Autor Tópico: O problema mente-corpo  (Lida 11169 vezes)

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Offline Adriano

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Re: O problema mente-corpo
« Resposta #75 Online: 28 de Abril de 2008, 21:10:12 »
Citação de: Wikipédia
Autopoiese (grego auto próprio, poiesis criação) foi o termo cunhado na década de 70 pelos biólogos e filósofos chilenos Francisco Varela e Humberto Maturana para nomear a complementaridade fundamental entre estrutura e função. A denominação autopoiese é a fusão de dois termos: “auto” que refere-se ao próprio objeto e “poiese” que diz respeito à reprodução/criação A autopoiese é uma terminologia empregada inicialmente por dois biólogos chilenos Humberto Maturana e Francisco Varela para designar os elementos característicos de um sistema vivo e sua estrutura. As pesquisas sobre tal objeto de estudo apontaram uma definição de vida como sendo a autonomia e constância de uma determinada organização das relações e os elementos constitutivos desse mesmo sistema, organização essa que é auto-referencial no sentido de que a sua ordem interna é gerada a partir da interação dos seus próprios elementos e auto-reprodutiva no sentido de que tais elementos são produzidos a partir dessa mesma rede de interacção circular e recursiva

Por isso o conceito de autopoiese é o melhor que conheço para a vida, já que reune autocognição e auto-replicação.

A diferença é que autômatos não teriam a noção de replicação nem de finitude, que advém do conceito de um ser mortal.
Princípio da descrença.        Nem o idealismo de Goswami e nem o relativismo de Vieira. Realismo monista.

Offline Buckaroo Banzai

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Re: O problema mente-corpo
« Resposta #76 Online: 28 de Abril de 2008, 21:32:28 »
Os morcegos certamente fazem um mapa 3d, mas não sei se eles tem uma experiência/representação visual-mental, ou sequer auditiva-mental, desse mapa.

Se não tivessem teriam a cabeça quadrada de tanto bater em árvore.

Então um momento. Se eu criar um robô que é capaz de andar num labirinto sem bater nas paredes, através de sensores daqueles tipos dos carros que estacionam automaticamente, ele teria algum tipo de experiência subjetiva? (Ou mesmo esse equipamento dos carros?)

Eu acho que isso só não seria necessariamente suficiente, muito embora não saiba o que seria suficiente. Acho que pode ser mais ou até menos que isso.

Mas em tese, uma "entidade" que possa recolher informações, processar e reagir de acordo, não necessariamente tem experiência subjetiva; então poderiamos teoricamente inventar um suber robô que voasse sem bater pelos labirintos das cavernas dos morcegos, sem que ele tivesse uma experiência subjetiva. Teoricamente poderíamos fazer o computador desse robô de silício ou com neurônios...



Citar
Alguma experiência eles tem. Uma experiência que sequer é possível descrever em palavras, muito embora consigamos até descrever as leis físicas que sustentam sua eco-localização. Isso não é revelador para você ? A linguagem matemática poderia ser uma forma de 'conversar' com um morcego inteligente, porque ele teria uma consciência subjetiva pela qual consegue representar sua experiência subjetiva única, intgraduzível, para uma outra linguagem mais genérica, traduzivel até para uma espécie que não tem essa capacidade.

Pode ser; como eu acho que talvez já tenha dito, talvez a experiência subjetiva seja algo tão básico como ser meio intrínsico à qualquer coisa que tenha algum tipo de "informação", o que é praticamente tudo, talvez. Mas talvez seja necessário algo mais, e "zumbis filosóficos" sejam possíveis. Eu não sei.


Citar
Eu não digo que "não sei" com o intuito principal de colocar isso em dúvida, poderia ser muito bem que tivessem a experiência auditiva, mas fossem visualmente cegos, ou que tivessem uma experiência visual com base principalmente em informações não-óticas. Mas também poderia ser até que outras coisas que tipicamente não se pensa ter qualquer experiência subjetiva, tenham.

