Autor Tópico: Inteligência artificial  (Lida 15213 vezes)

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Offline Sdelareza

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Re:Inteligência artificial
« Resposta #50 Online: 06 de Março de 2016, 09:50:44 »
No seu artigo sobre o problema da parada, Turing usou como base uma máquina de Turing universal, que consegue
simular uma outra máquina de Turing.

Turing provou que não existe um procedimento geral para uma máquina de Turing universal resolver o problema da parada
 para todas as entradas possíveis numa máquina de Turing qualquer.

Acho que isso é irrelevante. O cérebro é uma máquina. Se por alguma definição técnica estrita, não é um "computador biológico", ainda assim um computador "de silício" com uma arquitetura/"fluxograma" tão próxima quanto for possível*, talvez até "neurônios de silício", ainda seria chamado disso, de computador, ainda que fosse talvez um erro como chamar jacaré de crocodilo. Mas talvez "processador" seja genérico o bastante para fugir dessa tecnicalidade.

Um cérebro constituído de carbono e água é algo completamente diferente que um processador de sílício, então eles
possuem efeitos diferentes.

Um medicamento com certo princípio ativo pode ser eficaz para combater determinada doença. Mas quem garante
que qualquer outro princípio ativo permite combatê-la também de maneira tão eficaz?


Offline Buckaroo Banzai

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Re:Inteligência artificial
« Resposta #51 Online: 06 de Março de 2016, 10:42:30 »
Sim, eu me referia a um processador de silício que fosse "tão idêntico quanto for possível" a um bioquímico/neuronal, ou no que for relevante ao que toca o processamento que ele faz.

Seria como desenvolver diferentes princípios ativos e veículos, mas buscando mesmo funcionamento fisiológico exato, para continuar nessa analogia com medicamentos.


Um questionamento curioso que vi certa fez inclusive começava cogitando a possibilidade de se inventar um neurônio aritificial, que pudesse ser colocado entre outros neurônios, e interagisse com eles de forma que é para os outros neurôinos, indistinguível do que seria um neurônio biológico. Colocados lado a lado, o biológico e o artificial teriam a mesma entrada, e a mesma saída. Parece perfeitamente lógico que então uma pessoa que fosse tendo neurônios biológicos sendo substituídos por artificiais na medida em que estes morressem, continuaria funcionando praticametne exatamente como era com os neurônios biológicos (com exceção de eventuais diferenças que apresentassem em mau funcionamento). E continuaria sendo o caso até mesmo após a substituição completa, até não ter mais nenhum neurônio biológico em todo cérebro ou mesmo no corpo.

Essa é a conclusão mais parcimoniosa que se pode ter, por enquanto. Questioná-la requer supor haver "algo mais", desconhecido e fundamental, no que ocorre dentro de cada neurônio (ou "não localmente" entre todos), e de alguma forma independente e mais relevante de suas entradas e saídas, e restrito à física molecular dos neurônios, apenas. O que é um tanto difícil de se sustentar. É meio como tentar sustentar que o giro de um motor a explosão não se deve a esses princípios e não daria certo se não fosse feito dos mesmos metais e não usasse o mesmo combustível.

E você pode de qualquer forma sempre contornar esses questionamentos com reproduções do que quer que seja que esteja havendo que não seja capturado nesse nível supostamente superficial de entradas e saídas. Talvez de fato acabe esbarrando eventualmente num tremendo obstáculo físico, como haver algo fundamental nas propriedades diamagnéticas da água e interações com moléculas biológicas, e que não se conseguisse reproduzir o mesmo resultado físico que há a partir disso de nenhuma outra forma. Mas é um grande "talvez".


O curioso é que acaba sendo também uma contra-argumentação ao argumento da "sala chinesa" de Searle, que numa "expansão ao absurdo", ainda poderia ter os mesmos princípios, com pessoas-neurônios, em vez de neurônios artificiais nanotecnológicos.

Offline Pedro Reis

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Re:Inteligência artificial
« Resposta #52 Online: 06 de Março de 2016, 11:20:36 »

Acho que isso é irrelevante. O cérebro é uma máquina.

É relevante. Se não fosse relevante pessoas não estariam empenhadas em construir uma teoria da computabilidade.

Trata-se de responder o que essa tecnologia pode ou não fazer.

Assim como a Teoria da Complexidade é relevante: entre outras coisas o cara não fica quebrando a cabeça para encontrar uma solução ótima para o problema do caixeiro-viajante porque já sabe que não existe.

É uma pergunta de 100 milhões de dólares. Se eu tivesse a resposta estava me candidatando
ao Nobel.

O cérebro faz as coisas mais fantásticas. Se pudermos obter dessa tecnologia que os engenheiros eletrônicos sabem desenvolver, um cérebro trabalhando para nós, isto seria uma das maiores conquistas até agora da humanidade.

Um cérebro criando novos ramos da Matemática, propondo e demonstrando teoremas, redigindo
leis, estabelecendo novas teorias na Fisica, fazendo projetos de Arquitetura e Urbanismo, escrevendo romances, compondo sinfonias...

Claro que a Teoria da Computabilidade não tem como objetivo responder a esta pergunta. Mas
faz parte.

Por outro lado, como no caso do caixeiro-viajante, é relevante saber o que não se pode fazer
porque você não perde tempo tentando. Se provamos que algo não é possível por um caminho
então não se investe nesse caminho e se procura por outro.

Por exemplo: se embarcarmos em um robô o poder de processamento atual ainda assim, por enquanto, este robô não faz o que uma formiga faz. A capacidade que a formiga tem de se movimentar em todo tipo de terreno, até mesmo terrenos novos e não conhecidos, de trabalhar cooperativamente com outras formigas criando estruturas complexas como formigueiros e realizando tarefas, de se comunicar com outras formigas, de zelar pela sua sobrevivência e pela da sua sociedade, de se orientar no espaço, ir e voltar de lugares desconhecidos, de procurar e reconhecer alimento, de reconhecer diferentes condições climáticas, de procurar e reconhecer material necessário ao formigueiro e saber transportar estas coisas, de saber sua função na sociedade e provavelmente saber identificar as funções diferentes de outras formigas, de saber
como se reproduzir, até de diferenciar se algo é mineral, vegetal ou animal, porque uma formiga não pica uma planta ou uma pedra, apenas outros animais. E muito mais.

E a formiga faz tudo isso com um hardware mínimo. Um sistema nervoso muito simples.

A tecnologia que existe agora supera a complexidade do sistema nervoso da formiga, por isso é uma pergunta de 100 milhões de dólares. Por que os robôs não são tão sofisticados quanto formigas? Não estamos sabendo como usar o potencial da tecnologia ou existe alguma diferença inerente entre o processamento do robô e o sistema nervoso da formiga?

Que o cérebro é uma máquina, provavelmente sim. Mas para quem está pesquisando IA interessa muito saber se existe alguma fronteira intransponível entre máquinas-cérebro e máquinas-computadoras.

------------------------------------------------------

A ideia de neurônios artificiais é interessante do ponto de vista de teoria. Mas tem uma coisa: o neurônio artificial não poderia ser como um prótese, como um braço ou uma perna artificial. Que são artefatos muito diferentes da parte biológica que substituem.

Porque ele precisaria fazer o que outros neurônios fazem. Ele precisaria se reproduzir, porque ao contrário do que se pensava o cérebro continua produzindo neurônios na idade adulta. Então ele teria que ter algo como um DNA compatível. E a interação entre neurônios envolve processos químicos, então o artificial teria que ter esta interface também... de modo que o neurônio artificial no final se pareceria tanto com o biológico que talvez fosse indistinguível.

Indo alem da IA e considerando o problema da máquina consciente, para mim, pessoalmente, me parecem absurdas tanto a hipótese do "funcionalismo", que a reprodução de determinadas operações logicas por si só gerariam consciência, quanto a ideia de que a consciência é produto de reações eletro-químicas.

Acho mais razoável esperar que a resposta esteja em algum aspecto da natureza que ainda não conhecemos. Assim como a relatividade do tempo e de espaço era inimaginável para alguém no século 17.

Por outro lado, o que garante que nossa capacidade intelectual é o que basta para conhecer e compreender todos os aspectos da realidade? O que garante que não existam perguntas fundamentais, as quais não somos sequer capazes de formular, e muito menos de respondê-las?

