Autor Tópico: Ateísmo e Moral; Religiões e Moral.  (Lida 7784 vezes)

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Ateísmo e Moral; Religiões e Moral.
« Online: 26 de Outubro de 2008, 23:28:32 »


Estados laicos são garantidores da liberdade de crença ou não crença. O ateísmo vem ganhando algum espaço, apesar de pequeno frente aos que seguem qualquer religião. Os crentes não sabem como lidar com ateus, e ateus não sabem como lidar com crentes. Tanto de um lado quanto de outro há acusações das mais variadas, que culminam em desavenças típicas de disputas religiosas, cada qual buscando demonstrar a superioridade de sua opção. Mas ser ateu ou ser religioso é realmente um fim em si ou é apenas um meio para se buscar algo superior?

O ser humano precisa de certos critérios para poder viver em sociedade. Ordenações jurídico-políticas existem em todos os lugares do planeta, e cada qual deve contemplar o pensamento dominante daquela sociedade. Objetivamente não se pode dizer que qualquer sociedade possua leis arbitrárias, eis que a lei é externação do que aquela sociedade define como justo. A importância de uma lei só deve ser analisada sob o prisma da sociedade em questão; se ela concorda com tais leis, então ela não é arbitrária. O fim nunca será uma lei universalmente perfeita, mas uma lei que agrade a sociedade em questão.

Com posições religiosas a questão é parecida, mas com o foco não voltado à sociedade, mas ao indivíduo. O ser humano precisa lidar com situações que só têm validade entre seres humanos, eis que são criações suas. Ajudar o próximo, dizer obrigado, cumprimentar com um aperto de mão, dar atenção em uma conversa, são exemplos de questões morais e não reguladas por leis. Trata-se de atos que dependem exclusivamente do indivíduo em seu ministério particular, e que não podem ser exigidas por ninguém.

Um indivíduo que entende que sua religião é superior por cultuar um determinado Deus ou prática religiosa, e se revolta com quem assim não o faz, só pode estar errado, porque se preocupa com o meio e não com o fim. Um ateu que entende que sua posição é superior por não cultuar nenhum Deus, e se revolta com quem assim não o faz, só pode estar errado, porque se preocupa com o meio e não com o fim.

Se a religião achar que é um fim em si mesmo, de modo que não tolere visões diferentes, haverá intolerâncias. Se o ateísmo achar que é um fim em si mesmo, de modo que não tolere visões diferentes, haverá intolerâncias.

O resultado prático de um religioso admirável será a boa moral. Este encontrará em seus livros sagrados os fundamentos de sua moral. O resultado prático de um ateu admirável será a boa moral. Este encontrará em seus livros de ética, filosofia e história  os fundamentos de sua moral.

Um religioso admirável vê na sua crença o fundamento da boa moral. Um ateu admirável vê na razão e lógica o fundamento da boa moral. Os dois trilham caminhos diversos para chegar ao mesmo fim; os meios são diferentes, mas o resultado é o mesmo. Qual a diferença prática de uma e outra coisa?

Se não importam os motivos que levam alguém a fazer o mal - Lindemberg diz que matou por amor - por coerência não deve importar os motivos que leve alguém a fazer o bem. Se porque assim diz a lei sagrada, ou se assim porque assim diz a ética e razão filosófica, pouco importa. O que importa mesmo é o resultado bom.

Se não se pode dizer que todos crentes são bons, também não se pode dizer que todos ateus são bons. E se o que importa são os resultados práticos, esse deve ser o único prisma de análise, e não a posição religiosa.

O ateísmo intolerante e dogmático, visto como fim em si mesmo, guiado pela bandeira da superioridade, inevitavelmente se tornará algo pernicioso, assim como alguns religiosos agem. O que se deve buscar é a tolerância. Porque religião e ateísmo são em apenas um meio. Se analisados de forma hermeticamente fechados em si, não têm qualquer relevância, seja para atingir os fins que os livros sagrados pregam, seja para atingir os fins que a ética e a razão pregam.




