MST ensinou PCC a fazer protesto
O Estado de S. Paulo (02/05/05)
Escutas autorizadas pela Justiça mostram que um integrante do movimento orientou presidiários a organizar manifestação
Josmar Jozino
Escutas telefônicas revelam que pelo menos um integrante do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) do Vale do Paraíba deu várias palestras a membros da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC) sobre como organizar a manifestação de parentes de detentos realizada no dia 18, em São Paulo. O protesto reuniu 8 mil pessoas em frente à Secretaria da Administração Penitenciária, na Avenida São João, centro. Foi a maior concentração de parentes de presos registrada no País e chamou a atenção pela organização.
As gravações que apontam a participação do PCC foram feitas em 4 de abril. Nelas, presos das penitenciárias de Araraquara e Iaras, no interior do Estado, traçam estratégias sobre a organização do protesto. As escutas foram autorizadas pelo juiz Edmar de Oliveira Ciciliati, da Vara de Execuções Criminais da Comarca de Tupã, e coordenadas pelo tenentecoronel Cláudio Romero Furlaneto, comandante do 25.º Batalhão da Polícia Militar de Dracena.
Representante dos sem-terra teria até oferecido uma gráfica emprestada
O Estado teve acesso ao documento com as transcrições das escutas. Num dos diálogos, um preso de Iaras comenta com outro de Araraquara que conhece o líder do MST no Vale - e informa que o integrante do movimento era líder comunitário, amigo da família dele e 'pode estar dando uma orientação para o pessoal da facção de como proceder no campo de batalha'. Acrescenta ainda que esse amigo havia deixado à disposição deles uma gráfica.
Em outro trecho, o mesmo preso de Iaras conversa com um segundo detento de Araraquara e diz: 'Acabei de conversar com os líderes do MST e eles vão dar e vão passar umas instrução (sic) para a gente e foi marcada uma reunião e precisa passar um salve aí pra poder sintonizar umas pessoas aí da quebrada pra poder apresentar a nossa comitiva lá'.
Nos telefonemas grampeados, os detentos também falam sobre o pagamento do frete dos ônibus contratados para trazer os parentes de presos a São Paulo no dia da manifestação. Eles discutem ainda sobre o carro de som, as camisetas que os manifestantes usariam e o teor das frases usadas nas faixas durante o protesto. Algumas das inscrições diziam: 'Juízes indiferentes aos problemas carcerários' e 'Justiça é conivente com o descaso do governo'.
Em 12 de abril, o juiz Ciciliati encaminhou um detalhado relatório sobre as escutas telefônicas ao secretário da Administração Penitenciária, Nagashi Furukawa. De acordo com o documento, as conversas gravadas demonstram que a manifestação foi articulada dentro dos presídios.
O relatório diz que o dinheiro utilizado para o pagamento dos ônibus, camisetas e faixas veio de atividades criminosas. O juiz pede ao secretário Furukawa a internação em Regime Disciplinar Diferenciado (RDD) dos presos envolvidos nas conversas telefônicas interceptadas.
O líder interino do movimento no Vale do Paraíba, Francisco Bertolo, disse desconhecer qualquer contato com o PCC para a organização de passeatas. 'Estão envolvendo o nome do MST em mentiras para prejudicar o movimento.' Segundo ele, a organização do MST veta o contato com facções criminosas e a participação em crime. ? Colaborou: Simone Menocchi
Advogado que liderou ato será investigado
PROVIDÊNCIA: O secretário de Administração Penitenciária, Nagashi Furukawa, enviou ofício à seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) solicitando a investigação da conduta ética do advogado José Cláudio Bravos. No dia da manifestação dos parentes dos presos, ele afirmou que era um dos organizadores do protesto. Disse, também, que era presidente da União Paulista de Advocacia Penitenciária (Upape).
Furukawa enviou cópia do ofício à Delegacia Geral de Polícia (DGP), pedindo a abertura de inquérito para apuração dos fatos. No documento, ele alega ter informações de que a manifestação teria sido financiada pelo PCC. 'Há informação da minha assessoria de que o mentor e principal articulador da manifestação foi o advogado José Cláudio Bravos', afirmou.
No dia do protesto, Bravos afirmou aos jornalistas que os gastos da manifestação foram pagos com economia dos parentes de presos. Disse também que o ato não tinha vínculo com qualquer facção criminosa e que 210 ônibus transportaram as famílias dos detentos para São Paulo, mas 20 não puderam chegar à sede da SAP porque foram barrados por PMs.
O comboio, no entanto, ficou estacionado na Praça Princesa Isabel e na Avenida Rio Branco.
Além de portar faixas com palavras de protesto contra o sistema prisional, boa parte dos manifestantes usava camiseta branca com a inscrição 'Paz' escrita na cor azul. Outra parte vestia camiseta branca com a frase 'Justiça no cárcere', em letras verdes. ? J. J.
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