O consenso sobre a composição da atmosfera primitiva de Alexandre Oparin e John Haldane, que influencia todas as pesquisas sobre surgimento espontâneo de aminoácidos [inclusive a experiência de Urey-Miller]: "Foi proposto no início que, provavelmente, era formada [atmosfera primitiva] por metano (CH4), amônia (NH3), gás hidrogênio (H2) e vapor d’água (H2O)". "Compostos por elementos básicos da constituição de todos os seres vivos, estes eram liberados a partir de atividades vulcânicas; ficando retidos em razão da força gravitacional e dando origem à atmosfera primitiva". [ao que me sempre pareceu, foi que os compostos orgânicos já existentes é que nortearam as conclusões de como deveria ser a atmosfera primitiva, e não uma evidencia externa de uma possível atmosfera primitiva propriamente dita, que não fosse baseada já nos elementos necessários para a formação de compostos orgânicos como os aminoácidos].
A composição química e modal da atmosfera primitiva é uma estimativa com base na composição química das rochas terrestres mais antigas (c. de 4,2 Ga AP); das rochas lunares (c. 4,5 Ga AP) e da atmosfera de corpos extraterrestres, em particular os satélites de Saturno, como Titã, e de Júpiter, como Europa.
"Nas grandes explosões vulcânicas, os fragmentos sólidos do material vulcânico (cinzas vulcânicas) e gases podem ser lançados a grandes altitudes, na estratosfera e, dependendo de sua constituição e quantidade, podem interferir na radiação solar, impedindo que boa parte dela atinja a superfície da Terra". Segundo Alexandre Oparin e John Haldane "A energia necessária a estas reações [formação de compostos orgânicos como os aminoácidos] tinha origem em radiações solares (sobretudo ultravioletas), descargas elétricas de relâmpagos, radiações de elementos radioativos e calor proveniente de zonas vulcânicas". Mas como poderíamos ter intensa atividade vulcânica, radiações solares (sobretudo ultravioleta), em um ambiente que se enquadre em condições semelhantes as descritas para o Inverno Nuclear?
O vulcanismo no início da formação da Terra era diferente, pois era de composição essencialmente basáltica a peridotítica, proveniente de um magma muito fluído, com pouca ou nenhuma ocorrência explosiva, pois não havia crosta ou esta era muito fina. Portanto não há evidências que existiram "grandes explosões vulcânicas" nos primeiros 200 milhões do eon Hadeano.
A contribuição da desintegração nuclear foi a de proporcionar calor para o manto. Este calor é disperso por irradiação e por convecção, que por sua vez faz o material crustal se deslocar e ser eventualmente reabsorvido.
As condições de um Inverno Nuclear são totalmente teóricas e mesmo que este ocorresse, seria em uma atmosfera e em oceanos com condições físico-químicas completamente distintas daquelas do Arqueano.
Então poderíamos supor que as descargas elétricas de relâmpagos [ocorrendo com facilidade no início do processo – onde o material expelido pelo vulcão serviria como um aterramento facilitador para tais descargas, com cargas geradas inclusive pelo atrito de material mais sólido na atmosfera – como podemos verificar em fotos espetaculares de um vulcão em erupção no Chile http://postmania.org/?p=1287] seriam mais importantes para a formação de compostos orgânicos como os aminoácidos do que as radiações solares. Agora se as radiações solares ocorrem já num processo de fim do possível inverno nuclear (com atividades vulcânicas estabilizadas) talvez não haveria muito mais material suspenso na atmosfera como sugere Alexandre Oparin e John Haldane. Já com as radiações de elementos radioativos e calor proveniente de zonas vulcânicas creio que é necessário, assim como nas descargas elétricas, plena atividade vulcânica ocorrendo.
Para que as descargas elétricas associadas ao vulcanismo fossem mais importantes que as radiações solares, teria de haver um vulcanismo explosivo com duração de dezenas a centenas de milhões de anos. E não há dados que corroborem esta suposição. No entanto as descargas elétricas associadas a tempestades podem ter tido uma importância real.
Mas com plena atividade vulcânica ocorrendo (no contexto de atmosfera primitiva), temos muitos outros compostos danosos à existência e conservação da vida na terra.
A saber:
Em tese sim. Mas para tal afirmação ser válida você teria que demonstrar como estavam distribuído estes "compostos danosos", em termos de percentual e de distribuição espacial, tanto na atmosfera como nos oceanos primitivos.
Outro aspecto a ser considerado é que a forma de vida inicial era muito mais simples e provavelmente muito mais resistente às condições extremas de P, T e pH , semelhante aos extremófilos hoje.
Há outro aspecto ignorado por voce, que é a possibilidade de desenvolvimento de vida inicial baseada não em C, H, O, N mas em outros elementos e compostos, outrora considerados como nocivos. Eis um caso baseado em
arsênio.
