Por definição, o consumo de enteógenos é renúncia voluntária ao auto-controle da bioquímica cerebral.
Pode até ser que haja um contexto social em volta que compense essa perda de controle (me parece que é a idéia básica na Igreja do Daime que conheci certa vez). Mas ainda é, francamente, uma idéia tosca.
É verdade que os enteógenos alteraram a química cerebral, mas não somente eles, tudo afeta a química do cérebro, práticar esportes, comer, tomar café, domir, nascer, ficar doente, morrer. Não vejo grandes problemas em relação a isso, visto que é só questão de tempo para que o cerebro retome o controle e volte a funcionar basicamente no mesmo padrão ( e por isso grande parte do que foi experimentado acaba se perdendo ).
A respeito do contexto eu posso falar pouco, mas diria que é apenas natural, no caso da Ayahuasca ela é utilizada principalmente como um sacramento religioso, e como toda a religião há um contexto social em volta dela, da mesma maneira como o contexto é importante no cristianismo ou no budismo, no santo daime o contexto é importante para que as pessoas tenham a quem guia-las e esclarece-las a respeito da experiência de alteração da consciência que irão experimentar.
É bastante óbvio que o contexto social é importante, principalmente para pessoas menos preparadas. Mas ele não é essencial, principalmente para pessoas que já tem uma certa preparaçao e informação a respeito do que estão fazendo.
Mas isso tudo é tão vago, subjetivo, e passível de auto-ilusão que torna a experiência inteira inútil, Maurício. E a última frase é exatamente a cereja do bolo: que benefício poderia haver em acessar supostos conteúdos reprimidos ao mesmo tempo que se altera o próprio equilíbrio bioquímico do cérebro?
É correr o risco de criar uma situação com a qual não se saiba lidar. Por praticamente nenhum motivo exceto uma curiosidade um tanto mórbida.
Mas Luís, existem diversos beneficios, a vida não é objetiva, a maior parte dela inclusive é subjetiva, quantas pessoas não estão atormentadas por medos do passado e do futuro? Incertezas em relação à vida? Traumas de todas a especie? Todas essas coisas são "subjetivas" mas são parte integral da vida de todos os individuos, com a possibilidade de ampliar e verificar esse conteúdo mental reprimido a pessoa tem a possibilidade de ver coisas que estavam fortemente guardadas nas camadas mais profundas da mente, e quando esse conteudo vem a tona, ele é liberado, exatamente como acontece na meditação, só que de uma forma um tanto mais "drástica".
E falando nisso, eu não sei porque há tanto medo ou receio de "alterar a quimica cerebral", a Ayahuasca por exemplo tem como principio ativo principal o DMT, que é uma substância encontrada naturalmente no corpo humano e que é liberada pelo cerebro normalmente em pequenas quantidades, mas que dependendo da situação é liberada em grandes quantidades, talvez essas situações sejam as mais intensas pelo qual o corpo e a mente tem que passar, o nascimento e a morte, e talvez em alguns outros estados mentais que a mente pode experimentar sem experiência externa nenhuma, sonhos lucidos, meditações profundas e etc, existem estudos a respeito, mas por enquanto é só uma possibilidade.
Em todas as minhas experiências, a única coisa que acontenceu foi uma vontade enorme de PARAR e simplesmente contemplar todas as coisas, inclusive a minha própria mente. Ao fechar os olhos eu me senti completamente em mim mesmo, com uma clareza mental absurda sem por nem um instante deixar a razão de lado, revi momentos da minha vida, alguns que eu nem lembrava mais, revivi situações traumáticas e me libertei delas, fora que existia uma sabedoria imensa impregnada nesse estado mental que ensina muito a respeito de tudo sem precisar dizer nada.
É realmente inexplicável Luis, eu sei que algumas vezes é dificil conseguir visualizar exatamente do que se trata apenas vendo de fora, mas é assim que é, realmente é uma coisa que de fato pode ser "perigosa", não são poucos os casos de "viagens ruins" que acontecem principalmente quando as pessoas tem que se deparar cara a cara com os piores medos e querem continuar fugindo mas a experiência não os deixa.
O que levaria alguém a se conhecer como realmente é a usar enteógenos? Isso mais me parece vontade de fugir de si mesmo.
Mas os enteógenos te colocam face a face com você mesmo, integralmente, como isso seria fugir? Você acredita que há alguma diversão em utiliza-los? São horas de uma intensa experiência de aprendizado onde você encara seus maiores medos sem fugir deles ( como acontece geralmente no estado de consciencia de vigilia, onde algumas pessoas preferem "não pensar nisso" e reprimem os próprios pensamentos ) também algumas vezes encaramos a morte, a dissolução total do ego e isso parece-me que é bastante assustador para a maioria das pessoas, qual é a diversão disso tudo? Mas também encaramos nossas maiores virtudes e é por isso que as pessoas que não escondem nada de si mesmas e querem se conhecer como realmente são não tem medo, eu penso que tudo o que me foi mostrado foi de uma grande utilidade para eu aprender sobre todos os meus erros e me tornar uma pessoa melhor.
Uma vez me disseram que todo bêbado se considera inteligente. E é verdade. Qual seria a diferença, e por que valeria o risco? Você sabe muito bem que esse tipo de brincadeira não é nada segura.
Essa comparação sim é tosca, eu não vou me estender mais, mas eu nunca disse que você fica "mais inteligente", você continua exatamente como é, mas toda a experiência ganha um carater impessoal onde você pode contemplar a si mesmo sem as barreiras auto-protetoras e limitante do ego.
Abraços.