Se consideramos a mente de um macaco suas limitações estão evidentes para nós. Mesmo coisas triviais como dividir um número pelo outro estão além do horizonte de compreensão possível a um macaco. Mas é claro que o macaco não pode enxergar seus próprios limites, é preciso estar fora do limite para vê-lo.

É mais razoável supor que nós também temos limitações intelectuais. E talvez até "intelectos" não sejam a ferramenta capaz de apreender a realidade em toda a sua extensão.

Mas se limites como o do macaco também existem para nós, então nós jamais os conheceremos.

Porque isso implicaria em transcender a nós mesmos.

Offline Buckaroo Banzai

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Re:Inteligência artificial
« Resposta #53 Online: 06 de Março de 2016, 14:26:53 »

Acho que isso é irrelevante. O cérebro é uma máquina.

É relevante. Se não fosse relevante pessoas não estariam empenhadas em construir uma teoria da computabilidade.

Trata-se de responder o que essa tecnologia pode ou não fazer.

Quero dizer no sentido crocodilo x jacaré de relevância. É como se perguntar se no Brasil a pessoa deve se preocupar em ser morta por um crocodilo num rio. "A resposta é não, porque não tem crocodilos no Brasil fora de zoológicos", seria o equivalente a dizer que "computadores" num sentido técnico estrito, tal como "calculadoras", seriam supostamente limitados de forma que os impossibilitaria de fazerem aquilo que um cérebro faz.

De modo geral as pessoas não tem em mente um literalismo técnico, e são algo mais mais verdadeiras as resposta que "crocodilos" (na verdade jacarés) podem ser perigosos no Brasil, bem como que o cérebro é um computador e em tese um computador poderia ser construído ou programado para funcionar como um cérebro, embora se esteja distante de fazer isso. Além de não ter pedantismo/preciosismo semântico-técnico, ainda tem a vantagem de fugir de passar uma noção misticista quanto a cérebro/mente.



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Por exemplo: se embarcarmos em um robô o poder de processamento atual ainda assim, por enquanto, este robô não faz o que uma formiga faz. A capacidade que a formiga tem de se movimentar em todo tipo de terreno, até mesmo terrenos novos e não conhecidos, de trabalhar cooperativamente com outras formigas criando estruturas complexas como formigueiros e realizando tarefas, de se comunicar com outras formigas, de zelar pela sua sobrevivência e pela da sua sociedade, de se orientar no espaço, ir e voltar de lugares desconhecidos, de procurar e reconhecer alimento, de reconhecer diferentes condições climáticas, de procurar e reconhecer material necessário ao formigueiro e saber transportar estas coisas, de saber sua função na sociedade e provavelmente saber identificar as funções diferentes de outras formigas, de saber
como se reproduzir, até de diferenciar se algo é mineral, vegetal ou animal, porque uma formiga não pica uma planta ou uma pedra, apenas outros animais. E muito mais.

E a formiga faz tudo isso com um hardware mínimo. Um sistema nervoso muito simples.

Não é "muito simples". Mais simples é o sistema nervoso de alguns vermes. Já estão em andamento projetos de fazer o "upload" mental de vermes em pequenos robôs. Outra considerável barreira não é tanto o cérebro em si, mas o restante do hardware, do sistema sensorial e o controle do corpo.

http://edition.cnn.com/2015/01/21/tech/mci-lego-worm/

<a href="https://www.youtube.com/v/YWQnzylhgHc" target="_blank" class="new_win">https://www.youtube.com/v/YWQnzylhgHc</a>


Fico curioso se algo assim não poderia ser "evoluído" para hardware que se usa nessas sondas planetárias, através de "algoritmos genéticos" e etc e tal. Fazendo o cérebro/programa do "verme virtual" se adaptar a um novo corpo e ter novos instintos, moldados pelo design ou "escultura" humana deles.


(Também já se tem algo como um computador/robô que inferiu F=ma a partir de dados "observacionais" do movimento de um pêndulo, apesar de não ser nada "humanóide" em sua inteligência, não que me lembre)


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A tecnologia que existe agora supera a complexidade do sistema nervoso da formiga, por isso é uma pergunta de 100 milhões de dólares. Por que os robôs não são tão sofisticados quanto formigas? Não estamos sabendo como usar o potencial da tecnologia ou existe alguma diferença inerente entre o processamento do robô e o sistema nervoso da formiga?

Que o cérebro é uma máquina, provavelmente sim. Mas para quem está pesquisando IA interessa muito saber se existe alguma fronteira intransponível entre máquinas-cérebro e máquinas-computadoras.

Eu fico surpreso em se cogitar essa hipótese nesse ramo, mas não entendo exatamente nada dessa definição estrita de "computador" que talvez fizesse deles inerentemente insuficientes para funcionar como cérebros.



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A ideia de neurônios artificiais é interessante do ponto de vista de teoria. Mas tem uma coisa: o neurônio artificial não poderia ser como um prótese, como um braço ou uma perna artificial. Que são artefatos muito diferentes da parte biológica que substituem.

Porque ele precisaria fazer o que outros neurônios fazem. Ele precisaria se reproduzir, porque ao contrário do que se pensava o cérebro continua produzindo neurônios na idade adulta.

Mais ou menos. Isso não ocorre o tempo todo, e, se não me engano, não é bem "reprodução", mas um "comando" para diferenciação de células "semi pluripotentes" meio dormentes, que imagino talvez serem limitadas, como óvulos, ou como com o paradigma anterior de cérebros mesmo. Mas tavez essas por sua vez ainda se reproduzam, não sei.

O cérebro de qualquer forma não tem nessa reprodução celular algo fundamental para o seu funcionamento "rotineiro", então isso não é tão relevante. Dependendo do nível de tecnologia imaginária que se permite considerar, pode ser contornado. Mas mesmo sem isso a pessoa ainda teoricamente deveria funcionar indistinguivelmente, no mínimo indistinguivelmente de alguém com algum declínio cognitivo, como aquele que ocorre conforme a idade avança e as pessoa vão perdendo neurônios num ritmo maior do que o de qualquer reposição.


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Então ele teria que ter algo como um DNA compatível. E a interação entre neurônios envolve processos químicos, então o artificial teria que ter esta interface também... de modo que o neurônio artificial no final se pareceria tanto com o biológico que talvez fosse indistinguível.

Não precisaria do DNA em si, só da interface química.



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Indo alem da IA e considerando o problema da máquina consciente, para mim, pessoalmente, me parecem absurdas tanto a hipótese do "funcionalismo", que a reprodução de determinadas operações logicas por si só gerariam consciência, quanto a ideia de que a consciência é produto de reações eletro-químicas.

Acho mais razoável esperar que a resposta esteja em algum aspecto da natureza que ainda não conhecemos. Assim como a relatividade do tempo e de espaço era inimaginável para alguém no século 17.

(Já está falando talvez mais do "problema difícil" da consciência do que de limitações de máquinas ou modos de processamento quanto aos problemas "menores".) Acho que as duas últimas coisas não são mutuamente excludentes, "consciência como produto de reações eletro-químicas" e "algum aspecto da natureza que ainda não conhecemos". Ainda que o desconhecido talvez não seja especificamente "eletro-químico".


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Se consideramos a mente de um macaco suas limitações estão evidentes para nós. Mesmo coisas triviais como dividir um número pelo outro estão além do horizonte de compreensão possível a um macaco. Mas é claro que o macaco não pode enxergar seus próprios limites, é preciso estar fora do limite para vê-lo.

É mais razoável supor que nós também temos limitações intelectuais. E talvez até "intelectos" não sejam a ferramenta capaz de apreender a realidade em toda a sua extensão.

Certamente temos limitações cognitivas/intelectuais. No meu caso, começando já por tabuada mesmo.



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Mas se limites como o do macaco também existem para nós, então nós jamais os conheceremos.

Porque isso implicaria em transcender a nós mesmos.

Trans-humanismo.

Offline Sdelareza

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Re:Inteligência artificial
« Resposta #54 Online: 06 de Março de 2016, 17:03:14 »
Até agora o que é exatamente a consciência permanece uma incógnita, nem foi definida (penso eu) pela ciência.

