Falando em fraude:
Como uma startup de US$ 9 bilhões virou uma vergonhosa fraude
https://tecnoblog.net/236441/fraude-theranos-elizabeth-holmes/
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Theranos virou sensação ao prometer máquina capaz de fazer mais de 200 exames com poucas gotas de sangue. Mas a tecnologia não existe até hoje.Elizabeth Holmes chegou a ser comparada a Steve Jobs e a Bill Gates. A Theranos, startup que ela fundou, valia mais de US$ 9 bilhões em 2014, tudo por conta de um revolucionário equipamento portátil que prometia fazer mais de 200 tipos de exames médicos. Hoje, Holmes é um exemplo, não de empreendedorismo, mas do que não fazer no Vale do Silício ou em qualquer outra parte do mundo.
O motivo? Fraude. Fraude massiva.
Garota prodígio
Em 2003, quando a Theranos foi fundada, Holmes era uma estudante de 19 anos que cursava engenharia química na Universidade de Stanford. Os professores já percebiam nela um grande ímpeto de fazer algo inovador.
Depois do primeiro ano de estudos, Elizabeth Holmes conseguiu um trabalho de verão no Genome Institute of Singapore. Ali, ela lidou principalmente com exames para tratamento e diagnóstico de síndrome respiratória aguda grave (SARS, na sigla em inglês). Voltou cheia de ideias, tanto que não chegou a concluir o curso: com a aprovação de Channing Robertson, um de seus professores, ela criou a Theranos.
Há poucos detalhes sobre o aconteceu nos anos seguintes, mas Holmes disse que passou esse tempo trabalhando principalmente no desenvolvimento de uma tecnologia revolucionária capaz de fazer dezenas de exames médicos com algumas poucas gotas de sangue, diminuindo a complexidade dos procedimentos e o sofrimento dos pacientes.
O resultado desse trabalho seria o Edison, o tal do dispositivo que faz os testes sanguíneos, que supostamente apareceu no primeiro laboratório da companhia, inaugurado em 2013, mas nunca foi mostrado. Apesar de a Theranos não ter divulgado nenhum estudo que validasse os seus métodos, o dispositivo não demorou a chamar atenção, afinal, ele prometia mudar um mercado que, só nos Estados Unidos, movimenta mais de US$ 70 bilhões por ano.
Em 2014, a Theranos se tornou uma das grandes sensações do Vale do Silício. Elizabeth Holmes passou a ser convidada para entrevistas em programas de TV, deu palestras, fez até uma apresentação no TED (um trecho está no vídeo acima) e estampou capas de revistas como Forbes e Bloomberg Businessweek.
Holmes também ocupou a capa da revista Fortune. No veículo, ela foi tema de uma extensa matéria publicada em junho de 2014 que descrevia os seus feitos. Um ano e meio depois, o autor Roger Parloff publicou outra reportagem, mas para explicar como havia se deixado enganar.
Bom demais para ser verdade
Histórias de sucesso empolgam, ainda mais quando envolvem uma ideia que pode mudar a vida das pessoas. No auge do sucesso, a Theranos dizia que o Edison era capaz de lidar com quase 250 tipos de exames, incluindo alguns mais complexos, relacionados a câncer, por exemplo. Novamente, tudo com poucas gotas de sangue, trazendo menos desconforto ao paciente e mais agilidade aos médicos, pois os resultados também seriam entregues mais rapidamente.
Também havia promessa de redução substancial de custos. Não por menos, tratativas com centros médicos e hospitais começaram a aparecer, bem como investidores interessados nesse filão. O valor obtido com aportes passou de US$ 700 milhões, de acordo com a SEC, a comissão de valores mobiliários dos Estados Unidos. Como já dito, o valor de mercado da Theranos em 2014 foi estimado em US$ 9 bilhões. “Isso é sobre ser capaz de fazer o bem”, dizia Holmes.
Mas, ao mesmo tempo em que a Theranos atraía investidores e parceiros comerciais, a companhia se negava a fornecer detalhes sobre os seus métodos. Quase tudo o que se sabia sobre o negócio vinha de reportagens que não seguiam uma apuração aprofundada.
Parecia que a companhia estava simplesmente protegendo a sua tecnologia, mas nem mesmo a Centers for Medicare & Medicaid Services (CMS), órgão governamental que trata de assuntos de saúde nos Estados Unidos, tinha acesso ao Edison ou aos estudos da Theranos.
Enquanto Elizabeth Holmes gozava do status de grande empreendedora, especialistas da área e jornalistas analisavam a história da empresa com mais frieza e, a cada passo que davam, tinham mais certeza de uma coisa: a Theranos não estava nem perto de fazer o que prometia.
Castelo de areia
Embora houvesse mais gente desconfiada, o castelo de areia só desabou quando o jornalista John Carreyrou publicou no Wall Street Journal, em outubro de 2015, uma investigação apontando inconsistências nas promessas feitas pela Theranos.
Para começar, um ex-funcionário revelou a Carreyrou que, na verdade, o Edison fazia apenas uns 15 tipos de testes, não mais de 200. Além disso, o equipamento precisava de pelo menos três frascos de sangue para realizar os exames e não de apenas algumas gotas — na época, a empresa chegou até a remover essa afirmação de seu site.
Não parou aí: a Theranos também foi acusada de não revelar que fazia a maior parte de seus exames com equipamentos convencionais fabricados por outras empresas. Mais tarde, surgiram questionamentos sérios sobre a precisão de determinados exames, algo imperdoável para uma companhia que afirmava ter realizado até então mais de 3,5 milhões de testes.