Autor Tópico: Inteligência artificial  (Lida 15211 vezes)

0 Membros e 1 Visitante estão vendo este tópico.

Offline Mighell

  • Nível 03
  • *
  • Mensagens: 35
Inteligência artificial
« Online: 02 de Julho de 2005, 11:52:28 »
Vcs conhecem o famoso argumento de Roger Penrose contra a IA. Bem, é incrivel como um grande cientista como ele tenha escrito um livro tão grande a demonstrar que nunca será possível criar um robô consciente. Ele baseia o seu argumento no teorema da incompletude de Godel. Uma vez que há limites para a lógica e a Aritmética, uma máquina de Turing nunca poderá simular o cérebro humano e gerar a autoconsciência. Dah... o cérebro não é uma máquina de Turing programada pela lógica e aritmética, é uma estrutura que aprende pela experiência. E as redes neuronais, que são a grande promessa da IA, também não são máquinas de Turing (aprendem como nós) e por isso não estão sujeitas ás restrições do teorema de Godel. Quando Penrose propôs a sua prova de que não seremos capazes de criar a consciência (reparem que ele tenta provar uma negativa, outro problema da sua argumentação), já havia muita investigação sobre redes neuronais. Será que o tipo não fez o trabalho de casa.

Unbedeutend_F_Organisch

  • Visitante
Re: Inteligência artificial
« Resposta #1 Online: 02 de Julho de 2005, 12:04:13 »
Citação de: Mighell
Será que o tipo não fez o trabalho de casa...


Poderia explicar melhor, como as redes neuronais podem refutar o tal argumento de Penrose?

Offline Mighell

  • Nível 03
  • *
  • Mensagens: 35
Re: Inteligência artificial
« Resposta #2 Online: 02 de Julho de 2005, 12:19:31 »
Citação de: Unbedeutend Organisch
Citação de: Mighell
Será que o tipo não fez o trabalho de casa...


Poderia explicar melhor, como as redes neuronais podem refutar o tal argumento de Penrose?


 Bem em primeiro lugar ele pretende provar que nunca faremos robôs autoconscientes. Isto de provar uma negativa é sempre uma prova pouco ciêntífica, baseada na intuição ou sei lá mais o quê.

 Quanto ao teorema da incompletude, ele diz que um sistema lógico-matemático não é auto-justificativo. Há sempre uma premissa básica nesse sistema que não pode ser demonstrada matemáticamente. Transportando isto para a consciência, é um pouco como dizer que a consciência não se pode justificar a si mesma, ou que não pode se aperceber de si mesma. O argumento dele, começa por dizer que a consciência humana é especial e irreproduzível... e depois dá uma série de justificações esotéricas baseadas na teoria quântica (principio da incerteza), de que não percebi nada. O problema é que ele ataca a escola de IA do Topo para a Base. Nessa escola tenta-se simular a mente através da pura programação em máquinas de Turing (as máquinas de Turing são aparelhos que precisam de muita informação decomposta em lógica e aritmética para funcionar e por isso está sujeita ás restrições do Teorema de Godel). Ora ele reconhece que o cérebro não é uma máquina de Turing, porque funciona em paralelo (o cérebro pode executar bilhões de operação por segundo actuando em simultâneo, ao contrário das máquinas de Turing que fazem uma operação de cada vez a grandes velocidades), e conclui estranhamente que por causa disso não será possível simular a consciência. Ora, acontece que já existem redes neuronais que funcionam como o cérebro, e por isso não são máquinas de Turing sujeitas á limitações da incompletude de Godel. Como eu disse, aprendem com a experiência partindo de estruturas inatas (que envolvel um mínimo de programação). É aquilo que se chama uma abordagem da Base para o Topo. Em vez de programação massiça, as redes neuronais evoluem através da experiência.

 Não me peçam para demonstrar o teorema de Godel. Eu só compreendo o princípio e não a demonstração. Eu sou um asno a matemática. :lol:

Unbedeutend_F_Organisch

  • Visitante
Re.: Inteligência artificial
« Resposta #3 Online: 02 de Julho de 2005, 12:25:00 »
Então, em que época foi escrito o livro em que fala isso? Talvez naquela época não existissem redes neuronais, apenas a programação.

E de certa forma o argumento dele é bom, talvez desatualizado.

Offline Mighell

  • Nível 03
  • *
  • Mensagens: 35
Re.: Inteligência artificial
« Resposta #4 Online: 02 de Julho de 2005, 12:32:15 »
O Livro foi escrito em 88, se não estou em erro. E acho que a primeira rede neuronal surgiu na decada de 70. Seja como for, em 1985 John Denker dizia que o computador do futuro iria ter um elevado grau de paralelismo. Ou seja seriam redes neuronais. E acho que o argumento dele está tão desactualizado e é tão pouco ciêntífico que é basicamente uma nulidade. E ele está muito só na sua teimosia.  :?

Unbedeutend_F_Organisch

  • Visitante
Re.: Inteligência artificial
« Resposta #5 Online: 02 de Julho de 2005, 12:34:00 »
Pelo o que me lembre a IA de base, que se baseava na Biologia, etc..ficou durante um tempo na berlinda...

Offline Mighell

  • Nível 03
  • *
  • Mensagens: 35
Re: Re.: Inteligência artificial
« Resposta #6 Online: 02 de Julho de 2005, 12:39:58 »
Citação de: Unbedeutend Organisch
Pelo o que me lembre a IA de base, que se baseava na Biologia, etc..ficou durante um tempo na berlinda...


