O que seria uma evidência direta nesse caso? Um relato de um contemporâneo não se enquadra nisso, porque só chega até nós indiretamente, sabe-se-lá como ou porquê. A tese implicita da inexistência de historicidade é a do mito criado como fraude. Nesse caso, por que confiar numa evidência direta de um fato narrado por um contemporâneo se não sabemos quais os fins que ele objetivava com seu relato?
O que eu chamo de evidência direta é um relato de uma ou mais testemunhas oculares de sua existência, por exemplo. Um relato de primeira mão. Não estou interessado se chegou indiretamente ou quais os fins de quem relatou. O que interessa nesse caso em específico é que não há qualquer relato de primeira mão, apenas relatos surgidos décadas depois repetindo o que os cristãos diziam.
Eu havia falado no rigor da evidência direta, mas parece-me que há um rigor seletivo. As principais fontes acerca de César, que foi citado neste debate, são a História Augusta, Suetônio e Plutarco, todos eles bem
posteriores à César, de autores que não foram testemunhas oculares da vida deste, e apenas relataram o disse-me-disse das fofocas já frias do império. Por outro lado, o evangelho de João e as epístolas deste e de Pedro são relatos, supõe-se, de pessoas que conviveram com Jesus, e por seguinte há relatos de contemporâneos que conviveram com esses apóstolos, etc.
O problema, na verdade, não é com César ou Jesus, é o tipo de evidência positiva que se exige, que por ser
anacrônica, invalidaria a existência histórica de quase todos os homens da antigüidade.
Há um equívoco nisso de achar que César, Alexandre, Cleópatra e outros têm sua vida bem documentada. Só para me ater a esses que você citou, o grosso do que se conhece da vida deles é documentado por biográfos não muito fiéis, cheios de afetos ou rancores. O conceito de historiografia não é bem definido na época. Basta ver a análise leviana que Suetônio faz da administração de Cláudio, por exemplo. Na verdade, quase tudo o que se sabe dos personagens citados é basicamente o que chegou através das biografias comparadas empreendidas por Plutarco e Diógenes Laércio, que juntamente com o Suetônio formam aquilo que os estudantes de letras clássicas e afins chamam de "a grande revista caras da antigüidade". Tudo tão impreciso...
Não estou interessado na imprecisão dos seus biógrafos ou se eles eram fiéis ou cheio de rancores. Estou mostrando a diferença de nível de evidências entre alguém que não deixou nenhuma obra ou escrito e nem tem nenhuma evidência além do "ouvir dizer" escrito décadas depois e outros personagens históricos que fizeram guerras, invadiram e destruíram cidades, construíram outras, ergueram monumentos e emitiram documentos e escritos.
Sócrates era um pensador e não deixou obra nem escrito, e eu não duvido que ela tenha existido, apesar de que eu estranho quando tentam justificar o fato de ele não ter deixado nada antes de, pelo menos, tentar esclarecer a própria existência dele.
Sobre guerrear, pilhar, destruir etc., é uma contradição em termos com a figura de Jesus, com a sua suposta biografia, e com o ideal de um peregrino messiânico que cativou alguns pescadores e proferiu algumas palavras. Me parece outra abordagem inadequada.