Ola Uilli,
Você poderia falar mais sobre a filosofia da mente de David Chalmers? Eu estou lendo cinco livros no momento e tenho vários outros na fila, então recomendar ler o seu livro não vai adiantar no meu caso.
Vou resumir ( o que está entre aspas, retirei de artigos) :
O Chalmers diviviu o problema da consciência em 2. O problema dificil, e o fácil :
1 - O "fácil" consiste no estabelecimento de correlatos neurais entre a experiência conscientemente vivenciada e o cérebro. Por exemplo, eu causo uma dor em alguem, e mapeio os circuitos cerebrais atuantes.
"Como pode um sujeito humano discriminar estímulos sensoriais e reagir a eles de forma apropriada? Como é que o cérebro integra informação de muitas fontes diferentes e usa essa informação para controlar o comportamento? Como é que os indivíduos conseguem verbalizar os seus estados internos? Apesar de todas estas questões estarem relacionadas com a consciência, todas elas dizem espeito aos mecanismos objectivos do sistema cognitivo. Assim sendo, temos todas as razões para esperar que a investigação em curso em psicologia cognitiva e nas neurociências acabe por responder a estas questões
Em última instância, todos estes problemas se reduzem a questões acerca do modo como o cérebro desempenha determinadas tarefas: como discrimina estímulos, integra informação, produz relatos e por aí fora. Assim que a neurobiologia especificar os mecanismos neuronais apropriados, mostrando o modo como as funções se desempenham, os problemas fáceis estarão resolvidos."
2 - O difícil é exatamente a explicação de como este processamento é acompanhado pela experiencia consciente (a analogia do quarto chines refere-se a isso).
"O problema difícil, pelo contrário, é a questão de como é que processos físicos no cérebro dão origem à experiência subjectiva. Este mistério envolve o aspecto interno do pensamento e da percepção: o modo como as coisas sentem para o sujeito. Quando vemos,
por exemplo, experienciamos sensações visuais tais como a de um azul vivo. Ou pesamos no inefável som de um oboé distante, no sofrimento causado por uma dor intensa, num instante de felicidade ou na qualidade meditativa de um momento perdido em pensamento. Tudo isto faz parte daquilo que chamo consciência. São estes fenómenos que fazem o verdadeiro mistério da mente.
O problema difícil da consciência, pelo contrário, está para além dos problemas relativos ao modo como as funções se desempenham. Ainda que cada uma das funções cognitivas e comportamentais relacionadas com a consciência fossem explicadas, restaria sempre um mistério por explicar: porque é que o processamento destas funções é acompanhado por uma experiência consciente? É este enigma suplementar que faz com que o problema difícil seja difícil. "
Ele é o criador do argumento do Zumbi Filosófico, que é até hoje muito debatido. Além disso, considera que a biologia evolutia não fornece e não será capaz de fornecer explicação para o surgimento da consciencia, pois para cada ponto colocado como condição para seleção da consciencia podemos imaginar um modo automato de ação, processamento e reação que torna o procesamento consciente superfalo e não necessário. Argumenta, também, que exsite uma lacuna explicativa entre todas as teorias físicas e biológicas que temos (e que possivelmente venhamos a ter) e o fenomeno da consciência. Ele(
), e outros (
) fazem criticas aos "negacionistas"(Dennett e outros), que afirmam que a consciencia seja uma ilusão.
Dessa forma, ele propões que a consciência seja uma propriedade/entidade fundamental do universo.
Segue um link com um artigo de 16 páginas dele :
http://criticanarede.com/docs/chalmers.pdfMeu problema com mentes desemcorpadas é que sem mecanismo a partir do qual a mente possa emergir, seja ele um cérebro, um processador ou qualquer coisa análoga, de que forma uma mente poderia existir de forma independente da matéria que não possa ser classificada simplesmente como "Puf! Mágica." E se a mente não depende de um cérebro, o que impede as pedras, nuvens e cachoeiras de serem entidades conscientes dotadas de "espíritos da natureza", como supõem as religiões animistas. Podemos levar essa discussão para outro tópico, se quiser."
