Justiça proíbe garota de 14 anos a fazer aborto em hospitais do RSLÉO GERCHMANN
da Agência Folha, em Porto Alegre
O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, por meio de liminar, proibiu nesta sexta-feira que a adolescente de 14 anos, que diz ter sido vítima de estupro no município gaúcho de Bagé (393 km de Porto Alegre), seja submetida a aborto em qualquer hospital do Estado.
A garota, com dez semanas de gestação, diz ter sido violentada por um capataz da fazenda de sua família (que se dedica à pecuária). Ela conseguiu, em Porto Alegre, um hospital onde poderá se submeter à intervenção médica. Na tarde de hoje, ela estava em um hotel de Porto Alegre esperando decisão judicial que volte a autorizar a realização do aborto.
A decisão que impediu a intervenção médica foi concedida pelo desembargador Antônio Carlos Stangler Pereira. O caso ainda será analisado pela câmara cível especializada na área de família, para confirmar ou não a decisão.
O advogado da família da menina, Décio Lahorgue, entrou com um agravo regimental para derrubar a liminar. A análise ficou a cargo do desembargador Alfredo Guilherme Englert, que rejeitou o recurso.
O aborto havia sido autorizado pela 2ª Vara Cível de Bagé, que estendeu a realização da intervenção para hospitais de Porto Alegre e Pelotas. A decisão foi motivada depois que médicos, em Bagé, negaram-se a participar do procedimento alegando razões éticas e religiosas.
Presumido
Quando ocorreu o ato sexual, a menina tinha ainda 13 anos. De acordo com o artigo 224 do Código Penal, há o "estupro presumido".
"'Presume-se a violência se a vítima não é maior de 14 anos", diz a lei. Há, porém, interpretações.
A decisão do TJ gaúcho levou em conta cartas da menina para o capataz, apresentadas pela promotora Maria Cougo Oliveira, de Bagé.
A promotora diz acreditar que "não houve violência moral ou física contra a menina". Por isso, entrou com o pedido de liminar no TJ. Ela classifica as cartas enviadas pela adolescente como "de amor" e diz que, quando foi mencionada a possibilidade da prisão do rapaz, a garota chorou.
De acordo com a promotora, a menina está sofrendo pressão da família para abortar. "Tenho o dever de resguardar o direito do nascituro", disse ela.
O caso
O caso se tornou público quando a família da menina, com decisão judicial em mãos permitindo a interrupção da gravidez em razão de estupro, teve o pedido negado em Bagé por médicos e pela Santa Casa de Misericórdia.
Para ter a solicitação do aborto, a menina apresenta a decisão judicial e a ocorrência registrada na polícia local a respeito do estupro que diz ter sofrido.
A família tentou fazer a cirurgia duas vezes na Santa Casa de Misericórdia: uma após registrar a ocorrência e outra, na segunda-feira, quando o juiz José Antônio Prates Piccoli decidiu permitir o aborto.
Casado e com filhos, o capataz já se manifestou contrário ao aborto. Ele confirmou em depoimento que teve relações sexuais com a adolescente, mas sem violência.
O administrador da Santa Casa de Misericórdia de Bagé, Luiz Antônio Cheuiche, não quis comentar o caso. A mãe da menina, de 30 anos, se diz arrependida de não ter procurado uma clínica clandestina.
A menina, segundo laudo psicológico particular entregue pela família ao TJ, está em estado de depressão que pode levá-la até mesmo ao suicídio.
Fonte:
http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u108244.shtml