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Prefiro admitir que haja a verdadeira fé.
Como a ciência explica o espiritismoNeste mês, Chico Xavier completaria 100 anos. Mesmo após quase uma década de sua morte, os espíritas continuam idolatrando-o como o médium que deixou de viver a própria vida para confortar os outros. Já os céticos desconfiam de sua capacidade de entrar em contato com os mortos, se é que existe mesmo vida após a morte. E a ciência, a cada dia que passa, dispõe de mais recursos e estudos para explicar, racionalmente, os fenômenos relacionados ao espiritismo.“A maior dificuldade que os cientistas encontram para checar a mediunidade é enquadrar os ‘fenômenos espíritas’ em métodos científicos”, explica o neurologista e professor da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Renato Sabbatini. O método científico pressupõe que se deve testar repetidamente e de diferentes formas um fenômeno a fim de prová-lo. No entanto, nem sempre um médium consegue reproduzir de igual maneira a sua mediunidade ou seu suposto contato com os mortos. “Existem muitas coisas que não explicamos agora, mas isso não abala a minha convicção de que usando os métodos adequados ainda iremos descobrir. Até hoje, apenas 1% do cérebro humano foi investigado. É questão de tempo e de acumulação de conhecimento”, acredita.Uma das áreas da ciência que mais possui estudos que conseguem desvendar alguns fenômenos espíritas é a medicina. O efeito placebo e o fim natural da doença são apontados por especialistas como o porquê das cirurgias espíritas funcionarem. E já foi comprovado que as visões do além que são vistas por pessoas à beira da morte têm causa biológica: são alucinações causadas pelo excesso de dióxido de carbono na circulação sanguínea.Por sua vez, a psicologia mostra que o inconsciente é o principal personagem para compreender porque as pessoas conseguem falar, ouvir e ver espíritos. “As pessoas ouvem a voz do próprio inconsciente e a atribui aos falecidos”, diz a psicóloga clínica e professora titular da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Denise Gimenez Ramos.Confira, nas reportagens a seguir, como a medicina, a psicologia e a física veem o espiritismo e os mistérios relacionados ao seu maior nome, Chico Xavier.Chico Xavier: ciência tenta explicar fenômenos espíritas (Foto: Agência Estado)
O corpo faz "milagres"Existem dois tipos de cirurgias espirituais: com incisão no paciente ou por meio de passes. É corriqueiro encontrar alguém que se submeteu a uma delas e se curou. Seria obra de um espírito que efetua tratamentos espirituais ou da energia transmitida por meio do ritual envolvido? Para o neurologista e professor da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Renato Sabbatini, nenhum dos dois. “A cada dia que passa a ciência explica fenômenos que, antes, eram tidos como milagres. Por isso que, na Idade Média, existiam mais ‘milagres’ do que atualmente”, conta.Uma das explicações é o efeito placebo – uma substância ou procedimento inofensivo que possui efeitos terapêuticos. “Nas tribos indígenas dos Estados Unidos, os xamãs acreditavam que a doença era causada por maus espíritos. Quando alguém ficava doente, eles faziam um pequeno corte e jogavam um pedaço da pele e da gordura em uma fogueira”, conta Sabbatini. “Em outros casos, só fingiam realizar um corte e cuspiam na fogueira uma mistura de areia, musgo e sangue do próprio Xamã – a gengiva sangrava ao mastigar a mistura”, completa. Em ambos os casos, o doente se recuperava.Para se ter uma ideia da potência do método, o efeito placebo de antidepressivos e de remédios como V iagra é de 40%. Os medicamentos, respectivamente, funcionam efetivamente em 65% e 50% dos pesquisados. “Até ratos em laboratório apresentam esse efeito. O cérebro já está condicionado, sabe que se tomar remédio haverá uma melhora”, conta o médico. Além disso, também foi comprovado com estudos científicos que as pessoas que têm fé possuem um sistema imune mais fortalecido. “A pessoa se ajuda quando decide se curar”, diz.Gravura mostra xamã tratando um doente em uma tribo nos Estados Unidos: na verdade, a pessoa se cura sozinha (Foto: Getty Images)Outro detalhe é que muitas doenças são curadas espontaneamente. “Diariamente, o corpo sofre