Autor Tópico: Sociobiologia no Brasil?  (Lida 7805 vezes)

0 Membros e 1 Visitante estão vendo este tópico.

Offline Blues Brother

  • Nível 16
  • *
  • Mensagens: 422
  • Sexo: Masculino
Sociobiologia no Brasil?
« Online: 21 de Agosto de 2009, 11:24:00 »
O meu interesse por sociobiologia, hoje conhecida como psicologia evolucionista, é crescente.

Depois de Pinker, engatei Matt Ridley, Dawkins, Chomsky, Trivers e agora estou convencido.

Não seria nada de mais se eu não estivesse cursando...sociologia.

No meu curso, natureza humana praticamente não existe; é um conceito ocidental. O homem é sua história.

Bem, gostaria muito de trabalhar pesquisando o comportamento social humano do ponto de vista evolucionista.

Existe um grupo, "Milênio", no Brasil que está trazendo tais idéias para a academia, mas a maioria dos seus participantes tem formação em psicologia experimental, biologia e outras áreas. Apenas um é sociólogo.

Não encontro obras escritas por sociólogos brasileiros sobre isso, um silêncio colossal reina na sociologia, com exceção de alguns que vez ou outra fazem uma profissão de fé costumeira sobre a influência total da cultura sobre o comportamento humano. Citam Marshal Sahlins, inimigo mortal da sociobiologia, e pronto.

Por isso, estou pensando em abandonar a sociologia e ingressar na biologia, que é mais acolhedora a tais idéias.

Mas alguns colegas disseram que meu raciocínio está errado, afinal, se na sociologia ninguém está falando sobre tais questões, há uma chance maior de sucesso acadêmico pelo pioneirismo que isso representaria.

Na biologia, eu seria apenas "mais um" com idéias mais avançadas, mas nada muito inovador (será?).

Agora fico no dilema: ir para um campo acadêmico em que tais idéias são melhor recebidas e, portanto, que me oferece mais segurança (campo de trabalho, pesquisa, etc) ou arriscar numa área mais hostil às idéias da sociobiologia, em nome da possibilidade de fazer algo pioneiro?

O que meus colegas foristas sugerem?



Offline _tiago

  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 6.343
Re: Sociobiologia no Brasil?
« Resposta #1 Online: 25 de Agosto de 2009, 12:42:54 »
Matéria eletiva!?
Termina uma e emenda noutra facul...
...
Citar
No meu curso, natureza humana praticamente não existe; é um conceito ocidental. O homem é sua história.

E o q vc acha disso??? O que vc viu nas suas leituras???

Offline _tiago

  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 6.343
Re: Sociobiologia no Brasil?
« Resposta #2 Online: 25 de Agosto de 2009, 12:43:35 »
O melhor seria fazer biologia e um curso de sociologia à distância, só pra constar? Aliás, existe?

Offline Buckaroo Banzai

  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 38.735
  • Sexo: Masculino
Re: Sociobiologia no Brasil?
« Resposta #3 Online: 25 de Agosto de 2009, 14:03:53 »
Curioso. Eu já sou mais interessado nas explicações sociológicas, culturais e psicológicas que não incorram tanto no reducionismo biológico quanto o pessoal da sociobiologia e da "psicologia evolutiva dos módulos mentais, ambiente seletivo do pleistoceno, contra-o-"SSS", etc".

Offline Blues Brother

  • Nível 16
  • *
  • Mensagens: 422
  • Sexo: Masculino
Re: Sociobiologia no Brasil?
« Resposta #4 Online: 25 de Agosto de 2009, 14:33:54 »
Matéria eletiva!?
Termina uma e emenda noutra facul...
...
Citar
No meu curso, natureza humana praticamente não existe; é um conceito ocidental. O homem é sua história.

E o q vc acha disso??? O que vc viu nas suas leituras???

Obrigado pela resposta.

Eu sei que o ambiente social influencia poderosamente o comportamento dos indivíduos, mas entendo que nas ciências sociais ocorre uma espécie de sócio-determinismo porque todo o curso gira em torno do mantra de que "todo fato social só pode ser explicado por outro fato social" (Durkheim).

Isto é, uma fato social como, por exemplo, uma guerra civil, só pode ser explicado por outro fato social como, por exemplo, um golpe militar, que se originou em outro fato social, que foi a manifestação de trabalhadores por direitos. Em toda essa seqüência, analisamos cada ato como produto do precedente, sempre buscando as forças sociais, uma vontade geral, a coletividade que existe por trás dos fatos.

Ou seja, em nenhum momento, temos o cuidado de pensar: tudo começou com algum indivíduo, em algum lugar, que tomou tal decisão ou propagou tal idéia. Tudo nasce de uma força mística, uma entidade descrita por Rosseau, a vontade geral, é sobre essa coisa que nos debruçamos. 

   

Offline Blues Brother

  • Nível 16
  • *
  • Mensagens: 422
  • Sexo: Masculino
Re: Sociobiologia no Brasil?
« Resposta #5 Online: 25 de Agosto de 2009, 14:37:51 »
O melhor seria fazer biologia e um curso de sociologia à distância, só pra constar? Aliás, existe?

O meu dilema reside no seguinte: fazer biologia ou continuar na sociologia? Porque se eu ficar na sociologia, e estou no segundo ano, terei de fazer Mestrado, que todos sabem o quanto é cansativo e caro, daí para fazer Mestrado são dois anos e não me garante trabalhar com isso.

Se migrar para biologia, serei apenas um professor de biologia de ensino médio, NO COMEÇO,porque depois posso fazer alguma pós em, por exemplo, genética e daí trabalhar com isso.

A questão é que não há ninguém nas sociais fazendo isso no começo, por isso, penso que é uma grande chance de pioneirismo, mas, ao mesmo tempo, posso ser marginalizado pelos bambambãs da área e isso significa ficar sem emprego...

Offline pablito

  • Nível 14
  • *
  • Mensagens: 347
Re: Sociobiologia no Brasil?
« Resposta #6 Online: 25 de Agosto de 2009, 15:01:47 »
Depende do que você quer.

Você quer ter conhecimento sobre o assunto mas trabalhar em qualquer outra coisa?

Ou você quer ser um acadêmico? Fazer mestrado/doutorado, escrever livro, dar aulas e orientar na pós-graduação?

Se você pretende uma carreira acadêmica, bem:

1) Se você fica na Sociologia, talvez encontre barreiras nos departamentos de Sociologia que não querem (ou não sabem) tratar de aspectos biológicos.

2) Mas na Biologia você também encontraria barreiras nos departamentos que não querem (ou não sabem) tratar de aspectos sociais.

Porém, se você quer apenas o conhecimento, tem de avaliar se o que te interessa são mais os aspectos sociais ou os biológicos - tentando me fazer claro, numa graduação em biologia você não vai estudar apenas comportamento animal e ecologia, vai ter de estudar [piadinha besta]o processo de crescimento da grama e a morfologia das patas peludas das aranhas caranguejeiras do interior da Paraíba[/piadinha besta] também.
E em Sociologia vai ter de aguentar os relativistas fundamentalistas e estudar a [piadinha besta]produção de amendoins no Norte de Gana como paradigma da exploração proto-capitalista nas Nações de sub-semi-desenvolvimento em sua inserção global na distinção de gêneros entre os pigmeus[/piadinha besta].

Resumindo: a vida é sofrimento, pra onde quer que você se vire....  8-)


Offline Buckaroo Banzai

  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 38.735
  • Sexo: Masculino
Re: Sociobiologia no Brasil?
« Resposta #7 Online: 25 de Agosto de 2009, 16:47:17 »
Citar
Pure sociology is a controversial but revolutionary[citation needed] approach developed by Donald Black as an alternative to the individualistic focus of virtually all previous theories and paradigms in the discipline. [...]
This approach attempts to explain social life (the sociological behavior of organizations, groups, relationships, and interpersonal facts such as murder and art) solely with reference to variable aspects of social structure, such as the distribution of resources or degree of past interaction among participants, rather than to anything remotely psychological, such as wants, needs, beliefs, desire, preferences, meanings, intentions, hopes, choices, or anything else remotely individual. Pure sociology is thus free from psychology, as well as teleology - and even people, as such. [...]

Virtually all previous (and other) sociology addresses either mental constructs (psychology), the purposes of action (teleology), or individuals as such - and most of it does all three. Pure sociology reconceptualizes social behavior as something that does not exist in the mind, is not explainable by the aims of actions, and is supraindividual. That may sound Durkheimian but, as Black has said, the approach is "more Durkheimian than Durkheim". (By contrast, Durkheim, for example, ultimately explains suicide as the internal, individualistic response to one of several kinds of social context.)


[...]

Criticism

Among others, Thomas J. Scheff, Professor Emeritus at the University of California-Santa Barbara, has criticized the idea that sociologists should ignore characteristics of individuals in explaining social life. In a letter published in Contemporary Sociology he argues theories that give no role to individuals' desires, beliefs and other aspects of their psychology are inadequate. Instead, Scheff argues, the only way to explain social phenomena is "to utilize variables from all relevant disciplines." After all, "it seems senseless to try to explain human conduct exclusively within a single discipline." [1]

[...]

http://en.wikipedia.org/wiki/Pure_sociology

Offline Nina

  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 5.805
  • Sexo: Feminino
    • Biociência.org
Re: Sociobiologia no Brasil?
« Resposta #8 Online: 25 de Agosto de 2009, 17:09:44 »
Eu sou suspeita para falar, mas o fato de apenas um dos pesquisadores do Instituito "Milênio" (deve ser os grandes grupos temáticos do CNPq, certo?) é sociólogo, é porque realmente não é um terreno muito fértil para tais idéias. O problema é vc encontrar quem te oriente...

Nada te impede de fazer pós em outros programas, como psicologia e biologia... mas vai ser mais complicado cumprir os créditos, pois vai faltar base.

A questão é que se vc sabe o com o que quer trabalhar, deve ver o caminho que deve percorrer pra chegar lá. É possível que com ambas as opções você consiga resultados similares.
"A ciência é mais que um corpo de conhecimento, é uma forma de pensar, uma forma cética de interrogar o universo, com pleno conhecimento da falibilidade humana. Se não estamos aptos a fazer perguntas céticas para interrogar aqueles que nos afirmam que algo é verdade, e sermos céticos com aqueles que são autoridade, então estamos à mercê do próximo charlatão político ou religioso que aparecer." Carl Sagan.

Offline Blues Brother

  • Nível 16
  • *
  • Mensagens: 422
  • Sexo: Masculino
Re: Sociobiologia no Brasil?
« Resposta #9 Online: 25 de Agosto de 2009, 17:47:47 »
Curioso. Eu já sou mais interessado nas explicações sociológicas, culturais e psicológicas que não incorram tanto no reducionismo biológico quanto o pessoal da sociobiologia e da "psicologia evolutiva dos módulos mentais, ambiente seletivo do pleistoceno, contra-o-"SSS", etc".