Offline Luis Dantas

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Re: Ateísmo e Moral; Religiões e Moral.
« Resposta #1 Online: 26 de Outubro de 2008, 23:44:12 »
Se não importam os motivos que levam alguém a fazer o mal - Lindemberg diz que matou por amor - por coerência não deve importar os motivos que leve alguém a fazer o bem. Se porque assim diz a lei sagrada, ou se assim porque assim diz a ética e razão filosófica, pouco importa. O que importa mesmo é o resultado bom.

Não acho que essa simetria se aplique.  Uma das diferenças entre "bem" e "mal" é que o primeiro envolve a habilidade de tomar certos cuidados para preservar e manter situações, enquanto que o segundo não necessariamente precisa dessa capacidade.  O bem se opõe à decadência natural das situações; tem intenção e vontade; precisa de maturidade e discernimento.  E precisa também de motivação clara e madura.

Os resultados concretos, é claro, pesam bastante.  Mas não podem ser consistentemente construtivos ao longo do tempo e das várias circunstâncias sem um mínimo de raciocínio claro e motivação definida.  Em uma palavra, lucidez.  Não apenas tolerância, mas também lucidez.
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Offline Moro

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Re: Ateísmo e Moral; Religiões e Moral.
« Resposta #2 Online: 26 de Outubro de 2008, 23:53:38 »
Gostei Jus,

Mas quando você tem que se preocupar com os meios, o que você faz? A divisão da coisa toda entre "meios" e "fins" faz sentido para qualquer coisa mais complexa do que uma construção civíl? Digo, na construção de uma sociedade, não há um fim (ou finalidade), há apenas uma construção sem fim de meios que corrigem desvios detectados e realmente não nos levam a nenhum lugar.

Outro ponto é que quando olhamos o resultado que conseguimos a partir de uma ação, esta denominada como um meio, talvez esqueçamos que essa ação não nos fez apenas chegar ao fim que idealizamos, ela pode ter gerado ou não sequelas, pode ter "custado" mais ou menos...

Acho que os meios acabam sendo fundamentais
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Offline JUS EST ARS

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Re: Ateísmo e Moral; Religiões e Moral.
« Resposta #3 Online: 27 de Outubro de 2008, 00:06:17 »


Citação de: Dantas
Em uma palavra, lucidez.  Não apenas tolerância, mas também lucidez.

Um lunático que ajude um cadeirante a subir uma elevação pratica a boa moral, a despeito de sua não lucidez.

Embora concorde com você, diria que a tolerância está um patamar acima no que se refere a permitir a realização da boa moral.


Citação de: Agnóstico
Mas quando você tem que se preocupar com os meios, o que você faz? A divisão da coisa toda entre "meios" e "fins" faz sentido para qualquer coisa mais complexa do que uma construção civíl? Digo, na construção de uma sociedade, não há um fim (ou finalidade), há apenas uma construção sem fim de meios que corrigem desvios detectados e realmente não nos levam a nenhum lugar.

Outro ponto é que quando olhamos o resultado que conseguimos a partir de uma ação, esta denominada como um meio, talvez esqueçamos que essa ação não nos fez apenas chegar ao fim que idealizamos, ela pode ter gerado ou não sequelas, pode ter "custado" mais ou menos...


Os meios são importantes em situações em que os meios são concretos, causam algum efeito no mundo fático. Em situações em que os meios se localizam apenas na mente, nas elocubrações internas, no mundo das idéias, estes são incapazes de produzir reflexo positivo ou negativo no mundo exterior.

Como os motivos religiosos, ou a ética, ou a filosofia são abstrações que só se concretizam no momento em que se externam no mundo fático, são incapazes de imprimir efeitos ou gerar sequelas ou efeitos colaterais por si, eis que continuam como meras asbtrações.

Se eu quiser ajudar alguém porque assim diz a bíblia, o ajudado nunca saberá o meio que guiou tal fim, a não ser que eu o revele. E se eu ajudar alguém porque a ética e razão recomendam, o mesmo se operará. Nos dois casos, os meios não causam qualquer efeito na realidade, e chegam ao mesmo resultado.


Offline Moro

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Re: Ateísmo e Moral; Religiões e Moral.
« Resposta #4 Online: 27 de Outubro de 2008, 00:08:51 »
Talvez se eu queira ajudar alguém porque diz a Bíblia, esse alguém não possa ser homossexual.

