Olha Danniel, o ponto mais errado do pontualismo é justamente a estase. As alterações drásticas são possíveis devido à arquitetura genônmica (blocos de genes interferem em blocos de características), e isso em nada vai contra o gradualismo, pois é fato que mutações graduais também causam especiação.
Certo, mas nem é preciso dessas mutações simples, porém de efeito mais drástico para alterações drásticas em um período geológicamente curto. Variação "regular" da população já pode dar conta, conforme forem as pressões do ambiente e disponibilidade dos nichos.
Mas estas mutações não seriam a variação regular da população?
Entretanto, a estase considerada pelo pontualismo é puramente morfológica. Não há como mapear a dinâmica genética nos exemplos mais fáceis de encaixar o pontualismo, como no registro fóssil. Agora vem a pergunta, as espécies são delimitadas por aparência, ou seja, pelo modelo fenético? Não seria esta uma classificação muito artificial?
Bem, acho que é realmente problemático se tentarem afirmar que a estase morfológica/adaptativa é muito mais que isso. No mínimo teria-se que aceitar que estão ocorrendo mutações neutras ou perto disso, no sentido de que mantém esse fenótipo. Mas não me lembro de ter lido algo nesse sentido muito às claras. Me lembrei agora do Dawkins, no capítulo sobre EP do relojoeiro cego, ter dito que as vezes os pontuístas falam do estase como se fosse algo mais do que o alcance dos picos adaptativos num ambiente relativamente constante, ou ausência de vantagem para algo diferente do que se é, de qualquer forma, no caso de espécies mais generalistas. Algo assim é tão sem sentido que até havia me esquecido (não o que dawkins disse, mas o que os pontuístas dizem, segundo dawkins). Ele disse que falam as vezes como se houvesse uma "força".
Se eles tivessem levado em conta claramente mutações neutras, por exemplo, estariam apenas reafirmando gradualismo. Como a idéia era lançar idéias novas, eles basearam tudo no registro fóssil. Talvez não fosse tão claro na época como é hoje, mas modelos baseados apenas na aparência para delimitar as espécies são dos mais falhos. Isso porque cada vez mais se acham espécies crípticas e espécies em anel na natureza... e delimitar o que é polimórfico do que é outra espécie ainda é um dilema para morfologistas. Como um amigo meu taxonomista fala, "qualquer n maior que 2 para um taxonomista é um problema".
Mas tirando esse lado "misterioso" e desnecessário da estase, e considerando apenas como ausência de pressões seletivas para algo diferente, continuo não vendo problema, e até acho que vai bem de acordo com a genética (além do lado adaptativo), sem ter que inventar nada; populações grandes ficam mais próximas do equilíbrio H-W, e fenotípicamente isso tende a significar uma estase mesmo.
Equilíbio nas frequências genotípicas não implicam em estase morfológica, implica apenas em proporções determinadas para alelos diferentes. W-H não faz predições morfológicas.
Qualquer outro conceito de espécie que se use, o evolutivo, coesivo, ou mesmo reprodutivo, embora também arbitrários em certas situações, são menos artificiais que o fenético... Se as mudanças morfológicas é que definem o limite das espécies, como ficariam as espécies crípticas? Há casos registrados de grupos de espécies que não são distinguidas pela morfologia, mas constituiem unidades evolutivas diferenciadas, inclusive isoladas reprodutivamente, mesmo quando encontradas em sintopia, ou seja, coabitando no mesmo nicho.
O problema é que Gould era paleontólogo, então o conceito de espécie mais forte na mente dele seria o fenético, porque não há como verificar os outros casos se tratando de fósseis.
Outro problema da morfologia de espécies pertinente ao EP (mencionado mais adiante no texto que citei), é o caso oposto ao que você citou, esse eu acho até mais importante, porque vai contra a premissa da maior parte da mudança morfológica ocorrer em vias de especiação: as espécies polimórficas. Perguntei sobre isso numa comunidade de paleontologia no orkut, e nem me responderam
... já numa lista de paleo me disseram que é problemática essa questão mesmo, acho que polimorfismos de uma mesma espécie podem por vezes ser classificados como espécies distintas, mas ainda aparentadas. Eu acho (talvez outros achem também, quero dizer que não tenho lá tanta base pra isso, é especulação minha), até que a cladística poderia classificar como mais aparentadas uma outra espécie biológica à um dos polimorfismos de uma mesma espécie, se essa outra for suficientemente aparentada.
