Campos de negóciosDe olho na Copa 2014, os principais estádios brasileiros viram polos comerciais, atraem empresas e geram receitas para investidores
Pioneiro: o Atlético-PR foi o primeiro a apostar nos negócios dentro dos estádiosNa maioria das cidades brasileiras, ir a um estádio de futebol é algo que se aproxima de um sacrilégio. Dificuldade de acesso, sujeira, banheiros alagados, falta de opções de alimentação, visibilidade ruim, cadeiras quebradas (isso quando elas existem) e, em alguns casos, estruturas em ruínas que ameaçam a segurança dos torcedores. Se as pessoas não vão aos estádios, os clubes deixam de ganhar dinheiro. Como manter esses gigantes custa caro, historicamente os grandes estádios do País sempre sugaram os cofres dos times de futebol. Nos últimos anos, porém, os clubes mais bem administrados descobriram que havia uma solução. Inspirados em exemplos internacionais, eles começaram a transformar os templos do futebol em grandes polos de negócios. Em vez de deixar a monumental estrutura parada, torrando milhares de reais, eles perceberam que podiam lucrar oferecendo uma variedade de serviços muitas vezes só encontrada em shopping centers, como restaurantes, lanchonetes, cafés, lojas de roupas, livrarias e academias de ginástica. De deficitários, alguns dos principais estádios do País se tornaram uma importante fonte de receitas. Mas isso é só uma parte do que está por vir. Com a escolha do Brasil para sediar a Copa do Mundo de 2014 (o anúncio oficial dos dez estádios escolhidos pela Fifa será feito no dia 31 de maio), o futebol brasileiro se prepara para receber o maior ciclo de investimentos de sua história.

Bonito e lucrativo: a assinatura de Ruy Ohtake está na remodelação do Morumbi. Até o final do ano, o anel inferior do estádio será um shoppingSegundo estudo feito pela Fundação Getulio Vargas, a realização no Brasil do evento esportivo mais importante do mundo exigirá uma injeção de recursos da ordem de R$ 35,9 bilhões. Desse montante, R$ 3,5 bilhões devem ser destinados para transformar velhas estruturas de cimento em modernas arenas multiuso. Favorito para receber a abertura da Copa, o Morumbi, que pertence ao São Paulo, consumirá R$ 130 milhões em reformas e adequações exigidas pela Fifa, entidade que regula o futebol mundial. Como o estádio possui uma base que não sofrerá mudanças profundas, esse valor é baixo perto do que outros projetos custarão. Na manhã da segunda-feira 18, o presidente do São Paulo, Juvenal Juvêncio, reuniu-se com o arquiteto Ruy Ohtake para acertar os últimos detalhes da adequação do estádio (as imagens do novo Morumbi que ilustram esta reportagem foram enviadas com exclusividade para a DINHEIRO pelo escritório de Ohtake).

Nos últimos anos, o São Paulo tem se dedicado a expandir os serviços oferecidos no Morumbi. Desde 2007, funciona ali a maior loja em um estádio da América Latina. Trata-se da Reebok Concept Store, um espaço de 700 m2 onde são vendidos uniformes do clube e outros artigos esportivos. A loja é a mais lucrativa da Reebok no Brasil. Foi um investimento tão bem-sucedido que a empresa decidiu inaugurar, no final de 2008, uma segunda loja em estádios de futebol. Ela fica no Beira-Rio, de propriedade do Internacional de Porto Alegre (candidato a receber partidas da Copa). “Há uma tendência no mundo em transformar estádios em shopping centers”, afirma Sérgio Milano, dono da rede de livrarias Nobel. No início do ano, Milano, que é são-paulino, desembolsou R$ 500 mil para abrir uma loja no Morumbi. Não se arrepende. O retorno do investimento, esperado para o fim de 2009, já veio. “O interessante é que abrimos todos os dias e a loja tem um movimento forte que não depende da realização das partidas de futebol”, afirma o empresário. Até o fim do ano, ele quer inaugurar duas novas livrarias em estádios. Para o clube, trata-se de lucro garantido. “O Morumbi era um gigante adormecido que dava prejuízo nos balanços”, afirma o presidente do São Paulo, Juvenal Juvêncio. “Agora, a situação é oposta.” Se há uma década a participação do Morumbi nas receitas totais do clube era irrisória, hoje ela está em torno de 15%. Em 2009, o estádio deverá gerar ao São Paulo pelo menos R$ 20 milhões.
Vila gremista: a arena projetada pelo Grêmio terá lojas dentro do estádio. Ao redor, a construtora OAS irá construir centros comerciais e prédios residenciaisO dilema Maracanã
O estádio candidato a abrigar a final do Mundial ainda espera pelo seu projeto de reforma

