Crônica presente no novo livro do Alex Castro, Radical Rebelde Revolucionário - Crônicas Cubanas:
Essa propaganda contra-revolucionária é foda. Por exemplo, dizem que as pessoas não podem sair de Cuba, o que é a mais arretada mentira. Claro que podem. Assim como qualquer cidadão brasileiro pode ter uma emissora de rádio: basta pedir uma concessão ao governo e pronto. Fácil assim.
A primeira coisa que um cubano necessita para sair de Cuba é estar em dia com suas obrigações legais e militares, não estar sofrendo nenhum processo judicial, não dever dinheiro a ninguém, essas coisas. Se já foi oficial das Forças Armadas ou membro do Alto Escalão do governo, esqueça; ele sabe demais. (Provavelmente o maior segredo militar de Cuba é que o arsenal nacional se reduz a um pente com seis balas.)
Depois disso, o candidato a turista precisa de uma carta-convite de alguém no país de destino. Digamos que você, leitor brasileiro, queira fazer esse favor ao seu amigo havaneiro ansioso para provar as delícias da economia de mercado. Você vai ter que ir até a representação diplomática cubana mais próxima – o que pode ser trabalhoso e caro, se você não mora nem em São Paulo nem em Brasília – e oficializar sua carta mediante o pagamento de US$ 140, que não é barato pra ninguém.
O distinto leitor brasileiro que se sente indignado com a fila que tem que pegar no consulado americano pra levar sua família a Disney – e ainda negaram o visto do Tio Oduvaldo! – pode ficar certo que, para os cubanos, tudo é muito pior, pra onde quer que tentem ir.
Ninguém gosta de imigrantes ilegais. Todos os países do mundo sabem que receber um cubano é correr o sério risco de ele decidir que lavar pratos em Madri é cem vezes mais lucrativo que ser neurocirurgião em Havana. Muitos governos se aproveitam dessa carta-convite exigida por Cuba para fazer com que seu cidadão-convidador pague um depósito: quando o cubano voltar pra casa, você recebe seu dinheiro de volta. Se ele decidir ficar, babau. Isso quando dão o visto, claro – o que não é comum. No México, por exemplo, país teúdo e manteúdo sustentado pelos dólares que garçons e faxineiras nos Estados Unidos mandam para suas famílias, o depósito é de US$ 3 mil. Estão pensando o quê? Imigrante ilegal no país dos outros é refresco!
Por fim, se o pobre cubano conseguir algum santo estrangeiro disposto a arriscar esse dinheiro e se o país de seu anfitrião lhe der o visto, ainda vai precisar pagar não só pelo visto (que nunca é de graça) como também pela permissão de saída (25 CUC = R$ 60), mais todas as despesas de viagem, naturalmente. O salário mínimo, vamos lembrar de novo, é de R$ 19, e o máximo, R$ 34.Radical Rebelde Revolucionário
(Brincadeira pra quem é bom de conta: calculem quantos séculos um cubano que ganha salário máximo precisa economizar metade de sua renda pra poder custear uma passagem de ida e volta pra São Paulo, mais estadia e alimentação nessa cidade por uma semana.)
Enfim, só mesmo sendo um contra-revolucionário anticomunista pró-Bush pra dizer que o governo de Cuba proíbe seus cidadãos de viajar ou emigrar. É impressionante como a ideologia cega as pessoas. Basta seguir os simples passos acima e qualquer cubano pode esquiar em Vail ou velejar pela Polinésia.