Com certeza... é por isso que um conceito de espécie baseado apenas em morfologia não cobre a maioria das espécies. Com os estudos de DNA, temos visto que a maioria das espécies possui mais polimorfismo do que o imaginado, e ao longo de 30 anos de estudos cromossômicos, observou-se que os limites entre espécies podem ser bem mais sutis do que os taxonomistas conseguem observar. Neste sentido, o que Gould afirma serem espécies diferentes, podem ser apenas formas polifórficas, e seu período de estase pode estar longe de calmaria na especiação.
É por estas coisas que o pontualismo tem saído dos debates evolutivos. Ninguém mais alimenta o pontulismo, a não ser os fundamentalistas religiosos que usam partes dele para fundamentar a ausência de formas fossilizadas (esquecendo-se tudo sobre fossilização, conscientemente). Até mesmo o Gould, em uma entrevista que infelzimente não tenho, disse ter se arrependido do pontualismo, por causa dos fundamentalistas...
Eu já li algo dele falando dos fundamentalistas terem se aproveitado da teoria dele, e feito confusão com saltacionismo, mas não lembro de ter lido dele ter se arrependido do EP, cuidado com o que diz, a memória pode pregar peças hein! Algo parecido com isso que ouvi dizer é que em "estrutura da teoria evolutiva", ou algo assim, ele "faz as pazes" com a seleção natural, que ele achava de pouca importância (acho que mais a nível individual).
Não acho que ele tenha se arrependido de propor o EP, mas de fazê-lo sem o pano de fundo que existe e que preveniria que fundamentalistas se apossassem e deturpassem a idéia. Não acredito que ele não tenha percebido as lacunas e erros no EP (previstos pelo gradualismo e que poderiam ter sido cobertos se ele estivesse mais atento às decobertas contemporâneas da genética molecular) que poderiam ser previstos e deveriam ser corrigidos.
Sobre a afirmação, foi um professor meu que falou e indicou a fonte, mas faz tempo e não me lembro onde procurar...
Sobre os fósseis, parece que os religiosos [fundamentalistas*] esquecem daquele detalhe: "ausência da evidência não é evidência da ausência...."
*acréscimo meu 
O pior é que não há ausência de evidência!!! Há é ignorância da evidência da parte deles!
Sim, ausência num entendimento próprio e inexplicável.
É também derivado do não entendimento da previsão geral que se faz pela ancestralidade comum, a possibilidade de se organizar geológicamente os seres.
Por aquilo que Darwin escreveu, sobre que deveriam ser encontrados fósseis documentando a evolução, eles se fixam numa necessidade inexistente de inúmeros fósseis documentando uma transição suave entre cada espécie, tantos a ponto de que fosse possível fazer um filme com a técnica "stop and go", filmando um segundo de um fóssil, então cortando para o próximo, e para o seguinte, de forma que quando fosse passado rápidamente veria-se algo similar ao que se veria se fosse tirado uma foto de tempos em tempos do desenvolvimento de um ser humano, desde o zigoto até a idade adulta, e feito um filme da mesma forma.
Infelizmente, nem passando um tratado de paleontologia sobre fossilização eles entenderiam... parecem esperar que ciências biológicas sejam exatas, quando elas são, oras, biológicas!
Quando o que importa, é que se não tivesse ocorrido a evolução, um cientista poderia vir com uma árvore macroevolutiva, e outros cinco, cada um com uma totalmente diferente, e todas seriam igualmente boas.
Pois é... ainda que existam diferenças entre ramos com árvores baseadas em morfologia das baseadas em DNA, como estão todos saindo da idade da pedra e partindo para sequenciamento de genes, temos visto é que mesmo incorporando mais genes às análises, a configuração das árvores não tem mudado muito. Tanto que não é precido usar mais que 3 genes numa filogenia molecular (o que corresponde a alguns milhares de pares de bases, que são, alguns milhares de caracteres, em oposição a 100 caracteres que um bom morfologista consegue reunir...). Dessa forma, não é segredo o motivo das filogenias moleculares serem mais seguras.