 Continua na Berlinda. Muitos dos programas que a Nasa usa nos seus veículos espaciais são redes neuronais. E a tendência é para aumentar. Um exemplo do poder das redes neuronais é o problema do caixeiro viajante. Nós temos N cidades ligadas por caminhos. O caixeiro tem de visitar cada uma das cidades  sem repetir os caminhos. Se N se torna muito grande, uma máquina de Turing bloqueia. Para N igual a oito, calcula-se que 6000 maquinas de Turing em paralelo levariam séculos a resolver o problema. Mas uma rede neuronal muito simples resolveu o problema numa semana...

Offline Mighell

  • Nível 03
  • *
  • Mensagens: 35
Re.: Inteligência artificial
« Resposta #7 Online: 02 de Julho de 2005, 12:46:21 »
Ah... esqueci-me de dizer que o Livro de Penrose é "A mente nova do Imperador".

Unbedeutend_F_Organisch

  • Visitante
Re: Re.: Inteligência artificial
« Resposta #8 Online: 02 de Julho de 2005, 13:42:27 »
Citação de: Mighell
Ah... esqueci-me de dizer que o Livro de Penrose é "A mente nova do Imperador".


E o livro(ou textos) do Marvin Minsky?

Caixeiro viajante é um problema clássico, tanto que é um dos desafios da Instituo Clay de Matemática,ou melhor, é um dos exemplos para um dos desafios - se há uma maneira mais fácil de calcular a possibilidade sem ter tanto trabalho(linguagem de leigo)-
Fazia tempo que não lia algo sobre o assunto, fui até no S. Google ler sobre o assunto.

Unbedeutend_F_Organisch

  • Visitante
Re: Re.: Inteligência artificial
« Resposta #9 Online: 02 de Julho de 2005, 13:46:19 »
Citação de: Mighell
Citação de: Unbedeutend Organisch
Pelo o que me lembre a IA de base, que se baseava na Biologia, etc..ficou durante um tempo na berlinda...


 Continua na Berlinda. Muitos dos programas que a Nasa usa nos seus veículos espaciais são redes neuronais. E a tendência é para aumentar. Um exemplo do poder das redes neuronais é o problema do caixeiro viajante. Nós temos N cidades ligadas por caminhos. O caixeiro tem de visitar cada uma das cidades  sem repetir os caminhos. Se N se torna muito grande, uma máquina de Turing bloqueia. Para N igual a oito, calcula-se que 6000 maquinas de Turing em paralelo levariam séculos a resolver o problema. Mas uma rede neuronal muito simples resolveu o problema numa semana...


Mas para um humano desenvolver uma rede neuronal com capacidade de ter todas as características da mente humana, não precisaria um longo tempo ou ainda usar do arcaico método "tentativa-e-erro"?

Offline Mighell

  • Nível 03
  • *
  • Mensagens: 35
Re: Re.: Inteligência artificial
« Resposta #10 Online: 04 de Julho de 2005, 11:46:41 »
Citação de: Unbedeutend Organisch
Citação de: Mighell
Citação de: Unbedeutend Organisch
Pelo o que me lembre a IA de base, que se baseava na Biologia, etc..ficou durante um tempo na berlinda...


 Continua na Berlinda. Muitos dos programas que a Nasa usa nos seus veículos espaciais são redes neuronais. E a tendência é para aumentar. Um exemplo do poder das redes neuronais é o problema do caixeiro viajante. Nós temos N cidades ligadas por caminhos. O caixeiro tem de visitar cada uma das cidades  sem repetir os caminhos. Se N se torna muito grande, uma máquina de Turing bloqueia. Para N igual a oito, calcula-se que 6000 maquinas de Turing em paralelo levariam séculos a resolver o problema. Mas uma rede neuronal muito simples resolveu o problema numa semana...


Mas para um humano desenvolver uma rede neuronal com capacidade de ter todas as características da mente humana, não precisaria um longo tempo ou ainda usar do arcaico método "tentativa-e-erro"?


 Parece que esses sistemas aprendem muito rapidamente. Basta um erro ser reconhecido para nunca mais acontecer.

Offline Sdelareza

  • Nível 15
  • *
  • Mensagens: 392
Re:Inteligência artificial
« Resposta #11 Online: 27 de Fevereiro de 2016, 21:21:41 »
Em 1936, Alan Turing publicou o artigo "On Computable Numbers, with an Application to the Entscheidungsproblem", onde introduziu
 uma máquina abstrata denominada "Máquina de Turing", que executa um programa com uma entrada finita de dados.
Expôs nele o problema da parada, ao mostrar que é impossível para um programa decidir se ele termina de rodar ou rodará indefinidamente.

Tratou-se de uma demonstração mecânica do Teorema da Incompletude do Godel, pois mostrou-se que é impossível decidir via algoritmo se um enunciado na aritmética é verdadeiro ou falso.


Para Penrose, isso demonstra que a mente no seu todo não pode ser reproduzida numa máquina. Certas partes da mente talvez (fazer contas, etc..), mas outras não.
Ele considera sobretudo a intuição humana como um processo mental que não pode ser reproduzida através de um algoritmo, e a interpreta como um fenômeno quântico.

Atualmente, costuma distinguir-se entre Inteligência Artificial Fraca e Inteligência Artificial Forte (esta última que é fora do alcance das máquinas).

Em 1950, Turing publicou o artigo "Computing machinery and intelligence", que lançou as bases da Inteligência Artificial com o chamado Teste de Turing, para poder determinar a inteligência de uma máquina. Uma pessoa faz perguntas em separado à um computador e à uma outra pessoa (sem poder reconhecê-los) por meio de mensagens datilografadas. Se ela não conseguia diferenciar a pessoa da máquina através das respostas após cinco minutos de testes, a máquina passa no teste.