Não acho que as coisas possam ficar apenas na mente Jus. O que você está pondo como o motor de uma ação, não é apenas a força motriz desta última ação.
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Offline JUS EST ARS

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Re: Ateísmo e Moral; Religiões e Moral.
« Resposta #5 Online: 27 de Outubro de 2008, 00:13:12 »


Talvez se eu queira ajudar alguém porque diz a Bíblia, esse alguém não possa ser homossexual.

Não acho que as coisas possam ficar apenas na mente Jus. O que você está pondo como o motor de uma ação, não é apenas a força motriz desta última ação.

Ateus não necessariamente são complacentes com homossexualismo, e religiosos não necessariamente o repudiam.

Um ateu tolerante com o homossexualismo ajudará tal pessoa, bem como o religioso.

Vê como a tolerância é a chave, e não a posição religiosa?



Offline Luis Dantas

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Re: Ateísmo e Moral; Religiões e Moral.
« Resposta #6 Online: 27 de Outubro de 2008, 00:15:29 »
Citação de: Dantas
Em uma palavra, lucidez.  Não apenas tolerância, mas também lucidez.

Um lunático que ajude um cadeirante a subir uma elevação pratica a boa moral, a despeito de sua não lucidez.

Não sei, não estou convencido.  Me parece um evento aleatório, acidental.

Citar
Embora concorde com você, diria que a tolerância está um patamar acima no que se refere a permitir a realização da boa moral.

Acima de que?
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Re: Ateísmo e Moral; Religiões e Moral.
« Resposta #7 Online: 27 de Outubro de 2008, 00:17:38 »
Ateus não necessariamente são complacentes com homossexualismo, e religiosos não necessariamente o repudiam.

Um ateu tolerante com o homossexualismo ajudará tal pessoa, bem como o religioso.

Vê como a tolerância é a chave, e não a posição religiosa?

Mas essa é mesmo uma questão de tolerância?  Penso que não.  O que leva a essa boa vontade para com o homossexualismo, se não for o discernimento?
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Re: Ateísmo e Moral; Religiões e Moral.
« Resposta #8 Online: 27 de Outubro de 2008, 00:18:10 »
Jus

Sim, concordo, não quis dizer que um religioso pode não ser tolerante e vice verso.
Também não quero entrar na discussão se as estatísticas são mais ou menos favoráveis a um ou outro.

O que estou postulando é que a qualidade do sistema de idéias que a pessoa usa vai fazê-lo ser mais ou menos eficiente em realizar o bem, de modo que os meios não podem ser ignorados.
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Re: Ateísmo e Moral; Religiões e Moral.
« Resposta #9 Online: 27 de Outubro de 2008, 00:26:47 »


Citação de: Dantas
Em uma palavra, lucidez.  Não apenas tolerância, mas também lucidez.

Um lunático que ajude um cadeirante a subir uma elevação pratica a boa moral, a despeito de sua não lucidez.

Não sei, não estou convencido.  Me parece um evento aleatório, acidental.

Uma criança pequena que divide os brinquedos; um bêbado que pede licença, paga a conta e vai embora; um cachorro que é fiel. Todos não são lúcidos como eu ou você aqui e agora, e nesses contextos, realizam atos morais.

Citar
Embora concorde com você, diria que a tolerância está um patamar acima no que se refere a permitir a realização da boa moral.

Acima de que?

Tolerância com as diferenças é mais importante para a realização da moral que a lucidez. O bom ato nem sempre é lúcido.

Enquanto a lucidez guia o ato, a intolerância com o pensamento alheio pode evitar que um ato moral sequer se realize (até visitaria os doentes do hospital, mas não vou porque lá tem um monte de crente chato).


Offline JUS EST ARS

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Re: Ateísmo e Moral; Religiões e Moral.
« Resposta #10 Online: 27 de Outubro de 2008, 00:37:29 »


O que estou postulando é que a qualidade do sistema de idéias que a pessoa usa vai fazê-lo ser mais ou menos eficiente em realizar o bem, de modo que os meios não podem ser ignorados.

É possível que uma pessoa querendo fazer o bem acabe por fazer o mal (ex. fazer o filho fumar um pacote de cigarro com a intenção de causar-lhe aversão, mas acabar por torná-lo um viciado). E alguém querendo fazer o mal acabe por fazer o bem (ex. jogar uma pedra na janela, errar o alvo e acertar o assassino que vinha passando).