Não entendi isso. Eles não tem nenhuma experiência visual compatível com a nossa. Mas que tem uma experiência, eles tem, porque estão vivos, captando percepções, procesando e decidindo, embora digamos que isso é mais um reflexo do que um raciocínio, ele é baseado nessas percepções.

Num dos posts anteriores eu até montei um exemplo em que me parece que fica impossível dissociar esse tipo de coisa, processamento, de experiência subjetiva. Mas ao mesmo tempo, talvez seja confusão semântica; é facílimo criar um programa que diga que gosta que apertemos o "enter" e agradeça a cada toque do "enter", sem que isso realmente signifique que ele "gosta" disso... e de forma similar, o morcego ou o robô poderiam ter a "experiência" dos dados ambientais nesse sentido de captação e processamento, sendo mais ou menos como geralmente se assume que é com um programa básico de computador (ou uma ratoeira), que não há uma experiência subjetiva, apenas uma cascata complexa de ação e reação, meio como uma fileira de dominós que se derrubam de maneira extremamente complexa.

A diferença é de complexidade... um programa de computador que diga que gosta que pressionemos "enter" talvez não precise ter nem três linhas... (há de qualquer forma toda a complexidade subjacente do computador no qual ele roda). Então... será que um programa complexo, que um intrincado processamento de dados é a chave para se ter algo mais que algo meramente análogo a uma peça de dominó derrubando outra?

Ou será que é apenas como milhares ou milhões de dominós alinhados, que normalmente supomos não fazer diferença? Eu não sei.



Citar
Citação de: Buckaroo Banzai
Na verdade eu não estou nem um pouco certo de que estamos nos entendendo... a questão não é inteligência. Como dito no trecho do texto do Chalmers que eu coloquei, inteligência é um dos problemas "fáceis" que podem ser colocados no saco de conceitos rotulado de "consciência". Não tenho dúvida alguma que diversos animais tem diversos graus de inteligência bem análoga (ou melhor, até "homóloga") à humana.


Bom, creio eu que agora você realmente precisa me dar um melhor exemplo do que a vermilhão. E vamos deixar os morcegos de fora, parece que a minha analogia 'morcegos' vs. 'morcegos inteligentes capazes de nos comunicar a sua experiência' não te demonstrou que há experiência, e que é subjetiva.

Eu entendi experiência subjetiva como a interpretação (subjetiva) de eventos ocorridos (experiência). Estou errado ?

Acho que o melhor exemplo é o do cego. Você não tem como passar de forma alguma a noção do que é "vermelho" para um cego. Você pode explicar que mecanismo físico faz com que veja "vermelho", que existem os fótons, que eles podem ser emitidos em diferntes freqüências, e que algumas células as distinguem e etc, mas isso não irá dar nenhuma noção ao cego do que é a experiência de "ver", muito menos da cor vermelha especificamente. Seria para ele um pouco como é para você tentar imaginar uma "cor que não existe", provavelmente pior, uma vez que você ao menos tem outras cores como exemplo.

Ao mesmo tempo, algumas pessoas são capazes de ver, sem terem no entanto essa experiência subjetiva da visão

http://en.wikipedia.org/wiki/Blindsight

Normalmente, pensamos que câmeras e computadores ligados à elas, apesar de identificarem corretamente cores e etc, não tem essa experiência que as pessoas que não são cegas têm.

Esse é o problema; assumimos isso, mas não sabemos realmente o que é suficiente/necessário para a experiência subjetiva, e muito menos como se forma. Casos como a "visão cega" nos permitem embasar a possibilidade de "zumbis filosóficos", talvez plenamente funcionais.

O melhor tratamento parece ser assumir que é algum tipo de coisa quase que fundamental da matéria, ainda que talvez necessite de um elevado nível de complexidade para "surgir" ou se configurar no nível presente nos humanos.