Nem sabemos se o cérebro produz a consciência (monismo) ou age como um receptor (dualismo).

Onde o método científico tem seus limites, podemos fazer uso da filosofia e é por isso que existe
a filosofia da mente.

Podemos "pensar ou achar que a máquina pode simular uma mente humana", mas sem algum modelo matemático ou lei da física para apoiar esse modelo, acho que a argumentação não tem valor.
« Última modificação: 06 de Março de 2016, 17:12:03 por Sdelareza »

Offline Sdelareza

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Re:Inteligência artificial
« Resposta #55 Online: 06 de Março de 2016, 17:09:40 »
Podemos fazer outros argumentos contra a possibilidade que máquinas reproduzem orgãos humanos.

Já conseguimos trocar orgãos essenciais do corpo humano (que realizam atividades essenciais ao organismo) por orgãos artificiais?
Trocar o estômago por um estômago artificial, ou um intestino por um intestino artificial?

Já tentaram fazer transplantes (foi na década de 80) com coração artificial, porém o experimento não foi bem sucedido
 e depois cancelado.

Máquinas artificiais e máquinas biológicas são constituídas de material diferente, então há incompatibilidade.
« Última modificação: 06 de Março de 2016, 17:28:00 por Sdelareza »

Offline Buckaroo Banzai

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Re:Inteligência artificial
« Resposta #56 Online: 06 de Março de 2016, 18:03:36 »
Até agora o que é exatamente a consciência permanece uma incógnita, nem foi definida (penso eu) pela ciência.

Nem sabemos se o cérebro produz a consciência (monismo) ou age como um receptor (dualismo).

Há diversos sentidos diferentes de consciência. Esse não é o único sentido possível de "dualismo", sendo que de modo geral esse de "receptor" é completamente desprezado pela ciência. O estudo de diferentes cérebros, de diferentes áreas cerebrais especializadas, é bem mais sugestivo de processamento localizado do que uma "recepção" de sinais fragmentados, desconhecidos, indetectáveis de qualquer outra forma.


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Podemos "pensar ou achar que a máquina pode simular uma mente humana", mas sem algum modelo matemático ou lei da física para apoiar esse modelo, acho que a argumentação não tem valor.

Acho que o descarte dessa hipótese por mero apelo a incredulidade que não tem lá muito valor. Não existe a princípio nenhum impedimento, então é algo como, antes de se ter modelos climáticos, dizer que é "sem valor" argumentar sobre ser possível modelar o clima.


Podemos fazer outros argumentos contra a possibilidade que máquinas reproduzem orgãos humanos.

Já conseguimos trocar orgãos essenciais do corpo humano (que realizam atividades essenciais ao organismo) por orgãos artificiais?
Trocar o estômago por um estômago artificial, ou um intestino por um intestino artificial?

Já tentaram fazer transplantes (foi na década de 80) com coração artificial, porém o experimento não foi bem sucedido
 e depois cancelado.

Máquinas artificiais e máquinas biológicas são constituídas de material diferente, então há incompatibilidade.

Bem, há robôs similares a esse que postei, controlados por neurônios biológicos, neurônios de ratos. Também se usa neurônios de ratos para controlar simuladores de vôo. Não cérebros inteiros, mas culturas de neurônios, que acabam se conectando de forma a funcionar meio como cérebros mais simples do que os de ratos, mas que ainda assim aprendem a controlar esse corpo/simulação, de forma que nem bem entendo.

<a href="https://www.youtube.com/v/wACltn9QpCc" target="_blank" class="new_win">https://www.youtube.com/v/wACltn9QpCc</a>
<a href="https://www.youtube.com/v/1w41gH6x_30" target="_blank" class="new_win">https://www.youtube.com/v/1w41gH6x_30</a>
<a href="https://www.youtube.com/v/1-0eZytv6Qk" target="_blank" class="new_win">https://www.youtube.com/v/1-0eZytv6Qk</a>
<a href="https://www.youtube.com/v/1QPiF4-iu6g" target="_blank" class="new_win">https://www.youtube.com/v/1QPiF4-iu6g</a>



Esse impedimento prático não é tão significativo para esse ponto que eu estava fazendo, a suposição de maior relevância da entrada e saída dos neurônios, do que do que quer que eles façam internamente para resultar nessa entrada e saída. E por extensão, a possibilidade de um cérebro artificial de neurônios artificiais. Independentemente de se conseguir uma interface que permitisse seu uso prostético.

E, de qualquer forma, se tem próteses hoje desde as mais mecânicas, como de substituição de quadril, e se tem coisas como marca-passos já faz um bom tempo, e mais recentemente, estão sendo testados até olhos artificiais. Há dificuldades, mas não impedimento absolutos, em "ciborgues".

<a href="https://www.youtube.com/v/Bh3MaoPVdNM" target="_blank" class="new_win">https://www.youtube.com/v/Bh3MaoPVdNM</a>




Também não se abandonou o desenvolvimento de corações artificiais:

https://en.wikipedia.org/wiki/Artificial_heart

Offline Sdelareza

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Re:Inteligência artificial
« Resposta #57 Online: 08 de Março de 2016, 00:11:32 »
Acho que o descarte dessa hipótese por mero apelo a incredulidade que não tem lá muito valor. Não existe a princípio nenhum impedimento, então é algo como, antes de se ter modelos climáticos, dizer que é "sem valor" argumentar sobre ser possível modelar o clima.

Sua argumentação que uma máquina pode reproduzir uma inteligência humana se baseia apenas sobre vídeos do youtube, achismos
e não sobre algum modelo matemático ou físico.

Se você diz que não existe a princípio nenhum impedimento, é que se trata de algo não falseável.

O que para muitos é algo não-científico. Teria algum jeito de tornar suas argumentações falseáveis?
« Última modificação: 08 de Março de 2016, 09:06:46 por Sdelareza »

Offline Pedro Reis

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Re:Inteligência artificial
« Resposta #58 Online: 08 de Março de 2016, 07:22:39 »

Quero dizer no sentido crocodilo x jacaré de relevância.[....]

De modo geral as pessoas não tem em mente um literalismo técnico, e são algo mais mais verdadeiras as resposta que "crocodilos" (na verdade jacarés) podem ser perigosos no Brasil, bem como que o cérebro é um computador e em tese um computador poderia ser construído ou programado para funcionar como um cérebro, embora se esteja distante de fazer isso. Além de não ter pedantismo/preciosismo semântico-técnico, ainda tem a vantagem de fugir de passar uma noção misticista quanto a cérebro/mente.


É "pedantismo técnico" só porque você quer que seja. Porque isto já foi suficientemente explicado.

De todo modo faço um último esforço.

Primeiramente não existe uma "definição estrita" de computador. E esse é o problema.

Ciência da computação, por ser abstrata, precisa que as coisas sejam rigorosamente definidas. Sem ambiguidade. Um exemplo: a Lógica Formal é uma ciência que estuda os argumentos pelas suas estruturas, ou seja, suas formas. Daí o "formal".

Por ser formal, sem uma definição de argumento, não há o que se fazer.

"Um argumento é uma lista de sentenças afirmativas que só podem ser verdadeiras ou falsas das quais uma é conclusão e as outras são as premissas bla, bla, bla..."

Definir computador é mais ou menos como tentar definir o que é cadeira. Se eu disser que cadeira é um objeto que serve para sentar não define porque um sofá também é. Uma poltrona também é. Uma sela de cavalo também.

Não funcionou porque essa definição é muito geral. Acaba abrangendo outras coisas que não são cadeiras.

Mas se eu disser que cadeira é um objeto que serve para sentar e tem quatro pernas, assento e encosto, também não define porque existe cadeira com três pernas, apoiada em coisas que não são pernas, etc.

Essa não funcionou porque é muito particular. Não abrange todas as cadeiras.

Definir é indicar uma condição SUFICIENTE e NECESSÁRIA para a pertinência a um conjunto.

Você vai ter dificuldade semelhante se tentar definir computador com base em tecnologias reais. Ou fica  muito vago ou abrangente demais para os propósitos de uma ciência abstrata.