Offline Luis Dantas

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Re: Ateísmo e Moral; Religiões e Moral.
« Resposta #11 Online: 27 de Outubro de 2008, 00:39:22 »
Uma criança pequena que divide os brinquedos; um bêbado que pede licença, paga a conta e vai embora; um cachorro que é fiel. Todos não são lúcidos como eu ou você aqui e agora, e nesses contextos, realizam atos morais.

Discordo respeitosamente.  A criança está cultivando, aprendendo a moral, provavelmente guiada por alguma autoridade externa.  O bêbado está seguindo os condicionamentos que cultivou exercendo sua moral.  O cão, talvez tenha consciência dos sentimentos e expectativas do ser humano a que está ligado.  Não são situações tão divorciadas assim das motivações envolvidas.  E não tem valor moral algum se não houver algum grau de discernimento e lucidez envolvidos.

Citar
Tolerância com as diferenças é mais importante para a realização da moral que a lucidez. O bom ato nem sempre é lúcido.

Não?

Citar
Enquanto a lucidez guia o ato, a intolerância com o pensamento alheio pode evitar que um ato moral sequer se realize (até visitaria os doentes do hospital, mas não vou porque lá tem um monte de crente chato).

Isso tampouco é tolerância.  Coragem moral seria um nome mais adequado.  Tolerância não é uma atitude ativa.
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Re: Ateísmo e Moral; Religiões e Moral.
« Resposta #12 Online: 27 de Outubro de 2008, 00:45:45 »


Não sei se concordo que a lucidez é tão importante quanto a tolerância, pelos motivos que coloquei. Mas de qualquer forma, lucidez e tolerância são atributos alcançáveis por ateus e religiosos, sendo o problema a ausência destes  atributos, e não a presença de ateus ou religiosos.



Offline Luis Dantas

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Re: Ateísmo e Moral; Religiões e Moral.
« Resposta #13 Online: 27 de Outubro de 2008, 00:47:12 »
Ah, isso é verdade.
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Offline Moro

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Re: Ateísmo e Moral; Religiões e Moral.
« Resposta #14 Online: 27 de Outubro de 2008, 23:48:07 »
Jus,

Usando a analogia do bêbado. O cara pode estar em um bar, pagar sua conta e ir embora, pegar o carro e matar alguém. O que aconteceu é que seu estado não permitiu que atingisse a plenitude de sua capacidade, além de gerar efeitos colaterais.

Mas como não gosto de analogias...

Não dá para julgar alguém apenas pela maneira como ele executa um ato específico. O sistema ideológico adotado por uma pessoa pode ser bom para realizar algumas tarefas, e péssimo para outras.
Querer descrever a complexidade ou o espectro de qualidades de uma pessoa através da análise de alguns atos específicos é muito difícil, quer sejam esses atos bons ou ruins, isto é, é difícil fazer uma generalização a partir  de "um ateu fazendo o ato X" ou "um espírita fazendo o ato X" e encontrar algo como os meios não importam.
Nosso dia a dia é composto de um sem fim de atos e atitudes, e certamente eles são qualitativamente afetados pela qualidade de nossa ideologia.
« Última modificação: 27 de Outubro de 2008, 23:58:03 por Agnóstico »
“If an ideology is peaceful, we will see its extremists and literalists as the most peaceful people on earth, that's called common sense.”

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Offline Luis Dantas

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Re: Ateísmo e Moral; Religiões e Moral.
« Resposta #15 Online: 27 de Outubro de 2008, 23:55:34 »
Jus, um autor que pode te interessar: Lawrence Kohlberg

http://en.wikipedia.org/wiki/Kohlberg's_stages_of_moral_development

(Finalmente me lembrei do nome dele) :)
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Offline JUS EST ARS

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Re: Ateísmo e Moral; Religiões e Moral.
« Resposta #16 Online: 28 de Outubro de 2008, 00:27:55 »


Paixões das mais variadas guiam o ser humano. Sexo, política, dinheiro, poder, religião etc. Não houvessem tais paixões, e fôssemos absolutamente racionais seríamos todos iguais, mas robôs inúteis.