Também sou interessado, é claro, mas as explicações sociológicas são tão pobres que dá um desânimo...

Existe a piada interna do cara que fez sua tese sobre invisibilidade social: ele virou um gari por uns tempos na USP e nem os seus colegas de curso o reconheciam e, consequentemente, não lhe davam cumprimentos. A tese é extremamente sentimental, a começar pelo título, mas foi um alvoroço.

A Explicação Sociológica: os garis sofrem preconceito por causa do trabalho que realizam, esse preconceito de classe, gerado por uma indústria cultural de alienação e reforçado pelo ambiente competitivo em que vivemos, faz com que as pessoas ajam de forma egoísta e cínica.

Agora pergunto: quem aqui vive cumprimentando estranhos na rua? Por que deveríamos? Estamos num filme da Disney?

Offline Blues Brother

  • Nível 16
  • *
  • Mensagens: 422
  • Sexo: Masculino
Re: Sociobiologia no Brasil?
« Resposta #10 Online: 25 de Agosto de 2009, 17:56:00 »
Eu sou suspeita para falar, mas o fato de apenas um dos pesquisadores do Instituito "Milênio" (deve ser os grandes grupos temáticos do CNPq, certo?) é sociólogo, é porque realmente não é um terreno muito fértil para tais idéias. O problema é vc encontrar quem te oriente...

Nada te impede de fazer pós em outros programas, como psicologia e biologia... mas vai ser mais complicado cumprir os créditos, pois vai faltar base.

A questão é que se vc sabe o com o que quer trabalhar, deve ver o caminho que deve percorrer pra chegar lá. É possível que com ambas as opções você consiga resultados similares.

Que bom que alguém aqui conhece o instituto milênio, troquei idéias por email com o professor André Ribeiro Lacerda, que é o sociólogo que você citou, sobre o campo em sociologia e ele foi bem franco:

"A área das ciências sociais no Brasil (sociologia e antropologia basicamente) é muito resistente a abordagens do tipo biossociais".

Mas..."A Associação Americana de Sociologia criou um grupo permanente de trabalho.Portanto, meu caro, é um bom investimento, embora seja um caminho espinhoso".

Resumindo: a vida é sofrimento, pra onde quer que você se vire...2

Offline Nina

  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 5.805
  • Sexo: Feminino
    • Biociência.org
Re: Sociobiologia no Brasil?
« Resposta #11 Online: 25 de Agosto de 2009, 19:37:31 »
Pois é... lembro de outro nome: Walter Neves. Ele orienta no programa onde fiz meu doutorado (Genética) e em outro mais na sua área (Antropologia), ambos na USP. Acho que talvez ele trabalhe com a abordagem que você procura. Lembro de umas teses interessantes, mesmo de alunos da Genética, que abordavam o fundo biológico de costumes de diferentes tribos, por exemplo. Uma delas era sobre o cuidado parental em tribos onde há dote por parte da noiva... Outr estudo (não sei se fora uma tese ou se foi só um seminário de um aluno dele, não lembro mais) sobre como as mulheres se mostravam mais acessíveis  no período do mês em que estavam ovulando... eram estudos bem interessantes!

No site do IB você acha seu contato: www.ib.usp.br

É o cara que descreveu o fóssil hominídeo mais antigo do Brasil, a Luzia.

:ok:
« Última modificação: 25 de Agosto de 2009, 19:39:41 por Nina »
"A ciência é mais que um corpo de conhecimento, é uma forma de pensar, uma forma cética de interrogar o universo, com pleno conhecimento da falibilidade humana. Se não estamos aptos a fazer perguntas céticas para interrogar aqueles que nos afirmam que algo é verdade, e sermos céticos com aqueles que são autoridade, então estamos à mercê do próximo charlatão político ou religioso que aparecer." Carl Sagan.

Offline Buckaroo Banzai

  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 38.735
  • Sexo: Masculino
Re: Sociobiologia no Brasil?
« Resposta #12 Online: 25 de Agosto de 2009, 20:16:24 »
Curioso. Eu já sou mais interessado nas explicações sociológicas, culturais e psicológicas que não incorram tanto no reducionismo biológico quanto o pessoal da sociobiologia e da "psicologia evolutiva dos módulos mentais, ambiente seletivo do pleistoceno, contra-o-"SSS", etc".

Também sou interessado, é claro, mas as explicações sociológicas são tão pobres que dá um desânimo...

Recomendo também não se empolgar demais com a possibilidade das explicações de Psicologia Evolutiva, principalmente com iniciais em maiúsculo.

Não é nem que só vá encontrar besteira, mas é que em boa parte do tempo realmente devem ser necessários "níveis" de explicação diferentes para fenômenos sociais. Mais ou menos como existe a química, apesar de "já" existir a física. No fim das contas, tudo é físico mesmo, mas ainda assim é bem mais fácil entender as coisas com níveis diferentes de explicação onde níveis inferiores de organização são praticamente desprezíveis - como quarks e seus spins, cores e sabores, para algo ser alcalino, ácido ou outra coisa.

Muitas vezes explicações biológicas acabam se encontrando em saias curtas para explicar coisas da própria biologia mesmo. Como por exemplo, seleção sexual. Como regra, o macho é o que disputa, e a fêmea é quem escolhe; ao longo de milhares de gerações, essas tendências comportamentais genéticas permitiram que os machos com os melhores genes se reproduzissem, portanto tiveram um melhor resultado final do que em populações onde essas tendências de competição e seleção de parceiros não evoluiu.

Ok, parece bastante razoável. Só que, recentemente se percebeu que em em populações de saigas (bicho que parece uma mistura de veado e anta), onde houve um recente declínio agudo na população de machos, caçados por humanos por causa dos seus chifres, os padrões de seleção sexual se inverteram, quando ninguém estava olhando. Agora as fêmeas, que não tem chifres, é que disputam haréns de escassos machos na porrada.

Não foi toda a lógica por trás da seleção sexual por água abaixo, ainda há o componente da escassez, agora de certa forma os machos, apesar de produzirem os mais baratos espermatozóides, são um recurso mais raro e mais fundamental à reprodução, como os óvulos. Mas simplesmente é insustentável a noção de que o comportamento do macho que disputa e da fêmea seletiva estava rigidamente arquitetado em seus cérebros; essa inversão dos padrões de  comportamento não evoluiu geneticamente nessa situação, o comportamento se modificou espontâneamente diante dessa nova ecologia na qual a espécie se viu jogada.

Agora, quanto a sociobiologia, lembre-se que começa tentando derivar para a sociedade humana, de seres com cérebros substancialmente mais complexos que o das saigas, o que se sabe sobre o comportamento de insetos, qua mal cérebro têm. Então, levando isso em consideração, não parece um paradigma lá muito promissor, não sem toneladas de ressalvas e considerações sobre maior complexidade biológica da nossa espécie.

Ainda sobre seleção sexual, outro exemplo clássico recebeu um golpe violento da realidade recentemente. Ao que parece, as fêmeas dos pavões não ligam tanto para a beleza das caudas. É mais o barulho, um guizado, que diferentes tipos de penas fazem que chama a atenção. O que levanta a possibilidade de toda a cauda vistosa ser um subproduto acidental, o mais espalhafatoso de todos, para algo que talvez pudesse ser tão visualmente rudimentar quanto um chocalho de cobra e ter o mesmo efeito.



Não quero dar uma impressão que seja tudo uma porcaria, pode mesmo se ter hipóteses interessantes se levando em consideração esse tipo de coisa evolutiva, mas ao mesmo tempo é bem arriscado se gerar algo que pode até parecer bem convincente, mas é incompleto (um pouco como esses casos da saiga e da cauda do pavão). Por exemplo, características do comportamento feminino e masculino, praticamente universais, poderiam ser razoavelmente explicadas como "esses comportamentos são potencialmente benéficos à sobrevivência da prole; logo variantes genéticas que determinassem tendência a esses comportamentos foram selecionadas". Assim, a menina brinca de bonequinha porque é um tipo de treinamento biológico à função de mãe, e o menino brinca de carrinho, mocinho e bandido e etc, porque é um preparo biológico ao papel de protetor e provedor. Não é de forma alguma algo gritantemente absurdo, mas pode ser desde um pouco diferente até errado em alguns pontos.

Por exemplo, talvez indivíduos de ambos os sexos fossem tão predispostos a brincar de uma coisa ou de outra (ou variassem menos do que a variação individual dentro de um mesmo sexo), mas os pais é que instintivamente tenderiam a criar meninos e meninas de maneiras diferentes, e isso por sua vez influenciaria no desenvolvimento do seu comportamento. Algo parecido com isso é fato (ao menos quanto ao tratamento diferencial por parte dos pais, não sei quanto a ser instintivo; coloquei isso só como uma hipótese curiosa, de ainda ser instintivo, mas estar em outro lugar), estudos mostram que os pais, mesmo aqueles que dizem não tratar diferentemente as os filhos de ambos os sexos, tratam e avaliam diferentemente as situações de acordo com o suposto sexo de bebês ainda sem qualquer dimorfismo sexual significativo. Vêem a mesma foto de um bebê, que é dito ser menino, e dizem que ele é "forte, inteligente, corajoso", ou se tiver cara de choro, que está irritado; enquanto que a mesma foto, se disserem ser de uma menina, será "gentil, carinhosa", ou "medrosa" se for cara de choro. Também apresentam mais preocupação com bebês do sexo feminino fazendo qualquer atividade física, com relação a mesma atividade realizada por bebês meninos.

Ao fazer isso, também criam a divisão entre meninos e meninas, das quais crianças dos respectivos sexos também ativamente procurariam se associar e tenderiam automaticamente a gostar. Na verdade, em pouco tempo (um dia de aula, se bem me lembro), pode-se até criar artificialmente "ódio racial" em crianças as induzindo a se separar pela cor dos olhos. Não é de se subestimar o que poderia ser conseguido criando as distinções entre coisas de menino e coisas de menina.

Isso vai colocar as pessoas em tipos de atividades diferentes, criar gostos diferentes, etc, algo mais ou menos análogo a diferenças de comportamento que praticamente todo mundo aceitaria serem étnicas, e não biológicas. Junte isso a coisas como que, em uma semana com os olhos vendados, um adulto já está começando a usar o córtex visual para outra função, como armazenamento de vocabulário, e então no fim das contas não será de se estranhar se homens forem de Marte e mulheres de Vênus, mas de forma não determinada tão simplesmente ou puramente a partir de diferenças nos cromossomos sexuais ou até mesmo diferenças de desenvolvimento cerebral neonatal (e pós-natal) sob a influência de hormônios diferentes.
 




Citar
Existe a piada interna do cara que fez sua tese sobre invisibilidade social: ele virou um gari por uns tempos na USP e nem os seus colegas de curso o reconheciam e, consequentemente, não lhe davam cumprimentos. A tese é extremamente sentimental, a começar pelo título, mas foi um alvoroço.

