Se assistir aos vídeos, vai ver cubanos mostrando os hospitais que não tem nem aspirinas e dando outros relatos. O que seria mais "independente"?
Se eu produzir um vídeo mostrando o Instituto do Fígado, InCor ou do ICESP e publicar isso na mídia, eu demonstro fácil, fácil que a medicina do Brasil dá de relho em qualquer medicina do mundo. Trabalhar com extremos da curva de Gauss ou mostrar situações específicas sem quantificá-las leva a uma generalização totalmente errônea. Particularmente, eu desconfio de quase tudo o que é veiculado na mídia não especializada.
Por que devemos desprezar esses relatos e ficar só com a versão oficial? Ela é "independente" e despolitizada?
Eu não desprezo esses relatos, mas busco contextualizá-los desapaixonadamente, o que foi tudo o que a Época não fez. Também tenho enormes desconfianças de "versões" e estatísticas oficiais (qualquer pessoa que analisasse as estatísticas de produção da Alemanha, em 1936, afirmaria que o país estava desmilitarizado). Eu trabalho com estratégia em saúde e busco, sempre, bancos de dados supranacionais e internacionais, como a OMS, OPAS, ONU, Banco Mundial, Bird, CIA (esta com algumas reservas, já que apresentam algum viés ideológico e estratégico). Esses bancos trabalham com estatísticas fornecidas pelos próprios governos, mas dispõem de uma série histórica relativamente longa e têm mecanismos de consistência que tornam os dados mais confiáveis (exemplo: tente passar para a OMS uma estatística mostrando que a expectativa de vida aumentou, enquanto a mortalidade infantil cresceu e veja o que ocorre...)
Sem dúvida. Não se pode supor que apenas existem os hospitais denunciados, mas tampouco pode-se ignorá-los apenas por não estarem em consonância com a propaganda que diz que tudo corre às mil maravilhas. Se eles existem, qualquer que seja a sua representatividade no fim das contas, eles já mostram que aquilo que comumente é dito não mostra toda a verdade sobre o sistema.
Primeiramente, ao analisar um fato eu jogo a propaganda no lixo. A questão, aqui, é de representatividade, mesmo. A questão é saber quantos hospitais, em Cuba, têm a situação descrita pelo dissidente.
Por outro lado, há uma questão que os brilhantes editores da revista simplesmente deixaram passar batido: em saúde, não existe nenhuma ação sem consequência. o que se reflete nas estatísticas. Expectativa de vida e mortalidade infantil são fortemente dependentes de uma série de fatores, entre os quais a assistência médica é um dos decisivos.
Se a situação do sistema médico cubano é realmente a que foi apontada pelo dissidente, há que se explicar por que Cuba apresenta uma expectativa de vida maior e uma mortalidade infantil menor que a verificada nos EUA. Alguns conspiracionistas afirmam - sem jamais provar - que essas estatísticas são manipuladas. Cabe-lhes o ônus da prova, sem apelo a evidências anedóticas.
OBS: é muito comum ver a imprensa, quando quer detratar um aparelho de saúde, concentrar-se em questões como filas, precariedade de instalações, falta de hotelaria, excesso de demanda. Esses são os fatores mais visíveis utilizados. Entretanto, nenhum deles é muito significativo para se avaliar a qualidade desse aparelho. Muito mais importante seria analisar o grau de resolutividade, preparo das equipes, grau de complexidade do atendimento e outras. Apenas um exemplo: se você chegar, a qualquer hora, no Hospital das Clínicas de São Paulo verá filas enormes, algumas instalações de dar dó, enfermarias pouco confortáveis e pode facilmente chegar á conclusão que o hospital não presta. Entretanto, o HCSP é tido como um dos melhores hospitais do mundo. Há sempre que se ter cuidado com o que se analisa.