Isso pode ser contornado através de um modelo minimalista de máquina capaz de realizar as funcionalidades fundamentais do que se espera que venha a ser um computador. Se não estou enganado modelos já haviam sido propostos antes de construírem as primeiras máquinas. A tese de Church-Turing conjectura sobre as características que devem apresentar dispositivos mecânicos que executem algoritmos.

A tese: "Toda função computável é computável em uma máquina de Turing."

E algoritmo é entendido como:

- Conjunto finito de instruções precisas e simples, que são descritas com um número finito de símbolos.
- Sempre chega ao resultado em um número finito de passos.
- Pode, a princípio, ser executado por um ser humano com apenas papel e lápis.
- Não exige inteligência para ser executado.

Por meio de um modelo como esse ( um modelo conceitual ) podemos desenvolver uma teoria da computação. Então você não precisa de uma definição que lide com as particularidades físicas e de engenharia de uma determinada tecnologia de computação. Se você demonstrar que as funções de um dispositivo computacional qualquer podem ser, todas elas, implementadas em uma máquina de Turing, ou coisa equivalente, como uma combinação das funções simples dessa máquina, então você garante que toda a teoria existente se aplica também a este outro dispositivo.

Do mesmo modo, se algum dispositivo não puder ser simulado em uma máquina de Turing, então a teoria é inaplicável.

E o que isso tem a ver? Ter pelo menos uma ideia sobre isso é o que explica aquela analogia que eu fiz com a máquina de lavar, sobre a expectativa de que rodar um determinado programa possa tornar um computador consciente não seja muito diferente do que esperar que se realizarmos determinadas operações de lavagem a lava-roupas também poderia se tornar um dispositivo consciente.

Porque se você olhar lá dentro desse troço vai ver algo como a linha de montagem de uma fábrica, só que em vez de produtos ela está fabricando, transportando e armazenando strings de bits. Estas strings não têm significado em si mesmas, o significado somos nós que atribuímos. Em um registrador de 4 bits 1111 poderia ser o número 15, mas pode ser conveniente também calcular como se fosse -1. Se você somar 1010 com esse 1111 a operação é a mesma, mas o resultado você interpreta o significado.

Então suponha que alguém finalmente escreveu o programa que simula a mente humana. Em tese, um engenheiro de produção de uma fábrica de Lego poderia ter projetado uma linha de montagem que produz somente peças amarelas e azuis. Inadvertidamente, sem que ele percebesse, a tal linha de produção poderia, por puro acaso, estar realizando as mesmas funções, passo a passo, do tal programa emulador de mente. De forma que quando o programa gera bit 1 a linha de produção faz um peça amarela, e quando o programa gera bit 0 a peça é azul.

Se aceitamos a tese funcionalista como plausível temos que aceitar que essa fábrica se tornaria consciente também. Para surpresa do próprio engenheiro e dos funcionários.

Várias perplexidades emergem desta conjectura: não estamos vendo, em lugar nenhum, processos que poderiam ser interpretados como algoritimicos ( e nossa vida é cercada deles ) desenvolverem mentes em seus substratos. Os únicos exemplos são os processos que ocorrem em sistemas nervosos de máquinas biológicas.

Se estes seres são máquinas computacionais, da forma como atualmente entendemos que seja uma, então as mesmas funcionalidades poderiam ser reproduzidas em infinitos substratos diferentes. Não só isso! Deveria haver muitos, talvez uma infinidade, de processos algorítimicos diferentes capazes de produzir os mesmos resultados.

Por exemplo: não há só uma forma de ordenar uma lista, há inúmeras.

Então, se o funcionalismo deve ser levado a sério, a natureza, por puro acaso, entre infinitas possibilidades, programou os algorítimos "certos" nos sistemas nervosos das máquinas biológicas. Tipo... já dá para imaginar, já não parece tão longe, o tal robô-formiga. Que vai fazer tudo que a formiga faz. Contudo não terá uma mente primitiva como talvez seja o caso da formiga.

Se levarmos em consideração que consciência não traz nenhuma vantagem do ponto de vista evolutivo, fica difícil explicar até mesmo sob a luz da Teoria da Evolução, o porquê do surgimento dessa especificidade, se na perspectiva funcionalista ela parece ser apenas uma possibilidade entre inúmeras.

No sentido de que uma máquina biológica autômata que fizesse tudo que uma máquina biológica consciente faz, porém sem consciência, não teria nenhuma desvantagem de sobrevivência e reprodutiva, em relação a seres conscientes.

Aí é que surge a relevância do que você chama de "modelo computacional estrito". Porque se você diz, como realmente disse, que:

Citar
[...] não tem nenhuma abordagem teórica do problema de inteligência ou até mesmo consciência que não possa ser em última  instância dita "computacionalista", ainda que possa requerer programas mais complexos, ou a interação entre diferentes programas rodando simultâneamente, versus um cenário mais extremamente simplificado.

é preciso saber com base em quê você diz isso. Porque para a abordagem "computacionalista", e isso estou especificamente tentando demonstrar, o que não é relevante é se o programa é simples ou complexo, se executado com múltiplos processadores ou apenas um, etc... Estas características e outras não ampliam os limites da computabilidade de uma máquina de Turing.

A relevância reside no fato de que tudo que o homem sabe construir até hoje e que pode ser chamado de computador pode ser reduzido a uma máquina de Turing. Inclusive os computadores quânticos.

Embora eu não esteja muito inteirado sobre computadores quânticos, sei que podem ser simulados por máquinas Turing. Embora estes computadores prometam resolver alguns daqueles problemas que mencionamos, considerados intratáveis no atual paradigma. Mas isto devido a rapidez de cálculo, que seria realizado de uma forma não semelhante a dos computadores atuais.

Não é portanto uma questão de jacaré ou crocodilo. Se tudo que conseguimos conceber como "computacionalista" até hoje, pode ser equiparado a um modelo do tipo de máquina Turing, e se, aparentemente ( talvez só aparentemente ) o cérebro faz algumas coisas que parecem não computáveis, isso significaria que a abordagem computacionalista não é capaz de resolver o problema.

Ainda dentro desse conceito de "computacionalista" não tenho grandes objeções a que o cérebro possa ser comparado a uma máquina ( e até que essa máquina tenha como resultado a mente ), mas... tenho muitas dúvidas legítimas de que:

Citação de: Buckaroo Banzai
o cérebro é um computador e em tese um computador poderia ser construído ou programado para funcionar como um cérebro,

Por todas estas considerações já feitas o cérebro pode até ser uma máquina, mas devemos considerar a hipótese de que não seja uma máquina programável.

Eu chutaria que não é. Por isso a importância de saber se é jacaré ou crocodilo.
« Última modificação: 08 de Março de 2016, 07:32:39 por Pedro Reis »

Offline Pedro Reis

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Re:Inteligência artificial
« Resposta #59 Online: 08 de Março de 2016, 07:28:36 »
Acho que o descarte dessa hipótese por mero apelo a incredulidade que não tem lá muito valor.

Continuo discordando da sua interpretação da falácia do apelo a incredulidade.

Apelo a incredulidade seria quando alguém rejeita uma proposição apenas porque não é capaz de entendê-la.

È quando você apresenta todos os argumentos consistentes e as evidências, e mesmo assim são rejeitados com a justificativa de que a pessoa não consegue entender. Ou ela nem se interessa em conhecer os argumentos e evidências e descarta a hipótese simplesmente porque parece contrariar o conhecimento intuitivo.

Não é o caso da hipótese "funcionalista". Que é uma coisa tirada do nada!

O ônus da prova é de quem sustenta a hipótese. É uma proposta contra-intuitiva, que por todos os aspectos parece absurda, e com base em absolutamente nada. Nenhuma evidência, não resulta da observação de nenhum fenômeno que a sugira ( pelo contrário ), uma coisa totalmente ad hoc, uma peça desenhada arbitrariamente só para resolver um quebra-cabeça que ninguém está sabendo montar.

Considere a Teoria de Darwin: também é contra-intuitiva, e se analisada superficialmente a T.E. parece absurda. O que a faz tão fácil de ser atacada pelos fundamentalistas religiosos.