A Explicação Sociológica: os garis sofrem preconceito por causa do trabalho que realizam, esse preconceito de classe, gerado por uma indústria cultural de alienação e reforçado pelo ambiente competitivo em que vivemos, faz com que as pessoas ajam de forma egoísta e cínica.

Agora pergunto: quem aqui vive cumprimentando estranhos na rua? Por que deveríamos? Estamos num filme da Disney?

Eu retruco a piada: talvez exatamente o mesmo experimento fosse ser bem mais respeitado e aplaudido (certametne em alguns círculos), ou no mínimo menos vaiado, se explicação fosse nas linhas de Psicologia Evolutiva: "sobre como temos a tendência de almejar o melhor status social para melhorar nossas chances de passar nossos genes adiante, evitando nos relacionar com indivíduos de status inferior, pois isso rebaixaria nosso status aos olhos de potenciais pares ou outros membros importantes da sociedade; esse instinto é tão arraigado e potente que seu módulo está cognitivamente numa hierarquia superior àquela das relações sociais, efetivamente bloqueando o reconhecimento individual aos rostos de pessoas de seu círculo social quando elas sinalizam status social inferior".

:D


MEU ZEUS! Que monstruosidade de post enorme eu escrevi! Não tinha percebido até colocar o "preview". É melhor parar por aqui. Resumo da ópera: várias vertentes de paradigmas/explicações são interessantes, é melhor criticar tudo, não dar colher de chá para ninguém e etc. Há um monte de variações dentro de cada área, não há só Pinker, Buss, Tobby, Wright, mas tem Tomasello, Frans de Waal, Buller; não tem só sociobiologia e Psicologia Evotiva; tem "psicologia evolutiva" (com iniciais minúsculas), biossociologia, ecologia comportamental humana, "economia comportamental", etc, etc. Talvez mesmo a bizarrice de "sociologia pura" forneça coisas interessantes. É interessante ver diferentes abordagens...

Offline _tiago

  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 6.343
Re: Sociobiologia no Brasil?
« Resposta #13 Online: 25 de Agosto de 2009, 21:45:19 »
Blues,

E existe aonde ir pra escapar disso? Sinceramente, não conheço ambos assuntos, mas...
No seu caso, a guerra civil começou pelo golpe militar e este, efeito dum protesto. Saber que encontramos em nossa espécie um “componente genético” para um “comportamento em bando” não explica ainda o motivo da guerra civil, sequer o da greve dos trabalhadores. Essa tal “motivação genética” não implica que haverá sempre alguma convulsão popular, ela, no máximo, indicaria sua possibilidade. (Entre aspas pois tudo que falei foi um chute, mas com um princípio. Tudo que é genético encontraríamos no substrato de um evento mais geral, assim, a greve é o comportamento geral e a possibilidade de juntamento, a coexistência e a identificação entre os membros dela, essas possibilidades, seriam mais genéticas. Enfim, um chute de balde!)
Outro chute. O desejo sexual me parece bastante genético. Hoje menos, mas é só olhar uma foto da Megan Fox que eu já penso em besteira. A genética me faria sentir desejo, se tudo certo, por mulher, afinal é do interesse do gene. Agora, por influência social ou/e (também) biológica, eu poderia sentir o mesmo pelo... Megatron!

...

Então, todos os sociobiólogos que eu conheço são antes biólogos... Sei lá! Tem um q esqueci o nome q é filósofo.

...

Agora, deixa eu ler o texto do Bukaroo, sucinto!!

Offline _tiago

  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 6.343
Re: Sociobiologia no Brasil?
« Resposta #14 Online: 25 de Agosto de 2009, 22:02:03 »
Muito bom texto Bukaroo...

Offline Irracionalista

  • Nível 13
  • *
  • Mensagens: 280
  • Sexo: Masculino
Re: Sociobiologia no Brasil?
« Resposta #15 Online: 25 de Agosto de 2009, 23:10:32 »
Citar
Ok, parece bastante razoável. Só que, recentemente se percebeu que em em populações de saigas (bicho que parece uma mistura de veado e anta), onde houve um recente declínio agudo na população de machos, caçados por humanos por causa dos seus chifres, os padrões de seleção sexual se inverteram, quando ninguém estava olhando. Agora as fêmeas, que não tem chifres, é que disputam haréns de escassos machos na porrada.

Não foi toda a lógica por trás da seleção sexual por água abaixo, ainda há o componente da escassez, agora de certa forma os machos, apesar de produzirem os mais baratos espermatozóides, são um recurso mais raro e mais fundamental à reprodução, como os óvulos. Mas simplesmente é insustentável a noção de que o comportamento do macho que disputa e da fêmea seletiva estava rigidamente arquitetado em seus cérebros; essa inversão dos padrões de  comportamento não evoluiu geneticamente nessa situação, o comportamento se modificou espontâneamente diante dessa nova ecologia na qual a espécie se viu jogada.

O que não altera em quase nada a lógica da Seleção Sexual, apenas alterou qual dos sexos terá que fazer um investimento maior em decorrência de um fator não-tão-usual. Parece-me mais um "corner-case" digno de nota do que algo que abale as estruturas da Seleção Sexual.

Citar
O que meus colegas foristas sugerem?

Eu sugeriria terminar Sociologia e então, se você for louco o bastante, partir para um segundo curso, em especial Ciências Biológicas ou Psicologia. Você provavelmente vai se estressar também com Biólogos, por que muitos ou caem no Reducionismo Bioquímico ( eu tenho preferências por esses, mas eles se tornam irritantes a médio-prazo ), ou caem em um Holismo que não aceita nenhuma explicação redutiva, a menos que você consiga englobar quase todos os níveis de explanação possíveis.
"Make Money, Not War."

Offline Buckaroo Banzai

  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 38.735
  • Sexo: Masculino
Re: Sociobiologia no Brasil?
« Resposta #16 Online: 26 de Agosto de 2009, 00:39:08 »
Citar
Ok, parece bastante razoável. Só que, recentemente se percebeu que em em populações de saigas (bicho que parece uma mistura de veado e anta), onde houve um recente declínio agudo na população de machos, caçados por humanos por causa dos seus chifres, os padrões de seleção sexual se inverteram, quando ninguém estava olhando. Agora as fêmeas, que não tem chifres, é que disputam haréns de escassos machos na porrada.

Não foi toda a lógica por trás da seleção sexual por água abaixo, ainda há o componente da escassez, agora de certa forma os machos, apesar de produzirem os mais baratos espermatozóides, são um recurso mais raro e mais fundamental à reprodução, como os óvulos. Mas simplesmente é insustentável a noção de que o comportamento do macho que disputa e da fêmea seletiva estava rigidamente arquitetado em seus cérebros; essa inversão dos padrões de  comportamento não evoluiu geneticamente nessa situação, o comportamento se modificou espontâneamente diante dessa nova ecologia na qual a espécie se viu jogada.

O que não altera em quase nada a lógica da Seleção Sexual, apenas alterou qual dos sexos terá que fazer um investimento maior em decorrência de um fator não-tão-usual. Parece-me mais um "corner-case" digno de nota do que algo que abale as estruturas da Seleção Sexual.


Sim, não quis sugerir que seleção sexual não valesse nada, de fato, apenas se "inverteu", trocaram os papéis, mas ela continua, ainda que talvez com diferenças significativas.

Como tudo isso (esse tópico, mais o outro do Blues Brother, onde ele ironizou a colocação de que o gênero poderia ser uma construção social) tem um subtexto meio de aplauso ao determinismo biológico como explicação, onde, por exemplo, todos os padrões de comportamento masculinos e femininos típicos estão "hard-wired" no cérebro, queria dar um exemplo de como isso pode não se sustentar tão firmemente nem para seres com cérebros dos quais se espera consideravelmente menos flexibilidade comportamental que os nossos, menores e que não tem o desenvolvimento retardado/prolongado como nós.

Ou seja, o comportamento não é determinado de forma simplista por "genes nos machos que os fazem competir por fêmeas, e genes nas fêmeas que as fazem selecionar machos", mas esse comportamento da competição por parceiros é algo mais flexível, e suscetível a algo análogo a um "contexto social", no caso, ecológico. Seja lá exatamente quais forem os princípios básicos que regem isso.

Mesmo que os machos de fato tenham o comportamento de competição por parceiras determinado de forma bem "literal" nos genes (em vez de ser algo "ecologicamente emergente") e simplesmente não apareça nessa situação porque eles não precisam competir, de repente surgiu essa competição por parte das fêmeas que é inesperada pelo seu papel natural típico.







Blues,

E existe aonde ir pra escapar disso? Sinceramente, não conheço ambos assuntos, mas...
No seu caso, a guerra civil começou pelo golpe militar e este, efeito dum protesto. Saber que encontramos em nossa espécie um “componente genético” para um “comportamento em bando” não explica ainda o motivo da guerra civil, sequer o da greve dos trabalhadores. Essa tal “motivação genética” não implica que haverá sempre alguma convulsão popular, ela, no máximo, indicaria sua possibilidade. (Entre aspas pois tudo que falei foi um chute, mas com um princípio. Tudo que é genético encontraríamos no substrato de um evento mais geral, assim, a greve é o comportamento geral e a possibilidade de juntamento, a coexistência e a identificação entre os membros dela, essas possibilidades, seriam mais genéticas. Enfim, um chute de balde!)

Não conheço quase nada, mas me parece interessante para esse tipo de coisa o trabalho interdisciplinar de Thomas Homer-Dixon. Bibliografia:

The Upside of Down: Catastrophe, Creativity, and the Renewal of Civilization. Toronto: Knopf. 2006. ISBN 0-676-97722-7.

The Ingenuity Gap. New York: Knopf. 2000. ISBN 0-375-40186-5.

Environment, Scarcity, and Violence. Princeton: Princeton University Press. 1999. ISBN 0-691-02794-3.

Population and Conflict. Liège: International Union for the Scientific Study of Population. 1994. ISBN 2-87108-032-1.

Environmental Scarcity and Global Security. New York: Foreign Policy Association. 1993. ISBN 0-87124-152-8.


Para mostrar os títulos, já meio interessantes e talvez mais esclarecedores do que uma síntese que eu tentasse fazer de uma entrevista/conversa que vi com ele no blogginheads.tv. Certamente mais breve.



Muito bom texto Bukaroo...
  :hihi: Obrigado.

Offline Buckaroo Banzai

  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 38.735
  • Sexo: Masculino
Re: Sociobiologia no Brasil?
« Resposta #17 Online: 26 de Agosto de 2009, 00:42:25 »
Outra coisa que vi recentemente e achei meio interessante é "psicohistória", num sentido não-asimoviano. A idéia é uma espécie de "psicanálise da história" mas achei bastante mais interessante do que podia esperar por algo derivado da psicanálise. O que eu vi por acaso parece mais com psicologia do desenvolvimento do que psicanálise. Nada de sonhos e interpretações de portas como vaginas, postes como pênis, nem nada assim.

