Antes de tudo, gostaria de antecipar que muitas dúvidas minhas (e acho que de outros também) ficaram esclarecidas nessa sua última postagem, apesar de algumas ainda persistirem. O principal é que, segundo foi dito, a IC só é "positivista forte" em relação às entidades do "micromundo", e que a através da decoerência as coisas do "macromundo" podem possuir existência "concreta" mesmo quando não as estamos observando (a Lua, por exemplo). Se for assim, a IC me parece menos absurda. Mas ainda vou fazer algumas perguntas "residuais" nesse tópico.
Nada de se tentar usar isso para ganhar algum "crédito" ou "favor" na discussão
Nossa, estou me sentindo como o maligno Victor Von Doom ou mesmo, Lex Luthor! Fora o fato de que nem imagino como é possível ganhar algum "crédito" ou "favor" na discussão, afirmando que estou sem tempo para postar. Em suma, o que faço é apenas avisar que minhas respostas podem demorar. Mas ok, vamos deixar isso para lá. Talvez algumas respostas tenham ficado confusas ou incompletas, muito embora, não existe a menor possibilidade de grandes detalhes em um fórum, inclusive pela falta de tempo, como vc mesmo comentou. Vou tentar resumir as questões e esclarecer certos pontos.
O problema era o seguinte: eu falava ou perguntava A. Você ao invés de simplesmente responder "A não procede devido a B", ficava com respostas retóricas e alguns ad hominens, acrescentando que não tinha tempo. Eu então falei o que acima está escrito para que, independentemente de haver ou não intenção de sua parte de responder abusando de retórica, você parasse ou diminuisse com a retórica.
Então você é positivista…
Não costumo me rotular,
A frase completa que eu postei foi essa:
"Então você é positivista (ou “instrumentalista”) em relação às “coisas” e realista em relação às teorias? È isso o que dá a entender essas postagens." Você não gosta de "rótulos"? Sem problemas! Há uma maneira de lhe satisfazer, embora eu tenha que escrever um pouco mais mais:
Onde estiver escrito "positivista", substitua por "uma pessoa que acha que as coisas só existem quando são observadas". E onde estiver escrito "realista", substitua por "uma pessoa que acha que as coisas podem existir mesmo quando não estão sendo observadas".
A frase anterior fica assim:
Então você é
uma pessoa que acha que as coisas só existem quando são observadas em relação às coisas, e
uma pessoa que acha que as coisas podem existir mesmo quando não estão sendo observadasem relação às teorias? É isso que dá a entender as suas postagens".
Viu? Sem "rótulos". Satisfeito agora?
muito embora, em Ciência, há uma, digamos, “postura positivista” bastante salutar, talvez próxima do que você chamou de “positivismo fraco”. Mas veja bem, isso não significa que a maioria dos cientistas sejam positivistas no sentido literal da palavra. Creio que a grande maioria nem mesmo pensa a esse respeito ou mesmo, seja “realista em seu íntimo” porque parece ser o óbvio e é a herança da visão newtoniana, ou antes, da visão mecanicista, cartesiana.
Digamos que não é pura e simplesmente uma "herança da visão newtoniana" ou coisa do tipo. Não tem nada a ver com teorias científicas e todas elas (com exceção, na minha opinião, das ciências "históricas" que eu citei) podem ser vistas de um ponto de vista realista ou não. Realismo (a idéia de que as coisas não deixam de existir quando não estamos olhando para as mesmas) na verdade é uma idéia metafísica, pois não é falseável (da mesma forma que o não-realismo). Não dá para fazer um teste empírico para saber se um determinadado objeto existe ou não existe nos momentos em que não estão sendo observados. Entretanto, muitas questões surgem inevitavelmente sem o realismo, por exemplo:
A realidade não existe independentemente do observador. É necessário primeiro definir
quê observador:
1- Para que não haja contradições (coisas que são reais e não-reais ao mesmo tempo), é necessário que haja um observador "privilegiado". A realidade que ele "cria" é a única. As observações feitas pelos demais não são reais. O difícil seria "convencer" os demais observadores (sejam quem ou o quê forem) disso.
2- Se não houver nenhum observador "privilegiado", então as realidades "criadas" por quaisquer observadores seriam reais. Não haveria portanto uma única realidade, e uma mesma coisa A poderia ser real e não-real ao mesmo tempo, pois poderia estar sendo observada por um observador e não por outro, sendo nenhum deles "privilegiado". Além dessa contradição, seria de se estranhar que as realidades criadas pelos diferentes observadores fossem tão altamente coincidentes (como o que acontece conosco), ficando parecendo que a realidade é independente dos mesmos, o que não poderia ser o caso.
