O fato das religiões estabelecerem o que é moral e imoral não significa que a moral seja um preceito criado pelas religiões. Como eu disse, o certo e o errado são leis universais, e não religiosas. Existem muito antes das religiões. Ou seja, não é errado matar apenas porque as religiões determinaram que é errado matar. É errado matar porque qualquer consciência mais desenvolvida não consegue viver em paz quando viola essa lei. As religiões apenas usufruem dessa lei e usam como preceitos.
Em que mundo você vive? De que mundo fala? Nem matar é universalmente errado... Muitos grupos, calcados em religiosismos, consideram válido e produtivo eliminar os opositores. Matar em “legítima defesa” (e esse conceito possui componente subjetivo) é aceitável. Matar o inimigo quando em guerra não fere a moral. Muita gente sonha matar o marginalzinho que inferniza a comunidade e quando ouvem que o sujeito foi morto pela polícia ou milícia dão graças a Deus.
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Quantas vezes em nosso íntimo não desejamos a morte daquela criatura com quem antipatizamos? Esqueceu o que disse Jesus? “Ouviste o que está escrito: ‘Não matarás’, mas se alguém se encolerizar contra seu irmão, em seu coração já cometeu o crime”. Quer dizer, de certo modo, todos somos matadores em potencial...
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Tem muita consciência “desenvolvida” vagando por esse mundo, ciosa de que matar (ou ao menos desejar ardentemente que morra) a “escória” é louvável. E por escória podem entender qualquer tipo, desde pedófilos, homossexuais, torcedores de outro time, até vizinhos fofoqueiros.
O nosso planeta, por exemplo, é um código moral e um guia que nos ensina a viver bem em sociedade. Ou seja, causar mal ao planeta afeta toda a humanidade. O nosso corpo, por outro lado, é um guia que nos ensina qual a maneira correta de viver bem e feliz. Ou seja, comer em excesso causa problemas de saúde; falta de higiene gera doenças; ferir a si mesmo, seja fisicamente ou psicologicamente, causa dores intensas; mentir em excesso causa problemas mentais; falta de trabalho deixa o corpo cansado e fraco; trabalho em excesso sobrecarrega o corpo; preguiça deixa o corpo e a mente lenta etc.
Se nosso planeta é esse “código moral” que imagina então suas lições estão difíceis de ser aprendidas. A chamada “mentalidade ecológica” é coisa recente na história e ainda tem muito espaço a conquistar até ser levada a sério pela maioria da população.
Pior ainda no quesito “cuidados pessoais”: cometemos toda sorte de desatinos contra o corpo, seja por ignorância ou por descaso.
Agora, uma coisa é certa: ferir-se a si próprio causa dores intensas... há poucos dias fui pregar um preguinho. Não achei o martelo e usei uma marretinha. Não deu outra, em vez de acertar o prego porrei o dedo: a dor foi deveras intensa!
São leis universais e naturais. Qualquer civilização inteligente, seja em qualquer lugar do universo, quando chegarem na idade da razão, vão desenvolver os mesmos preceitos de moral e justiça, visto que serão guiados pelo planeta em que vivem e pelo próprio corpo.
Não são “leis universais”, são comportamentos adotados pelas diversas civilizações: se alguns desses comportamentos expressam uso sábio dos recursos que a natureza disponibiliza isso é mais questão de sorte que de conscientização. Os silvícolas eram mais “ecológicos” que nós, pois extraíam da natura apenas o necessário para sobreviverem, o que evitava “cansar” o ambiente, mas hoje, os sobreviventes desses grupos tendem aderir aos padrões típicos da exploração desenfreada do patrimônio natural. O homem moderno não se preocupa se esgota as reservas de riquezas: quando estas acabam sua avidez o direciona para substitutos e a espoliação prossegue.
Curiosa sua declaração: “qualquer civilização inteligente, seja em qualquer lugar do universo”: sutil afirmação de autoridade. A hipótese de que exista vida no cosmo, além da Terra, e vida inteligente, é plausível, mas não confirmada. A rigor, não se pode asseverar nada sobre “civilizações inteligentes” fora de nosso planeta, enquanto não for demonstrado que as há. Mesmo porque, essas civilizações podem existir, ser inteligentes (até mais que nós) e serem grandes predadores espaciais, rapinando desenfreadamente as riquezas dos planetas que encontram...
Qualquer estado de direito cria suas leis seguindo esse modelo da natureza. A partir desse modelo você pode prever o futuro com muita precisão. Ou seja, é certo que todas as sociedades vão deixar de comer alimentação animal, que vão acabar com as guerras, que vão condenar o estupro, que vão condenar a violência etc independente das religiões aceitarem ou não. Todos os países do mundo vão ter seus regimes/estados de direitos iguais em justiça. É apenas questão de tempo.