Em 1980, John Searle publicou um artigo para refutar o Teste de Turing e outras formas de Inteligência Artificial através do argumento do "Quarto Chinês".
Ele imagina um computador que recebe dados em chinês e os traduz em inglês. Há uma pessoa dentro do computador que recebe os dados em chinês e as traduz em inglês obedecendo às instruções de um manual de tradução chinês-inglês. O que Searle quis dizer com esse exemplo é que uma máquina (no exemplo, a pessoa dentro) não compreende a linguagem. Ela pode compreender a sintaxe, mas não pode compreender a semântica.

Searle não quis dizer que é impossível construir uma máquina que pensa ou age como um humano já que os humanos são máquinas biológicas complexas. Segundo ele, uma máquina que reproduz a mente humana deveria ser do mesmo material que aquele de um humano.







« Última modificação: 28 de Fevereiro de 2016, 09:40:34 por Sdelareza »

Offline Pedro Reis

  • Nível 39
  • *
  • Mensagens: 4.085
Re:Inteligência artificial
« Resposta #12 Online: 28 de Fevereiro de 2016, 03:25:34 »
O Mighell estava equivocado. Redes neurais e neuronais são implementadas em computadores que são logicamente equivalentes a máquinas de Turing.

Tudo que um computador convencional pode fazer ( paradigma de Harvard ou Von Neuman ) também poderia ser implementado em uma máquina de Turing, ou em uma máquina RAM.

Se você pode demonstrar que algo não é computável em algum desses modelos teóricos abstratos consequentemente demonstra-se que também não é computável em uma máquina real logicamente equivalente. E vice-versa.

Com o atual paradigma de computadores é impossível produzir consciências artificial. Vale destacar que uma rede neuronal é nada mais que um programa, um sequência de instruções de máquina, rodando no computador. Um programa como outro qualquer.

Imaginar que exista um determinada sequência de instruções de máquina que, se e quando executada, dotaria o hardware de consciência é o mesmo que imaginar que possa existir um trouxa de roupa suja específica que se colocada em uma máquina de lavar converteria a lava-roupa em uma entidade dotada de consciência.

Offline Buckaroo Banzai

  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 38.735
  • Sexo: Masculino
Re:Inteligência artificial
« Resposta #13 Online: 28 de Fevereiro de 2016, 08:01:53 »
Não vejo qualquer sentido nessa "analogia". Parece mais algo que só assume a resposta e tenta ridicularizar a idéia, como dizer, "imaginar que a vida é um processo apenas mecânico é o mesmo que imaginar que colocar num recipiente camisas suadas e trigo gerará ratos depois de 21 dias".

Acho que não tem nenhuma abordagem teórica do problema de inteligência ou até mesmo consciência que não possa ser em última instância dita "computacionalista", ainda que possa requerer programas mais complexos, ou a interação entre diferentes programas rodando simultâneamente, versus um cenário mais extremamente simplificado.

Acho que você pode aceitar isso ao mesmo tempo em que aceita a validade da lógica do "experimento" da sala chinesa, que não é qualquer "bot" que puder tapear um bom número de pessoas que estará por isso se aproximando signficativamente do que ocorre no cérebro, ou progressivamente mais, conforme mais convincente for.

Offline Sdelareza

  • Nível 15
  • *
  • Mensagens: 392
Re:Inteligência artificial
« Resposta #14 Online: 28 de Fevereiro de 2016, 09:32:10 »
Alguém fez uma comparação interessante.

Quando fazemos uso do nosso cérebro (pensando, calculando ou raciocinando), significa que por dentro, sinais elétricos são transmitidos via sinapse (o sinal elétrico é convertido num sinal químico, que em seguida é reconvertido num sinal elétrico) de um neurônio para outro, através de redes de trilhões de neurônios.

Seria como comparar aquilo a um conjunto de trilhões de dominós em linhas. Quando derrubamos um dominó, ele vai derrubar progressivamente os outros dominós na mesma linha ou das outras linhas que se conectam.

A questão é: como explicar a ação responsável por derrubar o primeiro dominó?

Offline Brienne of Tarth

  • Nível 33
  • *
  • Mensagens: 2.510
  • Sexo: Feminino
  • Ave, Entropia, morituri te salutant
Re:Inteligência artificial
« Resposta #15 Online: 28 de Fevereiro de 2016, 10:41:07 »
Quando fazemos uso do nosso cérebro (pensando, calculando ou raciocinando), significa que por dentro, sinais elétricos são transmitidos via sinapse (o sinal elétrico é convertido num sinal químico, que em seguida é reconvertido num sinal elétrico) de um neurônio para outro, através de redes de trilhões de neurônios.

Mais ou menos, a maioria das sinapses dos mamíferos são sinapses químicas, mas existe uma forma simples de sinapse elétrica que permite a transferência direta da corrente iônica de uma célula para a célula seguinte. As sinapses elétricas ocorrem em locais especializados chamados junções. Elas formam canais que permitem que os ions passem diretamente do citoplasma de uma célula para o citoplasma da outra. A transmissão nas sinapses elétricas é muito rápida; assim, um potencial de ação no neurônio pré-sináptico, pode produzir quase que instantaneamente um potencial de ação no neurônio pós-sináptico. Sinapses elétricas no sistema nervoso central de mamíferos, são encontradas principalmente em locais especiais onde funções normais exigem que a atividade dos neurônios vizinhos seja altamente sincronizada. Embora as junções sejam relativamente raras entre os neurônios de mamíferos adultos, eles são muito comuns em uma grande variedade de células não neurais, inclusive as células do músculo liso cardíaco, células epiteliais, algumas células glandulares, glia, etc. Elas também são comuns em vários invertebrados.

Seria como comparar aquilo a um conjunto de trilhões de dominós em linhas. Quando derrubamos um dominó, ele vai derrubar progressivamente os outros dominós na mesma linha ou das outras linhas que se conectam.
A questão é: como explicar a ação responsável por derrubar o primeiro dominó?

