Se não, qual exatamente seria o limite? Qual a margem de dificuldade que se pode dizer que crimes cometidos são motivados pela pobreza?
condições básicas de saúde, educação, lazer, moradia, dignidade. começa por aí.
E o qual o limite do básico para o "extra"? Faça um gradiente de uns três exemplos que você ache que possam começar a deixar de ser crimes determinados pela pobreza e passar a ser criminalidade "pura", ou estabeleça algum limite claro, se tiver algo em mente... mas ao menos o mais ou menos, sem deixar a lacuna enorme
roubar pão
roubar dinheiro pela internetComo se distingue um crime "realmente" motivado pela pobreza de um cometido apenas por falta de escrúpulos, por simplesmente não se importar com o prejuízo causado a outro e apreciar a vantagem obtida?
Bom, o objetivo não é distinguir, ninguém deve ser tratado conforme sua posição social, ainda mais se cometer um crime inadímissivel, hediondo digamos. os criminosos devem ser punidos todos, de maneira uniforme, até para servir como exemplo.
Bem, eu acho que um roubo de comida ou remédio por uma pessoa passando necessidades é algo bem menos grave do que de íntens não essenciais do mesmo valor, como uma caneta de luxo, ou um par de tênis, ou alguma coisa qualquer na faixa de valor do pão, por alguém que tenha dinheiro ou não para comprar essas coisas.
Acho que a pobreza e a necessidade são conjuntamente atenuantes, mais ou menos de forma análoga ao crime passional, ao matar alguém quando se perde a cabeça num acesso de fória, e o assassinato frio, planejado por qualquer motivo, ganho material ou prazer. Mas nesse nível, de necessidade; não acho que os traficantes e assaltantes de banco estejam fazendo o que fazem principalmente por "necessidade", por não terem outra opção, sejam os ricos ou os pobres.
E tanto mais isso deveria ser considerado verdade quanto mais se considerasse determinante a pobreza de modo geral como influente nos crimes, em oposição a uma causa de escolha individual. Se a pessoa não tem culpa de ser pobre para começar, e não tem culpa de ser criminoso porque a pobreza determinou isso, não faz sentido falar em "penitenciária" ou penas, teria que ser visto como uma pessoa que pegou alguma infecção porque mora onde não há saneamento básico, vítima do sistema, teria que receber tratamento; desde o ladrão de galinhas até o Fernandinho beira-mar, o Marcola, com alguma linha traçada em algum lugar dentre eles até a Suzane Hichtofen.
A questão é que se toda (ou pelo menos um pouco mais) da sociedade se conscientizar que a pobreza e miséria são fatores condicionantes à criminalidade(e claro, não os únicos), as pessoas possam se preocupar não só em por uma cerca elétrica na sua residência, ou se armar, mas também procurar cobrar por ações mais efetivas, da administração pública, da comunidade, para amenizar as condições de vida sofríveis a que estão submetidas uma grande parcela da população.
Eu acho que isso é importante totalmente independentemente da miséria pobreza hipoteticamente sererm uma causa importante para a criminalidade, não só pelo terror psicológico da pobreza representar milhares de potenciais criminosos. Mais ou menos da mesma forma que não é incomum se preocupar com políticas para saúde e saneamento de regiões pobres que podem nem ser tão próximas à sua casa para que você corra o risco de pegar alguam doença pela falta de saneamento, não tem nada a ver uma coisa com a outra.
O meu interesse é principalmente "científico" mesmo, de entender as causas a despeito de posições políticas, e do lado mais "pessoal", acho isso extremamente insultante, a idéia de que pessoas pobres tem maior tendência ao crime, e acho extremamente desprezível que algo assim seja feito como um tipo de jogo político, como se os políticos que não fazem mais que a obrigação ao fornecer as oportunidades para uma vida digna sejam heróis salvando caridosamente um bando de animais irracionais que de outra forma sairiam roubando e matando como se fossem macacos ou coisa parecida, ou numa colocação um pouco menos drástica, como se fosse o responsável direto pelas pessoas serem ou não morais, o messias, salvador.
Já que tamos falando de números, um dado interessante a se pesquisar. Qual o destino dos meninos de rua? será que tem algum estudo a respeito disso? só a espectativa de vida, e a causa mortis já seria o suficiente.
Não entendi bem o ponto...
São pessoas que passam por situações de dificuldade extremas, e nessas situações, a vida de crimes se torna muito tentadora. Pra alguns, a única opção.
a expectativa de vida e a causa da morte eu citei porque seria um dado interessante, creio que a maioria "opta" pelo crime, e ao fazerem isso diminuem consideravelmente suas expectativas de vida, além de correrem o risco de serem mortos por armas de fogo.
Eu tenho curiosidade quanto a esses números. Acho que a imensa maioria dos pobres e miseráveis não recorre ao crime; alguma parte recorre eventualmente, mas acho que sem fazer disso um meio constante de vida. Uma pequena parte, resolve fazer disso um meio de vida mais lucrativo, e por culpa dessa parte principalmente, e da estrutura criada, alguma outra parte acaba sendo "sugada", vão recrutando e etc.