3- Se a realidade não existir sem que nenhum observador consciente a esteja observando. Nesse caso, a realidade para todos os observadores conscientes deverá ser a mesma, mas as coisas que não forem ou estiverem sendo observadas por ninguém não seriam reais. Assim, tudo o que ocorreu ou ocorre separado no tempo ou no espaço do ser humano não é real.
3- Se só são reais as coisas que estão interagindo com qualquer coisa, inclusive inanimadas. Nesse caso é muito difícil distinguir isso do Realismo. As diferenças são insignificantes. Apenas descreve de forma mais complicada o que poderia ser descrito de forma mais simples.
Enfim, questões como essas não aparecem se supormos a realidade como existente independentemente da observação. O não-realismo deixa inexplicado porque há uma total concordância entre as pessoas sobre a realidade, "parecendo" que ela é independente das mesmas. As outras "versões" mais fracas que eu dei do não-realismo fazem um malabarismo gigantesco para descrever de forma bastante artificial coisas que no realismo "flui" naturalmente.
No entanto,
tudo isso não compromete e nem interfere significativamente com a pesquisa científica. Ela pode ser feita dentro de uma visão realista (dizer que as coisas e fenômenos que as teorias descrevem ocorrem de fato) ou instrumentalista/positivista (dizer que as coisas ou fenômenos que a teoria descreve não necessariamente ocorrem de fato, mas são apenas "conceitos úteis" para descrever fenômenos observáveis).
No entanto,não vejo como as ciências "históricas", que descrevem coisas do passado,ou coisas afastadas de nós no espaço, podem ser enquadradas dentro de uma visão não-realista. Ou seja, de uma visão que afirme que as coisas que elas dizem que ocorreram não necessariamente ocorreram "de fato".
Vou procurar responder suas dúvidas e depois, me diga o que vc acha, se sou positivista, realista, ou algum tipo de meio termo, se é que isso tem sentido.
Como assim "se é que isso tem sentido"? O que você quer dizer com "sentido"?
Agora, somente um esclarecimento: me parece que, mesmo para um positivista, uma teoria é um modelo matemático, uma ferramenta que se utiliza para fazer previsões e depois, checar essas previsões com experimentação.
Para TODOS os cientistas é assim. Todos seguem o método científico. A única diferença está no que eu disse no outro post.
Também acho (muito embora possa ser apenas achismo de minha parte) que não existam físicos sérios que sejam positivistas fortes, ou seja, a Lua não existe quando não olhamos para ela, etc. Não saberia dizer a posição de Wheeler, muito embora, ele não seja um dos “desenvolvedores” da IC. Seus comentários são curtos e não esclarecem muito.[/color]
Ok.
há diferença entre o que eu falei sobre o elétron e o que eu falei sobre a banheira?
Uma diferença gigantesca. Feynman uma vez se referiu ao elétron (ou a todas as partículas elementares) como sendo diferente de qualquer coisa que qualquer um tenha visto. O elétron não é uma bolinha, não é uma onda, não é uma coisinha pequena, etc. As questões que você levanta, seja em relação à banheira, seja em relação à Lua, etc. A IC não afirma que a Lua não está lá quando não olhamos, e Bohr, à época, já se referenciava a possíveis mecanismos que evitariam uma amplificação dos efeitos quânticos para o nosso mundo do dia a dia, ou macro-mundo.
Para mim, a única bizarrice (já que estamos utilizando esse termo, embora eu o usei inicialmente com a conotação de “bizarrice física”, ou bizarrice em relação à Física, o que me parecia claro) do IC foi a atitude de se adotar duas Físicas e dois mundos, um macro, onde era válida a Mecânica de Newton, e outro micro, onde era válida a MQ.
Quem resolveu essa questão foi, entre outros, Gell-Mann e Hartle, com a visão através de Histórias Decoerentes e seus Mecanismos de Decoerência, conforme já havia falado em várias oportunidade. Agora, entrar em maiores detalhes sobre como funcionam esses mecanismos, etc, é impossível através de postagens. É uma trabalheira dos inferno, vide o tamanho do tópico referente à Realidade Quântica, o qual já passei o link em postagens anteriores. E também, reforço meus comentários da última postagem. Você descartou os mecanismos como ad hoc, independentemente do link do Ângelo, onde um dos mecanismos possíveis foi demonstrado.
Posso até não ter conseguido ser claro em alguns comentários, mas se você descarta as coisas e continua a pedir explicações, bem, não sei o que dizer. Simplesmente chegamos em um círculo vicioso.
Ok. Esclarecido então. A IC só é "positivista forte" em relação aos objetos micro. Em relação aos macro,a decoerência os fazem serem "definidos" e "concretos" ou seja, poderem existir independentemente de qualquer interação com os mesmos. Minha única (e talvez última) pergunta é a seguinte:
Os mecanismos de decoerência são as interações com outras partículas, raios cósmicos, radiações térmicas, etc. Certo?