Não se explica, se eu entendi sua pergunta. Seria como perguntar como surgiu o "primeiro coelho".
GNOSE

Offline Sdelareza

  • Nível 15
  • *
  • Mensagens: 392
Re:Inteligência artificial
« Resposta #16 Online: 28 de Fevereiro de 2016, 11:32:09 »
É. Seria como dizer "Como surgiu a primeira forma de vida?"

O pensamento corrente na biologia é a biogênese (que a vida nasce da vida), quando antes o que dominava era a teoria da geração espontânea.

Mas como a biogênese explica o surgimento da primeira forma da vida? E a consciência surgiu também junto com as primeiras formas de vida?

Então voltando a minha pergunta, seria perguntar: "Quando alguém pensa e toma uma decisão, quem e como ativou o primeiro neurônio de um sinal que atravessa trilhões de neurônios?"
« Última modificação: 28 de Fevereiro de 2016, 11:39:02 por Sdelareza »

Offline Pedro Reis

  • Nível 39
  • *
  • Mensagens: 4.085
Re:Inteligência artificial
« Resposta #17 Online: 28 de Fevereiro de 2016, 13:03:17 »
É. Seria como dizer "Como surgiu a primeira forma de vida?"

O pensamento corrente na biologia é a biogênese (que a vida nasce da vida), quando antes o que dominava era a teoria da geração espontânea.

Mas como a biogênese explica o surgimento da primeira forma da vida? E a consciência surgiu também junto com as primeiras formas de vida?

Então voltando a minha pergunta, seria perguntar: "Quando alguém pensa e toma uma decisão, quem e como ativou o primeiro neurônio de um sinal que atravessa trilhões de neurônios?"

Acho que uma pergunta ainda mais difícil de responder seria como este processo bio-químico, físico, gera a experiência subjetiva da consciência. Ou, que sequência de eventos no mundo físico gerariam a primeira centelha de consciência.

Sobre a analogia é preciso entender que Ciência da Computação é uma ciência formal abstrata assim como a Lógica e a Matemática. Ciência da Computação não tem nada a ver diretamente com eletrônica ou engenharia eletrônica. É teorema e demonstração.

Mas como provar um teorema sobre computabilidade se não se definir o que é um computador?

É muito difícil definir "computador" ( talvez impossível ) porque todas estas máquinas que chamamos de computador possuem muitas particularidades e diferenças tecnológicas entre si.

Mas não teria sentido algum provar que um determinado problema é ou não computável ( sim!, existem problemas que se demonstram não computáveis ) se você não sabe o que é um computador. O termo computável só passa a adquirir algum significado depois de definido o que vem a ser um computador.

Da mesma forma se quisermos calcular a função de ordem de complexidade de um determinado algoritmo temos que definir o que é computador, e assim por diante...

Esse problema pode ser contornado se definirmos uma máquina formal, abstrata, puramente conceitual, capaz de executar um certo número finito de operações bem definidas. Então podemos demonstrar formalmente coisas que esta máquina pode ou não fazer, a ordem de grandeza do número de operações para realizar alguma tarefa algoritimica, a ordem de grandeza da quantidade de memória exigida, etc...

A máquina de Turing e máquina RAM são exemplos destas máquinas conceituais da Ciência da Computação.

Agora, uma vez que você definiu ( especificou ) o que seria uma máquina RAM tudo o que você tem que fazer é demonstrar que todas as operações lógicas, o conjunto finito de operações que este computador real, físico, aí em cima da sua mesa, é capaz de fazer, podem ser ( todas elas ) implementadas como uma sequência de operações elementares da máquina RAM conceitual.

De forma que obviamente está assim demonstrada a equivalência entre estes dois sistemas e a garantia de que todos os teoremas provados para uma máquina RAM se aplicam também a esta máquina física, específica. E vice-versa: tudo que for válido e verdadeiro para esta máquina física também é valido ( poderia ser realizado ) para uma máquina RAM.

A demonstração de Penrose sobre a impossibilidade de consciência baseia-se na máquina conceitual de Turing. Então compreenda da seguinte forma: se você demonstra que com o conjunto de operações de uma máquina de Turing é impossível construir um algoritmo que receba como entrada um programa ( sequência de operações desta mesma máquina ) e forneça como saída a informação se este programa para ou se este programa entra em "loop" e roda para sempre, então isto também será verdade para qualquer outro sistema para o qual se prove sua equivalência com a máquina de Turing.

Por acaso é o caso deste desktop aí na sua mesa.

Não dá para passar a perna nesse teorema. É onde o Mighell se equivoca: qualquer rede neuronal poderia ser implementada em uma máquina de Turing, portanto não poderia transcender as potencialidades demonstradas para a própria máquina de Turing.

Esta confusão a respeito da natureza dos computadores vem do fato dos computadores se parecerem para muitos de nós como uma "caixa preta", uma coisa meio mágica fazendo coisas incríveis sem que a gente saiba muito bem como.

Mas na verdade todos os computadores reais, físicos, que podemos comprar em alguma loja, em tese poderiam ser simulados, por exemplo, por engenhocas feitas com encanamentos de PVC, bombas hidráulicas, válvulas hidráulicas e pequenos recipientes para armazenar e dispensar certas quantidades de água. Ou seja, todo o funcionamento do seu computador, seja ele de modelo for, poderia ser inteiramente mimetizado por um sistema hidráulico. De fato o primeiro computador operacional conhecido, o Mark I desenvolvido em Harvard, que funcionava a base de válvulas e relés,  foi baseado em um modelo que um matemático inglês chamado Charles Babbage tentou desenvolver no século 19, e que era inteiramente mecânico. Ele jamais conseguiu, não porque fosse teoricamente impossível, mas porque a complexidade envolvida estava além das possibilidades da época. Talvez até mesmo das possibilidades de hoje, se considerarmos que o eletro-eletrônico Mark I ocupava todo um imenso galpão em Harvard.