Se Darwin não tivesse passado anos fazendo observações, uma quantidade enorme de experimentos, verificando as consistências de suas hipóteses com tudo que se podia observar, até com a Geologia, apresentado inúmeras evidências independentes convergindo para as mesmas conclusões, ao mesmo tempo em que ninguém conseguia encontrar alguma contradição irreconciliável com a teoria, e em vez disso somente tivesse se limitado a afirmar que toda a diversidade da vida se desenvolveu de uma única forma ancestral como se esta revelação tivesse vindo subitamente em um sonho, ninguém poderia levar a sério esta hipótese e isto não poderia ser chamado de apelo a incredulidade.

Offline Johnny Cash

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Re:Inteligência artificial
« Resposta #60 Online: 08 de Março de 2016, 08:12:31 »
O que exatamente é a "criatividade humana"?

A impressão que tenho é que no lado que defende a impossibilidade de reprodução da "criatividade humana" por outros mecanismos, ainda há um resquício de influência religiosa e uma necessidade de se colocar no centro do universo, como algo muito especial, diferente e não-emulavel.

A maior parte das pessoas não consegue sequer apontar o Afeganistão no mapa-mundi, ninguém consegue desenhar nada que seja melhor do que uma criança desenharia, nem criar canções, nem jogar basquete maestralmente...
« Última modificação: 08 de Março de 2016, 08:15:30 por Johnny Cash »

Offline Buckaroo Banzai

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Re:Inteligência artificial
« Resposta #61 Online: 08 de Março de 2016, 08:24:32 »
Vi primeiro a última mensagem. Depois leio o resto da primeira e respondo mais calmamente. Por hora, só um comentário/pergunta justamente quanto à última colocação:


Por todas estas considerações já feitas o cérebro pode até ser uma máquina, mas devemos considerar a hipótese de que não seja uma máquina programável.

Eu chutaria que não é. Por isso a importância de saber se é jacaré ou crocodilo.

E então o que seria aprendizado, além de programação? "Aprendizado" que talvez inclua coisas que talvez intuitivamente sejam mais tidas como respostas "inerentes" do sistema nervoso e sensorial, como a visão, mas que sob análise mais cuidadosa, parecem envolver algo que talvez possa ser rotulado de "aprendizado". Não necessariamente o mesmo "tipo" de aprendizado que se pensa como em "aprender sobre geografia", mas mais como em desenvolver coordenação motora, aprender a andar. Falo de coisas como gatinhos recém-nascidos de olhos vendados ficarem permanentemente cegos depois de um tempo, e mesmo humanos que perderam a visão e a recuperaram mais tarde, terem um bocado de dificuldade em se adaptar, em efetivamente "usar" o que vêem,  compreender como aquilo que vêem representa objetos no ambiente em vez de serem meras formas sem significado. Acho que surdos que recuperam a audição também tem problemas parecidos, havendo inclusive quem defenda que talvez não se deva ter tais tentativas de recuperação, podendo ser mais prejudiciais do que benéficas.


(Em contrapartida o vídeo do robo-verme mencionava, "ele não foi programado para fazer isso, é o seu conectoma que dita esse comportamento"... então talvez haja também uma distinção técnica relevante entre "programação" e "formação de conexões que determinam o comportamento", embora novamente eu pensaria que isso é uma "forma" de programação...)





Acho que o descarte dessa hipótese por mero apelo a incredulidade que não tem lá muito valor.

Continuo discordando da sua interpretação da falácia do apelo a incredulidade.

Apelo a incredulidade seria quando alguém rejeita uma proposição apenas porque não é capaz de entendê-la. [...]

Não é o caso da hipótese "funcionalista". Que é uma coisa tirada do nada!

O ônus da prova é de quem sustenta a hipótese. É uma proposta contra-intuitiva, que por todos os aspectos parece absurda, e com base em absolutamente nada. Nenhuma evidência, não resulta da observação de nenhum fenômeno que a sugira ( pelo contrário ), uma coisa totalmente ad hoc, uma peça desenhada arbitrariamente só para resolver um quebra-cabeça que ninguém está sabendo montar.
 
[...]

Apelo a incredulidade é só "achar incrível" a idéia; "não consigo crer", não "não consigo entender". Se alguém ainda defende a coisa, naturalmente irá dizer que quem "acha incrível" apenas não entendeu, mas não é necessariamente o caso, pode ter entendido e ainda assim achar incrível.

"Funcionalismo" não é "tirado do nada", tem toda uma história de pensamento por trás que eu não vou saber detalhar. Resumidamente, o melhor ponto a favor deve ser o de ser talvez a "hipótese" mais fisicalista/naturalista para as coisas (e logo mais parcimoniosa). Provavelmente mesmo aquelas críticas de Searle acabam no fim das contas concordando com o funcionalismo, até sendo funcionalistas, apenas são a ressalva de que talvez não seja em última instância possível realizar todas as mesmas funções com qualquer material, meio como você não faz imãs de madeira, ou um super-computador enfileirando dominós.

Ou seja, ao mesmo tempo em que talvez fosse possível fazer um robô que agisse como esperado de sentir dor mas fosse ainda um "zumbi filosófico" quanto a isso, também poderia ser possível construir um que sentisse dor, desde que você pudesse reproduzir fisicamente o que quer que causasse a dor no cérebro, num nível mais minucioso, o que talvez fosse possível de ser conseguido mesmo sem usar as mesmas moléculas. Talvez um pouco como adoçantes ainda são sentidos como doces embora só sendo externamente parecidos em algo com o açúcar, mas levando algo assim para o cérebro e sistema nervoso, em vez do objeto estimulante.












O que exatamente é a "criatividade humana"?

A impressão que tenho é que no lado que defende a impossibilidade de reprodução da "criatividade humana" por outros mecanismos, ainda há um resquício de influência religiosa e uma necessidade de se colocar no centro do universo, como algo muito especial, diferente e não-emulavel.

Existem particularidades da criatividade humana, que decorrem da mecânica que a produz, assim como todo produto de alguma mecânica deverá ter características condizentes com sua origem. Por isso mesmo, nem sempre outras mecânicas, que criem o mesmo tipo de coisa, criarão coisas indistinguíveis. Para tanto você precisa ou dos mesmos mecanismos exatos, ou de algo mais focado nesse resultado, em imitar o produto de um dado mecanismo.

Eu tenho a impressão que talvez mais do que antropocentrismo, há uma rejeição já a "mecanismos" como a própria explicação da humanidade. Seríamos seres "transcendentais" à física, inerentemente inexplicáveis. Não sei se isso "deixar de ser" antropocentrista, apenas no sentido de que talvez possa ser extendido a outros animais em algum grau, bem como atribuído a seres imaginários mais "centrais" que nós, como anjos, deuses, extraterrestres.



Offline Pedro Reis

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Re:Inteligência artificial
« Resposta #62 Online: 08 de Março de 2016, 08:51:35 »
É engraçado porque eu tenho a tendência de achar que algumas pessoas podem estar fazendo exatamente isso, mas ao contrário.

Alguém que tenha uma predileção/propensão a uma visão materialista do mundo, talvez force a barra com problemas difíceis, quando estes parecem desafiar suas ferramentas materialistas.

O que eu estou tentando fazer é, não resolver o problema, porque seria muita pretensão, mas apenas pensar sobre ele sem estar contaminado por nenhuma predisposição desse tipo.

Quando alguém "resolve" o problema simplesmente dizendo "é só uma ilusão" me parece forçado. Posso estar enganado porque não conheço a fundo os argumentos, mas parece forçado. Mais ou menos como alguém com uma propensão a uma visão espiritualista do mundo resolve todos os problemas com o ad hoc "foi Deus". É na verdade uma forma de varrer para debaixo do tapete o problema e não pensar mais nele, porque se deveria dar o próximo passo e perguntar: " Então quem fez Deus?"

O funcionalismo também parece forçado.

O que eu estou tentando é pensar sobre a coisa sem nenhuma predisposição. O que já é um tanto difícil.

O objetivo é modesto: apenas pensar honestamente sobre o assunto. Porque não tenho a pretensão de entender e muito menos de resolver o problema.

Offline Buckaroo Banzai

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Re:Inteligência artificial
« Resposta #63 Online: 08 de Março de 2016, 09:07:07 »
Acho que o descarte dessa hipótese por mero apelo a incredulidade que não tem lá muito valor. Não existe a princípio nenhum impedimento, então é algo como, antes de se ter modelos climáticos, dizer que é "sem valor" argumentar sobre ser possível modelar o clima.