Offline Moro

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Re: O problema mente-corpo
« Resposta #77 Online: 29 de Abril de 2008, 01:13:27 »
Citar
Então um momento. Se eu criar um robô que é capaz de andar num labirinto sem bater nas paredes, através de sensores daqueles tipos dos carros que estacionam automaticamente, ele teria algum tipo de experiência subjetiva? (Ou mesmo esse equipamento dos carros?)

Não, em hipótese alguma.


Citar
Num dos posts anteriores eu até montei um exemplo em que me parece que fica impossível dissociar esse tipo de coisa, processamento, de experiência subjetiva. Mas ao mesmo tempo, talvez seja confusão semântica; é facílimo criar um programa que diga que gosta que apertemos o "enter" e agradeça a cada toque do "enter", sem que isso realmente signifique que ele "gosta" disso... e de forma similar, o morcego ou o robô poderiam ter a "experiência" dos dados ambientais nesse sentido de captação e processamento, sendo mais ou menos como geralmente se assume que é com um programa básico de computador (ou uma ratoeira), que não há uma experiência subjetiva, apenas uma cascata complexa de ação e reação, meio como uma fileira de dominós que se derrubam de maneira extremamente complexa.

Isso.

Computador

funcao faça (int a) {
 if a == algo
   facao X
 se nao
   faca Y
}

Nao tem experiencia subjetiva. Sinceramente nem consigo entender onde alguém consegue ver a menor possibilidade de experiencia subjetiva em um computador.

Existe também a probabilidade é de eu não entender o que vc está falando sobre experiência subjetiva.

Eu entendo assim:
  Um evento acontece
  Eu correlaciono esse evento específico a algo passado, por algum motivo. Esse algo passado me deixou contente.
  Eu interpreto esse fato com um viés positivo OU esse fato me representa algo positivo.

Ex: Vejo uma criança suja de barro. Me lembro sujo de barro aos 8 anos, brincando com meus primos. Sorrio e fico contento com o menino sujo de barro.

Então, tenho a partir do evento ocorrido, tenho uma experiência para mim, porque tem sentido para mim, e outra pessoa vai entender de maneira distinta o que ocorreu.

É isso??
   
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Offline Buckaroo Banzai

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Re: O problema mente-corpo
« Resposta #78 Online: 29 de Abril de 2008, 02:15:25 »
Não, isso não é experiência subjetiva... eu não sei como exatamente chamaria isso... considero um tipo de processamento, uma rotina ou algoritmo de busca de associações de "termos". Talvez algum programa até pudesse ter algo parecido (meio como programas de reconhecimento facial, por exemplo), mas ainda assim não é disso que se trata o "problema difícil".

Repetindo de uma mensagem anterior o que acho que é a minha melhor explicação até agora:

Acho que o melhor exemplo é o do cego. Você não tem como passar de forma alguma a noção do que é "vermelho" para um cego. Você pode explicar que mecanismo físico faz com que veja "vermelho", que existem os fótons, que eles podem ser emitidos em diferntes freqüências, e que algumas células as distinguem e etc, mas isso não irá dar nenhuma noção ao cego do que é a experiência de "ver", muito menos da cor vermelha especificamente. Seria para ele um pouco como é para você tentar imaginar uma "cor que não existe", provavelmente pior, uma vez que você ao menos tem outras cores como exemplo.


Assim, talvez mesmo esse programinha mais básico do computador pudesse ter algo análogo a "ver o vermelho", só que talvez sem análogo para qualquer experiência conhecida por nós. Ou talvez não. Mas talvez algum tipo de computador mais complexo tenha, não sabemos.

...do texto do Chalmers:

Citar
The really hard problem of consciousness is the problem of experience. When we think and perceive, there is a whir of information-processing, but there is also a subjective aspect. As Nagel (1974) has put it, there is something it is like to be a conscious organism. This subjective aspect is experience. When we see, for example, we experience visual sensations: the felt quality of redness, the experience of dark and light, the quality of depth in a visual field. Other experiences go along with perception in different modalities: the sound of a clarinet, the smell of mothballs. Then there are bodily sensations, from pains to orgasms; mental images that are conjured up internally; the felt quality of emotion, and the experience of a stream of conscious thought. What unites all of these states is that there is something it is like to be in them. All of them are states of experience.