Talvez este computador hidráulico que imaginei, capaz de mimetizar todas as operações de um determinado computador real específico, precisasse ser tão imenso que ocupasse todo o espaço do sistema solar, precisando também de uma quantidade de energia quase ilimitada para funcionar ( sem falar na água! ), mas isso não importa, este é apenas e tão somente um experimento mental.

Imagine então que este sistema que é apenas um intrincado conjunto de canos e válvulas e recipientes, fazendo com que água circule por ele, imagine que este sistema possa despertar para a autoconsciência, a mesma autoconsciência que você experimenta, se você for capaz de fazer a água circular circular e ser armazenada em uma determinada sequência de operações específica... Absurdo! O sistema é indiferente, inconsciente, à forma pela qual está operando, assim como uma máquina de lavar é indiferente a que tipo de roupa está lavando.

Ou então, se for mais simples, podemos imaginar, sem perda de generalidade, que qualquer programa ( até mesmo um programa que implemente uma rede neuronal ) é uma sequência específica de instruções de máquina escritas a lápis em papel de pão. Evidentemente a atividade de ler e executar cada uma destas instruções, sejam quais forem e em qualquer sequência, não poderiam por si produzir a experiência subjetiva da consciência em quem as estivesse lendo e executando. Fosse este algo ou alguém um sistema físico ou biológico.

Mas de forma alguma isto representa uma prova de que a consciência não pode ser resultado de processos físicos e que um dia possam até ser reproduzidos artificialmente. Mas é uma prova de que o atual paradigma de computador não pode, como acredita Penrose, jamais ser consciente.


Offline Buckaroo Banzai

  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 38.735
  • Sexo: Masculino
Re:Inteligência artificial
« Resposta #18 Online: 28 de Fevereiro de 2016, 14:22:06 »
É. Seria como dizer "Como surgiu a primeira forma de vida?"

O pensamento corrente na biologia é a biogênese (que a vida nasce da vida), quando antes o que dominava era a teoria da geração espontânea.

Mas como a biogênese explica o surgimento da primeira forma da vida? E a consciência surgiu também junto com as primeiras formas de vida?

A origem "primeira" da vida se dá por trás da abiogênese, uma "geração espontânea" mais complexa e gradual do que a intuída originalmente, e não totalmente compreendida. O que a faz fundamentalmente possível é não haver distinção fundamental entre "matéria viva" e matéria não-viva. Vida é um nível específico de atividade organizada que realiza uma série de funções, que conduzem a reprodução dessas organizações/organismos.

A consciência certamente não surgiu junto com as primeiras formas de vida, dado que requer sistema nervoso, no mínimo, e mais que isso, um certo nível de organização e padrões de atividade específicos.



Citar
Então voltando a minha pergunta, seria perguntar: "Quando alguém pensa e toma uma decisão, quem e como ativou o primeiro neurônio de um sinal que atravessa trilhões de neurônios?"

Possivelmente não tem muito sentido pensar no "primeiro neurônio" a ser ativado numa decisão.

Em algum momento após o desenvolvimento do sistema nervoso, a atividade cerebral não pára. Mesmo quando se está dormindo. Então a resposta mais "leiga" é "algum dos milhões deles", e a técnica talvez tentasse delinear a atividade da "decisão" daquela que a precede, e talvez ainda assim não chegasse a apontar apenas um neurônio singular como desengatador do início da atividade de decisão.

Na analogia de dominós, é um pouco como se os dominós fossem dominós João-bobo, e mesmo internamente nunca chegasse um ponto onde todos estão caídos ou em pé ao mesmo tempo. "Todos" caindo ao mesmo tempo possivelmente é algo de que se aproximam ataques epiléticos.

Offline Buckaroo Banzai

  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 38.735
  • Sexo: Masculino
Re:Inteligência artificial
« Resposta #19 Online: 28 de Fevereiro de 2016, 14:34:38 »
Ou então, se for mais simples, podemos imaginar, sem perda de generalidade, que qualquer programa ( até mesmo um programa que implemente uma rede neuronal ) é uma sequência específica de instruções de máquina escritas a lápis em papel de pão. Evidentemente a atividade de ler e executar cada uma destas instruções, sejam quais forem e em qualquer sequência, não poderiam por si produzir a experiência subjetiva da consciência em quem as estivesse lendo e executando. Fosse este algo ou alguém um sistema físico ou biológico.

Mas de forma alguma isto representa uma prova de que a consciência não pode ser resultado de processos físicos e que um dia possam até ser reproduzidos artificialmente. Mas é uma prova de que o atual paradigma de computador não pode, como acredita Penrose, jamais ser consciente.



Não é prova de nada. É apenas apelo a incredulidade.

E acho que há uma confusão aí entre um programa com instruções definidas, que não poderia ser consciente, e o programa em execução num computador (ou ainda, o programa em execução "isolado" do computador, consciente de um "ambiente" definido no computador -- mas não de estar em execução num computador*), que teoricamene talvez possa, talvez dependendo do hardware permitir quaisquer operações necessárias, ou ainda, disso que se atribui ao hardware poder ser simulado de maneira suficientemente "isomórfica", sem ele.


* meio como seríamos nós supondo que a hipótese de universo simulado seja correta, mas aqui supondo apenas um grau muito mais mínimo de "consciência". Seja lá qual for o padrão mínimo de atividade neuronal (ou suficientemente análoga) que possa se dizer ser consciente, também num sistema nervoso mínimo necessário. Mas em vez disso ocorrer, digamos, num verme ou embrião de tardígrado, ocorreria num programa; consciente não de um ambiente real, mas virtual.