Offline Blues Brother

  • Nível 16
  • *
  • Mensagens: 422
  • Sexo: Masculino
Re: Sociobiologia no Brasil?
« Resposta #18 Online: 26 de Agosto de 2009, 02:29:33 »
Buckarro,

Eu conheço as criticas do Frans de Wall ao Dawkins (que, embora não seja sociobiólogo, foi um dos responsáveis indiretos pelo surgimento do campo) e aos sociobiólogos em geral. E sei que as limitações são muitas, afinal, é preciso colher material da arqueologia, antropologia e mesmo da história para sustentar diferentes versões da atual psicologia evolucionista sobre determinado aspecto do comportamento humano.

Sei que Karl Popper talvez fizesse um julgamento mais rigoroso da PE. Dizer que o evento X do Pleistoceno explicaria o aspecto Y do nosso comportamento é muito vago. Mas, numa linha de raciocínio que não seja simplista, acredito que as suposições, por mais bizarras que possam parecer, podem oferecer pistas importantíssimas sobre certas predisposições ou mesmo sobre a regularidade de determinados comportamentos que hoje não são razoavelmente explicados na linha sociológica. Penso principalmente nos temas relacionados ao sexo/reprodução.

Em relação a outras questões mais complexas como, por exemplo, o comportamento entre parentes e não-parentes, vejo que a contribuição de sujeitos como Robert Trivers é simplesmente fantástica. Na antropologia, o que seria explicado simplesmente com a repetição do óbvio (a criança é protegida porque faz parte da familia, porque tem uma mãe) ganha uma abordagem mais profunda (altruísmo nepotista ou de parentesco) quando pensamos nos aspectos mais profundos do comportamento (instintos, cálculos de soma zero, etc).

PS.: Sua piada ficou bem mais divertida que a minha, confesso!!!  :D   

Offline Irracionalista

  • Nível 13
  • *
  • Mensagens: 280
  • Sexo: Masculino
Re: Sociobiologia no Brasil?
« Resposta #19 Online: 26 de Agosto de 2009, 04:43:33 »
Citar
Sim, não quis sugerir que seleção sexual não valesse nada, de fato, apenas se "inverteu", trocaram os papéis, mas ela continua, ainda que talvez com diferenças significativas.

Talvez seja apenas uma questão de enunciado da Seleção Sexual, o mais visto é o de que "Machos tem um investimento menor na reprodução/atividade sexual, então as Fêmeas, por terem um investimento maior nisso, podem selecionar machos com uma certa característica, e machos tem que exibir tal característica ( vulgo, investir nela ) para atrair mais fêmeas". É um enunciado até correto, mas a SS não depende exatamente do gênero ( vide o cavalo marinho", e sim, do fato que um "em situações normais, o gênero A terá um grau de investimento maior na atividade reprodutiva, portanto ele tende a ser seletivo quanto a reprodução. Enquanto isso, o gênero B, por ter um investimento menor na atividade reprodutiva, será selecionado pelo gênero A para isso. Ou, se não for diretamente selecionado, ele terá de competir com outros do gênero B para se reproduzir com A."

Citar
Como tudo isso (esse tópico, mais o outro do Blues Brother, onde ele ironizou a colocação de que o gênero poderia ser uma construção social) tem um subtexto meio de aplauso ao determinismo biológico como explicação, onde, por exemplo, todos os padrões de comportamento masculinos e femininos típicos estão "hard-wired" no cérebro, queria dar um exemplo de como isso pode não se sustentar tão firmemente nem para seres com cérebros dos quais se espera consideravelmente menos flexibilidade comportamental que os nossos, menores e que não tem o desenvolvimento retardado/prolongado como nós.

Eu não diria que é um aplauso a Determinismo Biológico ( não vou negar que existem algumas explanações que beiram isso, além de diversas "Just So Stories"), e sim, um retorno a idéia que foi quase abandonada por certas tradições de pesquisa ( em Sociologia/Antropologia por influência do Relativismo Epistemológico, em Psicologia pela influência do Behaviorismo e seu "Ambiente determina tudo" ) que é a de que os gêneros/os genes possivelmente tem um grau de influência ( e esse grau de influência é refletido estatisticamente e também é influenciado pelo ambiente e pelas experiências de vida internalizadas pelo sujeito ) no modo como agimos.

Para aqueles que tem alguma influência Sociobiológica/Etológica ( esses sujeitos são os ancestrais de todos esses "porra-loucas" de SB e da PE  :), Genética Comportamental ( um campo ainda um pouco obscuro para mim) e da Psicologia Evolutiva, o enunciado acima é razoável. Para aqueles que passaram anos sob influência de idéia como "o gênero é uma invenção ocidental reforçada pelo patriarcalismo", " a cultura de uma pessoa influencia-o completamente, agindo como um superorganismo" e outras idéias, isso é visto como "Deterministas Biológicos querendo retornar idéias do Século XIX".

Citar
Ou seja, o comportamento não é determinado de forma simplista por "genes nos machos que os fazem competir por fêmeas, e genes nas fêmeas que as fazem selecionar machos", mas esse comportamento da competição por parceiros é algo mais flexível, e suscetível a algo análogo a um "contexto social", no caso, ecológico. Seja lá exatamente quais forem os princípios básicos que regem isso.

Mesmo que os machos de fato tenham o comportamento de competição por parceiras determinado de forma bem "literal" nos genes (em vez de ser algo "ecologicamente emergente") e simplesmente não apareça nessa situação porque eles não precisam competir, de repente surgiu essa competição por parte das fêmeas que é inesperada pelo seu papel natural típico.

Não há o que discordar aqui.

Citar
Eu conheço as criticas do Frans de Wall ao Dawkins (que, embora não seja sociobiólogo, foi um dos responsáveis indiretos pelo surgimento do campo) e aos sociobiólogos em geral. E sei que as limitações são muitas, afinal, é preciso colher material da arqueologia, antropologia e mesmo da história para sustentar diferentes versões da atual psicologia evolucionista sobre determinado aspecto do comportamento humano.

Eu sempre achei as críticas do Waal mezzo estranhas, e ia recomendar dar uma boa olhada no Jerry Fodor, mas depois do último texto dele, Against Darwinism, eu tenho as minhas reservas quanto a isso.

Citar
Sei que Karl Popper talvez fizesse um julgamento mais rigoroso da PE.

Eu tomo como regra geral que, se Popper escreveu sobre Ciências Biológicas, há imensas chances de ele estar errado. :hihi:
"Make Money, Not War."

Offline Nina

  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 5.805
  • Sexo: Feminino
    • Biociência.org
Re: Sociobiologia no Brasil?
« Resposta #20 Online: 26 de Agosto de 2009, 09:31:09 »
Sim, não quis sugerir que seleção sexual não valesse nada, de fato, apenas se "inverteu", trocaram os papéis, mas ela continua, ainda que talvez com diferenças significativas.

Como tudo isso (esse tópico, mais o outro do Blues Brother, onde ele ironizou a colocação de que o gênero poderia ser uma construção social) tem um subtexto meio de aplauso ao determinismo biológico como explicação, onde, por exemplo, todos os padrões de comportamento masculinos e femininos típicos estão "hard-wired" no cérebro, queria dar um exemplo de como isso pode não se sustentar tão firmemente nem para seres com cérebros dos quais se espera consideravelmente menos flexibilidade comportamental que os nossos, menores e que não tem o desenvolvimento retardado/prolongado como nós.

Ou seja, o comportamento não é determinado de forma simplista por "genes nos machos que os fazem competir por fêmeas, e genes nas fêmeas que as fazem selecionar machos", mas esse comportamento da competição por parceiros é algo mais flexível, e suscetível a algo análogo a um "contexto social", no caso, ecológico. Seja lá exatamente quais forem os princípios básicos que regem isso.

Mesmo que os machos de fato tenham o comportamento de competição por parceiras determinado de forma bem "literal" nos genes (em vez de ser algo "ecologicamente emergente") e simplesmente não apareça nessa situação porque eles não precisam competir, de repente surgiu essa competição por parte das fêmeas que é inesperada pelo seu papel natural típico.

Isso, por si só, não quer dizer que não está marcado nos genes o instinto de competição dentro do sexo. As relações ecológicas também dependem de densidade... se há muitas fêmeas disponíveis, é claro que não estarão brigando por elas. Há "sobra de recursos". Essa regra vale para alimento também. A competição por alimento acontece quando ele não é farto. Se há fartura, não há briga. Qualquer pessoa que tem um aquário em casa percebe isso, e a regra vale para comunidades, não apenas populações.

O fato de as fêmeas inverterem a situação e passarem a competir também não me parece algo tão inesperado. O instinto de reprodução causa esse efeito. Nunca vi referência a um gene que faça machos competirem por fêmeas ou vice-versa. Agora, dizer que não há genes que regulam o instinto reprodutivo ou que os genes não desempenham função no comportamento dos animais sempre será extremismo.

Assim, talvez o que aconteça é que não há necessariamente um instinto de competição por fêmeas, mas simplesmente o mesmo instinto reprodutivo, que é similar em ambos e gere esse efeito. Instinto é instinto porque não é racional. Logo, só pode ter fundo biológico.

Sim, eu sou determinista, mas não a ponto de achar que estupro é uma consequência natura da reprodução sexuada. Sei que o ser humano (e talvez até outros primatas, até certo ponto), tem sempre opção de escolha. Ou seja, eu defendo a idéia de que características são moduladas pelo meio, mas não criadas por ele.

Mas não consigo ver o ser humano como "fruto do seu meio". Isso para mim é esquecer tudo o que sabemos de genética... Se essa regra fosse correta, toda família tenderia a ser composta por irmãos parecidos, e na minha experiência, cada pessoa nasce com uma personalidade diferente. Isso é inato.

Ou se atribui isso a uma alma (que não é provada) ou se atribui aos genes (que existem).
"A ciência é mais que um corpo de conhecimento, é uma forma de pensar, uma forma cética de interrogar o universo, com pleno conhecimento da falibilidade humana. Se não estamos aptos a fazer perguntas céticas para interrogar aqueles que nos afirmam que algo é verdade, e sermos céticos com aqueles que são autoridade, então estamos à mercê do próximo charlatão político ou religioso que aparecer." Carl Sagan.

Offline Buckaroo Banzai

  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 38.735
  • Sexo: Masculino
Re: Sociobiologia no Brasil?
« Resposta #21 Online: 26 de Agosto de 2009, 13:00:52 »
Citar
Sim, não quis sugerir que seleção sexual não valesse nada, de fato, apenas se "inverteu", trocaram os papéis, mas ela continua, ainda que talvez com diferenças significativas.