Não muito diferente do puf do big bang
. Neste caso, a consciência seria tão fundamental no universo, como as particulas fundamentais. Tudo estaria sempre acompanhado de experiencia consciente. Nós, os animais, seriamos apenas parte desta experiencia consciência. E não concordo que seriam mentes desacopladas. A mente é "bem localizada" nos centros nervosos; a questão é a experiência consciente, que temos das nossas mentes.
Uma coisa que acho estranha, e que gostaria da sua opinião : a TRG é um dos nossos pilares sagrados do conhecimento atual. Pois bem, segudo esta teoria, o espaço-tempo existe "como um todo". Todos os eventos, do inicio do universo ao "final" estão contidos neste espaço-tempo existente, sendo o fluxo de tempo uma mera ilusão. Persistente, mas uma ilusão (não existe).
Ora, do ponto de vista do Dennett e outros a consciência é um processo, e este processo é o gerador da ilusão da consciência. Ou seja, a consciência dependente do fluxo de informações no cérebro. Mas a TRG nos fala que estes fluxos de informação é que são ilusórios, pois se não temos fluxo de tempo, não temos como ter fluxo de informação.
Temos, então, uma teoria (e qqer outra que dependa de fluxo) da consciência que não é suportada pela principal teoria cientifica da atualidade(se nao me engano, na MQ o fluxo de tempo tb é irrelevante). Como conciliar isto?
Isso me lembra Matrix : não é a colher que se move, e a sua consciência
Quanto ao argumento do fine tuning, eu o considero uma grande bobagem com base na minha interpretação, compartilhada por um conjunto de especialistas, de que ele não passa de uma falácia de argumento da ignorância disfarçado. Mais do que isso, estudando bem todas as constantes supostamente ajustadas finamente, a única que realmente parece ter sido "ajustada", segundo físicos como Steven Weinberg e Victor Stenger, é a constante cosmológica. No caso dela os valores calculados a partir de primeiros princípios indicam que ela deveria ser muitas ordens de magnitude maior do que é realmente e é um mistério que seu valor tão baixo -- um mistério que pode vir da falta de uma teoria unificada da gravidade quântica. Mas outras constantes, como o nível de energia do carbono, que é citada frequentemente como uma evidência de ajuste, após uma análise cuidadosa fica claro que elas poderiam variar muito mais do que parece à primeira vista -- no caso específico do nível de energia do carbono, o erro está em comparar seu nível de energia ao nível zero, em vez de compará-lo ao nível de energia do berílio e do hélio, segundo Weinberg essa observação faz com que o valor desse nível de energia possa variar em até 20%, em vez dos 1% que os partidários do design alegam.
Para Victor Stenger, mesmo no caso que ele taxa como improvável de existir apenas um universo, não se precisaria necessariamente invocar o design para explicar as constantes da natureza, primeiro porque uma teoria unificada poderia mostrar que as constantes da natureza são necessariamente o que são, e a teoria das cordas sugere fortemente que de fato elas sejam; e segundo porque o argumento do design é uma forma de chauvinismo do carbono, afinal é a vida que comprovadamente se adapta ao universo ao seu redor, não o contrário."
E por que Stenger classifica como improvável a existência de apenas um universo? Por incrível que pareça, a hipótese dos muitos-mundos está se tornando mainstream na astrofísica. Apesar de não haver evidências empíricas do mesmo, as leis da física como conhecidas hoje, sem super cordas e nem nada de extravagante, já seriam o bastante para um cenário chamado "inflação caótica", segundo o qual logo após o Big Bang o universo se expandiu muito rapidamente, resultando em quebras de simetria que causariam valores locais diferentes para as constantes fundamentais da física ao longo do espaço, e que as regiões onde um dado conjunto de valores se cristalizou estariam bastante afastadas espacialmente de suas vizinhas, funcionando como universos diferentes. Não existe nenhum motivo aparente pelo qual o cenário de inflação caótica não poderia ser verdadeiro e ele oferece poder explicativo suficiente para se tornar uma hipótese atraente.