Offline Sdelareza

  • Nível 15
  • *
  • Mensagens: 392
Re:Inteligência artificial
« Resposta #20 Online: 28 de Fevereiro de 2016, 15:11:54 »
Eu não sei qual a noção exata de consciência. Seria ela associada com inteligência?

Já que o título do tópico é "Inteligência Artificial", qual a definição de inteligência? Entendo inteligência como a capacidade de se adaptar a novas situações, tal como ela foi definida pelo epistemólogo Jean Piaget.

Uma máquina por mais sofisticada que ela parece ser (jogar partidas de xadrez, reconhecer vozes, padrões de rostos, formas ou de paisagens) sempre executa suas operações de forma bruta, analisando milhares de dados e combinações, das mais inúteis até as poucas que são realmente relevantes.

Enquanto um humano realiza essas atividades analisando apenas alguns dados e combinações - aqueles que ele sabe que são relevantes!

Uma máquina que executa cegamente e burramente milhares de dados e de instruções, sem saber com antecedência quais instruções devem ser descartadas,  pode ser considerada inteligente?

Para muitos, isso não tem nada a ver com Inteligência Artificial.


Uma máquina não pode entender uma linguagem (como disse Searle) e não pode mentalizar uma pessoa ou um objeto.  Para ela, tudo são apenas dados nas mais diversa formas (bancos de dados, registros, listas, matrizes, etc..). Ela pode por conta própria se adaptar a uma nova situação se ela não entende o domínio à sua volta ?


Agora estão falando da computação quântica. Não sei se aquilo representa um novo paradigma na computação que pode nós aproximar da consciência artificial.

Offline Buckaroo Banzai

  • Nível Máximo
  • *
  • Mensagens: 38.735
  • Sexo: Masculino
Re:Inteligência artificial
« Resposta #21 Online: 28 de Fevereiro de 2016, 15:38:59 »
Eu não sei qual a noção exata de consciência. Seria ela associada com inteligência?

Acho que nem tem uma só noção exata, infelizmente.

Em alguns casos será como "ciente de variáveis do presente", a consciência do ambiente, que talvez seja um nível praticamente "nulo" do termo.

Ainda haverá o termo "auto-consciência", onde a coisa já começa a ficar menos trivial, requerendo um sistema capaz de criar modelos das coisas, não só do ambiente, mas de si mesmo, e se reconhecer como estando nesse ambiente. E etc e tal. Bem provavelmente há radações disso e até do tipo anterior.

E por fim (ou talvez não) há ainda "consciência" como a experiência subjetiva que temos e dá origem à ilusão do "teatro cartesiano", que faz "dessa" consciência algo difícil de intuir ou explicar como algo meramente mecânico, físico, dado que simplesmente "não parece" físico; nosso entendimento da física é em qualquer outra instância objetivo/externo, esse é o único fenômeno que de que temos (e o único de que poderíamos ter) uma experiência física subjetiva. "Subjetivo" não sendo no sentido de "gosto pessoal", mas uma realidade objetiva apreensível diretamente apenas a cada indivíduo.


"Inteligência" também deve ter um monte de definições diferentes, mesmo antes de entrar naquelas de "7/8 inteligências" humanas.

Computadores/máquinas (máquinas não-humanas) podem ser extremamente inteligentes em coisas muito específicas, mas não são dotados de uma inteligência geral que é aquilo que mais comumente associamos ao termo, nos referindo a outras pessoas. Também deve ser mais o que se pensa por "inteligência artificial", em oposição a essas inteligências altamente específicas.

Essa "inteligência geral", assim como a consciência (ou todos os sentidos disso), provavelmente são "constituídos" de combinações de inteligências específicas, bem como talvez de inteligências específicas que gerem a algumas dessas inteligências.



Citar
Já que o título do tópico é "Inteligência Artificial", qual a definição de inteligência? Entendo inteligência como a capacidade de se adaptar a novas situações, tal como ela foi definida pelo epistemólogo Jean Piaget.

Uma máquina por mais sofisticada que ela parece ser (jogar partidas de xadrez, reconhecer vozes, padrões de rostos, formas ou de paisagens) sempre executa suas operações de forma bruta, analisando milhares de dados e combinações, das mais inúteis até as poucas que são realmente relevantes.

Enquanto um humano realiza essas atividades analisando apenas alguns dados e combinações - aqueles que ele sabe que são relevantes!

Não necessariamente. Nunca ou raramente vai fazer operações de "força bruta", isso é, calcular todas as possibilidades. Mas também não é bem "saber" com tanta superioridade o que é relevante. São heurísticas, algo mais humilde ou grosseiro do que pode sugerir "saber o que é relevante".



Citar
Uma máquina que executa cegamente e burramente milhares de dados e de instruções, sem saber com antecedência quais instruções devem ser descartadas,  pode ser considerada inteligente?

Para muitos, isso não tem nada a ver com Inteligência Artificial.


Uma máquina não pode entender uma linguagem (como disse Searle) e não pode mentalizar uma pessoa ou um objeto.  Para ela, tudo são apenas dados nas mais diversa formas (bancos de dados, registros, listas, matrizes, etc..). Ela pode por conta própria se adaptar a uma nova situação se ela não entende o domínio à sua volta ?

Bem, existe aplicação de heurística em computadores/máquinas, e até mesmo de "modelagem" de objetos (ou mesmo auto-modelagem).

Se por "inteligência artificial" o que se entende/pretende é reproduzir "inteligência animal", deve ser por aí o caminho.

Com isso já fizeram alguns robôs que não só, aprendem a andar por si próprios, se calibrando, descobrindo como são, como interagem no espaço, como reaprendem a andar se lesados.

