Ok, mas falando do trabalho que cabia ao velho, qual é a dificuldade em fazer um monte de caixas de sapatos em terreno plano? O que existe de tão especial naquela porcaria do prédio do congresso?
Nada.
Só concreto moldado em formas de madeira ao estilo construção de viaduto.
Ah, mas Brasília tem o formato de um avião, genial.
Em terreno nivelado e seco até eu faço, a questão é que dão valor demais ao velho, muito além do que deveria.
A esbeltez dos elementos e grandes vãos com limitações arquitetônicas tornavam muitos de seus projetos inviáveis do ponto de vista técnico, nem mesmo os concretos mais resistentes da época aliado a toda tecnologia disponível permitia que muitas de suas obras fossem realizadas sem que houvesse alterações arquitetônicas por parte dos engenheiros.
Muitas obras foram grandes desafios. A topografia do terreno é o menor dos problemas a meu ver, visto que pode ser facilmente solucionado com movimentações de terra, uma vez que dinheiro não era um fator condicionante.
Abaixo, Bruno Contarini comenta alguns dos desafios de engenharia enfrentados em projetos que realizou. Em vários casos nem mesmo engenheiros de outros países foram capazes de dar soluções que atendiam as condições impostas, tendo sido necessário desenvolver tecnologias exclusivas para viabilizar as obras.
Universidade de Constantine
Constantine, Argélia
1969
Bruno Contarini foi chamado por Niemeyer para projetar a estrutura da Universidade de Constantine depois de o escritório técnico francês inicialmente contratado ter afirmado que a concepção do arquiteto brasileiro era inexequível. O problema estaria no edifício ocupado pelas salas de aula, com 300 m de comprimento e colunas dispostas a cada 50 m. Para dar conta daqueles vãos, os franceses afirmaram que a parede sobre as colunas deveria ter 1,5 m de espessura. "Depois de alguns estudos, conseguimos realizá-la com 30 cm", orgulha-se Contarini. O resultado também é um dos preferidos de Niemeyer, não por sua monumentalidade, mas por causa dos espaços generosos e da fluidez proporcionada à circulação dos alunos.
Editora Mondadori
Milão, Itália
1968
Na sede da Editora Mondadori, em Milão, Niemeyer buscou criar um jogo harmonioso de volumes e espaços livres, mantendo as arcadas em vãos desiguais. "Era uma ideia que me ocorreu, uma ideia assim um pouco musical", comentou o arquiteto posteriormente.
Os engenheiros italianos afirmaram que a única opção viável seria apoiar a estrutura de cinco pavimentos sobre quatro pilares distribuídos a cada 6 m, gerando vãos regulares. "Só que era fundamental para o Oscar obter vãos diferentes, com 15 m, 6 m, 3 m etc.", lembra Contarini. A solução encontrada pelo calculista brasileiro foi simples. "Bastou mudar o sentido da estrutura apoiando-a em uma viga longitudinal. A partir daí foi possível colocar os quadros onde o Oscar queria", conta.
MAC (Museu de Arte Contemporânea)
Niterói (RJ)
1996
Quando comenta sobre a armação da estrutura utilizada no MAC (Museu de Arte Contemporânea) de Niterói, Bruno Contarini parece falar sobre uma obra de arte. Mas não sem motivo. Para atender as necessidades da arquitetura - que previa no salão principal um vão completamente livre de 462 m² com um núcleo de elevadores no centro - os cabos de aço protendidos, em vez de contínuos, formam um desenho semelhante a uma Estrela de David.
O salão é contornado no alto por um mezanino, o que levou o projetista à execução de quadros com grandes vigas protendidas sob o forro. Essas vigas avançam em balanços de 11 m e estão apoiadas em seis pilares com 50 cm de diâmetro.
Cidade da Música
Rio de Janeiro (RJ)
2009
Com inauguração prevista para este ano (conforme previsão à época do fechamento desta edição, em outubro), a Cidade da Música projetada pelo arquiteto Christian Portzamparc teve estrutura calculada pelo engenheiro Carlos Fragelli (Beton Engenharia) com consultoria técnica de Bruno Contarini. Com 87.403 m² de área construída, abrigará a maior sala de concertos da América Latina, com 1.800 lugares, reversíveis para 1.300 no caso de óperas. "Talvez essa seja a estrutura mais complexa das quais participei e certamente é um ótimo exemplo de colaboração entre projetistas", revela Contarini, comentando a parceria com Fragelli.
Composta por quatro pisos principais (dois pisos elevados, um térreo e um subsolo), a estrutura é composta por elementos estruturais de grandes dimensões e balanços assimétricos. Em alguns trechos foram empregadas grelhas com vigas a cada 5 m, em outros, os apoios ocorrem por meio de pilares inclinados, por alguns tirantes e por extensas paredes curvas em concreto protendido. Ao todo foram utilizados 65 mil m³ de concreto (incluindo para as fundações), 8 mil t de aço e 800 t de aço protendido.
Ponte Rio-Niterói
Rio de Janeiro-Niterói (RJ)
1974
Como diretor técnico da obra, que durou cinco anos, Contarini esteve à frente de 130 engenheiros e dez mil operários. Inaugurada em 1974, a ponte Rio-Niterói tem o maior vão em viga reta do mundo, com 300 m de extensão. A obra também introduziu uma série de inovações à engenharia nacional. Pela primeira vez foi utilizada a tecnologia de ilhas flutuantes com equipamentos de perfuração de tubulões, treliças de lançamento e dois equipamentos de colocação de aduelas.
"A tecnologia de execução de fundação de estacas escavadas de grande diâmetro (1,8 m) foi introduzida no Brasil nessa oportunidade, incluindo a construção pesada de peças pré-moldadas de concreto", comenta o engenheiro Benjamin Ernani Diaz, que também participou do projeto. "A construção em balanços sucessivos que se fazia de forma tradicional foi modificada radicalmente depois da construção da ponte", acrescenta Diaz. O projeto foi também o primeiro no País a ser feito inteiramente no computador, no caso um IBM 1130. Atualmente cerca de 140 mil veículos circulam diariamente pela ponte que liga a capital fluminense a Niterói.
http://construcaomercado17.pini.com.br/negocios-incorporacao-construcao/101/artigo283690-2.aspx
Essa filosofia do Niemeyer inclusive influenciou toda uma geração de arquitetos "artísticos" no Brasil, que negligenciam funcionalidade, desempenho e não enxergam uma construção como um negócio para as empresas - algo que precisa ser viabilizado pelo menor preço possível.