Você se referiu a dificuldade técnica do google de fazer uma seleção prévia de TODO o conteúdo que é postado no youtube, o que poderia, em tese, inviabilizar o seu funcionamento. Aí eu pergunto, se a empresa não consegue fazer isto, como uma lei poderia consegui-lo, mas sem causar os mesmos problemas?
Em primeiro, uma lei não pode conseguí-lo, no sentido ideal. Filosoficamente, nenhuma lei, em qualquer lugar do mundo, efetivamente proíbe uma conduta, apenas estabelece uma punição por sua violação. Essa dicotomia é sempre existente: se alguém roubar, irá preso, de maneira que se esse alguém estiver disposto a assumir o risco de ir preso, nada lhe impedirá de tentar roubar.
Em segundo, Direito lida com pessoas, interesses e idéias que em boa parte não fazem parte da natureza, sendo criações dos homens, servindo essa questão do YouTube como um bom exemplo. Desta forma, não lida com valores absolutos. As soluções verdadeiro/falso das ciências exatas são possíveis porque lidam com objetos naturais. O Direito lida com soluções do tipo razoável, aceitável, proporcional, bom, justo (que equivaleriam a verdadeiro) e excessivo, abusivo, desproporcional, mau, injusto (que equivaleriam a falso).
Em terceiro, o Direito é ideal, no sentido de ser uma idéia que almeja se concretizar, mas que sabe ser utópico, e portanto, não plenamente realizável no campo da vida real.
Respondendo sua pergunta: a lei resolverá na medida do possível. Ninguém duvida que sempre haverá quem disponibilizará um download proibido. Isso é uma meta que o Direito almeja, sabendo desde sempre ser impossível. O que uma lei deve buscar é um meio de limitar ao máximo essa prática, encontrando um ponto de equilíbrio e entre o direito à informação e o direito à propriedade.
Há portanto, dois Direitos Fundamentais em conflito: o direito à informação e o direito à propriedade. A solução dada pelo YouTube servirá de modelo para esse raciocínio. Havendo colisão entre Direitos Fundamentais, a principal técnica de solução é a seguinte (sempre se pensando abstratamente, e cada passo sendo premissa para o seguinte):
1. Adequação. O modelo do YouTube é apta a solucionar o problema?
Sim. Em tese, o YouTube pode tanto disponibilizar qualquer informação quanto proteger a propriedade intelectual.
2. Menor ingerência. O modelo do YouTube é a forma menos gravosa para solucionar o problema?
Sim. Em tese, ele nem libera tudo nem bloqueia tudo. Ele não exige um prévio cadastro de quem deseja apenas assistir, só o exigindo de quem quiser incluir um conteúdo. Ele faz satisfatoriamente seu próprio controle de conteúdo, sem a necessidade de interferência de uma censura estatal.
3. Proporcionalidade. O modelo do YouTube mantém a essência dos dois Direitos Fundamentais em conflito?
Sim. Ele permite o acesso à informação disponibilizada pelos usuários, à informação sem proteção, e à informação protegida com o consenso do detentor dos direitos autorais. E bloqueia o acesso a material protegido.
Conclusão: o modelo do YouTube é uma boa solução desta questão. Esse modelo poderia ser usado como parâmetro em um julgamento de casos concretos, sendo que em tese, quanto mais se afasta dele, mais abusivo o site em questão será. A lei que protege os direitos autorais já existe, falta fiscalizar.
Um exemplo de aplicação concreta da lei:
APELAÇÃO CRIMINAL. VIOLAÇÃO A DIREITOS AUTORAIS. ART. 184, §2º DO CÓDIGO PENAL. PRELIMINAR DE CERCEAMENTO DE DEFESA POR INDEFERIMENTO DE NOVA PERÍCIA. CRIME POSSUI FALTA DE REGULAMENTAÇÃO LEGAL. CONDUTA ACEITA PELA SOCIEDADE. INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. SUBSTITUIÇÃO DA PENA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1 - Não há que se falar em cerceamento de defesa se a perícia realizada pela polícia for idônea, subscrita mediante requisitos para tanto, com assinatura de dois profissionais devidamente habilitados, pertencentes à instituição, sendo clara e sem qualquer falha que a ponha em dúvida, se fazendo, assim, suficiente para a legitimação da prova carreada aos autos. 2- Não merece prosperar a alegação de que a conduta carece de legislação específica vez que a Lei nº 9610/98, que regulamentou os direitos autorais, não protege os chamados cd de games, por não poderem ser considerados obras intelectuais, tanto que o art. 8º, inciso II dessa Lei dispõe que "não são objetos de proteção como direitos autorais de que trata essa Lei os esquemas, planos ou regras para realizar atos mentais, jogos ou negócios", vez que a interpretação do referido dispositivo deixa claro que os jogos a que se refere não são os mesmos jogos de videogames ou computador, por essa modalidade não se utilizar de reprodução sonórica e gráfica em cds.
3- Não há dúvida de que o conteúdo desses jogos, disponíveis por download são realizados de forma desautorizada e, com isso, ilegal, vez que atualmente pode-se baixar na "rede" qualquer material, o que não significa que os autores e as empresas que os exploram sejam coniventes com essa prática. Pelo contrário, vê-se atualmente uma grande briga dos mesmos contra a pirataria na rede, por lhe causarem prejuízos imensuráveis. 4- Não há que se falar em insuficiência de provas, vez que além da confissão do acusado na fase policial, que pode ser utilizada se estiver em conformidade com as demais provas dos autos, os depoimentos do policial condutor e do um cliente corroboram com a tese se que o apelante comercializava cds falsificados. Além do que, conforme o laudo pericial, todos os 116 (cento e dezesseis) cds apreendidos eram falsificados. 5- Observa-se que sendo a pena aplicada de dois anos de reclusão e um mês de multa poderá ser substituída, conforme § 2º do art. 44 do CP por duas penas restritivas de direito. 6- Recurso conhecido e parcialmente provido.
(TJ-ES; ACr 24050016336; Primeira Câmara Criminal; Rel. Des. Subst. Ewerton Schwab Pinto Junior; Julg. 25/07/2007; DJES 04/09/2007; Pág. 41)
Como se vê, têm chegado ao judiciário só casos banais, nenhum de grandes proporções. Seria interessante ver a solução concreta do caso da comunidade do orkut que disponibiliza links para material ilegal.
Com exceção das imagens dos comunistas.... KCT!