Não me considero estatista, pelo menos no contexto brasileiro, já que sou favorável a privatizações em diversos setores. Mas como provavelmente sou mais estatista que a "média" daqui, vou me aventurar a responder, falando por mim e não pelos estatistas/comunistas/socialistas/petralhas de forma geral:
1 - em que fundamentalmente difere o estado de um conglomerado de empresas e acordos privados entre grupos de pessoas?
Em teoria, o Estado é exatamente um acordo privado entre um grupo de pessoas, como ilustrado da metáfora do contrato social. Mas enquanto empresas e grupos de pessoas têm como objetivo manifesto a obtenção de recompensas financeiras, o Estado, ou ao menos um Estado democrático, teria objetivo de articular esforços de todos os cidadãos para obter benefícios comuns, como a segurança pessoal e a proteção à propriedade.
Na prática, nada disso se sustenta. Na
realpolitik, a maioria dos estados modernos não apenas se parecem com conglomerados empresariais, como definitivamente o são, já que políticos não passam muito de lobistas de grandes empresas e setores privados eleitos através de investimentos em suas campanhas. Então quem decide em última instância como é a atuação do Estado é quem investe nas campanhas vencedoras (ou em dúvida investe em todas), e a nós cabe torcer para que esses interesses contemplados eventualmente coincidam com os nossos.
2 - estados/constituições estatais têm poderes mágicos, de forma que haver um papel que diz que uma série de instituições constituem um "estado", torna tal conjunto incorruptível, diferentemente de como aparentemente seriam inerentemente as empresas? Por que o mesmo não é verdade com "declarações de missão" de empresas, incluindo quesitos como "servir a sociedade"?
Não. Acho que ninguém em sã consciência defenderia isso. A própria Constituição é uma grande "declaração de missão", é apenas um símbolo com palavras bonitas que servem para justificar a atuação dos entes políticos. O que está escrito lá é cumprido ou descumprido ao sabor das contingências, já que o monopólio de sua fiscalização também pertence ao próprio Estado, e logicamente também é afetado pelos mesmos interesses das demais áreas do campo político.
2b - não são, as forças armadas/policiais, na prática, efetivamente os "warlords" que imperariam numa anarquia? Tanto forças armadas quanto companhias de segurança e defesa têm igualmente o poder necessário para dar um golpe e efeivamente controlarem toda a população. Textos que definem "constituições" nacionais em vez de contratos com empresas de defesa e segurança de alguma forma exercem um poder mais forte sobre as pessoas que detém o poder armado?
Acho que exercer o poder em um Estado já constituído demanda mais do que apenas o poderio militar. Também é necessário algum grau de legitimidade para governar. Não necessariamente legitimidade formal, como ter sido eleito, mas pelo menos algum grau de legitimidade carismática. Exercer o poder através apenas da ameaça gera instabilidade, sabotagem constante, guerrilhas. Todos os grandes "warlords" da história como Julio César, Napoleão, Hitler só conseguiram governar porque souberam transformar seu carisma em legitimidade para exercer o poder.
Em uma anarquia acredito que iria imperar alguém que tivesse algum aparelhamento militar, mas que também tivesse alguma legitimidade prévia para governar, como um ex-político de caráter "messiânico", um grande líder religioso, enfim, alguém que fosse amado e não apenas temido.