Só por curiosidade, Frango, você cursa cinema na faculdade?
Sim.
[ad hominem] Aha! Eu sabia! Então é por isso que você está defendendo o cinema nacional![/ad hominem]
Mas se a gente discorda de um ponto tão básico, fica difícil discutir. É como uma discussão onde um diz "eu acredito em deus" e outro diz "eu não", "mas deus existe", "não existe, não". Quase nem é uma discussão. Não que eu não ache que não haja uma indústria cinematográfica ou que não deva haver, mas tratar o cinema como um produto qualquer, não dá.
Aí a discussão sai do cinema e entra na política/economia. Eu entendo que o cinema é um produto sim, porque quem vai ao cinema espera rir, ou chorar, ou se assustar, ou ficar excitado, ou pensar ou (se o filme for muito bom) tudo isso junto. Então havendo gente disposta a pagar por isso haverá uma indústria que espera atender à essa procura.
Mais um ponto fundamental que eu discordo de você. Cultura não dá dinheiro pra quase ninguém. Se o Estado não incentiva, ninguém incentiva. E não acho que essas manifestações culturais (não só o cinema) devam desaparecer só por que não dão lucro.
A iniciativa privada incentiva muitos eventos culturais, seja porque recebem isenções fiscais, seja porque querem uma forma de publicidade para atingir a um público sofisticado (e mais endinheirado) ou seja simplesmente porque seus donos gostam desse tipo de evento.
Mais uma vez nos mirando nos EUA, tem outra indústria de cultura absurdamente lucrativa por lá além de Hollywood; são os musicais da Broadway em Nova Iorque. Para você ter uma idéia do quanto a Broadway é uma indústria imponente, saiba que passam muito mais turistas por essa rua de NY por ano do que pelo Brasil inteiro!
Cultura pode sim dar lucro se se inserir no mercado capitalista. Repito a minha opinião de que o governo não deveria colocar nenhum centavo em cultura, mas se tem alguma coisa que ele poderia fazer por ela é justamente incentivar e, vá lá, talvez até facilitar o surgimento de pólos culturais no Brasil onde a cultura seja financeiramente independente.
Quem investe bastante em cinema independente lá nos EUA são as grandes produtoras. Com qual objetivo, eu não sei... até inventam outros nomes. Só que algumas delas estão falindo (esses subprodutoras de filmes independetes ligadas às grandes produtoras, não as grandes produtoras em si).
Algumas sempre sobrevivem enquanto há público, e se não há público não há razão de ser para o cinema. Mas outra coisa é que também há vida inteligente em Hollywood, há diretores originais e filmes inovadores e na falta de produtoras de filmes independentes, os profisonais dessa área podem ser assimilados por Hollywood, fazendo certas concessões ao cinema espetáculo, mas influenciando as produções com sua própria personalidade também. E de resto sempre vai existir o cinema europeu, asiático, latino; se eles são bobos de colocar dinheiro público no cinema deles, não é problema nosso, podemos assistir aos filmes deles com o dinheiro que nos foi economizado dos impostos.
Enquanto tiver que competir desigualmente com um cinema que tem mais de cem anos ininterruptos de grande produção é que os filmes brasileiros não vão conseguir. Só uns poucos filmes conseguem público. Ninguém quer investir. Acabar com os incentivos é acabar com o cinema nacional.
A concorrência leva à excelência. E já existe um público fiel do cinema brasileiro. Mas só poucos filmes conseguem público porque muitos diretores ainda são narcistas a ponto de achar que a sua estética não pode fazer concessões ao gosto popular - só diretores consagrados podem se dar ao luxo de fazer isso, quem está por baixo tem que agradar; é assim que funciona na indústria literária.
Aliás, é interessante comparar com a indústria literária. Todo mundo reclama que o brasileiro lê pouco, mas você não vê autores brasileiro choramingando porque não há público para a literatura brasileira, por mais que ela seja (bem) menos variada do que a internacional. Mas a indústria literária nacional é independente, sólida e até lucrativa, veja o fenômeno mundial que é Paulo Coelho, por exemplo. Mas os nossos autores escrevem de igual para igual com os internacionais.