Talvez seja apenas uma questão de enunciado da Seleção Sexual, o mais visto é o de que "Machos tem um investimento menor na reprodução/atividade sexual, então as Fêmeas, por terem um investimento maior nisso, podem selecionar machos com uma certa característica, e machos tem que exibir tal característica ( vulgo, investir nela ) para atrair mais fêmeas". É um enunciado até correto, mas a SS não depende exatamente do gênero ( vide o cavalo marinho", e sim, do fato que um "em situações normais, o gênero A terá um grau de investimento maior na atividade reprodutiva, portanto ele tende a ser seletivo quanto a reprodução. Enquanto isso, o gênero B, por ter um investimento menor na atividade reprodutiva, será selecionado pelo gênero A para isso. Ou, se não for diretamente selecionado, ele terá de competir com outros do gênero B para se reproduzir com A."

Como disse, não é que fosse algo que destroçasse a seleção sexual em sua base... mas não era mais ou menos assumido que esses comportamentos eram sexualmente específicos de forma não-emergente, mas geneticamente determinada, adaptações dimórficas como órgãos sexuais, mas comportamentais?

Por exemplo, eu não consigo imaginar leões, que me parecem mais sofisticados que saigas, invertendo os padrões de comportamento sexual, com "prides" compostos praticamente só de machos com umas poucas fêmeas, por mais reduzido que fosse o número de machos (que me parece já acabar sendo algo mais baixo do que 1:1 normalmente, nesse caso).



Citar
Citar
Como tudo isso (esse tópico, mais o outro do Blues Brother, onde ele ironizou a colocação de que o gênero poderia ser uma construção social) tem um subtexto meio de aplauso ao determinismo biológico como explicação, onde, por exemplo, todos os padrões de comportamento masculinos e femininos típicos estão "hard-wired" no cérebro, queria dar um exemplo de como isso pode não se sustentar tão firmemente nem para seres com cérebros dos quais se espera consideravelmente menos flexibilidade comportamental que os nossos, menores e que não tem o desenvolvimento retardado/prolongado como nós.

Eu não diria que é um aplauso a Determinismo Biológico ( não vou negar que existem algumas explanações que beiram isso, além de diversas "Just So Stories"), e sim, um retorno a idéia que foi quase abandonada por certas tradições de pesquisa ( em Sociologia/Antropologia por influência do Relativismo Epistemológico, em Psicologia pela influência do Behaviorismo e seu "Ambiente determina tudo" ) que é a de que os gêneros/os genes possivelmente tem um grau de influência ( e esse grau de influência é refletido estatisticamente e também é influenciado pelo ambiente e pelas experiências de vida internalizadas pelo sujeito ) no modo como agimos.

Para aqueles que tem alguma influência Sociobiológica/Etológica ( esses sujeitos são os ancestrais de todos esses "porra-loucas" de SB e da PE  :), Genética Comportamental ( um campo ainda um pouco obscuro para mim) e da Psicologia Evolutiva, o enunciado acima é razoável. Para aqueles que passaram anos sob influência de idéia como "o gênero é uma invenção ocidental reforçada pelo patriarcalismo", " a cultura de uma pessoa influencia-o completamente, agindo como um superorganismo" e outras idéias, isso é visto como "Deterministas Biológicos querendo retornar idéias do Século XIX".

Refraseando o que eu coloquei... a mim parecia que o Blues Brother tinha comprado muito o espantalho inverso desse dos "frenologistas do século XIX", que é o dos "negacionistas da genética defendendo a tábula rasa e o nobre selvagem". Daí a idéia de equilibrar mais os determinismos e indeterminismos de todos os lados...



Citar
Citar
Ou seja, o comportamento não é determinado de forma simplista por "genes nos machos que os fazem competir por fêmeas, e genes nas fêmeas que as fazem selecionar machos", mas esse comportamento da competição por parceiros é algo mais flexível, e suscetível a algo análogo a um "contexto social", no caso, ecológico. Seja lá exatamente quais forem os princípios básicos que regem isso.

Mesmo que os machos de fato tenham o comportamento de competição por parceiras determinado de forma bem "literal" nos genes (em vez de ser algo "ecologicamente emergente") e simplesmente não apareça nessa situação porque eles não precisam competir, de repente surgiu essa competição por parte das fêmeas que é inesperada pelo seu papel natural típico.

Não há o que discordar aqui.

Citar
Eu conheço as criticas do Frans de Wall ao Dawkins (que, embora não seja sociobiólogo, foi um dos responsáveis indiretos pelo surgimento do campo) e aos sociobiólogos em geral. E sei que as limitações são muitas, afinal, é preciso colher material da arqueologia, antropologia e mesmo da história para sustentar diferentes versões da atual psicologia evolucionista sobre determinado aspecto do comportamento humano.

Eu sempre achei as críticas do Waal mezzo estranhas, e ia recomendar dar uma boa olhada no Jerry Fodor, mas depois do último texto dele, Against Darwinism, eu tenho as minhas reservas quanto a isso.

Essas coisas do Fodor aí me dão medo. Juntando isso a umas idéias de "inatismo extremo" (que todos conceitos mentais que temos, são inatos -- por mais absurdo que soe), parece que ele logo se voluntariaria a participar de um "what the blee--ck do we know, 2: what the hell is 'life' anyway?"

O que tem de errado com o Frans de Waal?








Sim, não quis sugerir que seleção sexual não valesse nada, de fato, apenas se "inverteu", trocaram os papéis, mas ela continua, ainda que talvez com diferenças significativas.

Como tudo isso (esse tópico, mais o outro do Blues Brother, onde ele ironizou a colocação de que o gênero poderia ser uma construção social) tem um subtexto meio de aplauso ao determinismo biológico como explicação, onde, por exemplo, todos os padrões de comportamento masculinos e femininos típicos estão "hard-wired" no cérebro, queria dar um exemplo de como isso pode não se sustentar tão firmemente nem para seres com cérebros dos quais se espera consideravelmente menos flexibilidade comportamental que os nossos, menores e que não tem o desenvolvimento retardado/prolongado como nós.

Ou seja, o comportamento não é determinado de forma simplista por "genes nos machos que os fazem competir por fêmeas, e genes nas fêmeas que as fazem selecionar machos", mas esse comportamento da competição por parceiros é algo mais flexível, e suscetível a algo análogo a um "contexto social", no caso, ecológico. Seja lá exatamente quais forem os princípios básicos que regem isso.

Mesmo que os machos de fato tenham o comportamento de competição por parceiras determinado de forma bem "literal" nos genes (em vez de ser algo "ecologicamente emergente") e simplesmente não apareça nessa situação porque eles não precisam competir, de repente surgiu essa competição por parte das fêmeas que é inesperada pelo seu papel natural típico.

Isso, por si só, não quer dizer que não está marcado nos genes o instinto de competição dentro do sexo. As relações ecológicas também dependem de densidade... se há muitas fêmeas disponíveis, é claro que não estarão brigando por elas. Há "sobra de recursos". Essa regra vale para alimento também. A competição por alimento acontece quando ele não é farto. Se há fartura, não há briga. Qualquer pessoa que tem um aquário em casa percebe isso, e a regra vale para comunidades, não apenas populações.

Justamente por isso há a estranheza. Retomando o exemplo do "experimento mental" com leões na mesma situação demográfica, ou algo equivalente. Para mim parece (talvez devesse aprender com a lição da saiga e dizer "pareceria", mas ainda a intuição sobre os instintos falando mais alto, fala mais alto) "óbvio" que simplesmente não iriam trocar de papéis, parece quase que gritantemente certo que nada poderia se aproximar de fêmeas com haréns de machos. Porque os machos simplesmente não tolerariam, justamente por causa de seus instintos de competição por fêmeas.

Talvez a principal diferença seja a "agressividade geral" em saigas versus leões, mas não sei dizer se isso só dá essa impressão, ou se realmente determinaria esse diferencial; não acho que temos bem como saber realmente o que iria acontecer. Ainda ficaria de olhos arregalados se acontecesse a mesma coisa, me pareceria ainda mais bizarro, surreal, mas acho difícil encontrar argumentos para negar essa possibilidade.

Algo parecido não me surpreenderia também com babuínos, de qualquer forma; já ouvi relatos de algo meio parecido. Acho que foi o Robert Sapolsky ficou pesquisando babuínos por um bom tempo, e uma vez se deparou com um grupo que era "dominado" por fêmeas, com um relacionamento entre os indivíduos muito mais pacífico, totalmente atípico, pois geralmente são dominados por machos valentões, "bullies" covardes que ficam só intimidando os outros por status mesmo.



Citar
O fato de as fêmeas inverterem a situação e passarem a competir também não me parece algo tão inesperado. O instinto de reprodução causa esse efeito. Nunca vi referência a um gene que faça machos competirem por fêmeas ou vice-versa.

Também não esperava que fosse "um gene", mas de modo geral, que como quer que seja geneticamente determinado em todos seus detalhes, o dimorfismo sexual também tivesse componentes comportamentais relacionados a essa competitividade, em vez de simplesmente determinar a orientação sexual.

Por exemplo, assim como imaginaria leões contidos em haréns se matando até sobrar só um ou até não poderem mais lutar, também imaginaria que fêmeas (leoas ou saigas) simplesmente não fossem fazer os seus haréns de machos. Ok, instinto de reprodução, tudo bem. Mas para mim o instinto de reprodução nesse caso seria só ficar numa boa, que viriam um monte de machos dar em cima e ela só precisaria escolher. Mesmo que mais ficassem sem se reproduzir talvez por serem muitas para um macho só dar conta, imaginaria que poderia ser como com algumas aves em situação parecida, que simplesmente não ligam, ou não se dão conta do problema, e até ajudam na criação ods filhos dos outros. Isso me parecia especialmente esperado se elas viviam em haréns, meio como leoas, que também ajudam no cuidado aos filhotes umas das outras. O que eu esperaria dos instintos de reprodução seriam só haréns de fêmeas maiores, não algo tão "não linear", virando tudo de cabeça para baixo.

Na verdade ainda penso que é mais ou menos assim (instintos mais rígidos e dimórficos do que se poderia imaginar por esse caso da saiga), mas de qualquer forma ainda existe uma flexibilidade comportamental que pode subverter isso, que parece quase que exemplo máximo da "natureza" desses bichos, ou de macho e fêmea nessas espécies.



Citar
Agora, dizer que não há genes que regulam o instinto reprodutivo ou que os genes não desempenham função no comportamento dos animais sempre será extremismo.

E acho que algo praticamente inexistente ou apenas defendido por gente bem, mas bem ignorante que nem vale a pena dar atenção.



Citar
Assim, talvez o que aconteça é que não há necessariamente um instinto de competição por fêmeas, mas simplesmente o mesmo instinto reprodutivo, que é similar em ambos e gere esse efeito. Instinto é instinto porque não é racional. Logo, só pode ter fundo biológico.

Sim, eu sou determinista, mas não a ponto de achar que estupro é uma consequência natura da reprodução sexuada.