It is undeniable that some organisms are subjects of experience. But the question of how it is that these systems are subjects of experience is perplexing. Why is it that when our cognitive systems engage in visual and auditory information-processing, we have visual or auditory experience: the quality of deep blue, the sensation of middle C? How can we explain why there is something it is like to entertain a mental image, or to experience an emotion? It is widely agreed that experience arises from a physical basis, but we have no good explanation of why and how it so arises. Why should physical processing give rise to a rich inner life at all? It seems objectively unreasonable that it should, and yet it does.

Offline Moro

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Re: O problema mente-corpo
« Resposta #79 Online: 29 de Abril de 2008, 09:39:38 »
Banzai

Não discuti até agora a questão do hard problem. Discuti a analogia com o computador.
Acho que o que aconteceu é pegarmos uma parte da sua argumentação (a análise com o computador) e deixarmos de lado o resto, que é bacana.
Mas infelizmente foi o ponto que eu comecei a argumentar, então vamos lá.

Veja a proposição:

Citar
When we think and perceive, there is a whir of information-processing, but there is also a subjective aspect
...
This subjective aspect is experience.
Aqui eliminamos o computador. Não há nada aspectos subjetivos, ainda que para um observador possa dar essa impressão.
Já dentro desse conceito, eliminamos a capacidade de ter experiência de um computador.

Citar
considero um tipo de processamento, uma rotina ou algoritmo de busca de associações de "termos". Talvez algum programa até pudesse ter algo parecido (meio como programas de reconhecimento facial, por exemplo), mas ainda assim não é disso que se trata o "problema difícil".

A sua dificuldade em conceituar para o computador é sintomática. Não existe link.
reconhecimento facial é um algorítimo. Não tem experiência.
E como vc disse, não é disso (e nem poderia ser) que se trata no problema difícil.

Citar
Acho que o melhor exemplo é o do cego. Você não tem como passar de forma alguma a noção do que é "vermelho" para um cego. Você pode explicar que mecanismo físico faz com que veja "vermelho", que existem os fótons, que eles podem ser emitidos em diferntes freqüências, e que algumas células as distinguem e etc, mas isso não irá dar nenhuma noção ao cego do que é a experiência de "ver", muito menos da cor vermelha especificamente. Seria para ele um pouco como é para você tentar imaginar uma "cor que não existe", provavelmente pior, uma vez que você ao menos tem outras cores como exemplo

Frase que funciona para uma pessoa, OK.
Agora associar o processo de explicar para alguém ao de um computador, no sentido de que ele irá entender algo por analogias, etc.. nope.
Não sei se vc já programou em um computador. Vc ficaria extremamente decepcionado.

Citar
Assim, talvez mesmo esse programinha mais básico do computador pudesse ter algo análogo a "ver o vermelho", só que talvez sem análogo para qualquer experiência conhecida por nós. Ou talvez não. Mas talvez algum tipo de computador mais complexo tenha, não sabemos.

Aqui é outra questão. Não importa a complexidade do computador, o software que o faz agir.
E software Banzai é uma sequencia de passos executados rapidamente, entenda isso.
Computador não tem experiência porque não faz nada sem o software e o Software não tem experiência porque é um modelo matemático.
"Associação de termos", modelaria com um modelo matemático de grafos que se bem me lembro é uma "arvore cíclica conexa"

Então, sabemos. Não, não há experiência subjetiva em um computador, nem com software, nem juntando sistemas de arquivos ou banco de dados.