<a href="https://www.youtube.com/v/ehno85yI-sA" target="_blank" class="new_win">https://www.youtube.com/v/ehno85yI-sA</a>

<a href="https://www.youtube.com/v/iNL5-0_T1D0" target="_blank" class="new_win">https://www.youtube.com/v/iNL5-0_T1D0</a>

<a href="https://www.youtube.com/v/xbizdSB00Fs" target="_blank" class="new_win">https://www.youtube.com/v/xbizdSB00Fs</a>

Citar
Agora estão falando da computação quântica. Não sei se aquilo representa um novo paradigma na computação que pode nós aproximar da consciência artificial.

Não entendo nada disso. Acho que geralmente se assume que não tenha nada significativo em nível quântico ocorrendo para explicar a mente e a consciência, Penrose deve ser a exceção.

Offline Pedro Reis

  • Nível 39
  • *
  • Mensagens: 4.085
Re:Inteligência artificial
« Resposta #22 Online: 28 de Fevereiro de 2016, 16:59:03 »

Não é prova de nada. É apenas apelo a incredulidade.

E acho que há uma confusão aí entre um programa com instruções definidas, que não poderia ser consciente, e o programa em execução num computador (ou ainda, o programa em execução "isolado" do computador, consciente de um "ambiente" definido no computador -- mas não de estar em execução num computador*), que teoricamene talvez possa, talvez dependendo do hardware permitir quaisquer operações necessárias, ou ainda, disso que se atribui ao hardware poder ser simulado de maneira suficientemente "isomórfica", sem ele.


Apelo a incredulidade é quando alguém considera que algo é muito difícil de entender, ou então não é capaz de conceber como funciona, e a partir disso conclui equivocadamente que seja impossível a ocorrência de tal fenômeno.

Você está subestimando imensamente a Ciência da Computação. O problema da parada do programa é formalmente demonstrável como um destes problemas não computáveis por qualquer sistema equivalente a uma máquina de Turing. Assim como existem outros problemas também demonstravelmente não computáveis.

Contudo um programador é capaz de identificar se um programa pára ou entra em loop. Se partirmos do pressuposto que é unicamente a atividade cerebral do programador a responsável por solucionar este problema podemos inferir disso que o cérebro humano não pode ser inteiramente simulado pelo atual paradigma de computadores eletrônicos.

Por paradigma atual entenda qualquer máquina, sistema ou dispositivo lógico-equivalente a uma máquina de Turing.

Não importa o quanto esta tecnologia evolua e se sofistique, não importa que em algum futuro você tenha máquinas com trilhões de terabytes que operem milhões de vezes mais rápidas que as mais rápidas máquinas atuais; ainda continuaria sendo uma máquina de Turing.

E uma máquina de Turing continuará, eternamente, sendo um modelo para o qual se demonstra a impossibilidade de simular a completa potencialidade do cérebro humano. Porque teoremas uma vez provados são eternos.

Logo, se partirmos também do pressuposto ( e atualmente não pode ser mais que um pressuposto ) de que a consciência é unicamente o produto da atividade de um sistema nervoso não há nenhuma garantia de que máquinas de Turing possam ser conscientes.

Quanto a diferença entre o programa em si e o processo de executar o programa ela existe, obviamente. Mas é preciso tentar entender com mais clareza o que seria o programa e o que seria atividade de executar o programa, e como esta entidade abstrata ( o programa ), e atividade concreta da execução do programa ocorrendo no mundo físico podem ou não se relacionar com o que chamamos de consciência.

Um programa pode ser entendido como uma sintaxe ou uma semântica. Se você enxerga o programa como uma sintaxe este então é uma sequência finita de instruções de máquina, que por sua vez também pertencem a um conjunto finito ( de instruções ). Esta sequência de instruções ( juntamente com os dados ) pode estar escrita em papel, gravada em pedra ou codificada de forma binária nos micro-capacitores da memória de um computador. Não importa, a realidade física de uma codificação de um programa é apenas um objeto inanimado, em todas as formas físicas que você seja capaz de codificar um programa.

Porém o programa visto como uma semântica é um substantivo abstrato. A semântica é a funcionalidade do programa, que tarefa realiza, para que serve, a sua função. A semântica não pode ser identificada com nada físico, não tem existência em si mesma, mas é a forma como a mente interpreta e atribui um significado àquela sequência de instruções. A semântica é a experiência necessariamente consciente da interpretação do programa.

Agora, se refletirmos com um pouco mais de cuidado sobre em que consistiria a execução de um programa, percebemos que a execução não tem nenhuma relação com o programa em si a não ser aquela atribuída pela semântica. Ou seja, o "link" entre o processo que executa o programa e a realização de uma determinada atividade com significado é feito pela mente consciente do observador que observa o programa em execução.

Tente atentar para um detalhe importante ao qual eu já havia aludido implicitamente: o MESMO programa pode ser executado por infinitos processos físicos diferentes. O mesmíssimo programa, exatamente da mesma forma, pode ser executado por um computador eletrônico, por um dispositivo mecânico como o que Babbage concebeu, por um computador hidráulico, ou até mesmo por um macaco treinado para reconhecer símbolos e realizar tarefas simples relativas a cada simbolo.

Agora tentamos responder á questão: " A consciência é resultante do programa, dos fenômenos  físicos que concorrem para a execução do programa, ou de uma combinação entre ambas as coisas? "

Intuitivamente muitos parecem achar que é resultante da interação entre programa e máquina. Que se aprendermos a escrever o programa certo este despertaria a consciência no hardware, ou alguma consciência surgiria de alguma forma, não necessariamente localizada em alguma coisa.

