Como pode ser interpretada em linguagem comum essa relação?
Há que se ter cuidado com a "linguagem comum" pois ela pode levar a falsas associações motivadas pela relação entre determinados termos e alguns de seus significados na tal linguagem comum.
Por um lado uma matematica "imaginária" que utiliza numeros e regras que não cabem nos numeros reais, e por outro, uma conjunto de fenomenos que tambem não cabe na fisica "real".
O raciocínio expresso acima é um exemplo.
É um jogo de palavras, mas em verdade nada significa. A ilusão foi possível porque, por acaso, deram o nome de
REAL a um certo conjunto de números e chamaram de
UNIDADE IMAGINÁRIA a raiz quadrada de -1.
Note que se tivessem chamado o conjunto dos números reais de CONJUNTO CONCRETO e a unidade imaginária fosse conhecida por UNIDADE SOFÍSTICA, você não teria pensado que poderia existir uma relação intrínseca entre
uma "matemática de sofismas" que utiliza números e regras que não são concretas, e uma Física que estuda fenômenos que não pertencem à Física "concreta".Trocando-se os termos chaves por outros percebe-se que a sentença na verdade não faz sentido.
Esse tipo de engano é bastante comum e todos nós cometemos.
Qualquer sistema numérico é imaginário porque é sempre uma abstração. O homem imagina, inventa, estes sistemas e suas regras de operação, de acordo com a conveniência de poder aplicar estas abstrações na resolução de problemas práticos.
A maioria diria que uma matemática onde 10 + 7 = 5 está errada, mas não é bem assim. Essa álgebra poderia estar associada a um sistema numérico prático para cálculos horários em relógios de ponteiros de 12 horas. 10 horas + 7 horas resultaria em 5 horas. Poderíamos criar um conjunto de números que chamaríamos de
Conjunto dos Números Horários, com regras específicas de adição e subtração.
Em programação de computadores, por exemplo, comumente se usa a aritmética do "complemento de 2", onde X - Y é obtido invertendo-se o valor de todos os bits na representação de Y resultando no complemento de Y. Então soma-se 1 a este complemento para se obter o valor que é adicionado a X, obtendo-se X - Y. Dessa forma, se estivermos trabalhando com inteiros com representação de 8 bits, então -100 = 156. Ou seja, 100 x (-1) = 156.
Uma álgebra tão válida quanto qualquer outra, porque funciona para aquilo que se pretende.
E se alguém nunca viu isso e achou confuso, basta raciocinar que é como na álgebra do Conjunto dos Números Horários que acabei de inventar. Com a única diferença que no relógio não tem número 0, portanto para achar o negativo de um número basta subtrair este número de 12 ( sem somar 1! ). O que equivale a inverter todos os bits na aritmética do complemento de 2.
Veja esse exemplo:
10 horas - 7 horas = 3 horas. Para encontrar (-7) faça 12 - 7 = 5.
Logo (-7) = 5. De fato, com o ponteiro marcando 10 horas se avançarmos 5 horas ele irá marcar exatamente 3 horas. ( 10 - 7 ) = ( 10 + 5 ) = 3.
Em complemento de 2 soma-se 1 depois da inversão dos bits porque a soma precisará passar também pela posição do 0. Como o relógio não tem 0, obtém-se o produto por (-1) apenas fazendo uma operação equivalente a inversão de bits.
Isso é para demonstrar que os números e as operações algébricas associadas a eles, podem e devem ser imaginados ( criados, inventados ) em função da conveniência.
Todo número é imaginário, mas nem sempre se pensou assim. Na Antiga Grécia a escola dos Pitagóricos via os números como coisas em si mesmas, e acreditavam até que só existissem números inteiros.
Quer dizer, para eles os números não tinham sido inventados e nem podiam ser inventados. Os números existiam da mesma forma que as pedras e os passarinhos: no mundo real, fora da mente humana.
Os pitagóricos tiveram muita influência sobre os matemáticos medievais, e essa noção de que sistemas numéricos não podiam ser inventados possivelmente atrasou em algumas décadas, ou séculos, o desenvolvimento dos números complexos.
Provavelmente você se lembra de como resolver uma equação do 2º grau, e a fórmula de Baskhara, baseada no método de completar os quadrados, possivelmente já era conhecida desde a Suméria ou Egito. Porém quando alguém encontrava uma equação como
, simplesmente considerava que não havia solução, porque parecia óbvio não haver número que elevado ao quadrado desse valor negativo.
Ocorre então que o desenvolvimento dos números complexos precisou esperar até a Idade Média, quando matemáticos se debruçaram sobre o problema muito mais difícil das equações de 3º grau, e foi quando um cara deduziu uma fórmula para encontrar raízes desse tipo de equação.
A dedução dessa fórmula (Tartaglia-Cardano) é longa e trabalhosa e eu teria que colar da Wikipedia porque não sei esse troço não, mas para a gente entender como surgiu a ideia dos números complexos não há necessidade dessa demonstração.
Apenas observe a equação do 3º grau abaixo:
Por simples inspeção verifica-se que 4 é uma raiz da equação:
Mas veja como seria o resultado da aplicação da fórmula para esta mesma equação.
Apareceu uma raiz quadrada de -121 na fórmula! Era muito estranho porque nesse caso não dava
pra fazer como nas equações de 2º grau e dizer que não tinha solução. Porque todo mundo tá vendo que 4 é uma solução!!!
O mais esquisito aí é que a demonstração dessa fórmula prova que o raciocínio que levou a esta dedução está correto, não pode haver erro. E no entanto aparece uma raiz quadrada de número negativo, coisa que os matemáticos medievais pensavam não existir. A maioria empacava em problemas desse tipo porque não podiam conceber que a solução estava simplesmente em bolar uma álgebra para resolver a fórmula. Uma álgebra que lidasse com raízes de números negativos, o que logicamente implicava em criar o conceito de raiz de número negativo.
Mas tá na cara!, pra resolver precisamos encontrar a raiz cúbica de
e raiz cúbica de
, e se essa raiz for da forma complexa
então é fácil calcular que b = 1.
Logo,
Basta admitir que raiz de -1 existe. Ou, definir raiz de -1.
Ou seja, os números reais são definidos como um subconjunto dos números complexos, assim como os racionais são subconjunto dos reais e os inteiros subconjunto dos racionais.
E embora a solução seja um número real ( que também é um complexo, pois todo real é complexo ) para encontrar esta solução é preciso operar no conjunto dos números complexos.
Não há nada de estranho e na verdade deveria ser natural para os matemáticos medievais, porque estavam acostumados com modelos exatamente análogos.
Veja,
.
x é um número inteiro!
Mas você só resolve se operar a raiz de 2, que é um número do conjunto dos reais.
Contudo os gregos pitagóricos ficariam empacados nessa simples equação da mesma forma que europeus medievais ficaram empacados em equações com raízes de números negativos, porque para os pitagóricos os números reais também não existiam.
O que às vezes não se percebe é que números complexos são meramente um artifício de cálculo, assim como números reais, racionais ou inteiros. Não há nada de esotérico em números "imaginários".