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Offline Buckaroo Banzai

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Re: O problema mente-corpo
« Resposta #80 Online: 29 de Abril de 2008, 15:49:27 »
Não vi ainda o problema com a analogia com um computador. Não que não hajam diferenças, diversas podem ser apontadas (e discutidas). Só não é claro que elas sejam fundamentais para a questão do "hard problem".


De outro texto do Chalmers:

Citar
2 Absent qualia and inverted qualia

The principle of organizational invariance is far from universally accepted. Some have thought it likely that for a system to be conscious it must have the right sort of biochemical makeup; if so, a metallic robot or a silicon-based computer could never have experiences, no matter what its causal organization. Others have conceded that a robot or a computer might be conscious if it were organized appropriately, but have held that it might nevertheless have experiences quite different from the kind that we have. These two sorts of objections are often known as the absent qualia and inverted qualia objections to broadly functionalist theories of consciousness.

http://cogprints.org/318/0/qualia.html



E a coisa não pára aí:

Citar
The project that Dan Lloyd has undertaken is admirable and audacious. He has tried to boil down the substrate of information-processing that underlies conscious experience to some very simple elements, in order to gain a better understanding of the phenomenon. Some people will suspect that by considering a model as simple as a connectionist network, Dan has thrown away everything that is interesting about consciousness. Perhaps there is something to that complaint, but I will take a different tack. It seems to me that if we apply his own reasoning, we can see that Dan has not taken things far enough. When we have boiled things down to a system as simple as a connectionist network, it seems faint-hearted to stop there, and perhaps a little arbitrary as well. So I will take things further, and ask what seems to be the really interesting question in the vicinity: what is it like to be a thermostat?
(Itálico meu)

http://consc.net/notes/lloyd-comments.html

Offline FZapp

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Re: O problema mente-corpo
« Resposta #81 Online: 01 de Maio de 2008, 11:45:08 »
Citar
Então um momento. Se eu criar um robô que é capaz de andar num labirinto sem bater nas paredes, através de sensores daqueles tipos dos carros que estacionam automaticamente, ele teria algum tipo de experiência subjetiva? (Ou mesmo esse equipamento dos carros?)

Não necessariamente. mas isso também não é um mapa.

Quando eu digo 'mapa 3d' me refiro a que o morcego coleta informações (atualizadas em décimas de segundo) de mais de um aparelho sensorial (ouvidos, nariz, sensações táciles do corpo mesmo) e as processa em conjunto.

Então você não tem somente uma coleção de instruções do que fazer caso o estímulo seja assim ou assado, que seria o necessário para o seu robô-rato.

Os mamíferos (e o morcego é um deles, ainda que existam opiniões em contrário, hahahahah!) possuem cérebros altamente complexos e estou supondo que consigam manipular o que chamamos de consciência, que seria a fabricação ilusória de uma entidade (no caso um 'ego') que detém o 'controle de processamento', reúne as informações e decide o caminho a seguir. Portanto ele precisa não só de sensações:

-> Precisa de circuitos básicos para se locomover (e aqui estamos falando do ferramental que nos ajuda a lidar com o resto do sistema, no caso do ser humano o hipotálamo principalmente; lembrem que passamos mais de ano para aprender a caminhar!)
-> A partir deles, deambula, falha e erra
-> Armazena informações (memória)
-> A partir de um 'banco de soluções', classifica eventos, isto é, decide e volta a catalogar

Não sei se percebem que para que este sistema funcione, um 'script' programático é insuficiente. É necessário que haja uma entidade que detenha o controle.

Já que estamos fazendo analogias com processamento de informações, o que Agnóstico descreveu é verdade para a programação estruturada, mas não para a orientação a objetos. Na orientação a objetos, tudo é objeto. Então você tem entidades 'mesa', 'cadeira', 'carro', você tem herança, então tem um entidade 'CAD 4345', que é uma entidade de tipo 'Ford Fiesta', com o atributo 'ano de fabricação' como '2002' e funções como 'andar de ré' ou 'abrir portamalas'.