Sua argumentação que uma máquina pode reproduzir uma inteligência humana se baseia apenas sobre vídeos do youtube, achismos
e não sobre algum modelo matemático ou físico.

Não, os vídeos do youtube se baseiam em estudos e projetos de pesquisadores sobre inteligência artificial e áreas relacionadas.

Na parte menos empírica da coisa o mais fundamental é que, se o mundo é físico, a mente também deve ser, e portanto, reprodutível construindo-se mecanismos que façam o mesmo, que tenha os mesmos processos realizados pelo cérebro.

Essa perspectiva geral ainda não permite automaticamente criar um modelo ("matemático" ou de ouro tipo) para o funcionamento do cérebro, isso requer primeiramente um entendimento minucioso do funcionamento do cérebro, que é o que vai se alcançando, engatinhando, inclusive em experimentos como esses documentados nos vídeos.


Citar
Se você diz que existe a princípio nenhum impedimento, é que se trata de algo não falseável.

Não, apenas que "a princípio, não há um impedimento". Poderia ser que conforme se caminhe adiante se esbarre num impedimento, e isso então seria uma falsificação do fisicalismo.


Citar
O que para muitos é algo não-científico. Teria algum jeito de tornar suas argumentações falseáveis?

Bem, em essência, a argumentação é "fisicalismo", isso é, o mundo, e o que há nele, é "físico". Isso incluiria a mente, não seria uma exceção.

É uma perspectiva tão "essencial" que acho difícil conceber uma "falsificação", algo meio como se perguntar em "falsificação da idéia da Terra ser redonda". Acho que seria necessariamente a demonstração de haver de fato coisas bastante consensualmente "não-físicas", para começar, bem como indicação de que algumas dessas coisas poderiam ter papel mais fundamental na explicação da mente humana do que a atividade mecânica do cérebro, neurônios, etc e tal, essas coisas concretas e existentes que "parecem muito" ser a origem da mente, sem as quais precisaríamos inventar toda uma outra categoria de "existência". Adicionalmente seria muito conveniente poder se dar conta dessas coincidências com a fisiologia cerebral e etc, uma vez que estas seriam descartadas como origem.

Não é algo que pareça minimamente provável de vir a acontecer, nesse andar da carruagem. O mais próximo disso que se tem são idéias pré-científicas que ainda não foram universalmente abandonadas.

Offline Pedro Reis

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Re:Inteligência artificial
« Resposta #64 Online: 08 de Março de 2016, 09:14:41 »
Porque quando você fala em programação você pensa em um contexto muito amplo. E esse é o problema das palavras: folha pode ser algo que cresce em árvores ou as páginas de um livro.

Mesmo nome, coisas diferentes.

Eu tenho em mente algo mais específico. Como essa coisa que não tem uma CPU, que não tem um conjunto de instruções, que não funciona sequencialmente, pode ser programável com a conotação de programável daquela tese de Church-Turing?

O cérebro aprende padrões, é um fato. Mas isso pode ou não ser chamado de programação dependendo só de como você define programação.

Na verdade eu comecei a esboçar um experimento mental muito interessante que aparentemente ( se não houver falhas ) poderia demonstrar que um computador ( no sentido ordinário do termo ) não poderia ser consciente por implicar em uma condição paradoxal que poderia ser demonstrada.

Acho que, talvez, se invertido, esse experimento pudesse mostrar que o cérebro também não pode se programável. Mas aí já tem a dificuldade de, apesar de eu não saber muito sobre computadores, sei muito menos ainda sobre cérebros.

Mas é uma masturbação mental interessante que está me ocorrendo agora...

Offline Johnny Cash

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Re:Inteligência artificial
« Resposta #65 Online: 08 de Março de 2016, 09:19:28 »
O que exatamente é a "criatividade humana"?

A impressão que tenho é que no lado que defende a impossibilidade de reprodução da "criatividade humana" por outros mecanismos, ainda há um resquício de influência religiosa e uma necessidade de se colocar no centro do universo, como algo muito especial, diferente e não-emulavel.

Existem particularidades da criatividade humana, que decorrem da mecânica que a produz, assim como todo produto de alguma mecânica deverá ter características condizentes com sua origem. Por isso mesmo, nem sempre outras mecânicas, que criem o mesmo tipo de coisa, criarão coisas indistinguíveis. Para tanto você precisa ou dos mesmos mecanismos exatos, ou de algo mais focado nesse resultado, em imitar o produto de um dado mecanismo.

Eu tenho a impressão que talvez mais do que antropocentrismo, há uma rejeição já a "mecanismos" como a própria explicação da humanidade. Seríamos seres "transcendentais" à física, inerentemente inexplicáveis. Não sei se isso "deixar de ser" antropocentrista, apenas no sentido de que talvez possa ser extendido a outros animais em algum grau, bem como atribuído a seres imaginários mais "centrais" que nós, como anjos, deuses, extraterrestres.

Esse "indistinguível" vai chegando ao ponto das discussões vinil vs. cd, gibson vs. fender, chiclete com banana vs. asa de águia, brahma vs. skol(!), em que no final das contas o que resta são lados defendendo gostos pessoais meio injustificáveis e na prática indiferenciáveis embora, com o auxílio de máquinas e sensores "artificiais", nos seja possível perceber as diferenças.


Eu, enquanto engenheiro, me acostumei a pensar sempre no sentido de "é claro que é possível, custa X (no mínimo) e os riscos conhecidos até agora são A, B e C", daí a relação de custo benefício pode ser o que inviabilize a execução de qualquer coisa.

Num ponto muito básico, sabemos que computadores e corpos humanos (não considerando somente o sistema nervoso) são constituídos de diferentes arquiteturas e materiais e, frequentemente, são utilizados por humanos para os mesmos fins, ja que mecânicas distintas podem entregar resultados iguais ou similares em boa proporção e exemplos são vastos.

Me parece que é ontologicamente possível que computadores "emulem" a criatividade humana, quando não, também, demonstrem "criatividade computacional" e, a pergunta que parece falhar em aparecer nesses casos é: é vantajoso (economicamente?) a tal ponto criar a IA que leve a esforços determinantes nesse sentido? Quem se beneficiaria com isso e como?

Talvez, na prática, não haja tempo ou qualquer recurso o suficiente, para o qual hoje não se conheça alternativa, pra que se crie a IA. Bom, ou até mesmo que se falhe homéricamente nas tentativas feitas até agora por conta de outras limitações justas.


Portanto, repito, até mesmo para entender: O que exatamente é a "criatividade humana"?




(!) Embora esse tópico específico tenha ficado mais fácil, nunca vi qualquer bebedor de cerveja passar num teste cego de "primeiro copo" entre essas.
« Última modificação: 08 de Março de 2016, 09:22:27 por Johnny Cash »

Offline Pedro Reis

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Re:Inteligência artificial
« Resposta #66 Online: 08 de Março de 2016, 09:37:33 »
Se eu puder dar um pitaco nisso: pra mim criatividade humana não existe. Criatividade seria a mente ser capaz de imaginar uma cor inteiramente diferente daquelas que o cérebro consegue ver.

Uma cor tão diferente de todas as outras quanto o azul é do amarelo. Isto para mim seria criar.

Mas novamente tudo se reduz à questão de definir o que é criatividade para dizermos se existe ou não criatividade humana.

De fato esse tipo de discussão ( sobre a natureza das máquinas e das mentes ) já pode começar muito viciada pelas predisposições metafísicas dos interlocutores. O que, como em qualquer outro tipo de discussão, transforma tudo em uma grande perda de tempo.

Mas para mim, particularmente, ocorre que nem os argumentos daqueles se identificam com uma noção mais metafísica do ser humano ( ou da vida em geral ) e nem os argumentos daqueles que tendem a ser mais fisicistas/materialistas me parecem satisfatórios.

Nesse caso eu acho que a posição cientificamente mais honesta é suspender o julgamento é apenas dizer: "não sei". Enquanto não se souber realmente.

Agora, IA existe, e é fantástica. Por exemplo, já temos programas que reconhecem pessoas procuradas em imagens, o que há não tanto tempo seria ficção científica.  O benefício ( lucro ) destas aplicações valem, claro, todo o custo.