Essas interações podem ocorrer com as entidades micro quando elas não estão sendo observadas? Se sim, elas podem fazê-las ficarem "definidas" ou "concretas"?
Se não podem, por quê?
Se podem, então as entidades micro podem ficar "definidas" ou "concretas" quando não há observação.
Um exemplo: no experimento da dupla-fenda, com detectores colocados nas fendas, há dois "pontos-cegos" em que os elétrons não estão sendo observados: um no espaço entre o emissor e as fendas´(ponto-cego 1), e outro no espaço entre as fendas e o anteparo (ponto-cego 2).
Segundo a IC, o elétron antes de qualquer interação não existe de forma "definida" ou "concreta", mas apenas como "probabilidades sobrepostas", e é por isso que ele atravessa ambas as fendas ao mesmo tempo quando não há nenhum detector nas mesmas e produz a figura de interferência. Quando há detectores, ela fica "definido" logo ao nível das fendas, atravessando portanto uma de cada vez e não produzindo assim a interferência. A minha dúvidas são:
1- Podem haver interações de raios cósmicos, radiação térmica, outras partículas, etc com os elétrons enquanto eles estão nos "pontos-cegos"?
2- Se não, porquê?
3- Se sim, elas podem fazer os elétrons ficarem definidos ou concretos antes de serem detectados na fenda ou no anteparo?
3- Se não podem, por quê? Por quê só a interação do instrumento de observação faz o elétron ficar definido ou concreto e as demais não?
4- Se essas interações nos "pontos-cegos" podem fazer o elétron ficar definido ou concreto, então:
A- Se eles ficam definidos "momentaneamente", perdendo esse estado definido e voltando a ser apenas "probabilidades" tão logo a interação acabe, então os elétrons no "ponto-cego 2", após terminarem de interagir com os detectores e voltarem a ficar "espalhados", serão detectados em pontos distintos porém bastante espalhados no anteparo comparativamente ao caso deles estarem como partículas. Isso procede? Se sim, os elétrons realmente ficam mais "espalhados" no anteparo do que o esperado caso estivessem como partículas? Se não, porquê?
Veja um exemplo: em alguma postagem anterior, você disse que a IC “adotava” misteriosos ou bizarros “estados sobrepostos”. Contudo, quando postei os comentários de Luiz Davidovich, em relação aos experimentos que mostram tais estados, não houve comentário nenhum.
O mesmo se deu em relação às probabilidades da MQ (ou IC, não importa). Foi mostrado em duas ocasiões, pelo menos, que as probabilidades quânticas NÃO SÂO probabilidades do mesmo tipo que usadas por cias. de seguro ou por cassinos, mas você continua afirmando que a visão probabilística se dá apenas devido à “desordem que causamos” quando efetuamos uma medida!
Gostaria de links para o caso do átomo. Se realmente um mesmo átomo foi detectado "em dois lugares ao mesmo tempo" (no mesmo sentido de um carro de 3 metros de comprimento ser detectado no Rio e em São Paulo ao mesmo tempo), então o indeterminismo intrínseco está comprovado (pelo menos para mim) e eu retiro o que eu disse sobre o mesmo, só mantendo o que falei sobre o não-realismo.
Quanto às probabilidades, a possibilidade de "vícios" ou "tendências" ou o que seja não pareceram ainda para mim descartáveis. Por isso, gostaria de links.
Veja este comentário, a respeito do Big Bang. Em certo sentido, o BB é como as partículas, diferente de tudo o que qualquer um já viu:[/color]
Observamos a Radiação Cósmica de Fundo, não o Big-Bang
Sem dúvida, mas a RCF é uma PREVISÃO do MODELO BB. Quanto ao “BB em si”, ou se preferir, à “singularidade inicial”, de foto, ninguém viu e nem sabemos se aconteceu! Isso é fato! O que temos é um modelo, que está em acordo com as observações, algumas boas ordens de grandeza abaixo de um segundo (bem além disso, por sinal, conforme as últimas análises do WMAP, confirmando o cenário Inflacionário). Contudo, mesmo assim, o BB em si, “o instante zero”, é tão somente uma “previsão” do Modelo, que deriva da RG. Par avançar, necessitamos de um modelo que vá além da RG, a Gravitação Quântica.
Sem dúvida, em muito dos “exemplos” que você colocou, são estudadas as evidências, mas a IC, vista sob o prismas de Histórias Decoerentes, em nada invalida (ou impede) a existência de dinossauros e civilizações. Inclusive, é através deles que o nosso “mundo cotidiano” emerge da realidade quântica. Só há uma Física e uma realidade, e ambas são quânticas.
Ok.
Se for esse o caso, então a IC é “realista”
Em seus moldes iniciais, a IC é considerada não-realista por tratar o quantum como uma série de possibilidades sobrepostas e não bolinhas ou ondinhas, como estamos acostumados a ver em nosso dia a dia.