Obviamente que a programação atual ainda é muitíssimo mais simples do que um cérebro de um mamífero, e diria que estas funções devem ser possíveis em outras espécies, mas é onde eu quero chegar: o problema 'duro' deriva da descrição que façamos de consciência, mas para mim é a evolução de um sistema para melhor resolver problemas, e resultado da complexidade do sistema (no caso, das funções do sistema nervoso).
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Re: O problema mente-corpo
« Resposta #82 Online: 01 de Maio de 2008, 11:55:55 »
Citar
Acho que o melhor exemplo é o do cego. Você não tem como passar de forma alguma a noção do que é "vermelho" para um cego. Você pode explicar que mecanismo físico faz com que veja "vermelho", que existem os fótons, que eles podem ser emitidos em diferntes freqüências, e que algumas células as distinguem e etc, mas isso não irá dar nenhuma noção ao cego do que é a experiência de "ver", muito menos da cor vermelha especificamente. Seria para ele um pouco como é para você tentar imaginar uma "cor que não existe", provavelmente pior, uma vez que você ao menos tem outras cores como exemplo.

Então, eu sinceramente não vejo como falar de 'qualia' dessa forma sem falar sobre a consciência, e a descrição que voc faz ('o cego e eu') pressupõe duas pessoas (duas entidades do gênero humano, em instâncias denominadas 'Banzai' e 'S Wonder') que nos levam a qustionar o que chamamos de consciência.

Porque a primeira pergunta que me faço é: experiência de quem ? Se temos um verbo, uma ação, e se alguém atribuiu essa ação a si mesmo, necessariamente é uma 'entidade', uma 'consciência'. Algo como 'eu, Julián Lakatos Popper tomei chimarrão e acabei de tossir'. Se falar só 'tossir' não tenho nem mesmo como enunciar o ocorrido. E se falar 'a pedra caiu' estou falando de um evento, e não de uma experiência. A experiència, novamente seria 'eu, Julián Lakatos Popper, vejo uma pedra cair'.

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Re: O problema mente-corpo
« Resposta #83 Online: 01 de Maio de 2008, 15:43:46 »
O "problema difícil" da consciência é tão difícil que já é difícil a começar pela própria explicação do que é o problema em si :D

O processamento desse nível existente pessoas e em muitos outros animais, pode realmente ser algo fundamental para a experiência dos qualia - não sabemos.

Você listou uma série de requisitos que acha que fariam a diferença entre uma entidade experimentar qualia e ser só um tipo de autômato zumbi-filosófico. Só que é concebível que, por um lado, que, talvez removendo boa parte dessa funcionalidade, ainda continuássemos com algo que experimenta os qualia (veja o texto do Chalmers sobre a possibilidade de termostatos experimentarem qualia);

E por outro lado, que talvez pudéssemos fazer um robô que fizesse isso tudo, e no entanto não experimentasse qualia - como no caso da "visão cega". Ele captaria as informações, seria capaz de se locomover, catalogar soluções, criar mapas, etc. Mas o processamento, sensorial ou das decisões, não seria acompanhado de uma "visão". Seria perfeitamente plausível que todos esses processos pudessem se dar "inconscientemente", sem originar a experiência dos qualia que discutimos. O robô agiria de acordo com um intrincado processamento dessas informações, poderia aprender que "ele" existe, até ser praticamente indistinguivel de uma pessoa em todas as suas capacidades mentais, e mecanismos pelos quais elas são alcançadas.

Não tem nada de inerente em qualquer tipo de processamento que saibamos que causa o fenômeno da consciência, e assim pode ser que processamentos dos mais complexos que se possa imaginar, não tenham nada nem "parecido" com qualquer experiência de qualia - mesmo que o resultado desse processamento fosse um comportamento absolutamente idêntico ao de um ser humano.

Mas mesmo assim, não haveria algo como "ser esse robô"; não haveria nada, diferentemente de nos imaginarmos como sendo outras pessoas ou animais complexos, que a partir dos seus sentidos criam os qualias diversos, tem "vozes internas" mentais (ao menos no caso dos humanos, depois da aquisição de um idioma).