Mas se assim fosse poderíamos inferir que esta sofisticada implementação de inteligência
artificial seria capaz de produzir o fenômeno da experiência subjetiva em qualquer meio
que a estivesse executando: fosse um desktop da IBM, um dispositivo hidráulico ou por meio de um chimpanzé executando tarefas por reflexo condicionado.

Não parece nem de longe ser uma hipótese razoável a se considerar.

Especialmente quando se percebe que o sistema executor é absolutamente indiferente ao que está sendo executado. Da mesma forma que uma máquina de lavar é indiferente ao que você coloca dentro dela.

Se você carregar a memória do computador com uma sequência aleatória de instruções de máquina e apontar o registrador de instruções com o endereço da primeira instrução ele vai começar a executar este programa que não faz absolutamente nada; e um programa que não faz absolutamente nada obriga a máquina a realizar os mesmos processos físicos de um programa que performe alguma função específica, identificável. Porque a identificação da função do programa, ou seja, a identificação da sua semântica, só existe para o  usuário, não para a máquina.

Por outro lado o mesmíssimo programa sendo executado em outro hardware com tecnologia inteiramente diferente ( mas seguindo ainda o mesmo paradigma lógico ) estaria desencadeando fenômenos físicos absolutamente diversos.

Então temos a questão de se a consciência é real ou é uma ilusão. Se é um fenômeno concreto deve ter como causa algum fenômeno, ou conjunto de fenômenos, intrínsecos à natureza do universo. Assim como gravidade ou a força elétrica, embora não totalmente compreendidas, devem estar relacionadas com algo da própria estrutura do universo. De outra forma teríamos que atribuir uma condição sobrenatural a estes fenômenos.

Se assim for não há nenhuma razão para se conjecturar que a execução de um programa é capaz de originar o fenômeno da experiência subjetiva. Porque a execução de nenhum programa está necessariamente condicionada a nenhum fenômeno físico específico, sendo possível executar qualquer programa de uma máquina equivalente a de Turing, por meio de infinitos processos físicos diferentes. Como já mencionei.

Contudo se a consciência é uma ilusão me parece dificil explicar o que é que está experenciando esta ilusão sem incorrer em lógica circular. Porque a ilusão em si é uma forma de experiência subjetiva; não faz sentido dizer que um tijolo ou um toco de pau está tendo ilusões. Ilusão também é um substantivo abstrato e portanto suposta, ela própria, como experiência subjetiva.

Offline Pedro Reis

  • Nível 39
  • *
  • Mensagens: 4.085
Re:Inteligência artificial
« Resposta #23 Online: 28 de Fevereiro de 2016, 17:18:04 »
Eu não sei qual a noção exata de consciência. Seria ela associada com inteligência?


É muito difícil definir consciência. Assim como inteligência.

No entanto não é sempre necessário definir as coisas para ser ter uma ideia bastante clara do que elas são. Por exemplo, você não consegue definir exatamente o que é uma cadeira, qualquer tentativa de definição se mostra insuficiente. Mesmo assim não há nenhuma dificuldade em reconhecer quando um objeto é uma cadeira.

A percepção da consciência é direta e imediata. Nossa mente percebe a si mesma como consciente. Já inteligência é um conceito que pode ser definido de várias formas.


Já que o título do tópico é "Inteligência Artificial", qual a definição de inteligência? Entendo inteligência como a capacidade de se adaptar a novas situações, tal como ela foi definida pelo epistemólogo Jean Piaget.


Já eu prefiro a definir inteligência como a habilidade de enxergar e/ou estabelecer relações entre eventos e objetos do mundo.  Quanto maior esta habilidade maior a sua capacidade de se adequar a novas situações.


Uma máquina por mais sofisticada que ela parece ser (jogar partidas de xadrez, reconhecer vozes, padrões de rostos, formas ou de paisagens) sempre executa suas operações de forma bruta, analisando milhares de dados e combinações, das mais inúteis até as poucas que são realmente relevantes.

Enquanto um humano realiza essas atividades analisando apenas alguns dados e combinações - aqueles que ele sabe que são relevantes!

Uma máquina que executa cegamente e burramente milhares de dados e de instruções, sem saber com antecedência quais instruções devem ser descartadas,  pode ser considerada inteligente?

Para muitos, isso não tem nada a ver com Inteligência Artificial.


Eu acho que isso só depende de como você define o que é inteligência. Se inteligência artificial é a realização por meio de artifícios de tarefas para as quais nós necessitamos de inteligência, então o termo é adequado.

Mas se você interpreta como uma reprodução artificial da inteligência humana, não. Como você observou nós não realizamos funções inteligentes da mesma forma que as máquinas ditas inteligentes.


Uma máquina não pode entender uma linguagem (como disse Searle) e não pode mentalizar uma pessoa ou um objeto.  Para ela, tudo são apenas dados nas mais diversa formas (bancos de dados, registros, listas, matrizes, etc..). Ela pode por conta própria se adaptar a uma nova situação se ela não entende o domínio à sua volta ?


Agora estão falando da computação quântica. Não sei se aquilo representa um novo paradigma na computação que pode nós aproximar da consciência artificial.

Estou absolutamente certo de que se a consciência artificial for possível terá que surgir de um novo paradigma de computação.

Offline Sdelareza

  • Nível 15
  • *
  • Mensagens: 392
Re:Inteligência artificial
« Resposta #24 Online: 28 de Fevereiro de 2016, 17:41:22 »
Será que houve uma vez algum robô que se rebelou ou executou algo no qual não estava programado?

Isso seria a prova que se trata de um robô consciente.

http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2015/07/1650682-trabalhador-e-morto-por-robo-em-fabrica-da-volkswagen-na-alemanha.shtml

 

Do NOT follow this link or you will be banned from the site!