Filosofias religiosas são paixões inerentes a seres humanos. Mesmo o ateu sem religião é inclinado a se apaixonar por sua opção, declarando a superioridade de sua escolha. Quando isso acontece, não há absolutamente diferença entre isso e se defender uma opção religiosa.

Escolher uma posição religiosa é como escolher uma camiseta. Uns gostam de azul, outros de vermelho. Mas ambas servem de vestimenta.

O problema surge quando os que preferem a camiseta vermelha se dizem superiores, porque vermelho é a cor do sangue, que é a essência dos seres humanos. De outro lado, os que gostam de camisa azul se dizem superiores, porque azul é o céu e o mar, de onde viemos, é lá que está a essência.

Os dois lados se degladiam para decidir quem está certo, até que surge alguém sem camisa, e diz que é ele o único certo, porque todos nascem sem camisa. Os de camisa azul só têm uma certeza em comum: a camisa; e o descamisado quer se opor a isso. Quem sempre se apegou a uma camisa a acha importante; o descamisado não vê qualquer importância nela.

A única coisa em comum entre eles é que com camisa ou sem camisa são seres humanos; ninguém está certo por estar com ou sem ela; mas qualquer um pode estar certo por apontar que com camisa ou sem camisa a essência é que somos seres humanos; a roupa é secundária, ou terciária, ou nem isso.

Há pessoas que sentem mais frio que outras, e por isso, sempre dependerão de uma camisa para poder viver e/o se sentirem bem. Pode-se dizer que uma camisa denuncia o caráter de uma pessoa? Certamente que não. O que importa é o caráter de quem veste a camisa.

O fim da camisa é proteger do frio e vestir; se a cor vai ser azul ou vermelha, ou se você vai se esquentar ligando o aquecedor, pouco importa.



Offline Galthaar

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Re: Ateísmo e Moral; Religiões e Moral.
« Resposta #17 Online: 28 de Outubro de 2008, 00:56:20 »

E se inventássemos a Droga da Obediência e todos os seres humanos se tornassem zumbis sem mente, mas extremamente bondosos (em seus atos, obviamente)? Isto é realmente desejável?

A lucidez é muito mais importante, principalmente porque é ela que define o que é a moral.

Os meios (métodos de pensamento) neste caso importam muito, pelo simples fato de que a moral não é absoluta.
"A dominação social no capitalismo, no seu nível mais fundamental, não consiste na dominação das pessoas por outras pessoas, mas na dominação das pessoas por estruturas sociais abstratas constituídas pelas próprias pessoas."

Moishe Postone, Tempo, trabalho e dominação social

Offline JUS EST ARS

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Re: Ateísmo e Moral; Religiões e Moral.
« Resposta #18 Online: 28 de Outubro de 2008, 01:23:27 »


Dou o braço a torcer na questão da lucidez.

Mas me diga, um ato essencialmente religioso e um ato essencialmente filosófico são capazes por si, de definir que um ou outro será bom? Um ser humano não pode aplicar a má religião ou a má filosofia?

A religião busca um critério divino de moral, que seria absolutamente bom, justo e perfeito. A filosofia moral racional busca o mesmo. É possível, através de qualquer das premissas, se chegar a um ato bom. E é possível, por qualquer dos lados que se trilhe, ficar perdido em dogmatismos que culminem em atos maus.

O princípios que norteiam as religiões são perfeitos, bem como os que norteiam a filosofia. Ambos querem praticar o bem de forma justa e perfeita. Deus é uma abstração, e para o religioso, fonte do absolutamente bom, justo e perfeito. Para o filósofo racional, a fonte é a mente humana, mas igualmente abstrata é a definição de bom, justo e perfeito.

O problema surge quando se dogmatiza esses princípios abstratos e essencialmente bons em forma de regras rígidas, que podem ter significados ambíguos e infinitas interpretações.

Isso se dá com o religioso que segue a bíblia ao pé da letra; e não com o que transcende seu significado e se guia por um critério principiológico, e extrai do texto escrito lições que contrariam a bíblia, mas atende o bom, justo e perfeito.