Eu já acho que sim, ou que "quase sim". Também acho que existem instintos que acabam funcionando como "instintos anti-estupro", todos os componentes instintivos do comportamento de socialização "normal", que devem fazer com que um indivíduo (humano) que se desenvolva "normalmente" simplesmente não seja um estuprador, que veja a coisa com uma repulsa profunda.



Citar
Sei que o ser humano (e talvez até outros primatas, até certo ponto), tem sempre opção de escolha. Ou seja, eu defendo a idéia de que características são moduladas pelo meio, mas não criadas por ele.

Mas não consigo ver o ser humano como "fruto do seu meio". Isso para mim é esquecer tudo o que sabemos de genética... Se essa regra fosse correta, toda família tenderia a ser composta por irmãos parecidos, e na minha experiência, cada pessoa nasce com uma personalidade diferente. Isso é inato.

Ou se atribui isso a uma alma (que não é provada) ou se atribui aos genes (que existem).

Recentemente ouvi outra analogia contra a dicotomia de genes versus meio, que achei bem interessante. Diferenças entre músicas não são uma questão de "ritmo versus melodia".

Se fosse para eu dar um substituto ao conceito de alma, não daria esse lugar aos genes, mas seria mais "proximal", e daria ao cérebro. Incidentalmente com quaisquer diferenças ou similaridades genéticas que afetem em aspectos similares ou diferentes da personalidade, mas ao mesmo tempo dando bastante espaço para ser algo bem maior que isso. Citando Carl Sagan, no livro "Dragões do Éden":

"Se cada cérebro humano só fizesse uma sinapse – correspondente a uma estupidez monumental – seriamos capazes de apenas dois estados mentais. Se tivéssemos duas sinapses, 4 estados, três sinapses, 8 estados, e em geral, para N sinapses, 2 estados. Mas o cérebro humano é caracterizado por umas 10 trilhões de sinapses. Por conseguinte, o numero de diferentes estados de um cérebro humano equivale a 2 elevado à essa potência, ou seja – multiplicado por ele mesmo 10 trilhões de vezes. Esse é um numero inconcebivelmente grande, muito maior, por exemplo, do que o numero total de partículas elementares (elétrons e prótons) em todo o universo, que é muito menor do que 2 elevado à potência de 10 trilhões. É em virtude desse imenso número de configurações funcionalmente diferentes do cérebro humano que dois seres humanos, mesmo que sejam idênticos, jamais poderão ser muito parecidos. Esses números enormes também podem explicar algo da imprevisibilidade do comportamento humano."

Offline Nina

  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 5.805
  • Sexo: Feminino
    • Biociência.org
Re: Sociobiologia no Brasil?
« Resposta #22 Online: 26 de Agosto de 2009, 15:59:31 »
Citar
Isso, por si só, não quer dizer que não está marcado nos genes o instinto de competição dentro do sexo. As relações ecológicas também dependem de densidade... se há muitas fêmeas disponíveis, é claro que não estarão brigando por elas. Há "sobra de recursos". Essa regra vale para alimento também. A competição por alimento acontece quando ele não é farto. Se há fartura, não há briga. Qualquer pessoa que tem um aquário em casa percebe isso, e a regra vale para comunidades, não apenas populações.

Justamente por isso há a estranheza. Retomando o exemplo do "experimento mental" com leões na mesma situação demográfica, ou algo equivalente. Para mim parece (talvez devesse aprender com a lição da saiga e dizer "pareceria", mas ainda a intuição sobre os instintos falando mais alto, fala mais alto) "óbvio" que simplesmente não iriam trocar de papéis, parece quase que gritantemente certo que nada poderia se aproximar de fêmeas com haréns de machos. Porque os machos simplesmente não tolerariam, justamente por causa de seus instintos de competição por fêmeas.

Talvez a principal diferença seja a "agressividade geral" em saigas versus leões, mas não sei dizer se isso só dá essa impressão, ou se realmente determinaria esse diferencial; não acho que temos bem como saber realmente o que iria acontecer. Ainda ficaria de olhos arregalados se acontecesse a mesma coisa, me pareceria ainda mais bizarro, surreal, mas acho difícil encontrar argumentos para negar essa possibilidade.

Algo parecido não me surpreenderia também com babuínos, de qualquer forma; já ouvi relatos de algo meio parecido. Acho que foi o Robert Sapolsky ficou pesquisando babuínos por um bom tempo, e uma vez se deparou com um grupo que era "dominado" por fêmeas, com um relacionamento entre os indivíduos muito mais pacífico, totalmente atípico, pois geralmente são dominados por machos valentões, "bullies" covardes que ficam só intimidando os outros por status mesmo.

Pois é, mas pra mim não é tão difícil aceitar a inversão, justamente porque aceitar outros machos é o custo de poder ter a chance de procriar... eles certamente não pensam, mas pode ser que já esteja ocorrendo uma seleção nesse sentido. Como toda variação selecionada é pré-existente, esta informação já pode estar em seus genes, mas o meio não era propício para expressar o comportamento.


Citar
Também não esperava que fosse "um gene", mas de modo geral, que como quer que seja geneticamente determinado em todos seus detalhes, o dimorfismo sexual também tivesse componentes comportamentais relacionados a essa competitividade, em vez de simplesmente determinar a orientação sexual.

A genética dos caracteres sexuais ainda é um tema que carece mais estudos. Vários organismos sexuados tem comportamentos iguais entre machos e fêmeas, além de aparência e até (aparentemente) carióitipos. Isso não os impede de serem, efetivamente, machos e fêmeas. Assim, talvez o comportamento diferenciado seja só uma questão de modulação do gene, ou até mesmo um relaxamento das relações ecológicas.

Citar
Por exemplo, assim como imaginaria leões contidos em haréns se matando até sobrar só um ou até não poderem mais lutar, também imaginaria que fêmeas (leoas ou saigas) simplesmente não fossem fazer os seus haréns de machos. Ok, instinto de reprodução, tudo bem. Mas para mim o instinto de reprodução nesse caso seria só ficar numa boa, que viriam um monte de machos dar em cima e ela só precisaria escolher. Mesmo que mais ficassem sem se reproduzir talvez por serem muitas para um macho só dar conta, imaginaria que poderia ser como com algumas aves em situação parecida, que simplesmente não ligam, ou não se dão conta do problema, e até ajudam na criação ods filhos dos outros. Isso me parecia especialmente esperado se elas viviam em haréns, meio como leoas, que também ajudam no cuidado aos filhotes umas das outras. O que eu esperaria dos instintos de reprodução seriam só haréns de fêmeas maiores, não algo tão "não linear", virando tudo de cabeça para baixo.

Eu já não acho mais anda estranho... entretanto, a regra do reproduzir, mesmo que o custo seja alto, ainda se mantém. Talvez esta seja a regra, e as circunstâncias das relações entre diferentes sexos seja influenciada por demanda, densidade, etc.


Citar
Na verdade ainda penso que é mais ou menos assim (instintos mais rígidos e dimórficos do que se poderia imaginar por esse caso da saiga), mas de qualquer forma ainda existe uma flexibilidade comportamental que pode subverter isso, que parece quase que exemplo máximo da "natureza" desses bichos, ou de macho e fêmea nessas espécies.

Acho que é por aí mesmo...


Citar
E acho que algo praticamente inexistente ou apenas defendido por gente bem, mas bem ignorante que nem vale a pena dar atenção.

Não se espante, mas extremistas há em todos as frentes... muito sociólogos descartam totalmente a influência genética sobre a personalidade.

E esse é um assunto que deveria ser mais discutido... até em casos de planejamento de adoção.


Citar
Eu já acho que sim, ou que "quase sim". Também acho que existem instintos que acabam funcionando como "instintos anti-estupro", todos os componentes instintivos do comportamento de socialização "normal", que devem fazer com que um indivíduo (humano) que se desenvolva "normalmente" simplesmente não seja um estuprador, que veja a coisa com uma repulsa profunda.

Não sei... mas talvez até seja. O ponto é que o racional pode sobrepujar.

Citar
Recentemente ouvi outra analogia contra a dicotomia de genes versus meio, que achei bem interessante. Diferenças entre músicas não são uma questão de "ritmo versus melodia".

Correta analogia. Mas quando a discussão é com sociólogos, que é o tema do tópico, a coisa acaba indo pra a dicotomia mesmo...

Citar
Se fosse para eu dar um substituto ao conceito de alma, não daria esse lugar aos genes, mas seria mais "proximal", e daria ao cérebro. Incidentalmente com quaisquer diferenças ou similaridades genéticas que afetem em aspectos similares ou diferentes da personalidade, mas ao mesmo tempo dando bastante espaço para ser algo bem maior que isso. Citando Carl Sagan, no livro "Dragões do Éden":

"Se cada cérebro humano só fizesse uma sinapse – correspondente a uma estupidez monumental – seriamos capazes de apenas dois estados mentais. Se tivéssemos duas sinapses, 4 estados, três sinapses, 8 estados, e em geral, para N sinapses, 2 estados. Mas o cérebro humano é caracterizado por umas 10 trilhões de sinapses. Por conseguinte, o numero de diferentes estados de um cérebro humano equivale a 2 elevado à essa potência, ou seja – multiplicado por ele mesmo 10 trilhões de vezes. Esse é um numero inconcebivelmente grande, muito maior, por exemplo, do que o numero total de partículas elementares (elétrons e prótons) em todo o universo, que é muito menor do que 2 elevado à potência de 10 trilhões. É em virtude desse imenso número de configurações funcionalmente diferentes do cérebro humano que dois seres humanos, mesmo que sejam idênticos, jamais poderão ser muito parecidos. Esses números enormes também podem explicar algo da imprevisibilidade do comportamento humano."

Eu também concordo... mas se fosse pra escolher entre alma e genes, ficaria com genes, uma vez que o genes tem influência direta na anatomia, histofisiologia, boquímica do cérebro... já a  suposta alma... ::)

Acho que nenhum geneticista retira do deesenvolvimento e experiências seu papel na construção da personalidade. Por outro lado, acho mais comum sociólogos esquecerem o papel da biologa quando tentam explicar as relações e interações humanas.
« Última modificação: 26 de Agosto de 2009, 16:01:44 por Nina »
"A ciência é mais que um corpo de conhecimento, é uma forma de pensar, uma forma cética de interrogar o universo, com pleno conhecimento da falibilidade humana. Se não estamos aptos a fazer perguntas céticas para interrogar aqueles que nos afirmam que algo é verdade, e sermos céticos com aqueles que são autoridade, então estamos à mercê do próximo charlatão político ou religioso que aparecer." Carl Sagan.

