Mas questão é justamente essa: quantas vezes você já comprou um objeto físico e te proibiram por contrato de revendê-lo ou emprestá-lo? Nenhuma. Em uma venda ocorre uma transferência de propriedade, logo não faz sentido quem está vendendo continuar controlando se a caneta pode ser revendida ou emprestada: eu comprei a caneta, ela é minha, e eu faço o que eu quiser com ela.
Mas você pode, tanto quanto sei, estipular condições de venda que a pessoa não faça o que quiser com algo que comprou. É o que as pessoas acham conveniente fazer com propriedade intelectual, se quiserem ter nisso seu sustento.
E agora, com a possibildade de cópia mais fácil do que nunca, isso acaba tendo que tomar outras formas, por preocupações que haviam em menor grau com substrato não-eletrônico.
Pode existir, sim, um controle da outra parte se houvesse um licenceamento; mas, a venda de software, livros e músicas não é um licenceamento. Eu pago pelo produto uma única vez ao invés de parcelas mensais, anuais, etc e a própria parte que está vendendo se refere a transação como "venda".
E pode ser muito bem ainda venda uma transação onde se estipule condições do que você pode e não pode fazer com o que comprou.
De forma similar, você pode comprar um carro, mas não pode raspar os números de identificação, nem mudar a cor, sem antes comunicar ao governo, ainda assim é compra.
Acho exagerado comparar uma venda com um divórcio: na venda eu pago um valor inicial e uso o produto o quanto eu quiser. Um casamento é um acordo entre duas pessoas que continuam a conviver (ao menos teoricamente) até que o contrato seja rompido.
Não estava verdadeiramente comparando uma venda com um divórcio, mas as condições de compra que qualquer um pode impor, com um contrato. Nem é bem uma comparação, se for ver, é só um outro contrato, de venda (ou de compra). E, em vez de comprar, ciente de não poder vender, depois querer vender mesmo assim, o certo seria não comprar, tal como não se aceitaria um contrato que previsse algo que não se quer (como não haver possibilidade de divórcio, entre outras coisas, mas pode ser simplesmente, vender o que quer que tenha comprado se não quiser mais).
O livro que esta na biblioteca foi parar lá com o consentimento do autor, diferente do PDF que esta sendo pirateado.
Não, não foi com o consentimento do autor. Se eu comprar um livro de uma editora para colocar numa biblioteca, ela nem sabe que é para isso que ele foi comprado, sem contar que muitas bibliotecas públicas aceitam doações.
Nunca ouvi falar de autores protestando contra doações de livros para bibliotecas, ou de qualquer tentativa de restringir a possibilidade das pessoas doarem ou emprestarem os livros. A grande diferença, é que pouco imoporta, alguém está comprando as unidades que são doadas às bibliotecas, não são feitas cópias pelas quais ele não recebe nada, e, diferentemente de cópias eletrônicas, as unidades vendidas, por mais emprestadas que sejam, eventualmente esbarram num limite físico que acaba "obrigando" as pessoas realmente interessadas a comprar livros, em vez de esperar até que eventualmente alguém empreste uma das poucas dezenas de unidades compradas.
A princípio, tanto as bibliotecas quanto as cópias eletrônicas diminuem o número de vendas dos livros. Mesmo com os limites físicos que um livro físico possui, após um certo período de tempo, pode acontecer de milhares de pessoas terem emprestado aquele livro na biblioteca. Qual a diferença de 1000 pessoas copiarem um ebook e 1000 pessoas lerem o livro na biblioteca? Mesmo que só 10 pessoas tenham lido pelo computador e 1000 pela biblioteca, os dois casos são iguais para o autor: várias pessoas leram sua obra, mas ele só recebeu o valor de um livro.
Uma comparação menos apelativa são as locadoras de DVD. Uma video-locadora legalizada não pode locar qualquer DVD, devem ser DVDs vendidos especialmente para locadoras, que custam mais caro. Já um livro comprado por uma biblioteca (ou doado para uma) é um livro normal, que custou o mesmo que o livro teria custado se seu destino não fosse uma biblioteca. Por que a diferença?
Bem, imagino que se os autores fossem ou se dessem conta de serem lesados por empréstimos de livros em bibliotecas, talvez bolassem condições parecidas com as de locadoras. Talvez seja algo que eles não se dêem conta, ou talvez os hábitos de consumo de filmes e livros sejam suficientemente diferentes para não fazer tanta diferença.
Quanto a comparação cópias grátis de ebook versus biblioteca, bem, eu fico quase sem entender por onde continuar argumentando. Parece óbvio que nem exatamente está sugerindo que o fato das pessoas poderem obter gratuitamente não faz com que o autor deixe de ganhar; só diz que é um ato essencialmente igual, se olhado isoladamente, isso ser feito num computador, ou num empréstimo na biblioteca. Bem, isoladamente até é, mas no "long run" pode fazer bastante diferença, devido a possibilidade de muito mais cópias eletrônicas serem feitas, do que gente lendo livro emprestado. Então é meio como comparar crianças peraltas roubando balinhas num mercado quando se está distraído no caixa, e ladrões virem a noite e roubarem tudo, e com isso sugerir que não se deva ter cadeados ou portões. "Ora, é tudo igual, no sentido de que em ambos os casos está perdendo dinheiro." É a mesma coisa, dos dois lados se pode ter possíveis perdas, mas num caso se considera uma delas negligenciável, a outra não.
Deixando de lado a natureza de se de fato roubar versus copiar, que não considero verdadeiramente análogas.