Mas o mais estarrecedor é que o robô agiria como se isso fosse uma "mentira", ele diria ter experiências, gostar de algumas experiências subjetivas e etc, mas as teria de verdade, não esse "fenômeno" da experiência subjetiva, ainda que a entidade, tivesse as suas experiências individuais puramente "físicas"/funcionais, tal como uma pedra ou um computador tem. Não há nada do nosso comportamento que dependa desse fenômeno da experiência, nem mesmo relatar que esse fenômeno existe, e concordar que existe, apesar de não podermos realmente saber como é ser outra pessoa. Bizarro.

Isso até leva alguns a dizerem que isso de "qualia" nem existe, mas ao mesmo tempo, a meu ver, essa afirmação é praticamente nula, e me parece que talvez até implique contraditoriamente em algo como que na verdade existe, e é quase universal, um tipo de propriedade da física. Mas nesse ponto eu já nem sei se estou raciocinando direito.  :D

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Re: O problema mente-corpo
« Resposta #84 Online: 01 de Maio de 2008, 20:01:36 »
Existe 'qualia' sem persona ? Sem identidade de quem a experimenta ?
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Re: O problema mente-corpo
« Resposta #85 Online: 02 de Maio de 2008, 00:16:34 »
Não sabemos... só sabemos que existe em humanos, que por acaso, tem uma identidade e etc. A idéia de que não seja um requerimento não me parece ter qualquer erro fundamental...

Surely, somewhere on the continuum between systems with rich and complex conscious experience and systems with no experience at all, there are systems with simple conscious experience. A model with superposition of information seems to be more than we need - why, after all, should not the simplest cases involve information experienced discretely? We might imagine a traumatized creature that is blind to every other distinction to which humans are normally sensitive, but which can still experience hot and cold. Despite the lack of superposition, this experience would still qualify as a phenomenology. So, just as a connectionist network qualifies as a model of superimposed phenomenology, the thermostat seems to qualify as a model of this basic kind of phenomenology. Indeed, if we accept Lloyd's approach, it seems to follow that in this model we have stripped down the substrate of phenomenology to its bare essentials.

http://consc.net/notes/lloyd-comments.html


... mas poderia ser um requerimento, de qualquer forma... talvez até bem mais que isso...

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Re: O problema mente-corpo
« Resposta #86 Online: 02 de Maio de 2008, 08:03:36 »
Um cão gemendo de frio ?

:)

Preciso ler mais sobre essa qualia para tentar desfazer a impressão altamente antropocêntrica que ela me dá !
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Re: O problema mente-corpo
« Resposta #87 Online: 02 de Maio de 2008, 15:50:12 »
O problema difícil da consciência se estende para a ciência da computação, onde é discute a possibilidade de uma inteligência artificial consciênte, a chamada IA forte.

Citação de: Wikipédia
Inteligência artificial forte

A investigação em Inteligência Artificial Forte aborda a criação da forma de inteligência baseada em computador que consiga raciocinar e resolver problemas; uma forma de IA forte é classificada como auto-consciente.

A IA forte é tema bastante controverso, pois envolve temas como consciência e fortes problemas éticos ligados ao que fazer com uma entidade que seja cognitivamente indiferenciável de seres humanos.

A ficção científica tratou de muitos problemas desse tipo. Isaac Asimov, por exemplo, escreveu O Homem Bicentenário, onde um robô consciente e inteligente luta para possuir um status semelhante a de um humano na sociedade. E Steven Speilberg escreveu A.I Inteligência Artificial onde um garoto-robô procura conquistar o amor de sua "mãe", procurando uma maneira de se tornar real. Por outro lado, o mesmo Asimov reduz os robôs a servos dos seres humanos ao propor as três leis da robótica.
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Re: O problema mente-corpo
« Resposta #88 Online: 02 de Maio de 2008, 16:22:51 »
Dar o nome é a parte mais fácil (IA Forte) - não conhecia.