cerca de 20 mutações celulares, que podem gerar um tumor”, conta Sabbatini. O câncer só se instala quando o corpo não reconhece aquela mutação como perigosa e não a combate. “Além disso, muitas outras doenças – com exceção das congênitas ou genéticas – podem se curar sozinhas, como inflamações e até diabetes do tipo dois”, explica. O sistema imunológico cuida, principalmente, das doenças psicossomáticas -- quando o estado mental causa sintomas físicos. “Sem contar que, muitas vezes, a pessoa procura várias alternativas para melhorar. Passa a se alimentar melhor, pratica atividades físicas, toma remédio e recorre à fé”, completa.Sobrenatural hoje, científico amanhã“Hoje, fenômenos que em algum momento foram vistos como sobrenaturais, uma vez explicado pela ciência, são esquecidos como fenômenos espíritas e entendidos como científicos”, afirma o físico do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), Henrique Lins de Barros. Um exemplo é o fogo-fátuo. “Trata-se de uma chama rápida produzida por emanação de gás resultante da decomposição de matéria orgânica – como o corpo humano”, explica o também físico do CBPF, Sebastião Alves Dias. “Como o fogo-fátuo aparece em cemitérios, as pessoas achavam que ele era a alma do falecido pegando fogo”, diz Barros.Fogo fátuo: de almas penadas a simples emanações de gases (Foto: Getty Images)“Logo após a fotografia ser inventada, em alguns casos, pessoas apareciam nas fotos, como se fossem fantasmas”, conta Barros. “Mas, depois, descobriu-se que, na verdade, tratava-se de duas fotos sobrepostas”, explica. Se o efeito foi feito de maneira proposital, ou não, os charlatões foram desmascarados. “A verdade é que os fenômenos ditos como espirituais são inexplicáveis do ponto de vista da física, porque não conseguimos repeti-los várias vezes com o mesmo resultado”, explica Dias.
A voz interiorNo século XIX, a doutrina espírita foi formulada por Allan Kardec tendo como base ciência, filosofia, moral e religião. No Brasil, Chico Xavier popularizou a religião. “Ele combatia a aproximação entre catolicismo e espiritismo. Mas tornou-se um líder religioso em ambos”, diz a antropóloga da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Sandra Jacqueline Stoll.“É muito difícil para o ser humano lidar com a morte”, diz o psicanalista e psiquiatra do Hospital das Clínicas Oswaldo Ferreira Leite. “Diante do desconhecido e da frustração, é um conforto ouvir ou ver o ente querido que faleceu”, explica. Para ele, as emoções interferem no julgamento podendo alterar a percepção da pessoa. Ela passa a ver e a ouvir coisas. “Na verdade, é um processo alucinatório”, diz a professora titular de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Denise Gimenez Ramos.O estado psicótico, mais grave, pode causar alucinações e perda de noção de realidade. “Ela fala coisas sem sentido e não tem controle sobre si”, explica Denise. Por isso, psicóticos podem aparentar estar possuídos. “A personalidade da pessoa está alterada, não parece mais ser ela mesma”, conta. Outras doenças graves, que podem estar associadas ao ver ou ouvir espíritos, são: transtorno dissociativo de identidade, epilepsia, transtorno bipolar e depressão.O psiquiatra suíço Carl Gustav Jung, em 1900, estudou uma prima adolescente que dizia ouvir vozes de pessoas que morreram. “Jung fez doutorado para compreender as mesas espíritas que as pessoas formavam para invocar espíritos. Ele descobriu que nada mais era um tipo de contato que a prima tinha com o próprio inconsciente”, conta Denise.Os primeiros estudos de Carl Jung mostraram que a mediunidade da prima era uma forma de contato com o inconsciente (Foto: Getty Images)Geralmente, a pessoa consegue entrar em contato com seu próprio inconsciente quando está em transe. “O transe favorece o rebaixamento de consciência e a imersão em conteúdos inconscientes”, explica. Para a estudiosa, quando está relaxada, uma pessoa pode entrar em profundo contato consigo mesma e acessar conhecimentos que nem ela sabia que tem. “Nosso cérebro é como computador, capta um monte de coisas que estão acontecendo, mas nossa consciência nem percebe”, afirma Denise. É assim que a ciência explica fenômenos como intuição e insights, aquela ideia brilhante que surge quando está distraído.