"Em 1991, a erupção do Pinatubo, nas Filipinas, expeliu grandes quantidades de aerossóis para a estratosfera, o que causou uma diminuição na temperatura da Terra de cerca de 0,5° C. Mais de um século antes, a nuvem provocada pela atividade do vulcão Krakatoa, na Indonésia, formou um escudo atmosférico capaz de refletir a luz do sol, causando a redução temporária de aproximadamente 1° C na temperatura do planeta. As explosões desses vulcões perduraram por muitos meses".
As explosões foram rápidas e curtas. As atividades vulcânicas é que se estenderam por alguns meses.
"O magma é formado por minerais já cristalizados e por gases dissolvidos na lava, principalmente vapor de água e gás carbônico. Os geólogos destacam a presença de outros gases, muitos deles tóxicos, como compostos de cloro, enxofre e flúor. O Hidrogênio é preferencialmente presente como vapor de água (H2O), com outras espécies à base de Hidrogênio ocorrendo em quantidades menores ou traços, tais como Hidrogênio molecular (H2), Metano (CH4) e Amônia (NH3). Das espécies do Carbono, o Dióxido de Carbono (CO2) é o dominante, ao passo que Metano (CH4) e Monóxido de Carbono (CO) ocorrem em quantidades menores. Dióxido de Enxofre (SO2), Ácido Sulfídrico (H2S) e Enxofre molecular (S2) compõem as principais espécies de Enxofre. Cloro, Flúor e Bromo ocorrem principalmente como ácidos, com o Ácido Clorídrico (HCl) predominando sobre o Ácido Fluorídrico (HF) e o Ácido Bromídrico (HBr). O Nitrogênio existe quase que exclusivamente como Nitrogênio molecular (N2). Quando presentes na fase gasosa, os metais são transportados grandemente como Sais de Enxofre ou de Cloro, e, em menor extensão, como espécies voláteis elementares".
E?
"Os gases mais abundantes liberados para a atmosfera a partir de um sistema vulcânico são o vapor de água (H2O, 30-90 mol%), seguido por Dióxido de Carbono (CO2, 5-40 mol%) e Dióxido de Enxofre (SO2, 5-50 mol%). Vulcões também podem liberar pequenas quantidades de outros gases, incluindo Ácido Sulfídrico (H2S, <2 mol%), Hidrogênio (H2, <2 mol%), Monóxido de Carbono (CO, <0,5 mol%). Alguns destes gases, quando emitidos a partir de condutos vulcânicos, reagem na atmosfera ou na pluma vulcânica formando aerossóis, os mais importantes sendo o Ácido Clorídrico (HCl), Ácido Fluorídrico (HF) e o Ácido Sulfúrico (H2SO4)".
Isto já foi descrito anteriormente, ainda que de modo menos detalhado.
E?
"No vulcão havaiano Kilauea, uma recente erupção efusiva de 500.000 m3 de magma basáltico liberou em torno de 2.000 toneladas de SO2 na troposfera inferior. Chuva ácida e poluição do ar são persistentes problemas para a saúde quando o vulcão está erupcionando. Outro tipo de liberação de gases ocorre quando os fluxos de lava alcançam o oceano. O grande calor provindo dos fluxos de lava ferve e vaporiza a água do mar, provocando uma série de reações químicas. A ebulição e as reações produzem uma grande pluma branca, conhecida localmente como cerração, contendo uma mistura de Ácido Clorídrico e água do mar concentrada".
A sua intenção, tal como nos parágrafos anteriores, é de enfatizar que o vulcanismo criou condições inóspitas para a vida.
Mas voce ignora o fato de que os compostos inóspitos não estavam distribuídos de modo uniforme pelos vastos oceanos de então. Além disto, como já afirmado anteriormente, o tipo de vida primordial era mais simples e mais resistente e poderia ter se desenvolvido justamente por cauda dos "compostos danosos".
Mesmo as experiências de Urey-Miller e similares, não levaram em consideração o ultravioleta e os elementos radioativos citados por Alexandre Oparin e John Haldane, muito menos quaisquer outros compostos que seriam nocivos ao experimento [acabando por dissolver toda a sopa] e claramente presentes em condições de atmosfera primitiva com intensa atividade vulcânica.
Estima-se que os oceanos se formaram há cerca de 4,3 Ga AP, sendo que os efeitos do UV são minorados ou eliminados no ambiente subaquoso. Por esta época a quase totalidade, em termos volumétricos, dos elementos radioativos já estavam no manto, por conta da grande diferenciação crustal ocorrida nos 150 a 200 Ma iniciais do planeta.
Acredito que para a realização de um experimento científico como os de Miller, todas as variáveis possíveis [elementos químicos presentes em condições de atmosfera primitiva com intensa atividade vulcânica] deveriam ser considerados [pf, me corrijam se não for isto]...
Sem dúvida. Acrescidas do tempo geológico de experimentação, na ordem de centenas de milhões de anos!