Offline Buckaroo Banzai

  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 38.735
  • Sexo: Masculino
Re: Sociobiologia no Brasil?
« Resposta #23 Online: 26 de Agosto de 2009, 17:34:29 »
Citar
Isso, por si só, não quer dizer que não está marcado nos genes o instinto de competição dentro do sexo. As relações ecológicas também dependem de densidade... se há muitas fêmeas disponíveis, é claro que não estarão brigando por elas. Há "sobra de recursos". Essa regra vale para alimento também. A competição por alimento acontece quando ele não é farto. Se há fartura, não há briga. Qualquer pessoa que tem um aquário em casa percebe isso, e a regra vale para comunidades, não apenas populações.

Justamente por isso há a estranheza. Retomando o exemplo do "experimento mental" com leões na mesma situação demográfica, ou algo equivalente. Para mim parece (talvez devesse aprender com a lição da saiga e dizer "pareceria", mas ainda a intuição sobre os instintos falando mais alto, fala mais alto) "óbvio" que simplesmente não iriam trocar de papéis, parece quase que gritantemente certo que nada poderia se aproximar de fêmeas com haréns de machos. Porque os machos simplesmente não tolerariam, justamente por causa de seus instintos de competição por fêmeas.

Talvez a principal diferença seja a "agressividade geral" em saigas versus leões, mas não sei dizer se isso só dá essa impressão, ou se realmente determinaria esse diferencial; não acho que temos bem como saber realmente o que iria acontecer. Ainda ficaria de olhos arregalados se acontecesse a mesma coisa, me pareceria ainda mais bizarro, surreal, mas acho difícil encontrar argumentos para negar essa possibilidade.

Algo parecido não me surpreenderia também com babuínos, de qualquer forma; já ouvi relatos de algo meio parecido. Acho que foi o Robert Sapolsky ficou pesquisando babuínos por um bom tempo, e uma vez se deparou com um grupo que era "dominado" por fêmeas, com um relacionamento entre os indivíduos muito mais pacífico, totalmente atípico, pois geralmente são dominados por machos valentões, "bullies" covardes que ficam só intimidando os outros por status mesmo.

Pois é, mas pra mim não é tão difícil aceitar a inversão, justamente porque aceitar outros machos é o custo de poder ter a chance de procriar... eles certamente não pensam, mas pode ser que já esteja ocorrendo uma seleção nesse sentido. Como toda variação selecionada é pré-existente, esta informação já pode estar em seus genes, mas o meio não era propício para expressar o comportamento.

Mas acho que é justamente o inverso, aceitando outros machos, reduzem a chance de procriar. Eles se dariam melhor, muito melhor, se simplesmente tivessem haréns maiores. Mas aí uma parte das fêmeas aparentemente que pode sair perdendo, a ponto de se "revoltarem".



Citar
Citar
Também não esperava que fosse "um gene", mas de modo geral, que como quer que seja geneticamente determinado em todos seus detalhes, o dimorfismo sexual também tivesse componentes comportamentais relacionados a essa competitividade, em vez de simplesmente determinar a orientação sexual.

A genética dos caracteres sexuais ainda é um tema que carece mais estudos. Vários organismos sexuados tem comportamentos iguais entre machos e fêmeas, além de aparência e até (aparentemente) carióitipos. Isso não os impede de serem, efetivamente, machos e fêmeas. Assim, talvez o comportamento diferenciado seja só uma questão de modulação do gene, ou até mesmo um relaxamento das relações ecológicas.

Bem curioso...


Citar
Citar
Por exemplo, assim como imaginaria leões contidos em haréns se matando até sobrar só um ou até não poderem mais lutar, também imaginaria que fêmeas (leoas ou saigas) simplesmente não fossem fazer os seus haréns de machos. Ok, instinto de reprodução, tudo bem. Mas para mim o instinto de reprodução nesse caso seria só ficar numa boa, que viriam um monte de machos dar em cima e ela só precisaria escolher. Mesmo que mais ficassem sem se reproduzir talvez por serem muitas para um macho só dar conta, imaginaria que poderia ser como com algumas aves em situação parecida, que simplesmente não ligam, ou não se dão conta do problema, e até ajudam na criação ods filhos dos outros. Isso me parecia especialmente esperado se elas viviam em haréns, meio como leoas, que também ajudam no cuidado aos filhotes umas das outras. O que eu esperaria dos instintos de reprodução seriam só haréns de fêmeas maiores, não algo tão "não linear", virando tudo de cabeça para baixo.

Eu já não acho mais anda estranho... entretanto, a regra do reproduzir, mesmo que o custo seja alto, ainda se mantém. Talvez esta seja a regra, e as circunstâncias das relações entre diferentes sexos seja influenciada por demanda, densidade, etc.

Eu ainda acho... realmente esperaria que se em 99.99% do tempo os comportamentos mais favoráveis para macho e fêmea são relativamente estáveis, devessem ser algo bem especializado e bastante rígido, e não algo tão flexível. Essa flexibilidade, se for para enxergar como resultado de seleção natural, teria como morfologicamente análogo algo como, levar elefantes para a Sibéria e ver eles começarem desenvolver uma pelagem de mamute. Bem, na verdade isso ainda teria a vantagem de ser benéfico para todo mundo, enquanto que essa inversão dos papéis sexuais só beneficia a algumas fêmeas, prejudicando as outras e aos machos, que também têm seu teto reprodutivo extremamente rebaixado em comparação a situação de só terem haréns maiores.

Por outro lado, isso tudo é tão recente e tão breve que deve ser só um "fluke". Em algumas gerações, acho que as coisas devem se reestabelecer, por vantagem reprodutiva de populações onde ainda vigorarem ou voltarem a vigorar as regras normais.


Citar
Citar
E acho que algo praticamente inexistente ou apenas defendido por gente bem, mas bem ignorante que nem vale a pena dar atenção.

Não se espante, mas extremistas há em todos as frentes... muito sociólogos descartam totalmente a influência genética sobre a personalidade.

Possivelmente devem ter extremistas mesmo, mas sei lá; acho que todos minimamente informados, no máximo assumem variações genéticas como desprezíveis em longo prazo, e que, ainda que se possa dizer que hajam bases genéticas para todo comportamento (até tocar piano, ainda que não existam "genes de pianista"), isso é mais ou menos irrelevante, pode-se simplesmente assumir que a "espécie se comporta assim".



Citar
E esse é um assunto que deveria ser mais discutido... até em casos de planejamento de adoção.

??

Como assim? Screening para comparação de compatibilidade entre genes que influenciem a personalidade dos pais e dos potenciais filhos que adotariam? Acho que estaria se querendo algo excepcionalmente melhor do que aquilo que já viria naturalmente com filhos biológicos mesmo, não se tem garantia de personalidades compatíveis só por isso.

Acho que até já tem gente oferecendo serviço de "agência de namoro genética", não visando evitar doenças recessivas nos filhos, como aquele negócio que alguns judeus fazem, mas meio como uma espécie de horóscopo high-tech.

Eu não duvidaria que isso desse mais certo do que agências por questionários de personalidade, de qualquer forma, não porque o screening genético realmente seja capaz de captar essa compatibilidade prometida, mas simplesmente porque provavelmente optar por esse tipo de serviço já indica uma crença em comum em determinismo genético, o que talvez seja maior do que as afinidades relatadas nas fichas que as pessoas preenchem não necessariamente com a verdade em agências tradicionais... :D



Citar
Citar
Eu já acho que sim, ou que "quase sim". Também acho que existem instintos que acabam funcionando como "instintos anti-estupro", todos os componentes instintivos do comportamento de socialização "normal", que devem fazer com que um indivíduo (humano) que se desenvolva "normalmente" simplesmente não seja um estuprador, que veja a coisa com uma repulsa profunda.

Não sei... mas talvez até seja. O ponto é que o racional pode sobrepujar.

Eu não acho que é nem exatamente o lado racional sobrepujando, mas uma diferença mais dramática no desenvolvimento mesmo. Se o seu primeiro idioma é português, é isso e acabou, nunca vai conseguir mudar, isso está fixo no seu cérebro. De forma similar, penso que socialização ideal produz cérebros não-estupradores, para os quais o estupro é algo totalmente anti-natural, não meramente controlado racionalmente. Nem existe um "impulso estuprador" para ser controlado, diferentemente de pessoas que tenham sofrido outro rumo de desenvolvimento, não-condutor ao que consideramos mentalmente saudável. Postei algo meio relacionado: "the childhood origins of terrorism".


Citar
Citar
Recentemente ouvi outra analogia contra a dicotomia de genes versus meio, que achei bem interessante. Diferenças entre músicas não são uma questão de "ritmo versus melodia".

Correta analogia. Mas quando a discussão é com sociólogos, que é o tema do tópico, a coisa acaba indo pra a dicotomia mesmo...

Eu realmente não conheço muito. Mas de vez em quando pesquiso e vejo defesas de que por exemplo, nem mesmo o behaviorismo, que é como que o ápice do desprezo a biologia (até à psicologia), não tem realmente uma implicação de negação de tendências biológicas nem nada; acusam, de ser na verdade o pessoal com um foco mais biológico a criar dicotomias desnecessárias...




Citar
Citar
Se fosse para eu dar um substituto ao conceito de alma, não daria esse lugar aos genes, mas seria mais "proximal", e daria ao cérebro. Incidentalmente com quaisquer diferenças ou similaridades genéticas que afetem em aspectos similares ou diferentes da personalidade, mas ao mesmo tempo dando bastante espaço para ser algo bem maior que isso. Citando Carl Sagan, no livro "Dragões do Éden":

"Se cada cérebro humano só fizesse uma sinapse – correspondente a uma estupidez monumental – seriamos capazes de apenas dois estados mentais. Se tivéssemos duas sinapses, 4 estados, três sinapses, 8 estados, e em geral, para N sinapses, 2 estados. Mas o cérebro humano é caracterizado por umas 10 trilhões de sinapses. Por conseguinte, o numero de diferentes estados de um cérebro humano equivale a 2 elevado à essa potência, ou seja – multiplicado por ele mesmo 10 trilhões de vezes. Esse é um numero inconcebivelmente grande, muito maior, por exemplo, do que o numero total de partículas elementares (elétrons e prótons) em todo o universo, que é muito menor do que 2 elevado à potência de 10 trilhões. É em virtude desse imenso número de configurações funcionalmente diferentes do cérebro humano que dois seres humanos, mesmo que sejam idênticos, jamais poderão ser muito parecidos. Esses números enormes também podem explicar algo da imprevisibilidade do comportamento humano."

Eu também concordo... mas se fosse pra escolher entre alma e genes, ficaria com genes, uma vez que o genes tem influência direta na anatomia, histofisiologia, boquímica do cérebro... já a  suposta alma... ::)

Acho que nenhum geneticista retira do deesenvolvimento e experiências seu papel na construção da personalidade. Por outro lado, acho mais comum sociólogos esquecerem o papel da biologa quando tentam explicar as relações e interações humanas.

