Nesta discussão , como em outras do mesmo teor , vejo o que considero um erro de perspectiva quanto ao assunto.
Ao se questionar a busca pela punição dos crimes de tortura , assassinato e sequestro contra os opositores da ditadura militar usa-se como argumento o fato ( correto para os que optaram pela luta armada) que eles pretendiam criar uma outra ditadura. Desta forma as violações
de fato dos direitos humanos que sofreram ficam "justificadas" pelos
prováveis atos que cometeriam caso estivessem no poder. Contrariando as normas do Direito ( ao que eu saiba , desde o Romano) o indivíduo é punido não pelo ato praticado mas pelo que poderia realizar em uma situação hipotética.
Além do mero absurdo , seja quanto ao direito quanto á justiça , é irônico ver que é o mesmo raciocínio que justifica os gulags , os presos políticos cubanos e todas as violações de direitos humanos em regimes ditatoriais de esquerda...
Por outro lado esquece-se um fato fundamental; os crimes políticos cometidos pelos opositores ao regime foram anistiados ( vide a
Lei da Anistia de 1979) mas as violações aos direitos humanos cometidas pelos agentes do Estado não.
E isto por duas simples razões:
- porque as violações cometidas pelos agentes do Estado não são consideradas crimes políticos
- nunca foram admitidas como existentes durante todo o regime militar
Durante todo o período da ditadura o Brasil tinha a tortura , o assassinato e a ocultação de cadáver como crimes previstos em seu código penal e , além disso , manteve-se signatário das convenções sobre direitos humanos da ONU e OEA então vigentes. Outrossim o regime militar possuia instrumentos jurídicos para realizar o julgamento e a condenação dos opositores , que foram as juntas de justiça militar , as quais realmente atuaram nos casos qua a elas chegavam ; é bom registrar que , embora sob um regime de exceção , poucos foram os casos em que as juntas de justiça deixaram de seguir as normas jurídicas da ampla defesa e do contraditório.
Assim , os governos da ditadura nunca poderiam admitir que permitiam violações sistemáticas dos direitos humanos de opositores pois isso significaria dizer que o Estado se tornara criminoso.
Portanto , a motivação dos opositores do regime é
irrelevante para a discussão da responsabilidade do Estado , já que aqueles foram anistiados ( ou seja , os crimes que lhes eram imputados froam considerados como não ocorridos) mas o Estado não pode se auto-anistiar. Os agentes do Estado que cometeram violações de direitos humanos permanecem passíveis de culpabilidade , já estes crimes são imprescritíveis , e o Estado brasileiro tem o dever ( baseado em convenções internacionais das quais foi livre signatário) de apurá-los e garantir a reparação às vítimas.