O mesmo se dá com o filósofo que adota qualquer escrito de outro grande filósofo como verdade universal que deve ser levado ao pé da letra. Quando ele transcende o texto e se apega à idéia principiológica, encontra a boa filosofia.

Reitero, o que importa não é um ato que se pauta pelo racionalismo filosófico ou outro guiado por religiosidade divina; o que importa é qual fiel se foi à idéia central de ambas coisas: bom, justo e perfeito.




Offline FxF

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Re: Ateísmo e Moral; Religiões e Moral.
« Resposta #19 Online: 29 de Outubro de 2008, 05:02:20 »
A Bíblia é um livro bárbaro de com idiotices de dois milênios. Não há nada que impeça alguém ter bons atos a partir disso, mas as probabilidades vão caindo...

Offline JUS EST ARS

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Re: Ateísmo e Moral; Religiões e Moral.
« Resposta #20 Online: 29 de Outubro de 2008, 12:37:14 »


Sim, quanto mais apegado à literalidade do texto bíblico como sendo uma verdade divina absoluta, pior. E quanto mais apegado à literalidade de um texto filosófico como sendo a expressão única da bondade, justiça e perfeição, pior.

Religiões relativizam bastante a Bíblia. Apesar de a adotarem, as cristãs se apegam mais ao novo testamento. Já os fiéis frequentemente dizem "essa parte só valia naquela época; isso não deve ser levado ao pé da letra; só aceito os 10 mandamentos; só aceito o novo testamento" etc.

Já a filosofia também adota múltiplas correntes que dão visões diferentes sobre problemas morais, se harmonizando e evitando dogmatismos.



Offline uiliníli

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Re: Ateísmo e Moral; Religiões e Moral.
« Resposta #21 Online: 29 de Outubro de 2008, 21:53:27 »
Filosofias religiosas são paixões inerentes a seres humanos. Mesmo o ateu sem religião é inclinado a se apaixonar por sua opção, declarando a superioridade de sua escolha. Quando isso acontece, não há absolutamente diferença entre isso e se defender uma opção religiosa.

Até concordo que existam ateus assim, mas eu não me identifico com eles. A começar porque "filosofia religiosa" é uma contradição em termos: a filosofia se baseia puramente na razão, não tem lugar para a fé e nesses sentido não faz sentido classificar a filosofia ateísta como religiosa.

Outra coisa é que filosofia é incompatível com paixão; ora, filosofia é "amor à sabedoria" e há uma grande diferença entre amor e paixão: amor é generoso, paixão é possessiva. Sendo assim, quem ama a sabedoria está disposto a fazer concessões, admitir o erro e rever suas posições quando a lógica e a razão recomendam. Quem tem paixão, por outro lado, está fechado para a verdade e não aceita conclusões que não a sua própria. A partir do momento em que você se apaixona por uma idéia você perde a razão.

Citar
Escolher uma posição religiosa é como escolher uma camiseta. Uns gostam de azul, outros de vermelho. Mas ambas servem de vestimenta.
(...)

Má analogia. Escolher uma visão de mundo não é como escolher uma camiseta, enquanto isto é uma questão de gosto pessoal onde não se pode determinar objetivamente se uma opinião é melhor do que outra, a escolha de uma visão de mundo esbarra no pequeno detalhe de que há um mundo aí que é visível e aparentemente cogniscível e que pode acontecer de uma opinião estar correta e todas as outras erradas.

Não concordo com a sua insinuação de que toda troca de idéias, toda discussão no sentido de atritar idéias umas contra as outras seja necessariamente prática de intolerência e indutora de conflitos. Embora isso seja verdade para as pessoas "apaixonadas", pessoas sábias, maduras, e interessadas no conhecimento podem - e devem - discutir educada e civilizadamente. 

Estou em geral me referindo ao plano teórico, mas me parece que a ênfase da sua conversa sobre camisas está no plano moral, onde para você não há diferença entre uma ética laica e uma ética religiosa. Bom, a minha crítica é que a ética religiosa é necessariamente dogmática e geralmente irrefletida, ela não é baseada primeiramente sobre uma preocupação genuína com a justiça, ela é imposta, revelada, definida por Deus. Para um religioso matar não é errado pela conseqüência desse ato, é errado porque Deus diz que é errado.