Mas se com IA você está querendo dizer um cérebro artificial eu diria que a resposta é SIM se o cérebro puder ser programável. E NÂO, que seria inútil, se isto não for possível.

Offline Buckaroo Banzai

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Re:Inteligência artificial
« Resposta #67 Online: 08 de Março de 2016, 16:49:55 »
Portanto, repito, até mesmo para entender: O que exatamente é a "criatividade humana"?

O que quer que as pessoas tenham criado...

Para uma "versão" mais estrita, sem poder usar ferramentas "geradoras" desse algo ou das partes, muito embora a criação da ferramenta geradora ainda seja criatividade humana. :biglol:

Offline Gigaview

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Re:Inteligência artificial
« Resposta #68 Online: 08 de Março de 2016, 20:12:34 »
O que exatamente é a "criatividade humana"?

A impressão que tenho é que no lado que defende a impossibilidade de reprodução da "criatividade humana" por outros mecanismos, ainda há um resquício de influência religiosa e uma necessidade de se colocar no centro do universo, como algo muito especial, diferente e não-emulavel.

A maior parte das pessoas não consegue sequer apontar o Afeganistão no mapa-mundi, ninguém consegue desenhar nada que seja melhor do que uma criança desenharia, nem criar canções, nem jogar basquete maestralmente...

Deve ter uma conexão com sobrevivência. Essas pessoas "que não" devem ser criativas em sobreviver na selva urbana de acordo com uma hierarquia de necessidades (Maslow?). Não cria canções mas enrrola o chefe com desculpas convincentes, não aponta o Afeganistão no mapa mas descobre um jeito de entrar sem pagar, etc e tal. A criatividade depende do foco, até mesmo para ser compreendida e avaliada.
Brandolini's Bullshit Asymmetry Principle: "The amount of effort necessary to refute bullshit is an order of magnitude bigger than to produce it".

Pavlov probably thought about feeding his dogs every time someone rang a bell.

Offline Johnny Cash

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Re:Inteligência artificial
« Resposta #69 Online: 09 de Março de 2016, 08:48:50 »
O que exatamente é a "criatividade humana"?

A impressão que tenho é que no lado que defende a impossibilidade de reprodução da "criatividade humana" por outros mecanismos, ainda há um resquício de influência religiosa e uma necessidade de se colocar no centro do universo, como algo muito especial, diferente e não-emulavel.

A maior parte das pessoas não consegue sequer apontar o Afeganistão no mapa-mundi, ninguém consegue desenhar nada que seja melhor do que uma criança desenharia, nem criar canções, nem jogar basquete maestralmente...

Deve ter uma conexão com sobrevivência. Essas pessoas "que não" devem ser criativas em sobreviver na selva urbana de acordo com uma hierarquia de necessidades (Maslow?). Não cria canções mas enrrola o chefe com desculpas convincentes, não aponta o Afeganistão no mapa mas descobre um jeito de entrar sem pagar, etc e tal. A criatividade depende do foco, até mesmo para ser compreendida e avaliada.

Pode ser que tenha essa conexão com a sobrevivência, e provavelmente tem, mas não somente.

Essas características de improvisação, relacionam-se se sempre á busca de alternativas para o alcance de um objetivo que o indivíduo identifica estar ameaçado, seja ele vital ou não. Outros animais demonstram essa capacidade e até sistemas não-humanos (programados e construídos por humanos, eu sei, e para atender humanos, eu sei).

Em várias das buscas por caminhos alternativos, sistemas não-humanos, que vou chamar de computadores novamente para evitar os outros animais, podem fazer a tarefa bem melhor do que humanos, como é o caso de ajuste de rotas marítimas e outros similares, em que o sistema consegue "acessar" e "processar" uma quantidade grande de variáveis determinantes com valor entregue por sensores distribuídos com grande distância. Muitas vezes a alternativa proposta pode ser até original, no sentido de nunca antes proposto, se o preciosismo nos deixar dizer que ela já não era obrigatoriamente uma das possíveis entre os "resultados" finitos do algoritmo.

Nem sempre essas improvisações humanas, também, serão "criativas", se é que já não vem meio programadas no sistema operacional ou mesmos nos módulos/patches de sobrevivência separados que podem ser natos ou adquiridos.

Essas improvisações devem seguir padrões de reações disparados a partir da percepção de alguns parâmetros específicos e, pelo que eu entendo, nada que não possa, variando em grau de dificuldade, ser ensinado a máquinas.

Softwares que, com método, improvisam música, parecem mostrar (ou sugerir) que a improvisação é mais metódica do que transcendental:

Citar
In this paper we discuss our approach to designing improvising music systems whose intelligence is centred around careful listening, particularly to qualities related to timbre and texture. Our interest lies in systems that can make contextual decisions based on the overall character of the sound field, as well as the specific shape and contour created by each player. We describe the history and paradigm of ‘expanded instrument’ systems, which has led to one instrumental system (GREIS) focused on manual sculpting of sound with machine assistance, and one improvising system (FILTER) which introduces the ability to listen, recognize and transform a performer’s sound in a contextually relevant fashion. We describe the different modules of these improvising performance systems, as well as specific musical performances as examples of their use. We also describe our free improvisation trio, in order to describe the musical context that situates and informs our research.

http://www.tandfonline.com/doi/full/10.1080/09298215.2013.860465



Btw.: Meus exemplos sobre as "incapacidades" do cidadão padrão foram apenas para tentar desenhar que "o homem" não é assim um ser tão espetacularmente criativo como parece querer se pintar.

Offline Buckaroo Banzai

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Re:Inteligência artificial
« Resposta #70 Online: 09 de Março de 2016, 09:13:22 »
Nada é "transcendental". É só diferente.

Exemplo com xadrez. Programas de xadrez tradicionais se baseiam em força-bruta, em calcular "todas" as possibilidades e ver qual é objetivamente a mais forte. Então se você reduz o nível de "dificuldade" do jogo, eles fazem movimentos que humanos nunca fariam. Ao mesmo tempo, ainda não tentam explorar falhas na forma humana de jogar (que é mais "heurística", baseada em memória, não em cálculo. Cálculo também, apenas não tanto). Diferentemente, uma pessoa pode, por ser uma pessoa, intuir que tipos de erros que outras pessoas fariam, e então fazer jogadas que são objetivamente mais fracas, mas que podem ser muito eficientes contra outras pessoas (especialmente jogadores mais fracos; quanto mais fortes são, mais vão se aproximando das jogadas que seriam feitas pelos melhores programas, embora não pelo mesmo mecanismo).

Não é que isso seja algo inalcançável por computadores, de qualquer forma. "No mínimo", na versão mais extrema, um "cérebro robô" que tivesse aprendido xadrez poderia fazer o mesmo. Mas também são possíveis "atalhos" que teriam esse mesmo traço de criatividade, se aproximando muito do que humanos poderiam fazer, sem copiar 100% o funcionamento da mente humana. Só não é como as coisas automaticamente acontecem com os programas já desenvolvidos.

Indo um pouco na outra direção, também poderiam se desenvolver jogos de xadrez que em níveis mais fáceis do jogo fizessem erros mais "humanos", em vez daqueles que os programas tendem a fazer, que tendem a parecer jogadas completamente sem sentido, em vez de jogadas apenas mais fracas, mas com um propósito não-insano que você possa intuir.


Conforme você passa para "criações" menos especializadas, como composição musical, escrever ficção, poemas, etc, mais difícil será reproduzir algo que pareça consistentemente "humano", muito embora isso não implique haver qualquer coisa mágica e inerentemente irreprodutível, seja com "atalhos"/imitação do produto, combinações delas, ou, para a aproximação mais extrema possível, imitação do mecanismo que produz. 

Nem que sejamos "espetacularmente criativos", só dotados de um hardware ainda único, que comumente terá em suas criações peculiaridades decorrentes de seus mecanismos únicos.

Offline Pedro Reis

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Re:Inteligência artificial
« Resposta #71 Online: 09 de Março de 2016, 14:05:16 »
Programas de xadrez não são do tipo força bruta.

Não dá.

Em média, para cada lance, um jogador tem umas 30 possibilidades de escolha para o movimento.