O difícil é por em prática.
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Offline FZapp

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Re: O problema mente-corpo
« Resposta #89 Online: 02 de Maio de 2008, 16:29:11 »
O problema difícil da consciência se estende para a ciência da computação, onde é discute a possibilidade de uma inteligência artificial consciênte, a chamada IA forte.

Citação de: Wikipédia
Inteligência artificial forte

A investigação em Inteligência Artificial Forte aborda a criação da forma de inteligência baseada em computador que consiga raciocinar e resolver problemas; uma forma de IA forte é classificada como auto-consciente.

A IA forte é tema bastante controverso, pois envolve temas como consciência e fortes problemas éticos ligados ao que fazer com uma entidade que seja cognitivamente indiferenciável de seres humanos.

A ficção científica tratou de muitos problemas desse tipo. Isaac Asimov, por exemplo, escreveu O Homem Bicentenário, onde um robô consciente e inteligente luta para possuir um status semelhante a de um humano na sociedade. E Steven Speilberg escreveu A.I Inteligência Artificial onde um garoto-robô procura conquistar o amor de sua "mãe", procurando uma maneira de se tornar real. Por outro lado, o mesmo Asimov reduz os robôs a servos dos seres humanos ao propor as três leis da robótica.

Steven Spielberg escreveu uma pinóia, é um conto de Brian Aldiss é que se chama 'Super Toys last all summer long' traduzido como 'Super-brinquedos duram o ano todo', aliás o roteiro baseado no conto foi escrito por nada mais e nada menos do que Stanley Kubrick, que chamou Spielberg para produzi-lo, e como queria fazê-lo 'à la Kubrick', demorou tanto para fazê-lo do jeito que queria, que acabou falecendo antes de terminar.

Mas enfim... velhos somos chatos mesmo.
--
Si hemos de salvar o no,
de esto naides nos responde;
derecho ande el sol se esconde
tierra adentro hay que tirar;
algun día hemos de llegar...
despues sabremos a dónde.

"Why do you necessarily have to be wrong just because a few million people think you are?" Frank Zappa

Offline Sergiomgbr

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Re:O problema mente-corpo
« Resposta #90 Online: 14 de Fevereiro de 2012, 19:05:03 »
Uma pergunta que talvez tenha a ver com a tal da "qualia", diz respeito a cores interferirem no gosto de um alimento.

 Afinal, se eu comer um sorvete rosa, já tendo comido um vermelho ou azul, ou roxo, tendo eles o mesmo sabor x,(para isso eu posso experimentá-los usando um óculos de cada cor, para minimizar a possibilidade do corante alterar a reação com as papilas gustativas) será que eu vou perceber alguma diferença? E se eu percebo alguma diferença isso é apenas algo essencialmente subjetivo?
Até onde eu sei eu não sei.

Offline Buckaroo Banzai

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Re:O problema mente-corpo
« Resposta #91 Online: 15 de Fevereiro de 2012, 19:59:53 »
Não chega a ter a ver. Podem existir "ilusões subjetivas" e se conseguir explicá-las sem abordar a questão de qualia, só lidando com a parte processual da questão.

Offline Sergiomgbr

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Re:O problema mente-corpo
« Resposta #92 Online: 15 de Fevereiro de 2012, 21:49:57 »
Isso parece meio hermético, a princípio. Pode clarificar um pouco? Não é tão "vermelhidão do vermelho" quanto, em certa instância???
Até onde eu sei eu não sei.

Offline Buckaroo Banzai

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Re:O problema mente-corpo
« Resposta #93 Online: 16 de Fevereiro de 2012, 09:15:49 »
É uma questão "funcional", como um bug de um aparelho que servisse para identificar cores, controlado por voz, onde o tom de voz de operador afetasse o processo de identificação de cores (por bug).

 

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