Mas esses já não são o que eu consideraria de crimes motivados pela pobreza, por essa característica de fazer disso um negócio mais lucrativo, ir expandindo e etc, e acho que tem análogos em quantidades bastante proporcionais em todas classes sociais. Parte do desvio da proporção se deveria à culpa desses praticamente, por oferecerem "vagas" que podem nem ter volta e etc. Esses eu acho problemático como classificar. De certa forma, as pessoas mais pobres acabam ficando mais provavelmente candidatas a essas "vagas", mas isso se dá mais do que pela pobreza por simples proximidade geográfica, e os que preenchem acabam mais provavelmente sendo pobres. Já que não considero a necessidade como algo que vai determinar absolutamente a corrupção moral, nem que a não-necessidade vai salvar disso, então teoricamente qualquer um, rico ou pobre, seria suscetível a aceitar as ofertas do crime organizado.
O único outro fator além da proximidade geográfica aí um pouco relacionado a pobreza é que para o pobre uma vantagem menor já compensaria mais; mas não acho que isso fosse o mais importante, que seja simplesmente uma relação de vantagem que se teria em praticar o crime de acordo com quanto já se ganhe ou tenha, porque isso preveria que a maioria dos pobres é criminosa simplesmente porque teria vantagem. A construção da moral individual é mais determinante.
Mas eu venho repetindo o tempo todo: não é que absolutamente não hajam crimes cometidos por pobreza
Sim, mas considera como "crimes cometidos por pobreza" apenas aqueles onde a pessoa rouba para se alimentar. Daí creio ser um número insignificante mesmo. Em cidades mesmo, isso dificilmente acontece.
(para suprir necessidades básicas de um modo geral... e alguma margem bem pequena acima, que não saberia precisar exatamente onde acaba também)
Mas qual o problema se fosse mesmo um número quase insignificante dos crimes motivados diretamente por pobreza, e que os outros crimes tivessem que ser considerados simples falta de escrúpulo individual não determinada diretamente por qualquer fator econômico?
mas uma coisa é meninos de rua que comem da chepa com os cachorros e que de vez em quando ou frequentemente roubem, e outra é uma pessoa que vive mesmo na favela, ganha algum dinheiro como catador de papel, vidro e lata, e um belo dia decide "bem, vou assaltar um banco"
não falei.
o que acho que nem é bem um "caso", acho que há mesmo dentre os pobres aqueles que simplesmente não querem fazer algum trabalho honesto que ganhe pouco e não se importam com os danos que podem causar, em tirar vidas até.
Sim. Quando estigmatizadas pelo descaso, indiferença, injustiças, condições sub-humanas.
ainda que ter mais dinheiro já torne menos necessária a violência direta para algum crime
Esse é o ponto!
Mas eu não me refiro só a crimes violentos, mas crimes em geral, como as pessoas, eventualmente decidem fazer ilegal, algo a despeito de prejudicarem outros, para obter algo que queiram, o que pode ou não envolver violência para obter.
Por exemplo, digamos que se pudesse dividir as pessoas assim, de modo bem grosseiro e com números totalmente inventados que não tenho pretensão de se aproximarem da realidade: de cada 100, 20 potencialmente cometerão um crime; 10 dessas apenas crimes que considerem que não prejudicam ninguém; as outras 10, sabe que prejudicam, mas fariam mesmo assim, dessas, 5 estão dispostas a prejudicar gravemente, inclisive matar, e 2 simplesmente não tem escrúpulo nenhum em matar.
Essas pessoas existiriam proporcionalmente em todas as classes sociais, mas os tipos de coisas que fariam seriam diferentes. Esses 5 mais potencialmente violentos nas classes mais ricas em menor freqüência precisariam para conclusão dos seus crimes serem de fato violentos, porque pode ser que fizessem falsificação, desviassem dinheiro via internet, qualquer coisa que não tivesse um grande elemento de ação. Já essas pessoas quando nas classes mais pobres, não teriam a oportunidade de crimes desse tipo, que exigem alguma estrutura pré existente, e praticariam qualquer outro crime que lhe fosse acessível, mesmo que violento. O dinheiro não está determinando o crime, mas apenas o tipo de crime "disponível".
há os crimes de violência gratuita - e há esses entre pobres também, e todos eu colocaria no mesmo grupo: pessoas inescrupulosas que cometem crimes que não são justificados apenas pelas necessidades de sobrevivência.
E esses são maioria entre os crimes? acho que de maneira nenhuma. boa parte se dão até por sérios distúrbios patologicos
escrevi mal o que queria dizer.... o meu ponto era que a classe social é tão má preditora de criminalidade que, apesar de teoricamente as classes sociasi mais altas tornarem eles quase completamente desnecessários ou no mínimo "tercerizáveis", ainda há aqueles dentro das classes altas que cometem crimes violentos por sangue frio mesmo (sem contar os passionais, não contam para esse assunto, acho). Não estou dizendo que sejam a maioria, que pessoas que potencialmente cometeriam crimes violentos cometeriam de qualquer forma, em qualquer circunstância, pode ser algo que fique "adormecido" por não estar entre as "exigências" do crime.