E isso é muito perigoso, porque temos exemplos mais do que suficientes na história, inclusive na história é recente, de como é fácil convencer certas pessoas de que Deus legitima atos imorais. Os terroristas que perpetraram os atentados de 11 de setembro, do ponto de vista moral tinham suas consciências tranqüilas, pois estavam convencidos de que agiam conforme a vontade divina. A frase de Arthur C. Clarke "Com ou sem religião, as pessoas boas continuariam boas e as pessoas más continuariam más, mas para levar uma pessoa boa a fazer o mal, você precisa de religião" é uma verdade demonstrada empiricamente.

Offline uiliníli

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Re: Ateísmo e Moral; Religiões e Moral.
« Resposta #22 Online: 29 de Outubro de 2008, 22:01:40 »
Sim, quanto mais apegado à literalidade do texto bíblico como sendo uma verdade divina absoluta, pior. E quanto mais apegado à literalidade de um texto filosófico como sendo a expressão única da bondade, justiça e perfeição, pior.

Verdade. Mas uma pessoa verdadeiramente racional não se apegará nem a uma coisa e nem a outra. Ninguém realmente cultua um texto filosófico como expressão última da verdade, a não ser que não entenda nada de filosofia... Veja bem que quem convida seus partidários a aceitar com paixão suas idéias é a religião, a filosofia convida a compreender, refletir criticamente e então aceitar ou não.

Offline JUS EST ARS

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Re: Ateísmo e Moral; Religiões e Moral.
« Resposta #23 Online: 30 de Outubro de 2008, 09:33:31 »


Citação de: uiliníli
Citar
Escolher uma posição religiosa é como escolher uma camiseta. Uns gostam de azul, outros de vermelho. Mas ambas servem de vestimenta.
(...)

Má analogia. Escolher uma visão de mundo não é como escolher uma camiseta, enquanto isto é uma questão de gosto pessoal onde não se pode determinar objetivamente se uma opinião é melhor do que outra, a escolha de uma visão de mundo esbarra no pequeno detalhe de que há um mundo aí que é visível e aparentemente cogniscível e que pode acontecer de uma opinião estar correta e todas as outras erradas.

Acho que você perdeu o ponto principal da historinha :P :

Os dois lados se degladiam para decidir quem está certo, até que surge alguém sem camisa, e diz que é ele o único certo, porque todos nascem sem camisa. Os de camisa azul só têm uma certeza em comum: a camisa; e o descamisado quer se opor a isso. Quem sempre se apegou a uma camisa a acha importante; o descamisado não vê qualquer importância nela.

A única coisa em comum entre eles é que com camisa ou sem camisa são seres humanos; ninguém está certo por estar com ou sem ela; mas qualquer um pode estar certo por apontar que com camisa ou sem camisa a essência é que somos seres humanos; a roupa é secundária, ou terciária, ou nem isso.

Há pessoas que sentem mais frio que outras, e por isso, sempre dependerão de uma camisa para poder viver e/o se sentirem bem. Pode-se dizer que uma camisa denuncia o caráter de uma pessoa? Certamente que não. O que importa é o caráter de quem veste a camisa.

O fim da camisa é proteger do frio e vestir; se a cor vai ser azul ou vermelha, ou se você vai se esquentar ligando o aquecedor, pouco importa.

Camisa vermelha/azul: religiosos; sem camisa: ateu.



Offline Luis Dantas

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Re: Ateísmo e Moral; Religiões e Moral.
« Resposta #24 Online: 30 de Outubro de 2008, 09:40:00 »
O problema com esse tipo de análise é que se baseia em uma falsa dicotomia.  Pode ser confortável classificar as pessoas em duas categorias distintas (religiosas e atéias) mas não é o que de fato acontece na realidade. 

Por um lado, crer em Deus, mesmo em religiões teístas, é mais uma meta do que um fato - e mesmo quem crê sinceramente raramente chega a algum consenso sobre o que esse tal Deus efetivamente é.

Por outro, religiosidade não depende nem precisa da crença em Deus.
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Em 18 de janeiro de 2010, ainda não vejo motivo para postar aqui. Estou nos fóruns Ateus do Brasil, Realidade, RV.  Se a Moderação reconquistar meu respeito, eu volto.  Questão de coerência.

 

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