Embora esteja misturando as ideias, tomara que suas profecias se concretizem (são opus de suas próprias meditações, ou baseia-se nalgum iluminado?). Aliás, parte delas já se tornou realidade: o estupro e a violência geral (estupro também é violência) já são condenados; o crime também, incluindo a corrupção, no entanto essas nefandas práticas são repetidas amiúde por todos os cantos.
Afirmar que as coisas mudarão (para melhor) independentemente de as religiões aceitarem as reformas é incongruente: a não ser que as religiões deixem de existir, se elas não acatarem as mudanças as pessoas que as seguem não mudarão.
Só pra complementar.
Cícero (106 a 43 a.C.)
“XXII - A verdadeira lei é a reta razão em harmonia com a natureza, difundida em todos os seres, imutável e sempiterna, que, ordenando, nos chama a cumprir o nosso dever, e, proibindo, nos aparta da injustiça. E, não obstante, nem manda ou proíbe em vão aos bons, nem ordenando ou proibindo opera sobre os maus. Não é justo alterar esta lei, nem é lícito derrogá-la em parte, nem ab-rogá-la em seu todo. Não podemos ser dispensados de sua obediência, nem pelo Senado, nem pelo povo. Não necessitamos de um Sexto Aelio que no-la explique ou no-la interprete. E não haverá uma lei em Roma e outra em Atenas, nem uma hoje e outra amanhã, ao invés, todos os povos em todos os tempos serão regidos por uma só lei sempiterna e imutável. E haverá um só Deus, senhor e governante, autor, árbitro e sancionador desta lei. Quem não obedece esta lei foge de si mesmo e nega a natureza humana, e, por isso mesmo, sofrerá as maiores penas ainda que tenha escapado das outras que consideramos suplícios.” (De republica, III, 22).
O texto que trouxe “só para complementar” pode ser classificado como uma de muitas profecias utópicas. Estas profecias expressam as expectativas do autor quanto ao futuro, as quais dependem de seu estado de espírito, seja inclinado ao otimismo ou ao pessimismo.
Tais vaticínios, venham de quem vierem, têm um ponto em comum: não se concretizam: os poucas que, se lidas com generosidade, parecem ter dado certo são exceções que confirmam a regra da irrealização.
Para ilustrar, veja o que o profeta Malaquias dissera, quatro séculos antes de Cristo:
MALAQUIAS 3
1 Eis que eu envio o meu mensageiro, e ele há de preparar o caminho diante de mim; e de repente virá ao seu templo o Senhor, a quem vós buscais, e o anjo do pacto, a quem vós desejais; eis que ele vem, diz o Senhor dos exércitos.
2
Mas quem suportará o dia da sua vinda? e quem subsistirá, quando ele aparecer? Pois ele será como o fogo de fundidor e como o sabão de lavandeiros;3 assentar-se-á como fundidor e purificador de prata; e purificará os filhos de Levi, e os refinará como ouro e como prata, até que tragam ao Senhor ofertas em justiça.
4 Então a oferta de Judá e de Jerusalém será agradável ao Senhor, como nos dias antigos, e como nos primeiros anos.
5
E chegar-me-ei a vós para juízo; e serei uma testemunha veloz contra os feiticeiros, contra os adúlteros, contra os que juram falsamente, contra os que defraudam o trabalhador em seu salário, a viúva, e o órfão, e que pervertem o direito do estrangeiro, e não me temem, diz o Senhor dos exércitos.
6 Pois eu, o Senhor, não mudo; por isso vós, ó filhos de Jacó, não sois consumidos.
MALAQUIAS 4
1 Pois eis que
aquele dia vem ardendo como fornalha; todos os soberbos, e todos os que cometem impiedade, serão como restolho; e o dia que está para vir os abrasará, diz o Senhor dos exércitos, de sorte que não lhes deixará nem raiz nem ramo. 2
Mas para vós, os que temeis o meu nome, nascerá o sol da justiça, trazendo curas nas suas asas; e vós saireis e saltareis como bezerros da estrebaria.
3 E
pisareis os ímpios, porque se farão cinza debaixo das plantas de vossos pés naquele dia que prepararei, diz o Senhor dos exércitos.
4 Lembrai-vos da lei de Moisés, meu servo, a qual lhe mandei em Horebe para todo o Israel, a saber, estatutos e ordenanças.
5 Eis que eu vos enviarei o profeta Elias, antes que venha o grande e terrível dia do Senhor;
6 e ele converterá o coração dos pais aos filhos, e o coração dos filhos a seus pais; para que eu não venha, e fira a terra com maldição.