Atraso: o novo Maracanã só deve ser apresentado em julho
O chamado “Maracanã do futuro” está distante do papel. O candidato natural a receber a final da Copa do Mundo de 2014 ainda não tem o seu croqui de reestruturação. Não se sabe se haverá lojas e restaurantes na parte interna do estádio, único espaço onde as modificações são permitidas. A estrutura interna será mantida, em razão do tombamento pelo patrimônio histórico. O atraso está ligado à decisão do governo do Estado do Rio de Janeiro de encerrar seu ciclo de investimentos no estádio. De 1999 a 2007, foram injetados R$ 300 milhões de dinheiro público para consertar os problemas do mais famoso palco do futebol brasileiro. A proposta é repassar para a iniciativa privada a gestão do complexo esportivo, por meio de uma Parceria Público- Privada (PPP), que encerrou a consulta pública na sexta-feira 22. A partir dessa data, a Secretaria de Esporte, Turismo e Lazer do Rio de Janeiro, que administra o estádio, tem 10 dias para inserir as propostas no edital de licitação e abrir o processo de concorrência. O vencedor deve ser anunciado em julho. O governo abre mão de qualquer receita gerada pelo novo Maracanã. Uma coisa, porém, é certa: os custos de adequação do gigante carioca serão os mais altos entre os estádios da Copa. Devem superar os R$ 400 milhões.