Não percebem que não há fósseis que documentem dessa forma o desenvolvimento das raças caninas, por exemplo, ou de outras, no entanto não os vejo afirmar que os cães não são descendentes modificados de um ancestral comum. E segundo alguns as raças caninas, apenas morfologicamente, somam diferença suficiente para classificação em diferentes gêneros (novamente um problema de paleo-espécies e similares).
Sem contar que é um grupo polifilético!
Eu gostaria de fazer um estudo desse tipo: pegar amostra de todas as raças caninas no seu centro de origem e montar uma árvore pra ver a derivação exata de cada raça e o índice de divergência genética entre as raças... dependendo do valor, poderia-se propor o agrupamento em outro gênero, com certeza... mas alguém já deve ter feito isso, preciso fazer umas buscas... Uns pesquisadores espanhóis estavam bem adiantados, já tinham estudados algumas raças...
Parece que não são capazes, ou não querem, ver essa possibilidade de modificação na descendência que eles mesmos não contestam, nas lacunas do registro fóssil; e ver que não há abismos muito mais significativos do que o existente entre um cão pequinês e um dinamarquês. Utilizando isso para preencher mentalmente as lacunas no registro fóssil e ver que elas não são impecílios para a ancestralidade comum universal, só restam um ou outros problemas menores, que talvez possam ser resolvidos de forma similar, só que aprendendo um pouco de como é o desenvolvimento e espécies com desenvolvimento peculiar, e vendo se não seriam casos similares. Mas talvez muitos não tenham mesmo entendido, tamanha é a deturpação que se encontra por aí, não se tratando nem de falta de capacidade ou de disposição para aprender.
Ou não querem...
Mas voltando ao assunto de equilíbrio pontuado/gradualismo filético
Nina e Atheist, para esclarecer:
Vocês provavelmente devem concordar que é bem possível, e provavelmente bem frequente, que espécies passem um longo tempo sem grandes modificações morfológicas, basicamente, por ausência de pressões, certo? E que isso é facilitado no caso de populações suficientemente grandes. Ok?
E em ambientes mais estáveis... se bem que argui-se que os ambientes estáveis poderiam facilitar a exploração de novos nichos e isso poderia levar a especiação... Então, estas são duas idéias opostas que vem sendo discutidas sobre especiação nos netrópicos (américa central e do sul). Não sei se você já leu algo sobre a teoria de refúgios...
E também, que eventualmente algumas subpopulações isoladas podem evoluir mais rapidamente, seja por efeito fundador, deriva, ou mesmo seleção natural. E essa população modificada pode substituir rapidamente a forma original, ou dar essa impressão, dependendo do caso. Por exemplo: se houve uma grande baixa na população, por algum motivo aleatório ou seletivo (em oposição à aleatório, criacionistas), há efeito fundador e depois a aumento da população com as características morfológicas novas, as únicas "salvas", caso a baixa populacional tenha se dado por razões seletivas, mais uma amostra não-representativa de características aleatórias que vem junto com os caracteres selecionados (ou apenas uma amostra não representativa de qualquer característica, caso não tenha sido seleção a causa). No registro fóssil, isso aparentaria que uma forma substituiu outra sem intermediários, até que se encontre o sítio ou sítios que eram os redutos das populações sobreviventes/fundadoras, onde seria mais provável encontrar as formas transiconais - transição que ainda assim não seria tão suave, por falha de registro e outras possibilidades.
Com certeza. Isso também poderia ser verificado no caso de espécies em anel. Veja que há um clina na distribuição das formas das espécies em anel, certo? Se algum evento extinguisse um grupo de formas transicionais entre um extremo e outro, isso não só levaria o grupo ao isolamento reprodutivo (já que nas espécies em anel somente as formas proximamente localizadas têm fluxo), e poderíamos pensar que há duas formas, mas na verdade, elas constituíam um grupo reprodutivo contíguo. No registro fóssil poder-se-ia achar apenas as formas extremas, sem as intermediárias. E olha que estamos falando a princípio da mesma população...