Bem, eu não conheço muito de explicações sociológicas. Mas penso que as explicações biológicas são de um "nível inferior" de explicação. Inferior não num sentido de se colocar todas as áreas de estudo numa espécie de hierarquia de "melhores" e "piores" meio como de vez em quando meio que fazem com "hard sciences" e humanas, com as biológicas num meio termo. Mas como algo meio análogo a se explicar um computador através "da física", em vez de da eletrônica ou informática; são "níveis" de explicação diferentes. Não é de forma alguma que a eletrônica não seja absolutamente determinada pela física, só que "aparecem" em diferentes "níveis" coisas melhor tratadas/entendidas com um repertório próprio de conceitos e explicações.

Para a vasta maior parte das questões sobre computadores, não deve interessar tanto assim os processos físicos que permitem, ou que em última instância são, o que quer que esteja se estudando. Vai ser na imensa maior parte do tempo mais útil falar em configurações do sistema operacional e de rede, ou cultura, vivência pessoal e círculos de amizades, do que de capacitores eletrolíticos e genes.

O próprio Pinker meio que dá um exemplo interessante. Ele tem uma apresentação nos TED talks sobre como a violência foi diminuindo com o passar do tempo na humanidade, mesmo em um curtíssimo espaço de tempo, como desde a Segunda Guerra até hoje, atribuindo isso obviamente não a mudanças genéticas, mas ao famigerado "meio" e as  mudanças culturais. Me parece mais um exemplo de situação onde a biologia é quase "desprezível" como explicação; não é que ela não esteja lá, e não seja significativa (não existem humanos sem biologia!), mas o meio mudou, e nós mudamos, enquanto a biologia continuou a mesma.

O que quer que possa se tirar de útil da biologia aí não é muito mais do que temos uma biologia tal que, nos permite essas mudanças comportamentais moduladas pela cultura. Não parece que uma explicação sociológica que praticamente não mencionasse nada de biológico fosse ficar seriamente lesada se não chamasse a atenção para o fato de ser tudo ainda parte da natureza humana de qualquer jeito.

Aliás, acho que Pinker mal menciona biologia nessa apresentação.


Citação de: [url=http://][/url]
Steven Pinker: A brief history of violence
<a href="http://www.youtube.com/v/ramBFRt1Uzk" target="_blank" class="new_win">http://www.youtube.com/v/ramBFRt1Uzk</a>
Steven Pinker charts the decline of violence from Biblical times to the present, and argues that, though it may seem illogical and even obscene, given Iraq and Darfur, we are living in the most peaceful time in our species' existence.

Offline Nina

  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 5.805
  • Sexo: Feminino
    • Biociência.org
Re: Sociobiologia no Brasil?
« Resposta #24 Online: 26 de Agosto de 2009, 18:10:04 »
Mas acho que é justamente o inverso, aceitando outros machos, reduzem a chance de procriar. Eles se dariam melhor, muito melhor, se simplesmente tivessem haréns maiores. Mas aí uma parte das fêmeas aparentemente que pode sair perdendo, a ponto de se "revoltarem".

Talvez o ganho seja na manutenção da segurança do grupo, ou na eficiência das estratégias de busca por comida.


Eu ainda acho... realmente esperaria que se em 99.99% do tempo os comportamentos mais favoráveis para macho e fêmea são relativamente estáveis, devessem ser algo bem especializado e bastante rígido, e não algo tão flexível. Essa flexibilidade, se for para enxergar como resultado de seleção natural, teria como morfologicamente análogo algo como, levar elefantes para a Sibéria e ver eles começarem desenvolver uma pelagem de mamute. Bem, na verdade isso ainda teria a vantagem de ser benéfico para todo mundo, enquanto que essa inversão dos papéis sexuais só beneficia a algumas fêmeas, prejudicando as outras e aos machos, que também têm seu teto reprodutivo extremamente rebaixado em comparação a situação de só terem haréns maiores.

Por outro lado, isso tudo é tão recente e tão breve que deve ser só um "fluke". Em algumas gerações, acho que as coisas devem se reestabelecer, por vantagem reprodutiva de populações onde ainda vigorarem ou voltarem a vigorar as regras normais.

Eu não vejo porque deveriam ser tão rígidas estas estruturas. Elas se provam bastante variáveis se pensarmos em grupos na base dos vertebrados...

Possivelmente devem ter extremistas mesmo, mas sei lá; acho que todos minimamente informados, no máximo assumem variações genéticas como desprezíveis em longo prazo, e que, ainda que se possa dizer que hajam bases genéticas para todo comportamento (até tocar piano, ainda que não existam "genes de pianista"), isso é mais ou menos irrelevante, pode-se simplesmente assumir que a "espécie se comporta assim".

Ignorar a variação genética é justamente deixar o lado biológico da espécie de lado...

Citar
E esse é um assunto que deveria ser mais discutido... até em casos de planejamento de adoção.

??

Como assim? Screening para comparação de compatibilidade entre genes que influenciem a personalidade dos pais e dos potenciais filhos que adotariam? Acho que estaria se querendo algo excepcionalmente melhor do que aquilo que já viria naturalmente com filhos biológicos mesmo, não se tem garantia de personalidades compatíveis só por isso.

Não de personalidades compatíveis não... mas há indícios que, por exemplo, agressividade possa ter fatores genéticos. Se for o caso, e você for um ser pacífico, no sorteio da adoção pode lhe ser destinado uma criança naturalmente agressiva.

Acho que até já tem gente oferecendo serviço de "agência de namoro genética", não visando evitar doenças recessivas nos filhos, como aquele negócio que alguns judeus fazem, mas meio como uma espécie de horóscopo high-tech.

Nem vislumbro estas coisas... mas já expliquei a questão que levantei...

Eu não duvidaria que isso desse mais certo do que agências por questionários de personalidade, de qualquer forma, não porque o screening genético realmente seja capaz de captar essa compatibilidade prometida, mas simplesmente porque provavelmente optar por esse tipo de serviço já indica uma crença em comum em determinismo genético, o que talvez seja maior do que as afinidades relatadas nas fichas que as pessoas preenchem não necessariamente com a verdade em agências tradicionais... :D

Se não for feito um perfil, e se depender da pessoa relatar o que ela julga características suas, ela também pode mentir... Segundo o House, todos mentem!  :P


Eu não acho que é nem exatamente o lado racional sobrepujando, mas uma diferença mais dramática no desenvolvimento mesmo. Se o seu primeiro idioma é português, é isso e acabou, nunca vai conseguir mudar, isso está fixo no seu cérebro.

Não sei onde li que a criança pode aeitar até 2 línguas mães, mas os idiomas precisam ser apresentados a ela antes do nono mês... puxa, minha memória está péssima...


De forma similar, penso que socialização ideal produz cérebros não-estupradores, para os quais o estupro é algo totalmente anti-natural, não meramente controlado racionalmente. Nem existe um "impulso estuprador" para ser controlado, diferentemente de pessoas que tenham sofrido outro rumo de desenvolvimento, não-condutor ao que consideramos mentalmente saudável. Postei algo meio relacionado: "the childhood origins of terrorism".

Então, na sua visão, se uma pessoa não foi bem conduzida sobre um determinado assunto, "já era"?

Danniel, assim você mata a chance de recuperação de presidiários, por exemplo. Você acha que eles podem mudar?

Eu realmente não conheço muito. Mas de vez em quando pesquiso e vejo defesas de que por exemplo, nem mesmo o behaviorismo, que é como que o ápice do desprezo a biologia (até à psicologia), não tem realmente uma implicação de negação de tendências biológicas nem nada; acusam, de ser na verdade o pessoal com um foco mais biológico a criar dicotomias desnecessárias...

Pode ser que minha leitura esteja viciada...

Bem, eu não conheço muito de explicações sociológicas. Mas penso que as explicações biológicas são de um "nível inferior" de explicação. Inferior não num sentido de se colocar todas as áreas de estudo numa espécie de hierarquia de "melhores" e "piores" meio como de vez em quando meio que fazem com "hard sciences" e humanas, com as biológicas num meio termo. Mas como algo meio análogo a se explicar um computador através "da física", em vez de da eletrônica ou informática; são "níveis" de explicação diferentes. Não é de forma alguma que a eletrônica não seja absolutamente determinada pela física, só que "aparecem" em diferentes "níveis" coisas melhor tratadas/entendidas com um repertório próprio de conceitos e explicações.

Eu já penso que elas seriam boas se fossem complementares. Isoladas, não vejo como podem ser úteis ou explicar bem qualquer coisa.


Para a vasta maior parte das questões sobre computadores, não deve interessar tanto assim os processos físicos que permitem, ou que em última instância são, o que quer que esteja se estudando. Vai ser na imensa maior parte do tempo mais útil falar em configurações do sistema operacional e de rede, ou cultura, vivência pessoal e círculos de amizades, do que de capacitores eletrolíticos e genes.

O próprio Pinker meio que dá um exemplo interessante. Ele tem uma apresentação nos TED talks sobre como a violência foi diminuindo com o passar do tempo na humanidade, mesmo em um curtíssimo espaço de tempo, como desde a Segunda Guerra até hoje, atribuindo isso obviamente não a mudanças genéticas, mas ao famigerado "meio" e as  mudanças culturais. Me parece mais um exemplo de situação onde a biologia é quase "desprezível" como explicação; não é que ela não esteja lá, e não seja significativa (não existem humanos sem biologia!), mas o meio mudou, e nós mudamos, enquanto a biologia continuou a mesma.

O que quer que possa se tirar de útil da biologia aí não é muito mais do que temos uma biologia tal que, nos permite essas mudanças comportamentais moduladas pela cultura. Não parece que uma explicação sociológica que praticamente não mencionasse nada de biológico fosse ficar seriamente lesada se não chamasse a atenção para o fato de ser tudo ainda parte da natureza humana de qualquer jeito.

Mas ele analisa o componente genético para dizer que os aspectos biológicos não mudaram, ou ele supõem?

Se pensarmos apenas no contingente que foi para as diversas guerras do século passado, já vemos que uma grande parcela da população deixou de se reproduzir. Será que essas pessoas não eram mais propensas a enfrentar os desafios que uma guerra impõem, sendo até mesmo menos pacífcas que as que escolheram ficar fora da guerra?

Não sei é uma hipótese válida (pensei nisso agora, rapidamente)... mas se os "covardes" ficam e se reproduzem, com o tempo, nossa sociedade deve ir se acovardando...

Pinker não exclui a biologia, mas também não a considera... o que na prática dá na mesma.
"A ciência é mais que um corpo de conhecimento, é uma forma de pensar, uma forma cética de interrogar o universo, com pleno conhecimento da falibilidade humana. Se não estamos aptos a fazer perguntas céticas para interrogar aqueles que nos afirmam que algo é verdade, e sermos céticos com aqueles que são autoridade, então estamos à mercê do próximo charlatão político ou religioso que aparecer." Carl Sagan.

 

Do NOT follow this link or you will be banned from the site!