Considerando isso como uma média, o adversário, para cada uma destas escolhas, também poderia responder com cerca de 30 movimentos para cada movimento seu.

Assim, só para avaliar todas as possibilidades em dois lances do jogo seria preciso examinar,em média, 900 configurações do tabuleiro.

Para avaliar 4 lances a frente seriam 810.000 possibilidades.

Para 6 lances 729 milhões.

Para avaliar apenas 10 lances a frente o programa teria que examinar 590 trilhões e 490 bilhões de configurações do tabuleiro.

E isso seria a parte fácil. O difícil é avaliar uma configuração do tabuleiro.

Um programa desse tipo, para ser uma solução bem grosseira, tem pelo menos que implementar uma árvore de decisão e uma função de avaliação.

A árvore examina em cascata todos os movimentos até determinado nível e a função é usada para avaliar cada configuração do último nível alcançado nessa árvore.

Suponha que a função recebe como entrada uma estrutura de dados representando uma configuração do tabuleiro e retorna um número entre -10 e +10. Com +10 significando vantagem máxima para as brancas (branca deu xeque-mate) e -10 vantagem máxima das pretas. Ou seja, quanto maior o valor retornado significa que mais as brancas estão em vantagem com aquele tabuleiro, e quanto menor o valor, maior seria a vantagem das pretas. Se retornar 0 seria uma condição equilibrada no jogo.

Se o programa jogar com as brancas ele quer escolher o movimento que MAXIMIZA essa função, mas não basta testar todos os movimentos que ele pode fazer e escolher o que receber maior valor porque isso não funciona. O programa precisa olhar a frente.

Se o programa vai olhar apenas 2 lances a frente para decidir o movimento, então para cada movimento possível ele teria que avaliar com a função cada uma das respostas pretas. Digamos que ele vá testar o 1º movimento de uma lista de todos os movimentos possíveis naquele lance: então vamos chamar este de movimento B1. ( B de brancas ).

Para B1 seria preciso avaliar todas as respostas possíveis das pretas e selecionar aquela para qual a função retornar o MENOR valor ( Indicando a melhor resposta que as pretas poderiam dar para aquele movimento B1 ), e B1 receberia então este valor como avaliação.

A ideia é supor que o adversário é perfeito e sempre dá a melhor resposta, por isso B1 é avaliado pelo MENOR valor retornado entre todas as respostas possíveis, representando a configuração que o tabuleiro provavelmente irá tomar no 2º lance ( se o adversário com as pretas for excelente ), como consequência do movimento B1.

Repita isto para todos os Bn possíveis movimentos e selecione aquele que recebeu o MAIOR valor. É o movimento a ser feito, aquele que vai acarretar consequências menos piores.

Isto para apenas 2 lances. Para olhar mais um lance a frente, o terceiro, repita esse algoritmo para cada resposta das pretas testada no segundo lance, mas agora invertendo: no algoritmo anterior, onde era escolhido o menor valor agora é o maior, e onde era o maior agora é o menor.

E assim sucessivamente para enxergar mais lances a frente.

Como as possibilidades crescem exponencialmente não dá para descer muitos níveis nessa árvore, por isso a força bruta não resolve. Além disso há o problema realmente difícil de avaliar o quanto uma dada configuração do jogo está favorável ou desfavorável.

É nisso que nós, humanos, somos bons pra cacete e os programas são uma bosta. Enquanto os programas são bons pra cacete em percorrer esta árvore e nós somos uma bosta.

A maior parte da inteligência artificial dos programas de xadrez está na implementação desta função de avaliação. Mesmo não sendo tão boa quanto a nossa é compensada pela capacidade de descer muitos níveis na árvore de decisão, e o algoritmo anterior também é melhorado por intermédio de várias heurísticas.

Para um jogo de damas, por exemplo, se poderia usar como função de avaliação simplesmente  o número de peças brancas subtraído do número de peças pretas, já que o objetivo é comer todas as peças pretas. Esta seria uma estratégia pobre para um jogador humano, mas como o computador pode descer muitos níveis na árvore o programa já daria trabalho para o oponente humano com as pretas.

Já no xadrez não é possível achar um critério simples assim para uma função de avaliação minimamente eficiente.

Offline Buckaroo Banzai

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Re:Inteligência artificial
« Resposta #72 Online: 09 de Março de 2016, 14:43:52 »
Programas de xadrez não são do tipo força bruta.


Atualmente são praticamente TODOS considerados como sendo de força bruta, ainda que, talvez, novamente, não seja uma definição 100% literal disso.

Não é como se estivessem calculando cada possível ramificação de cada possível jogada até o final, que talvez fosse a força bruta literal. Em vez disso vão descontando as alternativas mais infrutíferas, que requeririam jogadas ruins do adversário para funcionar.


Citar
https://en.wikipedia.org/wiki/Computer_chess

One reason they gave for the switch was that they found it less stressful during competition, because it was difficult to anticipate which moves their type B programs would play, and why. They also reported that type A was much easier to debug in the four months they had available and turned out to be just as fast: in the time it used to take to decide which moves were worthy of being searched, it was possible just to search all of them

In fact, Chess 4.0 set the paradigm that was and still is followed essentially by all modern Chess programs today. Chess 4.0 type programs won out for the simple reason that their programs played better chess. Such programs did not try to mimic human thought processes, but relied on full width alpha-beta and negascout searches. Most such programs (including all modern programs today) also included a fairly limited selective part of the search based on quiescence searches, and usually extensions and pruning (particularly null move pruning from the 1990s onwards) which were triggered based on certain conditions in an attempt to weed out or reduce obviously bad moves (history moves) or to investigate interesting nodes (e.g. check extensions, passed pawns on seventh rank, etc.). Extension and pruning triggers have to be used very carefully however. Over extend and the program wastes too much time looking at uninteresting positions. If too much is pruned, there is a risk cutting out interesting nodes. Chess programs differ in terms of how and what types of pruning and extension rules are included as well as in the evaluation function. Some programs are believed to be more selective than others (for example Deep Blue was known to be less selective than most commercial programs because they could afford to do more complete full width searches), but all have a base full width search as a foundation and all have some selective components (Q-search, pruning/extensions).

Though such additions meant that the program did not truly examine every node within its search depth (so it would not be truly brute force in that sense), the rare mistakes due to these selective searches was found to be worth the extra time it saved because it could search deeper. In that way Chess programs can get the best of both worlds.

Furthermore, technological advances by orders of magnitude in processing power have made the brute force approach far more incisive than was the case in the early years. The result is that a very solid, tactical AI player aided by some limited positional knowledge built in by the evaluation function and pruning/extension rules began to match the best players in the world. It turned out to produce excellent results, at least in the field of chess, to let computers do what they do best (calculate) rather than coax them into imitating human thought processes and knowledge. In 1997 Deep Blue defeated World Champion Garry Kasparov, marking the first time a computer has defeated a reigning world chess champion in standard time control. [...]



Uma tentativa mais recente está fugindo mais significativamente de força-bruta:

http://www.popsci.com/artificial-intelligence-takes-chess-beyond-brute-force
 

Offline Pedro Reis

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Re:Inteligência artificial
« Resposta #73 Online: 09 de Março de 2016, 15:01:01 »
Isso é chamado de podar a árvore. É uma das heurísticas que mencionei para melhorar aquele esboço de algoritmo. Como a árvore de decisão cresce exponencialmente, se você poda nós você também está melhorando exponencialmente a busca. Por exemplo, em vez de avaliar só as jogadas no último nível, pode-se avaliar os lances enquanto se desce, se você vai obtendo avaliações sucessivamente piores a cada nível provavelmente não há porque continuar, esse é provavelmente um desses movimentos infrutíferos.

Offline Brienne of Tarth

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Re:Inteligência artificial
« Resposta #74 Online: 09 de Março de 2016, 17:09:11 »
Desculpem-me a ignorância de leiga, mas vejo que na IA dos games, quando se tenta uma mesma estratégia, o jogo muda a dele e te derrota, aprendendo com os próprios erros.

Isso não é exatamente uma resposta espontânea, devido aos padrões já programados, eu acho (achismo mesmo) mas não existe nenhuma espontaneidade nas reações obtidas em logs mais adiantados?

Espero ter me dado a entender. :vergonha:
GNOSE

 

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