Procurar a moralidade na existência biológica é como procurar uma fórmula matemática em odores, tentando cheirá-la, ou desejar revelar um axioma filosófico a partir de sensações. É como tentar olhar uma música e, frustrado pela natimorta empreitada, declarar que é a música quem não deve existir. Você tenta ouvir um grande e belo quadro cuidadosamente pintado, e, porque não escuta nada, o declara terrível e fadado ao nada, quando o nada que você encontra se deve a nada mais que o embotamento de uma faculdade equivocada, utilizada para investigar um campo que não é de sua mesma natureza.
E quanto ao resto que o mano Levi escreveu... Eu posso desenvolver em mim potencialidades específicas do ser humano como a moralidade, o amor, a compaixão, a ética, etc... E estas qualidades possivelmente tornarão minha vida mais rica e significante.
Por que será?
Porém, contudo, todavia... são atributos ou potencialidades subjacentes à minha natureza humana. E não do mundo a volta com o qual me relaciono.
Desculpe, não sabia que se tratavam de duas coisas diferentes.