Outra teoria de muti-verso, um pouco mais polêmica, mas que é ainda mais explicativa e elegante é a teoria da seleção de Lee Smolin. Lee Smolin observou que se o universo parece ajustado para alguma coisa, não é para a existência de vida, mas para a existência de buracos negros. Acredita-se que existam 100 milhões de estrelas com massa para se tornar buracos negros só na nossa galáxia e durante uma longuíssima era na existência do nosso universo, praticamente tudo o que haverá no espaço são buracos negros. A vida, que comparativamente é muito mais rara e menos durável que os buracos negros parece ser mais um efeito colateral de um universo otimizado para produzir buracos negros do que o fim do universo em si.
E que mecanismo favoreceria a existência de universos com muitos buracos negros? Lee Smolin observou a já bem conhecida coincidência de que a composição do universo no momento do Big Bang é muito parecida com a composição de partículas que aparecem quando você esmaga um átomo contra o outro dentro de um acelerador de partículas, e assumiu a já plausível hipótese de que dentro de um buraco negro poderia se passar um Big Bang gerando um novo universo.
Para explicar o por que de o universo parecer otimizado para produzir buracos negros, Lee Smolin invocou uma hipótese, essa sim a mais polêmica de sua teoria, de que haveria uma lei física desconhecida que faria com que universos-filhos herdassem características dos universos de que brotaram, mas com alguma mutação possível, analogamente à reprodução da vida. Uma seleção natural cósmica faria com que após algumas gerações, universos com muitos buracos negros fossem muito mais comuns do que universos com poucos buracos negros.
Embora não haja evidências da seleção de Lee Smolin, ela é uma hipótese mais explanativa e mais capaz de fazer previsões interessantes do que Deus, além de se ajustar melhor aos pontos: é só olhar para o universo, nós sabemos que ele é compatível com a vida, mas ele não parece de maneira nenhuma otimizado para a vida. Se Deus queria tanto vida e ele ajustou na mão-grande as constantes universais para elas serem compatíveis com ela, por que ele não ajustou também cada sistema estelar para ser compatível com ela? Ou seja, se Deus fez um ajuste fino do lado de fora do universo, por que não fez um do lado de dentro também? Um Deus que só age a partir das leis da natureza é, obviamente, indistinguível das próprias leis da natureza. O fato de a vida estar distribuída no universo como se tivesse surgido naturalmente, como consequência da lei dos grandes números, não é evidência de Deus. O que seria evidência de Deus seria um universo com planetas colocados no lugar certinho para haver vida a cada sistema solar no universo inteiro, sem que nenhuma lei da física tornasse isso obrigatório.
Um universo igualzinho ao nosso, mas com vida por toda parte seria evidência de um universo projetado inteligentemente para a vida. Em vez disso, o que temos é um universo igualzinho ao nosso, mas com buracos negros ou buracos negros potenciais por toda parte. Parece muito mais razoável supor que o universo foi projetado para eles, e existe a possibilidade de uma explicação naturalista para existirem tantos deles por aí, e uma explicação natural é sempre melhor do que uma sobrenatural.
Uilli, acho importante voltarmos para a origem de toda esta discussão, pois é claro que multiversos acabam com este problema. Quando coloquei a questão do ajuste fino, foi para justificar a minha posição na enquete. Ou seja, se a teoria do big-bang for verdadeira (e este universo unico), como vc se posiciona com relação a existencia de Deus? No mais, concordo com quase tudo que vc falou.
ps : e toda a defesa que fiz do ajuste fino, ate o momento, foi com essa premissa (evento unico para universo unico).
Abs
Felipe