Outro exemplo seria de uma subpopulação em isolamento, por deriva ou seleção, ter fixada alguma vantagem em relação à sua população ancestral. Novamente a seleção dessa característica causa um efeito fundador de características aleatórias, menos importantes que essa selecionada. Essa subpopulação então se expande, rapidamete substituindo as formas da população ancestral, pela vantagem adquirida. As características aleatórias do efeito fundador podem tanto vir de carona, como se perder um pouco com a hibridação, mas novamente é registrado nos fósseis uma substituição súbita de uma forma por outra.
Isso e mais a Vicariância!!!
Isso, a excluindo as esquisitices que a teoria completa possa ter, seria "diagnosticado" como equilíbrio pontuado.
MAs é gradualista no sentido de que não requer que mutações tenham criado diferenças excepcionais nessas subpopulações, e nem que tenham ocorrido taxas elevadas de mutação, ou mutações enormes. Não é requerida a primeira possibilidade, mas é possível que também ocorra eventualmente, as duas últimas devem ser mais raras, talvez desprezivelmente raras.
Então, é por isso que eu afirmo que o padrão é visível, mas não é preciso do EP pra explicar estes fatos, como você mesmo observou. E mesmo mutações com grande impacto na morfologia, são apenas mutações! Na biologia é comum as pessoas cunharem termos novos (acho que o Templeton é campeão) e assumirem termos específicos, as vezes até para cada organismo... mas eu sou a favor de uma simplificação desta nomenclatura. Se não é preciso a etiqueta EP, por que usá-la?
Mas não é gradualismo filético, que seria o caso de uma população, a despeito de eventuais isolamentos e outras coisas, ter tido apenas pequenas modificações morfológicas (selecionadas ou nào), ocorrendo mais ou menos homogeneamente distribuidas durante a sua longevidade filética (não apenas em próximo de ocorrer a especiação, ou pouco depois), acumuladas de forma que apenas passado um bom tempo não se pode identificar morfologicamente como a mesma espécie. No decorrer disso tudo pode ter ocorrido a especiação, mas também sem uma grande aceleração das modificações.
Mas ainda sim é gradualismo.
Eu acho que os dois casos ocorrem, bem como o meio termo, gradualismo pontuado. Também podem ocorrer instâncias em que o que realmente ocorreu foi o segundo caso, mas o processo de fossilização acaba preservando de maneira falha, de maneira a poder ser identificado errôneamente como EP.
Bem, é isso aí.
Pois é... o registro fóssil é uma evidência forte de evolução, mas ele sozinho não responde às perguntas geradas por todos os padrões que se vê na natureza. E o que se vê como um padrão de EP pode ser apenas falha na informação que chega a nós. Nós sabemos muito bem que existe uma série de situações que podem distorcer a informação da história natural da população, algumas foram listadas antes... É por isso que sou cética com o EP. Mas digamos que ele exista como um entidade além do gradualismo... como seria a dinâmica genética destas populações? Não seria igual a um padrão gradual?
Pra mim, o EP é como se estabelecessem uma teoria pra explicar os padrões vistos pela embriologia, e queressem colocá-la em contraposição com os dados da ecologia e evolução, só que pra paleonto. Claro que não foi o que Gould e Eldredge buscaram a princípio, mas foi o resultado. O que pesquisadores de diferentes áreas precisam é integrar seus dados, e quando fizerem isso, vão retornar à idéias de Darwin, somadas ao que ele não tinha previsto, mas sentido existir, a genéica. Em suma, vão retornar à raiz do neodarwinismo, que agora também está passando por uma nova síntese, no sentido em que estão sendo desnudados pontos da embriologia que antes eram pouco claros, graças à biologia do desenvolvimento. Padrões diferentes existem e são resultado não de áreas diferentes de estudo e vieses de observação, mas da grande diversidade existente.
O legal da biologia é justamente isso, acabar percebendo que não há um padrão, mas vários padrões na natureza, embora não precisemos de várias teorias para explicá-los!