Arena verde: o Palmeiras cedeu para a W.Torre o direito de explorar o novo Palestra Itália. Em troca, a construtora arca com os custos de R$ 300 milhões do projetoO Clube Atlético Paranaense foi um dos pioneiros nesse processo. Em 1996, muito antes de os outros clubes se mexerem, introduziu o conceito de arena, em Curitiba. O que era o tal conceito? Um estádio que oferece conforto aos torcedores e que pode ser utilizado de múltiplas formas – como espaço para lojas ou academias de ginástica, por exemplo. Na última década, o estádio jamais foi deficitário, um feito notável num país em que os times estão acostumados a fechar os balanços no vermelho. No ano passado, a academia de ginástica que funciona ali gerou R$ 700 mil para o clube. A arena atleticana ainda tem uma loja da Umbro, lanchonete e churrascaria. Até o fim do ano, a diretoria do clube pretende inaugurar um bar temático assinado pela GRSA, maior grupo de serviços de alimentação do Brasil. O clube deve ser um dos escolhidos para sediar jogos da Copa de 2014. Para adequar o estádio, os custos com a reforma deverão chegar aos R$ 120 milhões.
Uma das ideias é voltar a negociar o nome do estádio com um patrocinador. O Atlético-PR foi o primeiro a usar essa estratégia para atrair um investidor, a Kyocera, que durante cinco anos explorou o espaço. A receita estimada era de R$ 5 milhões anuais, embora o presidente Marcos Malucelli não confirme. “Estamos aguardando a confirmação da Fifa para que a arena seja uma das sedes”, diz Malucelli. “A partir daí, o mercado será outro.”
A Copa do Mundo vai mudar a história dos clubes e dos estádios brasileiros. A Alemanha, sede do Mundial de 2006, é um exemplo. Para sediar a Copa daquele ano, os alemães gastaram ao todo US$ 10 bilhões. Os estádios receberam US$ 2,1 bilhões. De acordo com um estudo produzido para a DINHEIRO pela Casual Auditores, os 36 times que estão na primeira e segunda divisões do campeonato alemão tiveram um incremento de 85% nas receitas geradas pelos estádios em seis anos. São E 31 milhões, em média, por temporada. “A Alemanha aliou lucro e mudança social em todo o projeto da Copa”, diz Amir Somoggi, especialista em gestão de futebol da Casual Auditores. Algo parecido deve ocorrer com o futebol brasileiro. Os 20 principais clubes brasileiros da primeira divisão faturaram R$ 130 milhões com bilheteria em 2007. Com a inserção de outras fontes de receita nos estádios, a projeção é de uma receita de R$ 350 milhões em 2014, crescimento de 169%. “Há um potencial enorme para ser explorado com a transformação dos estádios em polos de consumo e entretenimento”, afirma somoggi.
Até quem não se candidatou para sediar os jogos tem projetos ambiciosos. É o caso de Palmeiras e Grêmio. O time gaúcho cedeu para a oas a construção da sua arena, que será erguida no bairro de humaitá a partir do primeiro semestre de 2010. o investimento previsto, de r$ 310 milhões, será inteiramente arcado pela oas. “o empreendimento terá shopping, hotel, centro de convenções e edifícios comercial e de habitação”, conta adalberto Preis, presidente da Grêmio empreendimentos. o clube terá participação nos resultados da área e o entorno será de exclusividade da construtora. a ideia do Palmeiras é receber uma grande seleção estrangeira, de preferência a da itália, para exibir a arena Palestra. a construção será feita pela W.Torre, que terá o direito de explorar comercialmente o espaço durante 30 anos. orçado em r$ 300 milhões, o projeto deve ter início em janeiro de 2010, com prazo de 24 meses para entrega. “o Palmeiras terá direito a um percentual das receitas geradas pelo estádio”, diz Solano Neiva, diretor da W.Torre.
A modernização dos estádios estimula o surgimento de novas parcerias entre clubes e empresas. Para elas, a melhoria das arenas representa uma oportunidade de aproximar suas marcas do público que frequenta os estádios. E o melhor: com o aumento do nível de conforto das arenas, as facções organizadas começam a perder espaço. “Notamos um aumento substancial no número de mulheres e crianças que compram nossos ingressos”, diz rubén osta, diretor-geral da Visa no Brasil. a Visa lançou em 2007 um programa de venda de ingressos com cartão de crédito, pela internet. Quem utiliza o serviço não pega fila para entrar no estádio e tem o direito de ficar num lugar demarcado. O que era para ser uma experiência se transformou num programa reconhecido internacionalmente. “Apresentamos o sistema para a Fifa, que ficou muito entusiasmada”, diz Osta.
Nos últimos dois anos, o mundo corporativo teve um papel vital na mudança do público que vai aos estádios. “Os empresários estão cada vez mais próximos do universo do futebol”, diz Beto saad, dono da BPs, empresa que possui camarotes no morumbi e no Pacaembu. “Os camarotes se transformaram num lugar importante para fazer networking.” As empresas que patrocinam esses espaços enviam convites para clientes, parceiros e formadores de opinião. Em cadeiras acolchoadas, aperitivos e drinques, as pessoas aproveitam para fazer contatos – e, claro, dar uma olhada na partida que acontece dentro de campo. Enquanto isso, os clubes faturam. Quando vendeu um camarote pela primeira vez, em 2002, o são Paulo recebeu r$ 75 mil por um contrato de um ano. Atualmente, um camarote de 30 lugares custa, em média, r$ 500 mil anuais.
Outros candidatosDezessete cidades foram indicadas pelo Brasil para sediar a Copa do Mundo de 2014. A Fifa visitou todas as candidatas no início deste ano. A escolha final será anunciada no domingo 31 de maio. Confira a seguir os projetos de algumas concorrentes:

http://www.terra.com.br/istoedinheiro/edicoes/607/artigo139383-1.htm