Aqui a discussão migra para um campo bastante complicado, que por sinal se debate há décadas, sobre a natureza dos estados sobrepostos de das chamadas “ondas de probabilidade”. A IC não atribui a isso uma realidade física, no sentido de bolinhas ou coisinhas pequenas. Contudo, se os estados possíveis coexistindo são reais, uma coisa é certa, a realidade a esse nível é totalmente diferente da realidade a que estamos acostumados a ver à nossa volta. Parece-me que, neste ponto, atribuir nomes tipo “realista” ou “não-realista” é tão somente uma questão de formalidade, como você bem falou.
Mas ressalto a observação anterior. Se considerarmos essa “realidade em potencial” como algo, é algo totalmente diferente de tudo o que qualquer um já viu.
O que eu dizia era em relação às partículas que interagem "fora da vista" do ser humano, que elas ficariam definidas e "reais" mesmo sem ninguem observando-as. Se a IC admite isso, então ela acaba sendo realista. A única coisa não-realista que sobra para a IC são as partículas subatômicas totalmente isoladas de quaisquer interações com outras;essas só passam a existir quando interagirem com outras ou com radiações.
Não entendo seu comentário. Foi você quem começou aqui com essas contestações à existência da realidade independente do observador, não eu.
De certa maneira sim, pois que pretendia levar a discussão a um ponto que mostrasse que defender esse ponto de vista é tão bom, ou tão bizarro que o seu ponto realista, mas a discussão acabou por tomar outro rumo. Mas já que estamos procurando esclarecer alguns pontos, vamos explorar um pouco isto, também. Antes de tudo, repito, eu NÃO DEFENDO, como já havia dito, que a Lua não está lá quando não se olha para ela, ok?
Mas vamos nessa linha. Por seus comentários, você acha bizarro a existência da Lua estar atrelada à observação. Façamos um experimento, então.
Você está dentro de uma nave, totalmente fechada, em repouso, no primeiro dos Pontos de Lagrange, ou L1, onde as gravidades da Terra e da Lua se compensam. Pergunta: como você DEMOSNTRA que a Lua existe?
Essa questão, do ponto de vista realista (ou "positivista fraco") equivale a como eu conseguiria demonstrar AQUI em minha casa a existência dos neutrinos;
No caso, se eu já observei a Lua antes quando eu estava fora do compartimento, eu simplesmente direi que a quando saírmos do compartimento, ou quando ele voltar a se mover, eu poderei demonstrar que a Lua existe (vale usar uma broca pra fazer um buraco?). Porém se eu nunca observei a Lua antes, eu não poderei afirmar que ela existe e nem sequer cogitaria sua existência. Quanto ao meu interlocutor, se nunca lhe foi demonstrado antes a existência da Lua, eu não exigirei que acredite em mim, da mesma forma que não exigiria a uma pessoa aqui em casa que não acreditasse na existência do neutrino.
Ser óbvio, não importa, nem é resposta. Quem já estudou Engenharia, Física ou Administração, entre outras matérias, teve Cálculo 1. Logo em minha primeira aula, o professor perguntou se zero era diferente de 1. A classe respondeu que sim. O professor perguntou porque sim. A resposta foi que era óbvio que zero é diferente de 1. Então, o professor disse: ah, é óbvio? Então DEMONSTRE!
Por sinal, essa foi a primeira questão de minha primeira prova de Cálculo 1, demonstrar que zero é diferente de 1![/b]
Ótimo. Então, baseado na sua frase que eu destaquei em vermelho e já que você usou a matemática como exemplo, poderia então me DEMONSTRAR os axiomas usados na matemática?
Portanto, não importa o quanto é óbvio o “seu realismo”, ou mesmo se 99,99% dos freqüentadores do CC sejam realistas, a questão é: como você demonstra?
Ok. Estou esperando, curioso, as suas demonstrações dos axiomas usados na matemática.
Perceba que em uma postagem anterior, você citou Popper, ao criticar o Positivismo. Contudo, quando defende o Realismo, você se deixa levar pelo INDUTISMO, esquecendo a crítica de Hume e do próprio Popper.
O indutivismo consiste em se fazer generalizações a partir de alguns casos, ou de fazer afirmações categóricas sobre o futuro com base no passado. Quando Popper afirma que o indutivismo é um mito e o "substitui" pela tentativa-e-erro, ele faz uma concessão inevitável, que é: sempre podemos estar errados; qualquer teoria, por mais casos que ela tenha a favor, pode vir a ser refutada. Tirando o fato de que o Realismo não é uma teoria científica, eu o considero algo "em aberto", uma "hipótese" ainda não falseada. Portanto, nada "indutivo" entra aí.