Vou repetir JCatino: estamos falando de indivíduos com carga genética masculina que tenham vagina (ou o inverso)? Porque se não for este o caso então o indivíduo não perdeu a vagina (como você disse) na fase embrionária, ele "perdeu a vagina" no momento em que um "espermatozóide macho" fecundou o óvulo.
A carga genética é metade-metade, então não há carga genética de um gênero. O que há é a diferenciação, no ser humano, de dois gêneros. Só que na prática o gênero hormonal, o gênero pelo qual o indivíduo se identifica, pode ser diferente da sua genitália. Embora seja muito raro, é isso que acontece.
Vamos colocar o caso de um transexual mulher, com genitália masculina: é neste caso é que eu disse que 'perdeu a vagina'. Isto é, hormonalmente é uma mulher, se sente uma mulher, age como tal; mas a genitália é de homem.
Hormonalmente mulher? Mesmo tendo testículos? Não que eu saiba. "Agir e se sentir como mulher" também é meio questionável; a pessoa nunca foi do outro sexo para realmente se sentir como tal - ela na verdade sempre se sentiu como ela mesma e apenas isso. O que ela mesma pode dizer é apenas que se sente insatisfeita com o sexo com que nasceu.
A afirmação de que se sente "do outro sexo" tem, sem romantismo, a mesma validade do que a de alguém em dizer que se sente um carvalho, uma lhama, ou o John Lennon, coisas que nunca foi para realmente poder comparar e atestar que se sente como tal. Ou, para os fins dessa discussão, tem a mesma validade da afirmação de alguém que diz que não deveria ter os membros ou que devesse ter outras partes do corpo de outras proporções ou formas.
A principal coisa diferença é que para essas coisas, por algum motivo, não se costuma imaginar que haja algum tipo de pré-determinação platônica da identidade que existisse antes do desenvolvimento do corpo; por algum motivo, as pessoas aceitam isso no caso de alguém que diz "nascer com o sexo errado". Talvez porque "ser de um sexo" é mais familiar e constante durante a vida, e se imaginar de repente transformado no outro é mais ou menos acessível, enquanto que se imaginar sendo "realmente" aleijado mas "erroneamente" não sendo é algo bem mais estranho, não temos referência. O mais próximo seria usar a experiência mais comum de não ser aleijado e imaginar e perder algum membro acidentalmente, como isso seria ruim e como preferiríamos voltar ao estado natural; e então supor que a pessoa que deseja ser aleijada sente "o inverso", mas ainda é estranho, e talvez o sofrimento dessas pessoas possa ser colocado de lado como menos "real", por não conseguirmos nos identificar tão facilmente.
A sua pergunta não responde a pergunta dele. Aí o que você pergunta é se nós, pessoas "normais", preferíamos perder uma orelha ou genitália; a resposta disso não nos diz nada sobre ser pior o sofrimento de desejar ter outra genitália, de desejar ser mutilado, ou de ter outras proporções e formas físicas. Eu nunca desejei ter outro sexo nem ser mutilado, outras proporções que não pudessem ser obtidas com uma dieta mais saudável e atividade física; são desejos bem distantes da minha experiência pessoal, e não sei se tenho realmente como compará-los.
Será ? Se tivesse uma vagina ao invés de um pênis a sua vida seria a mesma ? A pergunta é essa. E tem que ser pensada friamente, e compare agora à perda de uma orelha.
Mas agora você está defendendo as prioridades?

Obviamente não seria a mesma. Mas além da comparação presumir algo como a possiblidade de "eu", homem, existir platônicamente e de ter vindo a existir num corpo feminino, como uma espécie de encarnação espiritual, isso não anula a importância psicológica e funcional da perda de uma orelha (ou da sensação análoga e igualmente plausível de ter nascido com outras partes "erradas" no corpo, apesar de perfeitamente saudáveis), ainda mais sob a ótica de que estabelecer prioridades para tratamentos é algo questionável.
A hipótese de que é a mesma coisa a sensação de um transexual se comparada à alguém que fosse submetido à força a uma operação de mudança de sexo não é verificável, ou, no mínimo, não pode ser dada como certa assim tão facilmente, e da mesma forma, também não podemos saber que a sensação das pessoas que desejam ter outras diferenças no corpo é comparável à menor importância que pessoalmente podemos dar a esses atributos, em comparação com a genitália com a qual nascemos e construímos nossa identidade sexual.
O simples fato de ter gente que deseja não ter membros é evidência gritante disso, pois o normal é querer ter o corpo inteiro (como também é ser do sexo que se é). Com base nisso, como podemos realmente afirmar que a nossa prioridade pessoal pelo sexo é universal ou psicologicamente mais séria, a ponto da outra ser comparativamente irrelevante? Como isso pode não ser preconceito?
Como disse antes, talvez seja simplesmente mais fácil nos imaginarmos sendo de repente do "sexo errado" e como isso poderia ser ruim se comparado a termos "só" o nariz "errado", ou alguma desfiguração, e então pode até parecer só "maluquice" sem análogo algum não querer ter um membro ou dar muita importância a ter outros atributos físicos diferentes dos que se tem.